Golpe da Falsa Portabilidade/Redução de Empréstimo: O terror dos Funcionários Públicos, Aposentados e Pensionistas


08/09/2022 às 14h54
Por Susanne Schaefer | Schaefer & Souza Advogados Associados

Por todo Brasil, muitas pessoas tem se tornado vítimas dessa fraude cruel e muito bem articulada. Funcionários públicos estaduais, municipais e federais, além dos aposentados e pensionistas do INSS são o público alvo desse novo golpe que se aproveita de engenharia social, vazamentos de dados, falhas de segurança bancária e do próprio sistema bancário disponibilizado pelos Bancos aos seus Correspondentes Bancários.

 

Com a confiança emprestada pelo acesso a informações bancárias sigilosas por meio do sistema, há correspondentes diretos dos bancos e às vezes, até mesmo agentes autônomos e empresas vinculadas que estão induzindo clientes a erro, enganando-os com propostas de portabilidade e redução e dívidas enquanto na realidade, cadastram novos contratos de empréstimo em nome do cliente sem que este saiba quando o crédito cai, o induzem a transferir o dinheiro ao Correspondente ou empresa intermediadora (vinculada ao Correspondente).

 

O Modus Operandi se da seguinte maneira: a futura vítima é contatada por alguém se identificando como funcionário da empresa que supostamente representa diversos bancos ou apenas um banco (financeira ou correspondente bancário) e recebe proposta de portabilidade (transferência de dívida com juros menores para outra Instituição Financeira) ou meramente, de redução de juros e parcela.

 

É dito ao cliente que ele não terá qualquer aumento de comprometimento de renda, nova parcela ou acréscimo de juros, mas apenas a redução de sua dívida, passando a pagar o empréstimo ao Banco que irá fazer a operação de amortização que é representado pela empresa que lhe contatou. Ou Seja, em tese a pessoa se livraria da dívida antiga (no banco de origem) e assumiria uma parcela menor em um novo banco. Além disso, em alguns casos é prometido um “troco” na operação.

 

Por vezes, para transmitir confiabilidade ainda é firmado um contrato comumente chamado de “Cessão de Crédito” ou “Instrumento Particular de Negociação de Dívida e Outras Avenças”, que consiste em prometer ao cliente a “segurança da operação” através da representante bancária.

 

Ato contínuo, como golpe fatal, a vítima é informada que para que operação seja efetivada, cairá em sua conta (creditado pelo banco portador) um valor para amortizar a dívida antiga que esta sendo portada (comprada) ou que supostamente esta tendo seus juros reduzidos.

 

Os golpistas então convencem a vítima que quando o valor desse contrato novo cair em sua conta, ela deve transferi-lo imediatamente para a conta da empresa (financeira que supostamente representa o banco) para que essa faça em nome do banco a amortização da dívida antiga, reduza os juros e quite as parcelas.

 

Sem que a vítima compreenda suas vis intenções, a induzem a autorizar uma nova operação de empréstimo, mediante assinatura de cédula de crédito bancária física ou mediante contratação digital com confirmação via link e selfie. Uma vez que a vítima induzida a erro ceda e realize as confirmações que são eivadas de vícios de consentimento (eis que pesa estar autorizando apenas a portabilidade/redução), o novo empréstimo consignado é aprovado pelo Banco (que supostamente portaria a dívida antiga).

 

Assim que o valor do novo empréstimo entra na sua conta, a vítima já envolta no engodo pensa se tratar de valor necessário a operação de portabilidade, que em nada lhe onerará e transfera o dinheiro á empresa que supostamente representa o Banco.

 

Está consumada a fraude.

 

Os golpistas que entram em contato com as vítimas são muito convincentes! Extremamente articulados e mesmo após a pessoa transferir o valor, conseguem a manter em erro por bastante tempo, pois por vezes, alegam que a dívida antiga só vai demorar em ser quitada por questões técnicas, bancárias ou financeiras para encontrar "as melhores condições de quitação".

 

Quando repara que mesmo após transferir o dinheiro á "financeira" para a suposta quitação, o contrato antigo ainda aparece ativo e pior, agora junto ao um contrato novo que desconhece, a vítima reclama, mas para que a fraude se perpetue e gere seus frutos (tempo de mercado, novos clientes e novas indicações), os golpistas realizam depósitos de estorno de valores da nova parcela na conta do cliente, que pensa então ser assim que funciona a portabilidade, mas isso não dura muito tempo.

 

Na verdade dura apenas o tempo suficiente para que a empresa consiga captar mais gente, seja diretamente, seja por indicações de quem já fez a operação. É um verdadeiro esquema de pirâmide financeira, os clientes que caem no golpe hoje propiciam o levantamento de valores para quitar as parcelas dos clientes que caíram no golpe anteriormente, mas todos sabem que tais esquemas têm “data de validade”.

 

Após alguns meses, os estornos do valor da nova parcela que esta sendo descontada (indevidamente) cessam e a vítima fica com o prejuízo! A financeira para de responder as mensagens ou dá desculpa atrás de desculpa e uma hora vai “sumir do mapa”, junto com o dinheiro das vítimas, recomeçando a operação sob novo número de CNPJ.

 

O que na verdade tais empresas fazem é levantar capital de giro em nome das vítimas que pensam estar realizando uma operação bancária de portabilidade diretamente através do banco.

 

Registre-se oportunamente que a operação de portabilidade de empréstimo é em si, legítima. Porém esta modalidade contratual é uma operação feita exclusivamente entre os bancos, que para quitação dos saldos devedores dos empréstimos portados, se utilizam da CIP – Câmara Interbancária de Pagamentos do Banco Central para realizar entre si as devidas amortizações utilizando valores que em nada se relacionam com novas contratações em nome dos clientes.

 

Para uma operação de portabilidade real, o banco jamais creditará o valor destinado à quitação do saldo devedor do contrato antigo na conta do cliente, menos ainda haverá orientação para que o cliente transfira esse valor para a posse da Correspondente Bancária.

 

Frise-se que as Instituições Financeiras são objetivamente responsáveis pelas operações de seus correspondentes e agentes, independentemente do tamanho e complexidade de sua cadeia de vendas e captação. Nesse sentido a previsão contida na resolução 3.954/2011 do Banco Central do Brasil que regula a relação entre Banco e Correspondente Bancário:

 

Art. 1º As instituições financeiras e demais instituições autorizadas a funcionar pelo Banco Central do Brasil devem observar as disposições desta resolução como condição para a contratação de correspondentes no País, visando à prestação de serviços, pelo contratado, de atividades de atendimento a clientes e usuários da instituição contratante.

 

Parágrafo único. A prestação de serviços de que trata esta resolução somente pode ser contratada com correspondente no País.

 

Art. 2º O correspondente atua por conta e sob as diretrizes da instituição contratante, que assume inteira responsabilidade pelo atendimento prestado aos clientes e usuários por meio do contratado, à qual cabe garantir a integridade, a confiabilidade, a segurança e o sigilo das transações realizadas por meio do contratado, bem como o cumprimento da legislação e da regulamentação relativa a essas transações.

 

Logo, a fraude praticada contra o cliente neste caso não se enquadraria na excludente de ilicitude de culpa de terceiros, pois o correspondente bancário com acesso ao sistema do banco regularmente cadastrado e seus prepostos não se enquadram no conceito de “terceiros”, mas são representantes da casa bancária, sendo sua extensão.

 

A existência da Cadeia de Vendas é fato que se impõe, afinal, ou há uma cadeia de vendas, ou não existiria o novo contrato em nome da vítima o qual para existir precisa ser digitado com login e senha. Somado a tal fato, temos ainda o risco da atividade que deve ser suportado por aquele que causa danos desempenhando atividade comercial, conforme o parágrafo único do art. 927 do CC, sendo assim a responsabilidade solidária do banco que averbou o novo contrato inconteste, pois mesmo que não tenha participado da negociação, é responsável legal por ela.

 

Como se vê, a responsabilidade das instituições bancários em casos de fraude como este é plena, pois sua concretização é necessária a participação ativa de alguém com acesso ao sistema do banco, que além de repassar as informações sigilosas da vítima, utiliza desta vantagem para passar credibilidade no contato inicial, bem como para digitar a proposta do novo empréstimo no sistema bancário.

 

Importante registrar que a ilegalidade dessa falsa portabilidade onde o cliente precisa pagar valores nominalmente a empresa se manifesta ainda no fato de que legalmente, a remuneração dos Correspondentes Bancários é feita exclusivamente pelos Bancos com quem mantém a relação comercial e lhes é vedado receber diretamente do cliente qualquer valor, a qualquer título, conforme expressa previsão constante no artigo 10, inciso VI, da Resolução 3.954/0011:

 

Art. 10. O contrato de correspondente deve estabelecer

 

VI - vedação ao contratado de emitir, a seu favor, carnês ou títulos relativos às operações realizadas, ou cobrar por conta própria, a qualquer título, valor relacionado com os produtos e serviços de fornecimento da instituição contratante;

 

Obviamente que a atividade de Correspondente Bancário é regular e que a grande maioria das empresas é séria, honesta e trabalha dentro dos limites de sua atuação, dando importante suporte as Instituições Financeiras, porém para aqueles que querem levar vantagem, trabalhando na obscuridade e ilicitude, os acessos de dados e sistemas confiados a tal categoria são um prato cheio.

 

Para buscar resolver o problema, o cliente que se veja vítima deste tipo de golpe/fraude deve contatar diretamente o banco que realizou o contrato novo fruto de fraude através da SAC, denunciar o caso e pedir o cancelamento da operação. Deve também registrar boletim de ocorrência e se preciso for, acionar o PROCON e abrir uma reclamação junto ao Banco Central.

 

Caso não consiga solucionar o problema administrativamente, pode ainda processar a empresa e o Banco que fez o novo contrato, buscando anulação da nova operação feita mediante fraude, pedir danos materiais com repetição do indébito, indenização por danos morais, requerendo a antecipação dos efeitos da tutela tanto para suspender o desconto em caráter emergencial enquanto o processo tramita, quanto para tentar bloquear judicialmente o valor na conta da empresa golpista.

 

Claro que melhor do que ter um caminho para resolver, é não ter um problema desses para resolver, assim, importante a conscientização da população, especialmente das potenciais vítimas quanto à existência, funcionamento e perigo desta fraude bancária que para muitos parece gozar da mais lídima regularidade, até se que mostre um cativeiro financeiro.

 

Por fim, um último alerta, quando a empresa golpista consegue enganar o cliente uma vez, voltara a tentar novamente utilizando os limites de crédito que o mesmo possuir, assim, toda atenção é pouca na hora de negociar a contratar empréstimos.

 

| Susanne Vale Diniz Schaefer |

 

Advogada Pós-graduada em Direito civil e Processo Civil pela Faculdade Legale Educacional em São Paulo. Membro da Comissão de Direito Bancário e Comissão de Defesa do Consumidor na OAB Santos-SP.

 

Agente de Crédito Bancária certificada de acordo com as normas do Banco Central, com mais de seis anos de experiência prática na área bancária especialista em crédito consignado.

 

Sócia fundadora na Schaefer & Souza Advogados Associados, com equipe focada em processos envolvendo fraudes bancárias, possuindo o escritório além de área de amplo atendimento ao consumidor, nichos de atuação na esfera do direito civil, empresarial, trabalhista e previdenciário.

 

Autora do Canal “Via do Direito” no YouTube onde se compartilham conhecimentos sobre direitos, especialmente conscientizando consumidores e ensinando como evitar e como lidar com fraudes envolvendo crédito consignado.

 

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Susanne Schaefer | Schaefer & Souza Advogados Associados

Escritório de Advocacia - Santos, SP


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