A culpa é do tigre?


25/08/2014 às 16h09
Por Mateus Braun Sá

A culpa é do tigre?

Registro os meus cumprimentos ao leitor. No dia 30 de julho deste ano, tomamos conhecimento de uma notícia intrigante: um menino de onze anos teve o braço dilacerado por um tigre no zoológico de Cascavel, no Estado do Paraná, sendo obrigado a amputar o membro na altura do ombro em razão dos graves ferimentos. De acordo com informações veiculadas nas mais diversas mídias, o menino passeava com a família no zoológico municipal e, após atravessar a tela que divide o público e a jaula do animal e colocar o braço para dentro do espaço onde o tigre é exposto, foi atacado. Outras informações dão conta de que o garoto lesionado invadiu espaço proibido e foi alertado por diversas pessoas para sair daquele local, mesmo assim, ignorou as orientações, inclusive de seu pai. Já o município de Cascavel, por meio de nota, alegou que o pai do menino o incentivava a correr em volta da jaula do animal, pois o último estava dentro de uma grade de proteção. Apesar de controvertidos os fatos que envolveram o referido acidente e apresentadas várias versões de ambas as partes envolvidas, propomos aqui uma breve análise sobre a quem recai a responsabilidade do infortúnio, ou seja, quem deveria responder pelas lesões provocadas no menino paranaense: o município de Cascavel, por administrar o zoológico; seu pai em razão do dever de guarda, ou a responsabilidade foi exclusiva da vítima, o que pode afastar o dever de indenizar do município de Cascavel.

Inicialmente, antes de adentrar no mérito da “questã”, como dizem os antigos, o título do presente artigo é uma expressão jocosa para chamar a atenção do nobre leitor, em que pese manifestamos nossos sentimentos de compaixão com o menino que teve o braço amputado, por ser lesão irreversível. A ingenuidade da criança e a omissão do pai tiveram drásticas conseqüências.

Há argumentos defensáveis em favor de ambas as partes. Todavia, respeitando as teses contrárias, nos posicionamos pela responsabilização do pai, bem como sustentamos a responsabilidade exclusiva da vítima, ou seja, do próprio “guri”, afastando qualquer dever de indenizar do zoológico, representado e administrado pelo município de Cascavel. Explicamos.

O pai do garoto, Sr. Marcos Carmo Rocha, por meio de informações obtidas no site “G1”, argumenta que o zoológico não oferece segurança aos usuários e que a tela que divide o público da jaula do tigre é muito baixa, permitindo a qualquer pessoa ultrapassá-la e que estava cuidando de seu filho naquele momento, pois o animal apresentava comportamento muito tranqüilo. Não prospera tal argumentação, sendo insuficiente para condenar o zoológico, na nossa ótica.

De acordo informações, há placas de advertência no zoológico dando conta do perigo de se adentrar em área proibida. No momento em que o menino provocava o animal, pessoas próximas pediam para que o menino saísse daquele espaço, colocando-se a própria vítima em situação de risco e contribuindo exclusivamente para o acidente. Se o garoto não tivesse em área proibida e se obedecesse aos dizeres das placas de orientação do zoológico, por certo que não teria lesionado e amputado o braço, pois é impossível para o tigre ultrapassar a jaula e atacar o público indistintamente. Desta feita, a própria vítima, por meio de seu comportamento, assumiu os riscos e provocou o infortúnio, sendo única e exclusiva responsável pelo evento danoso, afastando dever de indenizar por parte do município de Cascavel.

O § 3º, do art. 14 do Código de Defesa do Consumidor traz hipóteses da responsabilidade do fornecedor de serviços, neste caso, o zoológico, sendo aplicável na hipótese o inciso II, que descreve: “O fornecedor de serviços só não será responsabilizado quando provar: (...) II - a culpa exclusiva do consumidor ou de terceiro”. Demonstrada a culpa exclusiva do consumidor (menino), resta isento de responsabilização.

Importante também aqui evidenciar que o comportamento omisso e negligente do pai do garoto também contribuiu para a ocorrência do acidente. Ora, não há necessidade de ter grandes conhecimentos em veterinária para saber que um animal deste porte pode ser perigoso, mesmo criado em cativeiro. Qualquer pessoa com um nível médio de discernimento não deixaria um filho brincar com um tigre, pois o vão da jaula permite o acesso de um braço pequeno de uma criança, sendo que o infante somente aprende limites quando direcionado neste sentido. O pai deveria ter assumido seu papel e retirado o filho daquele local proibido. Assim, infelizmente, o educador da história foi o tigre e não o pai.

  • Direito Civil

Mateus Braun Sá

Advogado - Gravataí, RS


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