PRESCRIÇÃO E DECADÊNCIA NO CÓDIGO CIVIL


02/01/2014 às 14h17
Por Luciano Magno Campos Campanella

Os Institutos da prescrição e decadência estão dispostos no novo Código Civil em seus artigos 189 a 206, e artigos 207 a 211 respectivamente.

Como a matéria era confusa na vigência do Código Civil de 1916, Agnelo Amorim Filho, visando esclarecer o assunto, concebeu um artigo histórico em que associava os prazos prescricionais e decadenciais a ações correspondentes, buscando quais as ações imprescritíveis. Ele associava a prescrição as ações condenatórias, ou seja, aquelas ações relacionadas com direitos subjetivos, próprio das pretensões pessoais. Por outro lado, a decadência estaria associada a direitos potestativos e as ações constitutivas, sejam positivas ou negativas. Manteria, portanto, relação com um estado de sujeição, próprio dos direitos potestativos.

Por fim as ações meramente declaratórias, como aquelas que buscam a nulidade absoluta de um negócio seriam imprescritíveis.

Não há nenhuma dúvida sobre a adoção da teoria do autor supracitado pelo novo Código Civil.

O artigo 189 do Código Civil dispõe que violado um direito nasce para o seu titular uma pretensão, que pode ser extinta pela prescrição sendo denominada Tese da Prescrição da Pretensão.

A prescrição pode ser extintiva, tratada na Parte Geral, ou aquisitiva, caso de usucapião tratado no Direito das Coisas. A prescrição extintiva é uma sanção ao titular do direito violado que extingue tanto a pretensão positiva quanto a negativa.

Existem debates doutrinários quanto à natureza jurídica da prescrição extintiva, havendo aqueles que entendem tratar-se de um fato jurídico strictu sensu e outros que entendem ser um ato jurídico strictu sensu. Compartilhamos da 1º posição, já que na prescrição há perda da pretensão justamente por uma ausência de vontade, já tratamento diverso deve ser dado à prescrição aquisitiva por usucapião. Quanto à contagem do prazo prescricional, é o teor do Enunciado nº 14, aprovado na I jornada de Direito Civil realizada em setembro de 2002: “Artigo 189: 1) o início do prazo prescricional ocorre com o surgimento da pretensão, que decorre da exigibilidade do direito subjetivo; 2) o artigo 189 diz respeito a casos em que a pretensão nasce imediatamente após a violação do direito absoluto ou da obrigação de não fazer’’. É a posição adotada por nós.

O artigo 190 prevê que a exceção prescreve no mesmo prazo em que a pretensão.

O artigo 191 admite a renúncia à prescrição por parte daquele que dela se beneficia, o devedor. Pode ser expressa mediante declaração comprovada e idônea do devedor que induzem a tal fato, como o pagamento total ou mesmo parcial da dívida prescrita, que não pode ser repelida, exemplo que é de obrigação natural (art. 882 CC).

Quanto aos prazos, não podem ser alterados pelas partes, conforme dispõe o art.192.

Prevê o artigo 193 que a prescrição pode ser alegada em qualquer grau de jurisdição, pela parte a quem aproveitar.

O juiz não pode suprir, de ofício, a alegação da prescrição, salvo se beneficiar a absolutamente incapaz, regra que consta do artigo 194 do CC.

A prescrição não se refere a direitos não patrimoniais, pois foi adotada a tese de Agnelo de Amorim Filho.

Entendemos que o artigo supramencionado revogou o artigo 219, parágrafo 5º do Código de Processo Civil, que dispõe “Não se tratando de direitos patrimoniais, o juiz poderá, de ofício, conhecer da prescrição e decretá-la de imediato”. Conclusão esta do Enunciado nº 155 do Conselho de Justiça Federal: “O art. 194 do CC de 2002, ao permitir a declaração ex ofício da prescrição de direitos patrimoniais em favor do absolutamente incapaz, derrogou o disposto no parágrafo 5º do art. 219 do CPC”.

Já o artigo 195 dispõe que os relativamente incapazes e as pessoas jurídicas, têm ação contra os seus assistentes ou representantes legais, que devem causa à prescrição, ou não a alegarem oportunamente.

Encerrando as regras gerais de prescrição, prevê o art. 196 que “A prescrição iniciada contra uma pessoa continua a correr contra o seu sucessor”.

Quanto as causas, elas podem ser impeditivas ou suspensivas da prescrição e estão dispostas nos artigos 197 e 201:

“Art.197: Não corre a prescrição nas seguintes hipóteses:

A) entre os cônjuges, na constância da sociedade conjugal;

B) entre ascendente e descendente, durante o poder familiar;

C) entre tutelados ou curatelados e seus tutores e curadores, durante a tutela e curatela.

Pelo inciso I, entre marido e mulher não correrá a prescrição ainda não iniciada, ou se iniciada, será suspensa.

No inciso II, o prazo prescricional inicia-se da data em que o menor completa 18 anos, exceção feita aos casos de emancipação, previstos no art. 5º da codificação novel.

Por fim, o inciso III mantém a regra anterior pela qual não corre a prescrição entre tutor e tutelado, curador e curatelado.

O art. 198 prevê que também não corre a prescrição contra os incapazes (art. 3º CC), contra os ausentes do País em serviço público da União, dos Estados ou dos Municípios e contra os que se acharem servindo nas Forças Armadas, em tempo de guerra.

Já o art. 199 trata de causas impeditivas (incisos I e II) e de causa suspensiva (inciso III), que merecem o mesmo tratamento prático, envolvendo situações entre pessoas.

O inciso I prevê que não corre a prescrição pendendo condição suspensiva, o que para o autor é causa impeditiva. Pode ser conceituada como um evento futuro e incerto que suspende a aquisição de direitos, bem como a eficácia de um ato ou negócio jurídico.

Quanto ao inciso II o autor entende que o comando legal em questão refere-se não ao prazo de prescrição, mas aquele fixado para um ato ou negócio jurídico.

Já, pelo mesmo comando legal, há causa suspensiva pendendo ação de evicção (inc.III). A evicção é a perda da coisa em decorrência de uma sentença que a atribui a terceiro, cujo tratamento legal específico consta entre os arts. 447 a 457 da codificação. De acordo com o artigo em questão, pendendo qualquer ação entre estas pessoas, a prescrição permanecerá suspensa.

O artigo 200 dispõe que quando a ação se originar de fato que deva ser apurado no juízo criminal, não correrá a prescrição antes da respectiva sentença definitiva. Este dispositivo tem aplicação direta nos casos em que envolvem a pretensão indenizatória, com prazo prescricional de 3 anos, contados da ocorrência do evento danoso ou do conhecimento de sua autoria, conforme o art.206 parágrafo 3º , V, CC.

Propõe o artigo 201 que suspensa a prescrição em favor de um dos credores solidários, só aproveitam aos outros se a obrigação for indivisível.

A interrupção do prazo prescricional envolve condutas do credor e do devedor, sendo que em relação aos efeitos, é cediço que a interrupção faz com que o prazo retorne ao seu inicio, partindo do seu ponto zero.

O artigo 202 diz que a interrupção somente poderá ocorrer uma vez. Como primeira hipótese de interrupção (art.202, I) pode ocorrer “por despacho do juiz, mesmo incompetente, que ordenar a citação, se o interessado o promover no prazo e na forma da lei processual”.

Também dispõe nos seus incisos II e III que ocorre a interrupção da prescrição por protesto judicial, bem como pelo protesto cambiário. Dessa forma, está totalmente revogada a Súmula nº 153 do STF pela qual simples “protesto cambiário não interrompe a prescrição”.

Interrompe-se também a prescrição pela apresentação do título de crédito em juízo de inventário ou em concurso de credores (Inciso IV).

O inciso V trata da interrupção da prescrição por qualquer ato judicial que constitua em mora o devedor.

Os incisos supracitados prevêm casos em que condutas do credor podem gerar a interrupção da prescrição, mas o inciso VI traz o único caso em condutas do devedor trazem o mesmo efeito:

“Art.202 (...), VI – por qualquer ato inequívoco, ainda que extrajudicial que importe reconhecimento do direito pelo devedor”.

O artigo 203 prevê: “A prescrição pode ser interrompida por qualquer interessado”. Cabe ao juiz, dentro das regras de equidade e razoabilidade, apontar quem seria o interessado referido no dispositivo.

O artigo 204 diz que a interrupção da prescrição por um credor não aproveita aos outros.

De acordo com o seu parágrafo 1º, contrariando a regra do caput, a interrupção atingirá os credores e devedores solidários, bem como os herdeiros destes.

O parágrafo 2º prevê no caso dos herdeiros observar norma específica.

O parágrafo 3º dispõe que a interrupção em prejuízo do devedor principal, também atingirá o fiador.

Quanto aos prazos para a prescrição previstos na Parte Geral do CC, dá-se por: 1º) Prazos ordinários, ou comuns, em geral, 10 anos – art.205. 2º) Prazos Especiais previstos no art. 206 e são de 1,2,3,4,5 anos

São imprescritíveis as ações sobre:

1.Os direitos da personalidade, como o direito à vida, à honra, à liberdade, à integridade física ou moral;

2.Estado da pessoa, como filiação, a condição, conjugal e a cidadania;

3.As ações declaratórias de nulidades absolutas, por envolverem questões de ordem pública;

4.O Direito de Família referente à prestação alimentícia, a vida conjugal, o regime de bens, a nulidade de casamento, a separação, o divórcio, o reconhecimento e dissolução da união estável;

5.As ações referentes a bens públicos de qualquer natureza.

Já a Decadência é a perda de um direito em decorrência de ausência de seu exercício, lembrando os critérios científicos de Agnelo de Amorim Filho para quem os prazos decadenciais estão relacionados com direitos potestativos, bem como aquelas ações que visam constituir positiva ou negativamente atos e negócios jurídicos, como no caso de ação anulatória de negócio jurídico.

Dispõe o artigo 207, salvo disposição legal em contrário, não se aplicam à decadência as normas que impedem, suspendem ou interrompem a prescrição.

Entretanto, constam algumas exceções no próprio CC, como o artigo subseqüente, pela qual a prescrição não corre contra os absolutamente incapazes apresentados no art.3º do CC.

O artigo 501, parágrafo único do CC, também é uma espécie de impedimento da decadência.

O prazo decadencial de 01 ano está previsto no caput do art.501 contado do registro do título em cartório.

O Código de Defesa do Consumidor prevê exceções, art. 26, parágrafo 2º, I e III.

Prevê o art.208 que “aplica-se à decadência o disposto nos artigos 195 e 198, inciso I”.

A decadência pode ser legal ou convencional. Legal é a que tem origem na lei, como em dispositivo do CC e do Código de Defesa do Consumidor, já a decadência convencional é a que tem origem na vontade das partes, estando prevista em contrato.

Não se pode renunciar a decadência legal, já a convencional pode, aplicando-se por analogia a regra do art.191.

De acordo com o art.210 CC o juiz deve de ofício, conhecer da decadência, quando estabelecida por lei. Já a decadência convencional, assim como a prescrição, não pode ser reconhecida de ofício. Isso é confirmado pelo art. 211 CC: “Se a decadência for convencional, a parte a quem aproveite pode alegá-la em qualquer grau de jurisdição, mas o juiz não pode suprir a alegação”

Todos os prazos prescricionais estão discriminados no art. 206 do CC. Logo todos os demais prazos estabelecidos tanto na Parte Geral quanto na Parte Especial do CC são decadenciais. Mais uma vez lembramos que de acordo com a obra de Agnelo de Amorim Filho os prazos decadenciais referem-se as ações constitutivas, sejam elas positivas ou negativas, diante da existência de um direito potestativo. Na grande maioria das vezes, relacionada com prazo decadencial, tem-se a ação constitutiva negativa típica, que é a ação anulatória.

  • Direito Civil
  • Prescrição e Decadência

Referências

BIBLIOGRAFIA: TARTUCE, Flávio. Direito Civil. Vol.2. 7º edição. São Paulo: Editora Método.

AMORIM FILHO, Agnelo. Critério científico para distinguir a prescrição da decadência e para identificar as ações imprescritíveis. Artigo publicado na RT nº 744 de 1997.  


Luciano Magno Campos Campanella

Advogado - Pouso Alegre, MG


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