ASPECTOS CONTROVERSOS ACERCA DA EMENDATIO E MUTATIO LIBELLI
INTRODUÇÃO:
Apesar das reformas de 2008, uma série de discussões ainda são pertinentes acerca destes temas. Existem dentro do nosso ordenamento jurídico, e, principalmente nos posicionamentos doutrinários e jurisprudenciais, discussões sobre problemas na identificação ainda de supostas violações ao sistema acusatório, de questões relacionadas a contraditório e ampla defesa não totalmente satisfeitos, em se tratando dos institutos da emendatio e mutatio libelli.
Assim, emendatio e mutatio libelli, foram objeto da reforma implementada em 2008, pela Lei 11.719. Sabemos que, de 2008 pra cá, não discriminando as reformas anteriores do CPP, o número de reformas do CPP é, evidentemente, enorme, o que fez com que o código passasse a ser considerado quase que uma concha de retalhos. Mas isso era necessário. É evidente que o ideal é que tenhamos a projeção de um novo conjunto de normas processuais penais com, obviamente, o projeto de lei que tramita hoje no Congresso Nacional, que é o novo CPP.
Mas enquanto não surge esse novo CPP, era preciso adequar os gritantes dispositivos inconstitucionais, que efetivamente se mostravam em desacordo com a Carta maior, que como cediço, muito trata do processo penal, tanto que alguns autores se reportam a um processo penal constitucional, visto que o CPP se demonstra totalmente insuficiente frente ao que a CF estabelece como garantias e DFs individuais que tenham relação com o processo penal brasileiro.
Nossa preocupação se refere a emendatio e mutatio libelli, e como dito, sofremos uma reforma em 2008, ocorrida nos arts 383 e 384 do CPP, que dizem respeito a emendatio e a mutatio respectivamente. Tendo dito tudo isso, partiremos desta reforma para chegarmos aos pontos de controvérsia da atualidade, trazendo os principais pontos ainda polêmicos relacionados a estes dois institutos.
ARTIGOS 383/384 ANTES E DEPOIS DA LEI 11.719/08:
Artigo 383 antes da Lei 11.719/08:
Art. 383, CPP. O juiz poderá dar ao fato definição jurídica diversa da que constar da queixa ou da denúncia, ainda que, em consequência, tenha de aplicar pena mais grave.
Artigo 383 após a Lei 11.719/08:
Art. 383 CPP. O juiz, sem modificar a descrição do fato contida na denúncia ou queixa, poderá atribuir-lhe definição jurídica diversa, ainda que, em consequência, tenha de aplicar pena mais grave.
§ 1º Se, em consequência de definição jurídica diversa, houver possibilidade de proposta de suspensão condicional do processo, o juiz procederá de acordo com o disposto na lei.
§ 2º Tratando-se de infração da competência de outro juízo, a este serão encaminhados os autos.
Percebe-se que, após a reforma, a redação do art 383 ficou mais rebuscada, no entanto, o seu conteúdo é o mesmo, não havendo uma efetiva mudança naquilo que pretendia alcançar.
O art 383, como visto, em sua redação original, apresenta a palavra ¨fato¨ antes da expressão ¨definição jurídica¨, e assim permaneceu com a reforma pela Lei 11.719, ou seja, de fato, não houve alteração das disposições do artigo em questão, no que se refere a palavra ¨fato¨ e a expressão ¨definição jurídica¨, sendo assim, aquela fora mantida em momento anterior desta.
Costuma-se utilizar isso como um macete, para explicar o que ocorre com o instituto da emendatio libelli, vejamos: Na emendatio, o fato é precedente, já era conhecido, e como visto, não fora alterado, se mantendo o mesmo, tanto em fase pré-processual, como durante o processo e também será este o fato a ser apreciado pelo juiz ao proferir sentença. O fato não mudou.
No entanto, faz-se necessário uma pequena retificação: Imagina-se que estivéssemos diante de um inquérito policial, e que este apresentasse dentro dos elementos de prova, o crime de furto. Com base neste inquérito, imagina-se que o Ministério Público ofereça a denúncia descrevendo o fato tal qual os elementos de informação viabiliza, ou seja, que realmente houve o crime de furto.
Porém, no momento de formular o pedido de condenação, o parquet indica como dispositivo legal aplicável o art. 157, o que caracteriza o crime de roubo. Portanto, na denúncia, narra-se o crime de furto, mas pede-se a condenação nas penas do art. 157 (crime de roubo). Neste caso, é provável que tenha havido um erro material por parte do MP.
Durante a instrução criminal, fase de colheita de provas em juízo, a prova demonstra existir o crime de furto, ou seja, o fato sempre foi o mesmo, já conhecido e não é alterado. É aqui que utilizamos o ¨macete¨, onde o fato, na emendatio libelli, será precedente, mantendo-se sempre o mesmo durante todo o processo. E, ao final, o juiz ao proceder a sentença, estando os fatos corretamente narrados, aplicará a pena de furto, fazendo uma emenda no que se refere ao dispositivo legal.
Portanto, no caso da emendatio libelli, o juiz faz uma retificação, uma emenda, adequando-se ao caso concreto.
INTRODUÇÃO DOS PARÁGRAFOS NO ARTIGO 383:
Ademais, com a reforma de 2008, acrescentaram-se dois parágrafos no art. 383. No exemplo dado, como visto, enquanto os fatos narrados remetem ao crime de furto, com pena de reclusão de 1 (um) a 4 (quatro) anos, o pedido do MP se deu com base no crime de roubo, cuja pena prevista em lei será de 4 (quatro) a 10 (dez) anos.
Surge então um grande inconveniente, qual seja, o crime de furto faria jus, em razão do critério pena mínima cominada a conduta em abstrato, ao benefício da suspensão condicional do processo (Lei 9099, art. 99), e o MP, tão logo oferecida e recebida a denúncia poderia propor o benefício.
Entretanto, quando do oferecimento desta denúncia, embora a narrativa fática caracterizasse um crime de furto, que faria jus ao benefício da suspensão condicional do processo, o tipo penal indicado na denúncia não correspondia. Por isso, em razão do tipo penal inapropriado indicado, não fora oferecido pelo MP o benefício da suspensão condicional do processo.
Na nova redação do art. 383, em seu §1º, traz uma nova solução para este problema, dizendo que, se em razão de um eventual equívoco na tipificação da denúncia não for oferecida a proposta de suspensão condicional do processo, o juiz, antes de proferir a sentença, dará a oportunidade ao MP de oferecê-la.
A redação do §2º do art. 383 ainda traz que, em se tratando de infração da competência de outro juízo, a este serão encaminhados os autos.
De acordo com a lei, o momento oportuno para que o juiz aplicasse o instituto da emendatio lbelli, seria o momento da sentença. Assim, o juiz deveria permanecer inerte durante todo o processo, aguardando o momento de sentenciar, quando então adequará o tipo penal àquele que seria cabível ao caso concreto.
Pergunta-se: Não seria razoável, que ao menos em determinados casos, o juiz pudesse antecipar a prática ou aplicação da emendatio?
No exemplo dado, a denúncia narra claramente o crime de furto. Se o crime narrado era evidentemente o de furto e o juiz recebesse a denúncia, já não poderia, desde logo, recebê-la pelo tipo penal adequado, viabilizando desde logo a oferta da suspensão condicional do processo?
Imagina-se também que fosse uma hipótese de incompetência flagrante do juízo. O juiz ao ler a denúncia, quando do juízo de admissibilidade da ação, analisando as peças de informação e a narrativa fática contida na exordial, não poderia desde logo antecipar a emendatio? Ou será que deveria aguardar toda a instrução processual para então, somente no momento de proferir a sentença, operar tal instituto?
O fato é que o instituto da emendatio está inserido no CPP, em seu capítulo da sentença. Assim, a posição dominante caminha no sentido de que não é possível a antecipação da emendatio.
Artigo 384 antes da Lei 11.719/08:
Art. 384 CPP. Se o juiz reconhecer a possibilidade de nova definição jurídica do fato, em consequência de prova existente nos autos de circunstância elementar, não contida, explícita ou implicitamente, na denúncia ou na queixa, baixará o processo, a fim de que a defesa, no prazo de oito dias, fale e, se quiser, produza prova, podendo ser ouvidas até três testemunhas.
Parágrafo único. Se houver possibilidade de nova definição jurídica que importe aplicação de pena mais grave, o juiz baixará o processo, a fim de que o Ministério Público possa aditar a denúncia ou a queixa, se em virtude desta houver sido instaurado o processo em crime de ação pública, abrindo-se, em seguida, o prazo de três dias à defesa, que poderá oferecer prova, arrolando até três testemunhas.
Artigo 384 após a Lei 11.719/08:
Art. 384 CPP. Encerrada a instrução probatória, se entender cabível nova definição jurídica do fato, em consequência de prova existente nos autos de elemento ou circunstância da infração penal não contida na acusação, o MP deverá aditar a denúncia ou queixa, no prazo de 5 dias, se em virtude desta houver sido instaurado o processo em crime de ação pública, reduzindo-se a termo o aditamento, quando feito oralmente.
§ 1º Não procedendo o órgão do Ministério Público ao aditamento, aplica-se o art. 28 deste Código.
§ 2º Ouvido o defensor do acusado no prazo de 5 (cinco) dias e admitido o aditamento, o juiz, a requerimento de qualquer das partes, designará dia e hora para continuação da audiência, com inquirição de testemunhas, novo interrogatório do acusado, realização de debates e julgamento.
§ 3º Aplicam-se as disposições dos §§ 1º e 2º do art. 383 ao caput deste artigo.
§ 4º Havendo aditamento, cada parte poderá arrolar até 3 (três) testemunhas, no prazo de 5 (cinco) dias, ficando o juiz, na sentença, adstrito aos termos do aditamento.
§ 5º Não recebido o aditamento, o processo prosseguirá.
Percebe-se que no art. 384, diferentemente do art. 383, a palavra ¨fato¨ aparece em momento posterior a expressão ¨definição jurídica¨. Ou seja, diferentemente da emendatio, em que o fato é precedente, permanecendo inalterado durante todo o processo, a mutatio se caracteriza pela mudança dos fatos, onde, durante o processo surgem provas de que os fatos são distintos dos narrados na exordial acusatória, sendo necessário, portanto, que haja a alteração do conteúdo fático descrito inicialmente.
O parágrafo único da redação original discriminava que, no caso da nova definição jurídica, em virtude de provas contidas nos autos que não estivessem contidas na peça acusatória, indicarem a existência de um crime mais grave, o MP deveria ser intimado pelo juiz para promover o aditamento.
Deste parágrafo único surgiram inúmeras críticas, e a primeira delas se referia a sua inconstitucionalidade, no sentido de que a privatividade da ação penal pública foi entregue ao MP pela Constituição, assim, deveria o MP, até por conta do Princípio da obrigatoriedade, que rege a sua atuação, aditar a denúncia espontaneamente, e não ser intimado pelo Judiciário, afinal de contas este é inerte, tendo que ser provocado pelo MP, e não o contrário.
Sendo assim, o parágrafo único da antiga redação do art. 384, era, nitidamente, uma afronta ao sistema acusatório e ao princípio da inércia, razão pela qual fora extinto com a reforma dada pela Lei 11.719/08.
Além do parágrafo único deste dispositivo, Nucci e outros autores também já vinham se posicionando no sentido da inconstitucionalidade do caput, afinal, este dizia que se o juiz reconhecesse a existência de prova nos autos que demonstrasse ser o crime diverso do constante na peça acusatória, mas que importasse em pena de idêntica ou menor gravidade, bastaria ouvir a defesa. No entanto, estes autores diziam que, se os fatos não estão narrados, tem de ser, visto que, não existe a possibilidade de que a defesa exerça o contraditório e a ampla defesa sobre aquilo que não consta da acusação, ou seja, como poderia a defesa se defender daquilo que não fora narrado? E não pode o juiz alterar a denúncia, visto que não é órgão de acusação.
Portanto, vários eram os doutrinadores que diziam que o caput do art. 384 também era inconstitucional, por flagrante violação ao contraditório e a ampla defesa, razão pela qual acabou ocorrendo sua alteração, também pela reforma dada pela Lei 11.719, de 2008.
Com a reforma, a nova redação do art. 384 trouxe que competirá ao Ministério Público alterar a denúncia e fazer ali constar a narrativa correta, de forma a viabilizar o contraditório, a ampla defesa e principalmente, a correlação entre acusação e sentença.
Assim, a nova redação do art. 384 manteve a estrutura que precisamos demonstrar, onde há a definição jurídica e o fato surge após; Exemplo: Sabe-se que os crimes de furto e apropriação indébita, apesar de terem suas condutas completamente distintas, possuem a mesma pena, qual seja, reclusão de 1 (um) a 4 (quatro) anos. Pergunta-se: Quem se defendeu de ter subtraído coisa alheia móvel (crime de furto), se defendeu de ter a posse ilícita da coisa e de ter invertido o animus da posse (crime apropriação indébita)? Não, haja vista serem narrativas completamente distintas.
Sendo assim, imagina-se que se tenha um inquérito que narra a existência de um furto. A denúncia é oferecida com base nestes elementos de informação do crime de furto, formulando o pedido de condenação. A prova colhida durante o processo demonstra que a conduta, na verdade, é distinta. O que se espera do MP, que é o órgão de acusação, é que ele tome a iniciativa de alteração, promovendo o aditamento, e assim, alterando a narrativa dos fatos, fazendo com que ela se adéque. Estando os fatos corretamente narrados na denúncia, a defesa poderá se manifestar, e o juiz poderá proferir a sentença pelo crime efetivamente praticado, que é o crime de apropriação indébita.
INTRODUÇÃO DOS PARÁGRAFOS NO ARTIGO 384:
A redação nova do art. 384 manteve em seus parágrafos a mesma ideia apresentada nos parágrafos do art. 383. Ou seja, se em virtude da mutatio libelli, ocorrer a necessidade de declínio de competência, o juiz deverá declinar da competência; se em virtude da mutatio, após o aditamento do MP, o juiz verificar da possibilidade de benefícios, como por exemplo, a suspensão condicional do processo, deverá instar o MP para que se manifeste acerca da proposta etc.
O art. 384 apresenta hoje, um dispositivo que também não era mencionado na redação anterior, mas o entendimento antes da reforma já era o de que, se o membro do MP que oficia na primeira instância não promovesse o aditamento quando ocorresse o fenômeno da mutatio, o juiz deveria aplicar o art. 28, remetendo os autos ao Procurador-Geral de Justiça. Assim, o que antes era aplicado por analogia, e era o entendimento doutrinário e jurisprudencial, hoje consta da própria lei.
Portanto, hoje, está de forma expressa na lei, conforme reza o §1º do art. 384, que em não ocorrendo o aditamento de forma espontânea pelo Promotor de Justiça, o juiz, enquanto fiscal do princípio da obrigatoriedade, deve aplicar o art. 28, remetendo os autos ao Procurador-Geral, para que este, se entender adequado, promova o aditamento.
EFETIVIDADE DO CONTRADITÓRIO:
O grande problema em virtude dos institutos da emendatio e da mutatio libelli, sequer dizem respeito a figura da correlação da acusação e sentença, mas sim, a efetividade do princípio do contraditório.
É fato que o processo penal brasileiro está, obviamente adstrito, ao que chamamos de princípio da congruência, ou seja, espera-se uma sentença dentro dos limites da peça acusatória ofertada, e que provoca o Judiciário, delimita a sua atuação.
Repara-se que no processo civil, os juízes estão adstritos ao pedido formulado na petição inicial, enquanto que, no processo penal, o princípio da congruência, também chamado de princípio da correlação entre acusação e sentença, tem contornos diferentes, pois faz com que o juiz tenha que proferir uma sentença nos limites da imputação, apresentada pelo órgão de acusação, na peça exordial.
Na verdade, a acusação no processo penal inclui o que chamamos de imputação e o pedido. A imputação confere, dentro do contexto do processo civil, com aquilo que lá seria chamado de causa de pedir. No processo penal, deve ser viabilizado o contraditório e a ampla defesa ao réu, sobre os fatos narrados na exordial, exatamente por isso, que se considera inepta uma denúncia que não faz a narrativa pormenorizada dos fatos. Assim, é necessário que a narrativa fática da peça acusatória viabilize todos os contornos do exercício da ampla defesa e contraditório, portanto, não basta o MP, ao elaborar a denúncia, apenas a indicação do fato penal, sendo necessário que ele faça uma narrativa de acordo com o que se espera do fato processual penal.
O MP não poderia, por exemplo, oferecer uma denúncia por homicídio, simplesmente imputando a morte de uma pessoa a alguém, sendo preciso que a narrativa indique o dia, o horário, o local, todas as circunstâncias envolvidas na prática da conduta, e que viabilize amplamente o exercício da ampla defesa.
Por isso mesmo é que existe a figura do ¨aditamento impróprio¨, onde o MP não pode, por exemplo, deixar de indicar na denúncia, a hora em que ocorreram os fatos. Ora, se um sujeito está às 15hrs em São Paulo, pode perfeitamente estar às 17hrs, no Rio de Janeiro. Contudo, a narrativa dos fatos deverá ser pormenorizada, o que indicamos como o fato processual penal, tão bem indicado na obra de Gustavo Badaró, sobre correlação entre acusação e sentença.
Portanto, ao formular a acusação, o MP deverá narrar os fatos através da chamada imputação e ao final formula um pedido de condenação genérico. A sentença deverá estar dentro dos contornos daquilo que fora imputado ao acusado. Daqui surgem uma série de problemas.
Ao falar da ampla defesa, deve-se saber que esta inclui a autodefesa e a defesa técnica. É certo que a máxima ¨narra os fatos e o juiz aplica o direito¨ parece interessante, no entanto, a ampla defesa, como dito, inclui a defesa técnica, não podendo se dispensar os critérios relacionados a esta, onde, embora o réu, no exercício da autodefesa, por não conhecer as questões de direito, efetivamente se defensa dos fatos, cabe a defesa deste acusado, defendê-lo também das questões jurídicas envolvidas no caso concreto.
Portanto, deve-se pensar se efetivamente existe efetividade no contraditório imposto somente sobre as questões de fato. Indaga-se se também não seria necessário, no caso do instituto da emendatio libelli, onde o juiz altera a situação jurídica dada ao fato, que fosse colocado também sob a ótica da defesa, as questões de definição jurídica aplicada àquele caso concreto, afinal, existem inúmeras repercussões sobre as questões de direito.
Assim, a primeira crítica que surgirá é que seria necessário para a emendatio, tanto quanto na mutatio libelli, um aditamento. Em segundo, se realmente seria necessário aguardarmos o momento da sentença para fins de que o juiz operasse a emendatio, principalmente nas hipóteses em que a emendatio implicasse na possibilidade de benefícios, que não fossem possíveis de serem observados com o erro de tipificação apresentada na peça inicial.
Em suma, são problemas que surgem em função da emendatio e da mutatio libelli que precisam ser solucionados, ou por uma alteração legislativa ou pela nossa jurisprudência, muitas vezes com uma mudança de posicionamento.
QUESTIONAMENTOS:
Será realmente o momento da sentença, o momento adequado para a emendatio?
Será que esta não deveria ocorrer em momento anterior, de forma adequar o processo? Seja em termos de competência do juízo, quando ocorrer uma incompetência, seja em relação a concessão de benefícios que antes não foram concedidos, seja em relação a alteração de um suposto procedimento (muitas vezes, a tipificação dado a um determinado fato poderá alterar, inclusive, o rito processual aplicado à espécia – Desta forma, como ficaria o devido processo legal se todo o rito fora todo percorrido e ao final, quando o juiz for proferir a sentença, se verifica que o crime era outro, e que o rito aplicável seria diverso? Onde estaria a economia processual?).
Sendo assim, será que não deveríamos abrir exceções para que se antecipasse a emendatio, senão para o juízo de admissibilidade da acusação, ao menos para o momento da absolvição sumária, do art. 397 do CPP, criada pela reforma de 2008? Se afirmativo, isso seguramente viabilizaria benefícios, procedimentos, competência etc.
EMENDATIO LIBELLI ANTECIPADA:
Os Tribunais Superiores sempre tiverem um posicionamento bastante claro acerca do momento oportuno para o instituto da emendatio libelli.
Seria possível a antecipação? Se a denúncia, quando recebida, já fosse recebida pelo tipo penal correto? Há casos em que este erro pode realmente se caracterizar por um erro material, e outros casos em que a situação é gritante, sendo extremamente prejudicial ao acusado.
O posicionamento dominante dos Tribunais versam sobre a inadmissibilidade da antecipação da emendatio libelli.
Vide a decisão que, posteriormente, fora divulgada no Informativo 702 do STF:
STF. DENÚNCIA. ERRO NA TIPIFICAÇÃO. LEI 9099/95.
A 1ª Turma, ante a inadequação da via eleita e por não vislumbrar ilegalidade flagrante, abuso de poder ou teratologia a justificar a concessão da ordem, de ofício, julgou extinto, por maioria, habeas corpus que pretendia substituir recurso ordinário constitucional. Na espécie, o paciente fora denunciado pela suposta prática dos crimes de falsidade documental e ideológica e uso de documento falso (CP, artigos 297, 299 e 304). Buscava a concessão da ordem para corrigir a capitulação jurídica da denúncia — para tentativa de estelionato — a possibilitar o benefício da suspensão condicional do processo (Lei 9.099/95, art. 89). Destacou-se jurisprudência da Corte no sentido de não ser possível, na via do habeas corpus, discutir-se a correta tipificação dos fatos imputados ao paciente na ação penal. Ponderou-se, ainda, não ser lícito ao magistrado, quando do recebimento da denúncia, em mero juízo de admissibilidade da acusação, conferir definição jurídica aos fatos narrados na peça acusatória. O momento adequado para fazê-lo seria na prolação da sentença, ocasião em que poderia haver a emendatio libelli ou a mutatio libelli, se a instrução criminal assim o indicar. Vencido o Min. Marco Aurélio, que concedia a ordem de ofício. Precedentes citados: HC 98526/RS (DJe de 20.8.2010) e HC 87324/SP (DJe de 18.5.2007). (STF. HC 111445/PE, Primeira Turma, Rel. Min. Dias Toffoli, 16.4.2013)
No mesmo sentido, tem-se uma decisão do STJ.
STJ. RECURSO ORDINÁRIO EM HABEAS CORPUS. CRIME CONTRA O SISTEMA FINANCEIRO (ART. 20, DA LEI 7.492/1986). PLEITO DE DESCLASSIFICAÇÃO PARA DELITO CONTRA A ORDEM TRIBUTÁRIA (ART. 1º, I, DA LEI 8.137/1990). ALEGADO EQUÍVOCO NA CAPITULAÇÃO DA CONDUTA. RECONHECIMENTO DA PRESCRIÇÃO. TRANCAMENTO DA AÇÃO PENAL. INADMISSIBILIDADE NO MOMENTO DO RECEBIMENTO DA DENÚNCIA. JUÍZO DE ADMISSIBILIDADE DA ACUSAÇÃO. POSSIBILIDADE DA EMENDATIO LIBELLI OU DA MUTATIO LIBELLI NA PROLAÇÃO DA SENTENÇA. AUSÊNCIA DE FLAGRANTE ILEGALIDADE. RECURSO DESPROVIDO. O momento do recebimento da denúncia, no qual o Magistrado faz apenas um juízo de admissibilidade da acusação, não é adequado para a desclassificação da conduta descrita para adequação da capitulação do delito, sendo na prolação da sentença o momento mais apropriado para tal medida, por meio dos institutos da emendatio libelli e da mutatio libelli. Nesse contexto, não há falar em inépcia da denúncia ou prejuízo à defesa, na medida em que o réu se defende dos fatos narrados e não da capitulação jurídica, podendo o Juízo, após a instrução probatória, atribuir aos fatos descritos na exordial acusatória, definição jurídica diversa nos termos dos arts. 383 e 384 do Código de Processo Penal. - In casu, os fatos narrados na denúncia, não autorizam, neste momento processual, concluir pela existência de erro grosseiro na capitulação jurídica do delito, razão pela qual mostra-se inadmissível o encerramento prematuro da ação penal, reconhecendo, ainda, a prescrição da pretensão punitiva estatal, tendo em vista o claro adiantamento do juízo de mérito da ação penal, a suprimir das instâncias ordinárias o conhecimento da causa. Recurso ordinário a que se nega provimento. (STJ, Rel. Min. Marilza Maynard (Desembargadora Convocada do TJ/SE), Data de Julgamento: 20/03/2014, T6 - SEXTA TURMA)
EMENDATIO LIBELLI ANTECIPADA E SUA INADMISSIBILIDADE PELOS TRIBUNAIS:
Este, portanto, seria o posicionamento dos Nossos Tribunais Superiores. No entanto, qual seriam as implicações para a defesa do acusado ou para questões que decorrem da tipificação jurídica nos casos concretos? Ou seja, quais seria os prejuízos deste posicionamento? Porque este posicionamento, na visão de muitos, não seria o correto?
IMPLICAÇÕES - Ausência de economia processual:
Imagina-se uma denúncia oferecida narrando que um indivíduo, credor de uma dívida que não vinha sendo paga pelo devedor, em razão de várias cobranças sem sucesso, prática a previsto no art. 158, o que caracteriza a extorsão. Ocorre que, da narrativa da denúncia, não se caracteriza extorsão, mas sim exercício arbitrário das próprias razões.
Se o crime fosse extorsão, seria de ação penal pública, porém, em se tratando do crime de exercício arbitrário das próprias razões, configura-se um crime de ação penal privada.
A primeira grande discussão que se dá, diz respeito a legitimidade da parte, que é uma condição da ação, devendo ser apreciada pelo juiz no juízo de admissibilidade da ação. Assim, deveria o juiz, fazendo a leitura da denúncia oferecida pelo MP e vislumbrando que, na verdade, se trata de outro crime, receber a denúncia somente porque o momento ideal não é aquele?
Daí surgem outras discussões: Se o crime for de ação penal privada, além da discussão sobre a legitimidade do MP para oferecer a denúncia, surge a discussão sobre uma possível causa extintiva da punibilidade – haja vista que, em sendo um crime de ação penal privada, a vítima deveria oferecer a queixa dentro do prazo decadencial de seis meses. Assim, será que já não teria decorrido esse tempo, devendo então ser declarada extinta a punibilidade em função da decadência? Ademais, o reconhecimento de causas extintivas da punibilidade se caracteriza como sendo questão de ordem pública, e, portanto, poderia ser reconhecida de ofício pelo juiz.
Além disso, se realmente o crime for de exercício arbitrário das próprias razões, o rito aplicado não seria o ordinário, o qual é utilizado para a extorsão, mas sim o sumaríssimo, da Lei 9099/95. Devendo também haver um declínio de competência, afinal seria competente os Juizados Especiais Criminais, observados os benefícios como conciliação, transação penal, suspensão condicional do processo etc.
Neste caso concreto, portanto, haveria um enorme o prejuízo da não operação da emendatio libelli num momento anterior a sentença.
Assim, é evidente que, diante de todo este contexto, é flagrante também a ausência de economia processual.
EMENDATIO LIBELLI ANTECIPADA E SUA ADMISSIBILIDADE PELOS TRIBUNAIS:
Como dito, apesar de não ser a posição dominante, também há decisões favoráveis acerca da emendatio libelli.
Vide algumas decisões neste sentido:
STF 2007 – EMENTA: I. Habeas corpus: descabimento. A análise da suficiência dos indícios de autoria e da prova da materialidade não dispensa, no caso, o revolvimento de fatos e provas que lastrearam a denúncia, ao que não se presta o procedimento sumário e documental do habeas corpus. II. Denúncia: errônea capitulação jurídica dos fatos narrados: erro de direito: possibibilidade do juiz, verificado o equívoco, alterar o procedimento a seguir (cf. HC 84.653, 1ª T., 14.07.05, Pertence, DJ 14.10.05). 1. Se se tem, na denúncia, simples erro de direito na tipificação da imputação de fato idoneamente formulada é possível ao juiz, sem antecipar formalmente a desclassificação, afastar de logo as conseqüências processuais ou procedimentais decorrentes do equívoco e prejudiciais ao acusado. 2. Na mesma hipótese de erro de direito na classificação do fato descrito na denúncia, é possível, de logo, proceder-se a desclassificação e receber a denúncia com a tipificação adequada à imputação de fato veiculada, se, por exemplo, da sua qualificação depender a fixação da competência ou a eleição do procedimento a seguir. III. Concussão e corrupção passiva. Caracteriza-se a concussão - e não a corrupção passiva - se a oferta da vantagem indevida corresponde a uma exigência implícita na conduta do funcionário público, que, nas circunstâncias do fato, se concretizou na ameaça. IV. Nulidade processual: inobservância do rito processual específico no caso de crimes inafiançáveis imputados a funcionários públicos. Necessidade de notificação prévia (CPrPenal, art. 514). 1. É da jurisprudência do Supremo Tribunal (v.g. HC 73.099, 1ª T., 3.10.95, Moreira, DJ 17.5.96) que o procedimento previsto nos arts. 513 e seguintes do C.Pr.Penal se reserva aos casos em que a denúncia veicula tão-somente crimes funcionais típicos (C.Penal, arts. 312 a 326). 2. No caso, à luz dos fatos descritos na denúncia, o paciente responde pelo delito de concussão, que configura delito funcional típico e o co-réu, pelo de favorecimento real (C. Penal, art. 349). 3. Ao julgar o HC 85.779, Gilmar, Inf.STF 457, o plenário do Supremo Tribunal, abandonando entendimento anterior da jurisprudência, assentou, como obter dictum, que o fato de a denúncia se ter respaldado em elementos de informação colhidos no inquérito policial, não dispensa a obrigatoriedade da notificação prévia (CPP, art. 514) do acusado. 4. Habeas corpus deferido, em parte, para, tão-somente quanto ao paciente , anular o processo a partir da decisão que recebeu a denúncia, inclusive, a fim de que se obedeça ao procedimento previsto nos arts. 514 e ss. Do C.Pr.Penal e, em caso de novo recebimento da denúncia, que o seja apenas pelo delito de concussão. (STF. HC 89686, Rel. Min. Sepúlveda Pertence, Primeira Turma, j. 12/06/2007, DJe-082 , DJ 17-08-2007 pp. 58)
STF 2013 – EMENTA HABEAS CORPUS. PROCESSO PENAL. EMENDATIO LIBELLI. LAVAGEM DE ATIVOS. DESCLASSIFICAÇÃO NO RECEBIMENTO DA DENÚNCIA, PARA ESTELIONATO. ART. 383 DO CÓDIGO DE PROCESSO PENAL. MOMENTO PROCESSUAL ADEQUADO. RELATIVIZAÇÃO. ESPECIALIZAÇÃO DO JUÍZO. 1. Segundo a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal é a sentença o momento processual oportuno para a emendatio libelli, a teor do art. 383 do Código de Processo Penal. 2. Tal posicionamento comporta relativização – hipótese em que admissível juízo desclassificatório prévio –, em caso de erro de direito, quando a qualificação jurídica do crime imputado repercute na definição da competência. Precedente. 3. Na espécie, a existência de peculiaridade – ação penal relacionada a suposto esquema criminoso objeto da ação em trâmite na vara especializada em lavagem de ativos –, recomenda a manutenção do acórdão recorrido que chancelou a remessa do feito, comandada pelo Tribunal Regional Federal da 1ª Região para a 1ª Vara Federal da Seção Judiciária do Maranhão, que detém tal especialização. 4. Ordem denegada. (STF. HC 115831, Rel. Min. ROSA WEBER, Primeira Turma, julgado em 22/10/2013, DJe-227 DIVULG 18-11-2013 PUBLIC 19-11-2013)
Há um caso em que se tem a posição contrária a antecipação da emendatio libelli, porém se trata de uma hipótese em que agravaria a situação. Vide abaixo o julgado, que depois fora publicado no STJ, em seu Informativo 509.
STJ Informativo 0509 2012 – DIREITO PROCESSUAL PENAL. ALTERAÇÃO DA TIPIFICAÇÃO QUANDO DO RECEBIMENTO DA DENÚNCIA. FINALIDADE DE AFASTAR PRESCRIÇÃO. Não é possível que o magistrado, ao receber a denúncia, altere a capitulação jurídica dos fatos a fim de justificar a inocorrência de prescrição da pretensão punitiva e, consequentemente, viabilizar o prosseguimento da ação penal. A verificação da existência de justa causa para a ação penal, vale dizer, da possibilidade jurídica do pedido, do interesse de agir e da legitimidade para agir, é feita a partir do que contido na peça inaugural, que não pode ser corrigida ou modificada pelo magistrado quando do seu recebimento. Com efeito, ainda que se trate de mera retificação da capitulação jurídica dos fatos descritos na vestibular, tal procedimento apenas é cabível quando da prolação da sentença, nos termos do art. 383 do CPP (emendatio libelli). Quanto ao ponto, é imperioso destacar que, ainda que o acusado se defenda dos fatos narrados na denúncia, e não da definição jurídica a eles dada pelo MP, não se pode admitir que, no ato em que é analisada a própria viabilidade da persecução criminal, o magistrado se manifeste sobre a adequação típica da conduta imputada ao réu, o que, evidentemente, configura indevida antecipação de juízo de valor acerca do mérito da ação penal. Dessa forma, havendo erro na correta tipificação dos fatos descritos pelo órgão ministerial, ou dúvida quanto ao exato enquadramento jurídico a eles dado, cumpre ao magistrado receber a denúncia tal como proposta, para que, no momento em que for prolatar a sentença, proceda às correções necessárias. Ressalte-se que a doutrina e a jurisprudência têm admitido em determinados casos a correção do enquadramento típico logo no ato de recebimento da exordial acusatória, mas somente para beneficiar o réu ou para permitir a correta fixação da competência ou do procedimento a ser adotado. Por outro lado, não se pode admitir que o magistrado, em prejuízo ao réu e sem que exista erro grosseiro por parte do membro do Parquet, atue de modo a alterar os parâmetros da denúncia formulada, o que configura violação ao princípio dispositivo, desrespeito à titularidade da ação penal e antecipação do julgamento do mérito do processo. Portanto, já transcorrido o lapso prescricional previsto para o crime imputado na denúncia quando do juízo de admissibilidade da acusação, é imperiosa a extinção da punibilidade do agente pela prescrição da pretensão punitiva estatal. Precedentes citados do STF: HC 89.686-SP, DJ 17/8/2007; do STJ: HC 103.763-MG, DJe 16/3/2009. (STJ. RHC 27.628-GO, Rel. Min. Jorge Mussi, julgado em 13/11/2012).
Portanto, ainda que pequena, já temos alguma frente para eventual mudança de posicionamento dos Tribunais Superiores.
CRÍTICAS A EMENDATIO LIBELLI ANTECIPADA:
I) Denúncia de mãos próprias:
Existem determinados crimes, em que se tem a dificuldade de entendimento sobre qual crime seria aplicado; Exemplo: ameaça e constrangimento ilegal; roubo e extorsão etc.
Então, muitas vezes, determinadas condutas dependem de uma prova colhida durante o processo para confirmarem uma tipificação, que muitas vezes, pode ser uma opção do próprio órgão de acusação.
Portanto, a jurisprudência traz que, para estes casos, a antecipação da emendatio libelli caracteriza denúncia de mãos próprias, onde o Judiciário estaria usurpando o papel acusatório entregue nas mãos do MP, pois a opinio delict pertence ao MP, devendo o juiz aguardar a instrução processual para somente então verificar se houve erro de tipificação ou se se trata de um posicionamento do órgão de acusação no momento da formação da opinio.
II) Necessidade de aditamento:
Como já dito, diz respeito a necessidade de que a defesa pudesse se manifestar sobre estas questões de direito antes do juiz promover a alteração (exigência do contraditório).
III) Circunstâncias agravantes:
O art. 385 do CPP indica que, ainda que o MP se manifeste pela absolvição, o juiz poderá condenar, bem como reconhecer agravantes não contidas de forma implícita ou explícita na denúncia. Se o réu deve se defender de fatos, estes devem estar todos narrados, inclusive os que dão margem a agravantes, e até mesmo, se fossem o caso, a atenuantes, embora pudessem ser reconhecidas de ofício dentro do sistema favorável a liberdade que vigora em nosso ordenamento jurídico.
CRÍTICA ATUAL SOBRE O INSTITUTO DA MUTATIO LIBELLI:
Atualmente, é certo que o art. 384 é muito melhor do que se apresentava em momento anterior. Mas a principal crítica está na sua posição topográfica.
Rapara-se que a mutatio não depende de uma atividade do juiz, sendo atribuída ao MP, cabendo a ele aditar a denúncia de forma espontânea, e não o juiz a provocá-la, tanto que a lei fora assim alterada.
No momento em que houve alteração legislativa, o ideal seria que a mutatio libelli deixasse de existir dentro do contexto da sentença e passasse a figurar junto a ação penal. O aditamento da denúncia, na verdade, não se caracteriza como o próprio exercício da ação penal? Ou propriamente uma consequência do princípio da obrigatoriedade da ação penal pública e de todos os demais princípios que regem a atuação do MP? Assim, o ideal seria que a mutatio fosse um estudo dentro da ação penal, e não mais da sentença.
MUTATIO LIBELLI E O PRINCÍPIO DA INÉRCIA:
Para uma visão garantista, o §1º do art. 384 do CPP, ainda continua se caracterizando como uma violação ao sistema acusatório – por que o juiz provocaria o Procurador Geral?
Como cediço, os garantistas não são favoráveis ao art. 28, entendendo ser uma violação ao princípio da inércia.
EMENDATIO E MUTATIO LIBELLI EM GRAU RECURSAL:
Há a possibilidade no caso de emendatio e a impossibilidade da mutatio em grau recursal.
Neste sentido, tem-se a Súmula 453 do STF e um julgado recente do STF.
Súmula 453 do STF: Não se aplicam à segunda instância o art. 384 e parágrafo único do Código de Processo Penal, que possibilitam dar nova definição jurídica ao fato delituoso, em virtude de circunstância elementar não contida, explícita ou implicitamente, na denúncia ou queixa.
STF 2013 - Possibilidade da emendatio libelli em fase recursal
EMENTA RECURSO ORDINÁRIO EM HABEAS CORPUS. PROCESSUAL PENAL. ART. 157, § 3º, DO CP (PRIMEIRA PARTE). DESCLASSIFICAÇÃO PARA O ART. 157, § 2º, I E II. VIOLAÇÃO DO ART. 617 DO CPP. NÃO OCORRÊNCIA. EMENDATIO LIBELLI. DOSIMETRIA DA PENA. PENA-BASE. ATENUANTE RELATIVA À CONFISSÃO ESPONTÂNEA. REGIME INICIAL DE CUMPRIMENTO DE PENA. OREM DENEGADA. 1. Estando as majorantes do concurso de pessoas e do emprego de arma de fogo delimitadas na denúncia e na sentença condenatória, e defendendo-se o acusado dos fatos, e não da capitulação jurídica estabelecida na inicial, não há falar em violação do art. 617 do CPP ou em reformatio in pejus. Viabilidade da emendatio libelli em segundo grau de jurisdição, desde que respeitados os limites previstos no art. 617 do CPP. Precedentes. 2. A dosimetria da pena é matéria sujeita a certa discricionariedade judicial. O Código Penal não estabelece rígidos esquemas matemáticos ou regras absolutamente objetivas para a fixação da pena. Cabe às instâncias ordinárias, mais próximas dos fatos e das provas, fixar as penas. Às Cortes Superiores, no exame da dosimetria das penas em grau recursal, compete o controle da legalidade e da constitucionalidade dos critérios empregados, bem como a correção de eventuais discrepâncias, se gritantes ou arbitrárias, nas frações de aumento ou diminuição adotadas pelas instâncias anteriores. 3. Existência de vetoriais negativas do art. 59 do Código Penal autorizadoras da elevação da pena acima do mínimo legal. 4. Redução da pena pelo Superior Tribunal de Justiça, no tocante à atenuante genérica da confissão espontânea, devidamente fundamentada, em patamar razoável e proporcional, diante das peculiaridades do caso concreto. 5. A pena definitiva de 06 (seis) anos de reclusão conjugada com as circunstâncias judiciais do art. 59 do Código Penal, ensejam, na hipótese, a fixação do regime inicial semiaberto, nos termos do art. 33, § 2º, b, e § 3º do Estatuto Repressivo. 6. Recurso ordinário a que se nega provimento. (STF. RHC 115654, Rel. Min. Rosa Weber, Primeira Turma, julgado em 05/11/2013, acórdão eletrônico DJe-229 DIVULG 20-11-2013 PUBLIC 21-11-2013)