A JURISDIÇÃO CONSTITUCIONAL NORMATIVA


06/10/2016 às 17h20
Por Daniel Ramos da Silva

A JURISDIÇÃO CONSTITUCIONAL

Daniel Ramos da Silva

Graduado em direito pela Universidade Cândido Mendes. Advogado. Pós-Graduando em Direito e Processo do Trabalho pela Universidade Cândido Mendes/Curso Fórum.

RESUMO

O motivo pelo qual este trabalho foi idealizado se baseia no estudo da apresentação da constituição como nascedouro de todo o ordenamento jurídico vigente. Abordando aspectos do processo legislativo, características da norma fundamentale ordenamento jurídico em si

Palavras Chave: Processo Legislativo. Constituição. Norma fundamental. Ordenamento Jurídico. Norma Fundamental. Poder Normativo.

SUMÁRIO: Introdução; 1. O Processo Legislativo; 2. A Norma Jurídica; 3. A Teoria do Ordenamento Jurídico; 4. Conclusão; 5. Fontes de Referência.

Introdução

Falando da norma fundamental, incerta na Constituição, e a partir da qual todas as outras decorreriam, tem-se características, modalidades e profundidades de aplicação que há de ser levado à análise.

Entendendo a Constituição como conjunto de normas de valor primário com relação a um dado Estado, observa-se, no caso brasileiro, dois grupos temáticos de norma: orgânica e dogmática.

Como primeiro grupo, se destaca a parte orgânica, onde o constituinte normatiza a estrutura do Estado. Se enquadram neste grupo normas que se destinam a organizar o Estado, como as que definem as formas de aquisição de poder e os processos do seu exercício. “Esses preceitos racionalizam o exercício das funções do Estado e estabelecem limites recíprocos aos seus órgãos principais.”[1].

Passando à parte dogmática, se encontram preceitos que visam nortear, direcionar, ou seja, mostrar o caminho por onde as ações do Estado devem seguir. Instituindo princípios e valores que se fazem importantes na ordem da comunidade.

Há ainda normas que não se enquadram nesses dois grupos, mas que em nada perdem hierarquicamente, pois todas as normas constitucionais gozam de igual status, não havendo sobrevalência entre as mesmas.

Neste sentido, mas com relação às normas infraconstitucionais, obviamente não se pode dizer o mesmo. Os preceitos contidos na Constituição situam-se no topo da Pirâmide Jurídica, prevalecendo sobre as demais.

1. O PROCESSO LEGISLATIVO

Como fase gestacional do princípio da legalidade, emerge o processo legislativo, o qual é responsável pela produção dos diplomas legais a serem recepcionados pelo ordenamento jurídico e seguidos nas diversas finalidades as quais possam se destinar. Objetivos estes que se estendem a todos os ramos do direito.

Cabe ressaltar que sendo um processo, a formação de leis tem fases que devem ser respeitadas visando a plena legitimidade e aplicabilidade dos preceitos contidos na mesma.

Primeiramente há de se analisar quem tem legitimidade para propor determinado projeto de lei – complementar ou ordinária -, emenda à Constituição, medida provisória e assim por diante. Seguindo este entendimento, a Constituição brasileira na sua seção VIII, iniciada pelo artigo 59, tratando especificamente do processo legislativo, resolve as questões ligadas aos legitimados para cada tipo de diploma legal sob a égide do referido processo. Dentre os legitimados encontram-se elencados diversos personagens que vão desde o Presidente da República, passando pelos órgãos do judiciário, ministros do Ministério Público, casas legislativas até os cidadãos reunidos em prol de iniciativa popular.

O rol dos legitimados é extenso, sendo certo a peculiaridade de cada agente propor demanda pertinente ao grau de ação que lhe é conferido. Neste diapasão há propostas de criação de novo direito que são de iniciativa comum, os quais o constituinte não restringiu a titularidade pelas proposições, e as propostas de iniciativa reservada. Nessa hipótese de iniciativa ocorre que o constituinte restringiu a possibilidade para demandar discussão legislativa a algumas autoridades e órgãos. Via de regra, os casos de iniciativa privativa – assim também chamado – não devem ser ampliados por via interpretativa, haja vista hipóteses de exceção. Por fim, “subordina ao seu titular a conveniência e oportunidade de deflagração do debate legislativo em torno do assunto reservado”[2].

Impulsionado por estímulo de legitimado apropriado, a proposta de novo direito deve ter início a fase de discussão na Câmara dos Deputados, salvo se resulta de iniciativa de Senador ou comissão do Senado.

Neste momento a proposição legislativa passa por debate nas comissões e plenários das respectivas casas legislativas. As famosas emendas, no caso de leis orçamentárias, incidem sobre os projetos nesta fase do processo.

Findo o período de debates na Câmara dos Deputados e no Senado Federal, adentra-se na fase de votação, onde deverá ser observada a existência de quorum especial ou não para dada propositura.

Aprovado em votação com quorum adequado ao projeto correspondente, o mesmo se submete à sanção presidencial. Neste momento do processo, o projeto encontra-se, em tese, maduro para entrada no ordenamento jurídico, isto porque já se deliberou sobre o mesmo acerca das questões em que ele incida e, principalmente, sobre a sua adequação junto à Constituição Federal.

A aludida sanção presidencial deve ocorrer em quinze dias de maneira expressa ou tácita, que ocorre caso o Presidente não se manifeste com relação ao projeto. Neste prazo o Presidente pode ainda vetar a entrada no ordenamento da proposta de novo direito e tal veto deve ser expresso.

Certo é que o referido veto deve ser fundamentado em razão de inconstitucionalidade - mesmo tendo o projeto passado por comissões parlamentares de constitucionalidade -, sendo chamado veto jurídico. Pode também se afastar a entrada em vigor de dado projeto por veto político, o qual é fundamentado na contrariedade ao interesse público.

O veto é irretratável e pode se estender a todo o projeto, dito total, ou ainda parcial, quando atinge apenas partes do projeto como artigos, incisos e parágrafos, mas nunca em relação a palavras ou expressões isoladas, prevenindo assim desfiguração da norma.

Figurando como espécie de recurso ao veto imposto ao projeto, o Congresso Nacional tem a possibilidade de rejeitá-lo. Por este motivo tem-se o veto presidencial como relativo. Procedendo à rejeição pode, o Congresso em sessão conjunta e escrutínio secreto, aprovar a rejeição do veto, seja ele total ou parcial.

Finalmente, passados os imbróglios de tramitação, se procede à promulgação, que atesta a existência da lei, a qual deve ser feita pelo Presidente ou se não o fizer em 48 horas, caberá ao Presidente do Senado. A publicação da mesma torna pública a lei e fixa o momento de entrada em vigor da nova norma, pondo fim ao procedimento.

2 - A NORMA JURÍDICA

A norma no direito pode, na maioria das vezes, advir do processo apresentado alhures, ou ainda de outras formas também revestidas de legalidade e validade no mundo legal, como no caso dos princípios do direito, para citar um caso.

Por este pensar, tem-se que as normas que adentram no ordenamento por via do processo legislativo pertencerem ao direito positivo, enquanto, seguindo o exemplo dado, os princípios residirem junto ao direito natural, aquele que não nasce da deliberação ativa dos operadores e sim da própria experiência humana.

Observa-se no bojo do pensamento acima, outros tipos de norma, que se não jurídicas, formam o consciente coletivo que cedo ou tarde poderá ou não estar presente nas deliberações dos tipos penais. Isso posto, pode-se citar a moral como norma, que mesmo não tendo condão jurídico direciona a conduta dos homens em sociedade, isto é irrefutável. Outro tipo de norma, agora já com condão jurídico em determinados sistemas, é o direito consuetudinário, que vem a ser uma espécie de jurisprudência das atitudes sociais, ou seja, práticas reiteradas de um dado grupo social.

Sem dúvida alguma, a norma está em tudo que se faz na vida social. O cidadão está rodeado de comandos ativos e passivos por quer que esteja. Sempre há placas dizendo por onde passar e onde parar, o que se deve fazer ou o que não se poder proceder. As normas começam a influir na vida do sujeito desde a infância, a partir do pátrio poder de seus pais, e não cessam até a sua morte, e pelo incrível que pareça, tutela-se até mesmo o fim da vida, pois, se não há previsão de punição, a verdade é que o suicídio não conta com prestígio social, um exemplo de norma moral.

Muito embora a sociedade esteja rodeada por normas de todo o tipo, incluindo-se neste conjunto preceitos religiosos, regras morais, regras costumeiras, regras de boa educação, sendo a norma jurídica apenas parte da experiência normativa em que o Homem se vê constantemente envolvido. Sobre isso diz Norberto Bobbio[3]:

“O número de regras que nós, seres que agem com finalidade, cotidianamente encontramos em nosso caminho é incalculável, ou seja, é tal que enumerá-las é um esforço vão, como contar os grãos de areia de uma praia”.

Seguindo então a análise no que diz respeito às normas jurídicas, que dão ensejo ao presente tópico, há de ficar claro que as citadas normas se submetem a três valorações distintas independentes entre si, que são a justiça, validade e eficácia de uma dada norma jurídica.

O problema da justiça de correlaciona-se com os valores que determinado ordenamento jurídico busca alcançar. A Constituição é então o paradigma que o legislador tem para dirigir sua obra, é da onde são indicados os valores que devem ser perseguidos. Logo, para afirmar se uma norma é justa ou não, neste caso, teria de se ter a resposta se a norma está apta para atingir esse objetivo ou não.

Passando ao problema de se atestar a validade de determinada norma, tem-se a tarefa de pesquisar se, primeiramente, a norma emana de pessoa legitima para determinado tema e assunto e ainda que tenha poder para produção de norma jurídica.

Ultrapassado este primeiro filtro, há de se buscar a informação se uma norma sucessiva não a ab-rogou, ou seja, a revogou, tornou-a sem vigência por regular a mesma matéria. Outro fator que deve ser levado a análise é se esta dada norma é incompatível com outras do sistema no qual esteja inserida, notadamente com normas hierarquicamente superiores, pois vigora o princípio, em todo ordenamento jurídico, não se podem ter válidas duas normas em colisão uma com a outra.

O problema da eficácia está diretamente correlacionado com os destinatários da norma. Quer dizer que mesmo que uma norma exista juridicamente não se traduz que constantemente seja seguida. As normas mais eficazes são justamente aquelas que se tem cumpridas de modo natural e espontâneo, tem-se as normas que são respeitadas somente a partir de coação e normas que ninguém as cumpre e tão pouco sofrem coação, seriam as menos eficazes. Sendo então um problema de constatação empírica de observação.

Ainda sobre os três fatores, é certo a independência entre eles. Isto posto, quer dizer que os três fatores de valoração da norma podem incidir sobre ela de maneira múltipla ou singularizada, pois um fator não depende do outro para sua manifestação.

Isto se traduz quando se observa a existência de normas justas e sem validade, como no caso dos dispositivos do direito natural, que embora fossem justos não conferiam validade a não ser se forem escritas em tratado de direito natural, por exemplo, ou quando se tem leis que são válidas e pela constante desobediência popular não são eficazes.

3 - A TEORIA DO ORDENAMENTO JURÍDICO

Como definição geral de ordenamento jurídico, tem-se que seja um conjunto de normas. Pensando desta maneira se exclui a ideia da existência de um ordenamento onde exista apenas uma norma.

Para corroborar a exclusão da hipótese de um ordenamento jurídico com apenas uma norma, basta levar em consideração que se precisaria regulamentar todas as ações do homem em apenas uma modalidade normativa, que seria o obrigatório, o proibido e o permitido.

Seguindo por este pensamento, seria preciso referir-se a todas as ações possíveis qualificando-as em uma única modalidade. Trabalho este que resultaria em três hipóteses de norma: tudo é permitido, tudo é proibido ou tudo é obrigatório.

Poder-se-ia pensar em uma norma que dispusesse que era obrigatório beber vinho. Nessa situação seria ilícito agir de outra forma que não fosse beber vinho. Mesmo neste caso com apenas uma norma, vê-se claramente duas normas: a positivada diz que é obrigatório beber vinho e uma que vem a ser o seu corolário, donde se entende que o não beber vinho seria ilícito. Para sistematização, tem-se que “X é obrigatório” implica “não-X é permitido”.[4]

Com essas considerações fica mais palpável a ideia da improcedência de um ordenamento jurídico com apenas uma norma, pois mesmo tendo apenas uma norma positivada, esta implicará em outra. Sem contar que um ordenamento nunca é tão simples assim que possa se comprimir em apenas um mandamento.

Sendo certa a multiplicidade de normas constantes de um ordenamento jurídico, é de bom alvitre considerar a unidade que faz com que este conglomerado de normas caminhe em uma direção comum, tornando este ordenamento harmonioso.

Por este viés estrutural do ordenamento jurídico, há de se fazer menção a Kelsen e à sua teoria piramidal. Onde as normas não estão todas no mesmo plano, isto é, há normas de maior relevância que outras.

As normas inferiores tem relação de dependência com as superiores, subindo desde as inferiores às que estão mais acima, chega-se à chamada norma fundamental, esta suprema, que não tem relação de dependência com nenhuma outra e sobre ela repousa a unidade do ordenamento jurídico considerado.

A partir da norma fundamental é que se edifica um ordenamento, do contrário se teria um amontoado de normas pois é da norma fundamental que se encontra o grau máximo de hierarquia entre as normas.

Neste sentido, infere-se que uma norma superior produz as normas inferiores a ela e, sendo assim, as normas inferiores executam as leis que estão hierarquicamente acima. Com relação à Pirâmide de Kelsen, tem-se que ao meio se encontram normas que tanto produzem quanto executam, já nos extremos se acham as normas que somente executam (inferiores) ou somente produzem (lei fundamental).

Passando a falar dos limites que determinada norma deve respeitar dentro do ordenamento jurídico, excetuando a norma fundamental, pois esta não encontra limitação, pelo contrário, limita as que se seguem no conglomerado de normas, encontram-se duas ordens de limites, um relativo ao conteúdo ou limite material, outro relativo à forma ou formal.

Ambos os limites citados acima são delimitados por leis e órgãos superiores aos que recebem prerrogativa normativa. Fica clara essa questão ao observar que o Poder Legislativo encontra escopo no Poder Constitucional, ou seja, as leis editadas por aquele Poder não podem estar em colisão com os preceitos deste.

O limite material se refere ao conteúdo da norma que poderá ser emanada e o limite formal estaria para a forma, modo ou processo que a norma inferior deve auferir para ser emanada. A delegação de editar norma é limitada “seja com relação a quem pode mandar ou proibir, seja com relação a como se pode mandar ou proibir”.[5]

É cristalina então a ideia de que um ordenamento jurídico é uno, coeso. Formado por uma multiplicidade de leis, que muito embora disciplinem os mais diversos assuntos afetos a vida social tem por escopo e fonte norteadora a norma fundamental, que nos dizeres de Norberto Bobbio:[6]

“É o critério supremo que permite estabelecer se uma norma pertence a um ordenamento; em outras palavras, é o fundamento de validade de todas as normas do sistema. Portanto, não só a exigência de unidade do ordenamento mas também a exigência de fundamentar a validade do ordenamento nos induzem a postular a norma fundamental, a qual é, simultaneamente, o fundamento de validade e o princípio unificador das normas de um ordenamento”

4 - CONCLUSÃO

Diante de todo o exposto pode-se observar que a jurisdição constitucional vai além de exprimir normas gerais, por assim dizer,do que se pode ou não legislar.

A norma constitucional realmente cria a partir de si todo um sistema complexo jurídico, donde advirão inúmeras normas infraconstitucionais disciplinando a vida dos cidadãos. Também emergem da Carta elementos de normas programáticas e dogmáticas que influenciarão sobremaneira a confecção do ordenamento infraconstitucional.

Podem também as normas Constitucionais apresentarem-se em duas modalidades: princípio e regra.

Na modalidade princípio há largo emprego de generalidade ou da abstração. Chama o legislador a buscar a assimilação do preceito como norma infraconstitucional, como no princípio do devido processo legal. O legislador por meio de lei instituirá um dado procedimento legal, seja penal ou civil, e estas delimitações formarão o devido processo legal a ser observado.

Na modalidade regra, chega-se perto das normas de aplicação imediata, pois trazem comandos que devem ser obedecidos.

[1] MENDES, Gilmar; BRANCO, Paulo Gustavo Gonet. Curso de Direito Constitucional. 7 ed. São Paulo: Saraiva, 2012. p.73

[2] MENDES, Gilmar; BRANCO, Paulo Gustavo Gonet. Curso de Direito Constitucional. 7 ed. São Paulo: Saraiva, 2012. p. 934

[3] Bobbio, Norberto. Teoria da Norma Jurídica. 1 ed. São Paulo, Edipro, 2001, p.27

[4] BOBBIO, Norberto. Teoria do Ordenamento Jurídico. 6 ed. Brasília: UnB, 1995. p. 33

[5] Idem. Ibidem. p. 54

[6] Idem. Ibidem. p. 62

  • Processo Legislativo
  • Constituição
  • Norma fundamental
  • Ordenamento Jurídico
  • Norma Fundamental
  • Poder Normativo
  • Constitucional

Referências

5 - FONTES DE REFERÊNCIA

MENDES, Gilmar; BRANCO, Paulo Gustavo Gonet. Curso de Direito Constitucional. 7 ed. São Paulo: Saraiva, 2012.

SILVA, José Afonso da. Curso de Direito constitucional Positivo. 19 ed. São Paulo: Malheiros, 2001.

BOBBIO, Norberto. Teoria da Norma Jurídica. 1 ed. São Paulo: Edipro, 2001.

BOBBIO, Norberto. Teoria do Ordenamento Jurídico. 6 ed. Brasília: UnB, 1995.

BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República do Brasil. Acessado no site: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Constituicao/Constituicao.htm, em 1º/10/2016.


Daniel Ramos da Silva

Advogado - Rio de Janeiro, RJ


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