EXCELENTÍSSIMO SENHOR JUIZ DE DIREITO DA X VARA CRIMINAL DA CIRCUNSCRIÇÃO JUDICIÁRIA DE BRASÍLIA-DF.
PROCESSO Nº.: xxxxxxxx
xxxxxx, devidamente qualificado nos autos do processo em epígrafe, vem perante Vossa Excelência, por intermédio de seu advogado, com fundamento no art. 403, § 3º, do Código de Processo Penal, apresentar
ALEGAÇÕES FINAIS POR MEMORIAIS
pelos fatos e fundamentos jurídicos a seguir expostos.
I – DOS FATOS
Consta na exordial que xxxxxx teria, no dia xx de xxxxx de xx, por volta das xxh, em via pública próxima ao xxx, xx, xxx, tentado subtrair para si, cabo de transmissão de energia de iluminação pública, mediante rompimento das caixas/bueiros, fato ocorrido durante o repouso noturno e concurso de pessoas.
Em xxx de xxxx de xxxx, houve o recebimento da denúncia pela suposta prática de furto qualificado tipificado no art. 155, § 1º e § 4º, incisos I e IV, c/c art. 14, inciso II do Código Penal, fl. xx, posteriormente o acusado foi citado, fl. xx, e apresentou resposta à acusação, fl. xx. No prosseguimento do feito não houve absolvição sumária, foi designada data para audiência de instrução e julgamento fl. xx.
Em juízo foram ouvidas as testemunhas xxxxxx e xxxxxx, ambos policiais militares. Ato seguinte procedeu-se o interrogatório do acusado. As oitivas foram gravadas em áudio visual de fl. xxx.
O Ministério Público oferceu Alegações Finais por Memoriais fls. xxx, requerendo a procedência parcial da pretensão punitiva do estado, nas penas do art. 155, § 1º e § 4º, inciso IV, c/c art. 14, inciso II do Código Penal, tendo os autos sido remetidos a defesa para apresentação das alegações finais.
II - DO DIREITO
DA ABSOLVIÇÃO POR NEGATIVA DE AUTORIA
Da análise do processo, é necessário o reconhecimento de que não há elementos probatórios suficientes para imputação do fato criminoso ao acusado. Tendo em vista que, os depoimentos das testemunhas trazem apenas indícios, mas não provas concretas que sejam capazes de ensejar condenação.
Em sede de interrogatório por autoridade policial, o acusado nega o crime (negativa de autoria) que lhe foi atribuído. Afirma que estava trabalhando com xxxx na xxxxx, quando avistou um rapaz enrolando um cabo, e que não tem nenhuma participação no furto de cabo de energia elétrica e não sabe quem cometeu o crime.
De acordo com depoimento em audiência do Policial Militar xxxxx, este foi informado via COPOM da realização do furto de xxxxx, assim que chegou ao local da ocorrência os guardas/porteiros do blocos sinalizaram a presença dos indivíduos. É importante ressaltar que “OS GUARDAS/PORTEIROS DOS BLOCOS” não foram ouvidos no interrogatório policial e nem em audiência, constam apenas as versão dos policias da abordagem, além disso não constam nos autos qualquer reconhecimento por parte destes guardas/porteiros de que xxxxxxxx seja autor do delito imputado.
Vale lembra que no momento da abordagem policial, o acusado informa que só estava trabalhando com reciclagem no local do cometimento do delito, e que não tinha qualquer envolvimento com o ocorrido.
Podemos nos basear dessa absolvição, seguindo o princípio presunção de inocência (in dubio pro reo) que nas palavras do doutrinador em sua obra Jurisprudencial Criminal (V.2 pg.446) de Heleno Claudio Fragoso:
“Nenhuma pena pode ser aplicada sem a mais completa certeza dos fatos. A pena, disciplinar ou criminal, atinge a dignidade, a honra e a estima da pessoa, ferindo-a gravemente no plano moral, além de representar a perda dos bens ou interesses materiais”.
Nos termos do Art. 386, IV do Código de Processo Penal brasileiro, deverá o juiz absolver o réu sempre que restar comprovada a não participação do mesmo na infração penal.
Com efeito, o acusado, ao ser ouvido em audiência, negou a acusação (negativa de autoria) que lhe foi feita, afirmando não ter participado do furto mencionado na denúncia. Além disso, afirma que no dia e na hora do fato, trabalhava com xxxxxx e que no momento avistou um rapaz na posse dos fios de cobre. Que o policial mandou que esse rapaz parasse, no entanto ele correu e não foi alcançado. Não obtendo resultado na perseguição, os policiais o abordaram e o atribuíram responsabilidade do ocorrido, o réu informou que cumpria pena em regime domiciliar e que o juiz da Execução tinha ciência do trabalho com reciclagem.
Em depoimento xxxxx, informou que não conhece o verdadeiro autor do fato, pois ele apenas passou correndo, impossibilitando seu reconhecimento. Além disso, relatou que no momento do ocorrido estava trabalhando, pois passava por necessidade e precisava trabalhar com reciclagem.
Ressalta-se que o interrogatório do acusado é considerado meio de prova e de defesa, devendo também ser sopesado por V. Exa. por ocasião da sentença. No presente caso, resta, pois, a palavra do réu e da testemunha, que devem prevalecer, tendo em vista a ausência de outros elementos de convicção, atendendo-se ao princípio do "in dubio pro reo".
Em relação à acusação que lhe é imposta, o réu é inocente. Para a sua condenação a prova da autoria deve ser plena e convincente, ao passo que para a absolvição basta a dúvida, consagrando o princípio "in dubio pro reo" contido no art. 386, V do CPP. Logo, a defesa reputa necessário que seja reconhecido o Princípio Constitucional do in dubio pro reo, na medida em que há dúvidas mais do que razoáveis acerca dos fatos e que estas devem militar sempre a favor do acusado.
Dessa forma, deve o réu seja absolvido por não existirem elementos de prova suficientes para condená-lo e não há provas de sua autoria, nos moldes do artigo 386, incisos IV e V do Código de Processo Penal.
DA INSUFICIÊNCIA DE PROVA PARA A CONDENAÇÃO
A exordial acusatória do insigne Ministério Público resumiu-se a denunciar o réu, lastreado por mero relato das supostas vítimas, pelo crime de furto qualificado tipificado no art. 155, § 1º e § 4º, incisos I e IV, c/c art. 14, inciso IIdo Código Penal.
É possível observar na audiência de instrução e julgamento, a fragilidade no conjunto probatório da acusação. Com efeito, apenas duas testemunha foram ouvidas em audiência sobre a ocorrência dos fatos, sendo estes os próprios policiais militares que fizeram a abordagem. O acusado xxxxx afirmou, resumidamente, que estava trabalhando com xxxxx na xxxx, quando avistou um rapaz enrolando um cabo, e que não tem nenhuma participação no furto de xxxxxx e não sabe quem cometeu o crime.
Os policiais militares, xxxxxx e xxxxx, relataram em audiência, que atenderam um chamado de situação de furto na via pública próxima ao xxxxxx, Brasília-DF. Afirmaram, ainda, que ao chegarem ao local da ocorrência os guardas/porteiros do blocos sinalizaram a presença dos indivíduos. É importante ressaltar que “OS GUARDAS/PORTEIROS DOS BLOCOS” não foram ouvidos no interrogatório policial e nem em audiência, constam apenas as versão dos policias da abordagem, além disso não constam nos autos qualquer reconhecimento por parte destes guardas/porteiros de que xxxxxxx seja autor do delito imputado.
Diferente, portanto, das declarações do acusado em audiência, que negou a acusação, afirmando não ter participado do furto mencionado na denúncia. Afirma que no dia e na hora do fato, trabalhava com reciclagem e que no momento avistou um rapaz na posse dos fios de cobre. Que o policial mandou que esse rapaz parasse, no entanto ele correu e não foi alcançado. Não obtendo resultado na perseguição, os policiais o abordaram e o atribuíram responsabilidade do ocorrido, mesmo informando que o juiz da Execução tinha ciência do trabalho com reciclagem. Restaram evidentes, portanto, a insuficiência de provas dos fatos aqui discutidos.
É certo que o art. 386, VII, prevê que o juiz absolverá o réu quando não existir prova suficiente para a condenação no crime de furto. Deve haver ainda, o respeito ao princípio in dubio pro reu, o qual preceitua que, havendo dúvida razoável, esta deve ser utilizada a favor do réu, sendo ele, absolvido. No presente caso, observa-se a fragilidade e insuficiência das provas testemunhais produzidas. Neste sentido, a jurisprudência do Egrégio TJDFT:
PENAL E PROCESSO PENAL. APELAÇÃO CRIMINAL. LESÃO CORPORAL. MARIA DA PENHA. AUTORIA E MATERIALIDADE DELITIVA NÃO CONFIGURADAS. DEPOIMENTOS DIVERGENTES. ABSOLVIÇÃO. MANUTENÇÃO. [...] Contudo, a apresentação de depoimentos divergentes, na fase extrajudicial e na fase judicial, e a ausência de outros meios de prova, dá ensejo a dúvida acerca da ocorrência e da materialidade do delito, impondo-se a absolvição do acusado, em respeito ao princípio do in dubio pro reo.
(Acórdão n.943412, 20150310042923APR, Relator: ESDRAS NEVES 1ª TURMA CRIMINAL, Data de Julgamento: 23/05/2016, Publicado no DJE: 31/05/2016. Pág.: 177/190) – grifos nossos.
Diante do exposto, a defesa técnica requer a absolvição do acusado, ante a insuficiência probatória quanto ao delito de furto qualificado, pois não foram ouvidos no interrogatório policial e nem em audiência os guardas/porteiros dos blocos mencionados pelos policiais que informaram a localização do acusado, nos termos do artigo 386, inciso VII, do CP.
DA EXCLUSÃO DA QUALIFICADORA DE ROMPIMENTO DE OBSTÁCULO
Consta nos autos que xxxxxx foi denunciado com incurso nas penas do art. 155, § 1º e § 4º, incisos I e IV, c/c art. 14, inciso II do Código Penal, por ter subtraido para si, mediante rompimento de obstáculo, cabo de transmissão de energia de iluminação pública, pertencente à Companhia Energética de Brasília.
A qualificadora prevista no inciso I, do § 4º, do art 155 do CP, por deixar vestígios, exige, para a sua incidência, a realização de laudo pericial que comprove a materialidade do crime, no entado o laudo pericial não foi realizado no local.
Em audiência o Policial Militar xxxxxxx, informa que não existe a necessidade de rompimento das caixa/tambas de boeiro, basta desencaixá-las. Fala de xxxxx: “não, só retirar mesmo, você pode andar pela quadras lá que elas são no chão, encaixadas”. Portanto, não há incidência da qualificadora de rompimento de obstáculo, mesmo que houvesse não foi realizado laudo pericial no local do delito.
Conforme art. 158 do CPP, quando existir vestígios, é indispensável o exame pericial, somente um laudo pericial pode constatar se houve ou não arrombamento em um local de crime. No fato em questão, não houve essa perícia para constatar o arrombamento das caixas/tampas de boeiro, ou seja, não se pode presumir que de fato houve arrombamento no local, se não há essa certeza.
Nesse sentido, é a manifestação da doutrina:
“É indispensável para a configuração da qualificadora o dano, não sendo suficiente que tenha a coisa sido removida, forçada, retirada. Por isso, e por restarem vestígios da destruição ou rompimento, exige-se para o reconhecimento da causa de aumento de pena o exame pericial. Não pode ser ele substituído por simples laudo do exame de local ou vistoria.” (MIRABETE, Julio Fabrini. CÓDIGO PENAL INTERPRETADO. São Paulo: Atlas, 2005).
De acordo com entendimento do STJ, tratando-se de furto qualificado por rompimento de obstáculo, torna-se indispensável a realização de perícia para a sua comprovação:
PENAL. HABEAS CORPUS. FURTO QUALIFICADO. ROMPIMENTO DE OBSTÁCULO. PERÍCIA TÉCNICA. NECESSIDADE.
1. O entendimento desta Corte é no sentido de que para incidir a qualificadora prevista no art. 155, § 4º, inciso I, do Código Penal é indispensável a realização de perícia, a fim de se constatar o rompimento de obstáculo. [...]
(STJ - HC 136455/MS) – grifos nossos.
Diante do exposto, e nos moldes do entendimento do Superior Tribunal de Justiça, não é possível considerar como agravante conduta que sequer foi cometida pelo acusado na infração penal ora analisada, uma vez não foi realizada perícia no local.
O Ministério Público concorda com o afastamento da qualificadora de rompimento de obstáculo: “O Ministéro Público entende que a qualificadora do rompimento de obstáculo não ficou demonstrada, pois conforme depoimento do policial militar xxxxxx as tampas de bueiro não precisam ser arrombadas, basta desencaixá-las. No mais, não foi realizada perícia no local, fl. xxx.”
Desta forma, restando provado que o furto supostamente praticado por xxxxxxx, não requereu do autor qualquer rompimento de obstáculo, entende-se que a qualificadora deva ser retirada.
Assim, fica evidente que a qualificadora prevista no art. 155, § 4º, I, CP, não merece prosperar, pois o crime de furto em caso de rompimento deixa vestígios e neste caso não houve perícia para comprovar o rompimento das caixas/tampas de bueiro para que houvesse a subtração dos cabos de energia, sendo inviável a aplicação da qualificadora supracitada.
DO AFASTAMENTO DA MAJORANTE DE REPOUSO NOTURNO
De acordo com o art. 155, § 1º do CP, aplica-se a qualificadora de repouso noturno quando o crime é cometido em horário noturno, no entanto a doutrina e decisões judicias recentes afirmam que existindo sistema de segurança, agentes de vigilância ou terceiros que exerçam vigilância sobre o local de ocorrência do delito é passível o afastamento da qualificadora. Além disso, é válido mencionar que o caso ora abordado se trata de furto tentando, tendo em vista que o delito não se consumou por ocasião de presença de porteiros/guardas de blocos adjacentes ao local do crime.
Neste caso, é de se observar que a tentativa de furto foi praticado em horário noturno, mas não sem ausência de segurança ou vigilância, tendo em vista que o local do delito se encontra em área comercial, além disso na circunvizinhança haviam certos porteiros/guardas que vigiavam o xxxxx, Brasília-DF. Assim, não é possível afirmar que o agente tenha se prevalecido da escuridão da noite para perturbar o sossego da quadra comercial e praticar o furto.
Sabe-se que a razão de ser dessa circunstância majorante é justamente o cometimento do crime durante o repouso noturno com ausência de vigilância ou segurança, o que não se vislumbra nesta hipótese. Portanto, a aplicabilidade da causa de aumento do repouso noturno, somente deve ser aplicada quando não houver qualquer vigilância ou indícios de vigilância sob o local do bem, que não é o caso, tendo em vista que os porteiros/guardas mantinham guarda na localidade, até porque os mesmos comunicaram a polícia.
Com efeito, a aplicação da qualificadora visa garantir o sossego e a tranqüilidade dos moradores durante o descanso noturno, o que não ocorre no caso em questão, visto que no local do delito inexiste moradores, ou seja, um boeiro onde não há pessoas dormindo e existindo vigias de prédios vizinhos que praticamente impedem a consumação do furto.
Desta forma, a causa de aumento acima deve ser afastada, conforme entendimento jurisprudencial.
IIII – DA DOSIMETRIA DA PENA
De acordo com o art. 68 do Código Penal, a dosimetria da pena deve respeitar o procedimento trifásico, sendo que em caso de condenação, a defesa postula a aplicação da pena-base no piso legal.
Da análise das circunstâncias judiciais do artigo 59 do Código Penal, verifica-se que todas são favoráveis ao acusado, não havendo elementos nos autos para que se possa fazer um juízo valorativo objetivo sobre a personalidade do acusado, razão pela qual a defesa pugna pela aplicação da pena-base no mínimo legal.
Requer, ainda, o afastamento da qualificadora referente ao rompimento de obstáculo, diante da ausência de laudo pericial e concordância do Ministério Público.
Na Segunda Fase da Dosimetria, não há atenuantes e agravantes a serem consideradas. Da mesma na terceira fase não há causas de diminuição, devendo ser afastada a majorante referente ao repouso noturno.
Não há óbice, portanto, de fixação da pena no mínimo legal, a qual poderá ser cumprida em regime inicialmente aberto (art. 33, § 2º, alínea c, do CP, permitindo, assim, que o acusado recorra em liberdade, pois incompatível o atual regime em que se encontra com aquele que eventualmente seja condenado ao cumprimento da reprimenda final.
Da mesma forma requer a substituição da pena privativa de liberdade por restritivas de direito, de acordo com o artigo 44, do Código Penal.
Por fim, pleiteia-se, ainda, a dispensa de dias-multa e custas, em razão da hipossuficiência do acusado.
IV – DOS PEDIDOS
Ante o exposto, a defesa técnica requer à Vossa Excelência:
1- Que seja o acusado absolvido, de acordo com o art. 386, incisos IV, V e VII, do Código de Processo Penal, diante da negativa de autoria e por não existir prova suficiente para a condenação;
2- O afastamento da qualificadora referente ao rompimento de obstáculo, diante da ausência de laudo pericial que conteste essa circunstâncias e concordância do Ministério Público;
3- O afastamento da causa de aumento de pena referente ao repouso noturno, conforme entendimento jurisprudencial
4- Em caso de condenação, que sejam consideradas favoráveis todas as circunstâncias judiciais da primeira fase da dosimetria (art. 59, CP), devendo a pena ser fixada no mínimo legal;
5- Aplicação do regime inicial de cumprimento no aberto, nos termos do arti. 33, § 2º, alénea c, do CP;
6- A substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de direitos, conforme o artigo 44, do CP;
7- Seja concedido o direito do acusado recorrer em liberdade, já que caso condenado será fixado regime diverso do qual o agente está sendo submetido, com imediata expedição de alvará de soltura;
8- Afastamento da reparação de danos, tendo em vista que o acusado é hipossuficiente nos termos da lei;
9- Pela gratuidade de justiça, com isenção de dias-multa e custas processuais, por se tratar de hipossuficiente nos termos da lei.
Nestes termos, pede e aguarda deferimento.
Brasília-DF, 04 de junho de 2018.
IVONILDO REIS SANTOS
OAB/DF - 17.026E