EXCELENTÍSSIMO SENHOR JUIZ DE DIREITO DA X VARA CRIMINAL DA CIRCUNSCRIÇÃO JUDICIÁRIA DE BRASÍLIA/DF.
PROCESSO Nº.: XXXXXX
XXXXXXXX, devidamente qualificado nos autos do processo em epígrafe, vêm, respeitosamente, perante Vossa Excelência, por intermédio de seu advogado, com fulcro no art. 403, § 3º, do Código de Processo Penal, apresentar
ALEGAÇÕES FINAIS POR MEMORIAIS
conforme os fundamentos de fato e de direito a seguir aduzidos.
I – DOS FATOS
Consta na exordial que xxxxxxxxxxx teria, no período de xx de xxxx a xx de xxxxx, praticado conduta de fraude a licitação prevista no art. 90 da Lei n. 8.666/93.
Em xx de xxxx de xxxx, houve o recebimento da denúncia pela suposta prática de fraude a licitação tipificado nos arts. 90 e 99, ambos da Lei nº 8.666/93, posteriormente o acusado foi citado, fl. xxx, e apresentou resposta à acusação, fl. xxxx. No prosseguimento do feito não houve absolvição sumária, foi designada data para audiência de instrução e julgamento.
Em audiência realizada em xx de xxx de xxx (mídia à fl. xxx), foram ouvidas as testemunhas xxxxx e xxxxx. Em seguida, houve os interrogatórios dos réus xxxxxx e xxxxxx.
Na fase do art. 402 do CPP nada foi requisitado.
O Parquet apresentou alegações finais por memoriais, oficiando pela condenação do réu xxxxxx nas penas dos artigos 90, da Lei n. 8.666/93.
A Defesa foi intimada para apresentar suas alegações finais por memorais em xxx de xxxx de xxxx.
É o relatório do essencial.
II – DO DIREITO
DA ABSOLVIÇÃO POR ATIPICIDADE DA CONDUTA
A tipicidade da conduta ocorre quando há a subsunção da conduta praticada pelo agente ao tipo penal. Na situação em tela, não restou comprovado que o réu tenha agido com o intuito de fraudar o procedimento licitatório.
Consoante o art. 90, da Lei nº 8.666/93, o crime de fraude à licitação consiste em: "Frustrar ou fraudar, mediante ajuste, combinação ou qualquer outro expediente, o caráter competitivo do procedimento licitatório, com o intuito de obter, para si ou para outrem, vantagem decorrente da adjudicação do objeto da licitação: Pena - detenção, de 2 (dois) a 4 (quatro) anos, e multa".
Ocorre que o fato ora sob comento não constitui crime de fraude a licitação, uma vez que não há a presença das circunstâncias elementares do tipo penal descrito. Isto porque, destrinchando-se o tipo penal, observa-se que a conduta do acusado não se amolda nas seguintes características: abuso de confiança; ação praticada de má fé; clandestinidade; falsificação, adulteração.
Restar provada de forma clara e precisa, sem a necessidade de exame valorativo do conjunto fático ou probatório, a atipicidade da conduta, aocorrência de causa extintiva da punibilidade, ou, ainda, a ausência de indícios de autoria ou de prova da materialidade.
Ora Excelência, como se denota da leitura da denúncia e dos depoimentos trazidos aos autos, o acusado em nenhuma hipótese conhecia o caráter fraudulento da licitação, visto que apenas era empregado da empresa que participou da licitação. Por isso, xxxxx em momento algum contribui para efetivação da simulação ou garantir que a licitação se baseasse em meios ilegais.
Deste modo, deve ser levado em conta para fins de caracterização do crime de fraude à licitação, a existência do elemento subjetivo do tipo penal, o qual se traduz na vontade de obter vantagem decorrente da adjudicação do objeto da licitação. A convicção quanto aos elementos subjetivos do tipo é entendimento jurisprudencial do Superior Tribunal de Justiça - STJ:
PENAL. AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. CRIMES PREVISTOS NO ART. 90 DA LEI Nº 8.666/93, EM CONTINUIDADE DELITIVA. DOLO ESPECÍFICO. AUSÊNCIA DE DEMONSTRAÇÃO EM ALGUMAS DAS CONDUTAS IMPUTADAS AO ACUSADO. ABSOLVIÇÃO EM RELAÇÃO A ESSES CRIMES QUE SE IMPÕE, SEM REFLEXOS NO AUMENTO DA PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE PELA CONTINUIDADE DELITIVA. DIMINUIÇÃO DA PENA DE MULTA. MAJORAÇÃO DA PENA-BASE DEVIDAMENTE FUNDAMENTADA EM CIRCUNSTÂNCIAS JUDICIAIS DESFAVORÁVEIS. QUANTUM DE AUMENTO. DISCRICIONARIEDADE DO JUIZ. FALTA DE PREQUESTIONAMENTO. INCIDÊNCIA DOS VERBETES SUMULARES Nos 282 E 356 DA SUPREMA CORTE. I. A ausência do dolo específico, consistente no especial fim de "obter, para si ou para outrem, vantagem decorrente da adjudicação do objeto da licitação", enseja, in casu, a absolvição pela prática do art. 90 da Lei 8.666/93 em algumas das condutas praticadas em continuidade delitiva. II. Na hipótese vertente, a remanescência de 9 (nove) outras condutas ilícitas autoriza a manutenção do aumento de pena, pela continuidade delitiva, no patamar de 2/3 (dois terços). III. A ausência de prequestionamento é óbice ao exame da matéria pela Corte Superior, a teor das Súmulas 282 e 356/STF. Agravo regimental desprovido. (AgRg no AREsp 185.188/SP, Rel. Ministro FELIX FISCHER, QUINTA TURMA, julgado em 03/03/2015, DJe 12/03/2015).
PENAL E PROCESSO PENAL. HABEAS CORPUS. 1. IMPETRAÇÃO SUBSTITUTIVA DO RECURSO PRÓPRIO. NÃO CABIMENTO. 2. CRIME DE FRAUDE À LICITAÇÃO. DEMONSTRAÇÃO DE DOLO ESPECÍFICO E PREJUÍZO AO ERÁRIO. DOLO NÃO COMPROVADO NA AÇÃO DE IMPROBIDADE. INDEPENDÊNCIA DAS ESFERAS. 3.
EXISTÊNCIA DE JUSTA CAUSA. ADEQUADA NARRATIVA. COMPROVAÇÃO DO DOLO. INSTRUÇÃO PROCESSUAL. 4. HABEAS CORPUS NÃO CONHECIDO.
[...]
2. O crime de fraude à licitação exige não só o prejuízo ao erário, mas também o dolo específico. Embora se tenha registrado na apelação cível que "não restou cabalmente demonstrado que a Apelante agiu com consciência da ilicitude da conduta e o ânimo de realizar o resultado proibido", não se pode descurar da independência das esferas, motivo pelo qual a conclusão alcançada na Apelação Cível, não vincula a esfera penal. Outrossim, o que se assentou foi a ausência de comprovação do dolo e não ausência do dolo propriamente dito. Nesse contexto, não é possível, de plano, afirmar a ausência do dolo específico, apenas em virtude da sua não comprovação na seara cível.
[...]
(HC 392.509/PR, Rel. Ministro REYNALDO SOARES DA FONSECA, QUINTA TURMA, julgado em 03/08/2017, DJe 16/08/2017)
Assim, conforme se observa do entendimento proferido pelo Egrégio Superior Tribunal de Justiça, para que haja efetivamente a imputação ao acusado do crime de fraude a licitação, necessário se faz que o caderno processual contenha suporte probatório mínimo para demonstrar a eficácia do agente na participação de uma associação que fraudou a licitação ora em comento, mediante o uso de algum meio eficaz fraudulento, de modo a obter o fim desejado, isto é, a vantagem ilícita. E, se há a ausência de circunstâncias elementares do tipo, o fato é atípico em relação ao denunciado.
Quanto à discussão que envolve o tipo de licitação a ser aplicado no caso em comento, foi escolhida a modalidade CONVITE, tendo sido esta apresentada pela Diretoria de Programação e Padronização e autorizada pela Central de Compras, com fundamento na manifestação apresentada pela Procuradoria do Distrito Federal (fls. xx/xx).
Além disso, a escolha da modalidade convite foi devidamente justificada conforme o documento de fl. xx, o qual informa que o valor estimado para o serviço era de R$ xxxxx (dentro dos R$ xxxxx para convite) e havia uma sobrecarga de pregões em andamento o que atrasaria a aquisição dos bens referentes à licitação ora em análise.
Ademais, conforme consta na Lei nº 8.429/92, a Improbidade Administrativa apresenta 3 modalidades, quais sejam: 1) Enriquecimento ilícito (art. 9º); 2) Prejuízo ao Erário (art. 10); e 3) Violação aos princípios da Administração Pública (art. 11). Na primeira e na terceira modalidade, para a sua caracterização, exige-se o dolo, elemento subjetivo este ausente nas atitudes de xxxx, o que de fato foi comprovado nos autos.
Observa-se que o Prejuízo ao Erário é a única modalidade de Improbidade Administrativa que prevê, para a sua caracterização, o elemento subjetivo dolo e culpa. Porém, não há falar em nenhum dos dois elementos, tendo em vista que o prejuízo ao erário não restou configurado, isto porque os serviços contratados foram efetivamente prestados, consoante os depoimentos das testemunhas e informações prestadas nos interrogatórios de xxxx e xxxx (mídia de fl. xxx).
No caso em exame, deve-se privilegiar o princípio in dubio pro reo eis que seria uma verdadeira afronta aos postulados do Estado Democrático de Direito permitir que uma pessoa seja condenada criminalmente com base em meros indícios de que perpetrou sua conduta com o dolo específico.
Portanto, a atipicidade da conduta do acusado tem como fundamentos a ausência de provas de que ele praticou manobras fraudulentas com o intuito de obter vantagem decorrente da adjudicação do objeto da licitação, e que ele tenha se beneficiado economicamente, em decorrência da suposta fraude.
Neste sentido, a Defesa pugna pela absolvição do réu, nos termos do art. 386, inciso III, do Código de Processo Penal, pois sua conduta não constitui infração penal.
Caso não entenda pela absolvição por atipicidade da conduta, deve ser considerada a absolvição pela não participação na prática do crime.
DA ABSOLVIÇÃO PELA NÃO PARTICIPAÇÃO NA PRÁTICA DELITUOSA
O Ministério Público imputa ao acusado a autoria do delito previsto no art. 90da Lei n. 8.666/93. Em alegações finais, o Parquet estaria ciente das supostas irregularidades no procedimento licitatório.
Na presente denúncia são repisados os argumentos ventilados na ordem originária, sustentando-se a ausência de indícios da participação do denunciado xxxxx no suposto crime, tendo em vista que o réu tão somente era na época empregado da empresa, e portanto não possuía poderes de administração ou de decidi qualquer assunto que contribuísse na efetivação de fraude.
O réu jamais manteve associação com os demais denunciados, sendo que não contribuiu na simulação ou fraudou o caráter competitivo do procedimento licitatório de n. xxxxxxx.
Ora, é ônus do MP provar a participação do réu na fraude do procedimento licitatório e para tanto são necessárias provas concretas para comprovar a concorrência do réu na prática do crime descrito na exordial. Nestes termos, é evidente a ausência de justa causa da denúncia, pois legalmente não foi provada a real participação do réu nas tratativas diretas da formulação de fraude a licitação.
Observa-se que as provas colhidas no Inquérito Policial não consubstancia a participação do acusado, além disso o depoimento de xxxxx visualiza o total desconhecimento em relação aos fatos de fraude de licitação. A demais, é visível que não existem subsídios suficientes que comprove a relação do réu com o esquema de fraude a licitação.
Todavia, não há nos autos indicação de que xxxxx tenha agido em conjunto com os demais réus. Aliás, em audiência afirmou que apenas trabalhava na empresa executando certas atividades, ressalta o defendente que sequer conhecia os responsáveis que organizaram a licitação e nem mesmo as demais empresas participantes da licitação.
Com efeito, resta configurado que o denunciado se configura como parte ilegítima da ação penal, tendo em vista que não participou ou contribuiu na efetividade de simulação da licitação, configurando apenas como mero funcionário da empresa que cumpria ordens de seu empregador.
xxxxxx exercia o cargo de xxxx da empresa xxxxx. Conforme se verifica no referido termo de declarações (fl. xx), que o réu se recorda de ter levado, em algumas administrações regionais os envelopes de preços e de documentos da empresa para que a mesma participasse das licitações de tais entes públicos.
Sendo assim, não existe conjunto probatório que afirma a prática do suposto crime, portanto não se pode imputar ao denunciado a prática do delito do ar, 90 da lei de licitações. Em todo caso, “sendo conflitante a prova e não se podendo dar prevalência a esta ou aquela versão, é prudente a decisão que absolve o réu”.
Ademais, é imperiosa a absolvição do acusado mencionando a causa na parte dispositiva, desde que reconheça estar provado que o réu não concorreu para a infração penal. Com efeito, os fatos da existência de fraude a licitação não apresenta a mínima correlação entre a descrição de determinado fato e a conduta do denunciado, sendo aferida a conduta tão somente por ter participado de alguns atos da relação da licitação, tendo em vista ser empregado da empresa que foi vencedora da licitação.
O acusado só efetuava o cumprimento de suas obrigações na atuação do processo participativo da empresa na licitação, sem conhecer da fraude que girava em torno da licitação. Dessa forma, não há qualquer argumento capaz de enquadrá-lo no crime que lhe foi imputado.
De acordo o entendimento da doutrina, só há ato de improbidade administrativa praticado por particular quando existir elemento subjetivo do dolo, motivo pelo qual precisa ser afastada o pedido de condenação do Ministério Público. Além disso, não restou provado a participação do denunciado na fraude a licitação, fator este que não caracteriza a má-fé com intuito de beneficiar-se pela lesão ao erário, visto que desconhecia qualquer indícios de fraude.
Ante o exposto, é visível que xxxxx desconhecia a suposta fraude ao procedimento licitatório, a sua absolvição é medida que se impõe. Dessa forma, requer a defesa a absolvição do réu com base no art. 386, IV do Código de Processo Penal.
DO REGIME INICIAL DE CUMPRIMENTO DA PENA.
Caso vossa Excelência entendo o contrário, a pena deverá ser cumprida em regime inicial aberto, pois a réu é primário e apresenta circunstâncias judiciais favoráveis, sendo que caso venha a ser condenada, a pena máxima não ultrapassaria 4 (quatro) anos, o que, segundo o teor art. 33, § 2º, alínea c, autoriza a fixação do regime inicial aberto.
SUBSTITUIÇÃO DA PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE POR RESTRITIVAS DE DIREITOS.
Da mesma forma, em caso de condenação por pena não superior à 04 (quatro) anos, por se tratar apenas de fraude a licitação, requer a substituição da pena privativa de liberdade por restritivas de direito, de acordo com o artigo 44, do CP.
A pena privativa de liberdade deverá ser substituída por restritiva de direitos, pois o acusado atende aos requisitos subjetivos e objetivos previstos no art. 44do CP: a) pena a ser aplicada provavelmente não será superior a quatro anos, b) crime não foi praticado com violência ou grave ameaça à pessoa, c) circunstâncias judicias favoráveis.
A substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de direitos e a concessão de sursis dependem do preenchimento dos requisitos previstos, respectivamente, nos arts. 44 e 77 do Código Penal.
Assim, a defesa pugna pela substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de direito nos termos do artigo 44 do Código Penal e, subsidiariamente, a aplicação da suspensão condicional da pena, nos termos do art. 77, do CP.
Por fim, pleiteia-se, ainda, a dispensa de dias-multa e custas, em razão da hipossuficiência do acusado, que é demonstrada pelo fato de ser assistido por Núcleo de Asistencia jurídica gratuita.
DA DOSIMETRIA
Na eventualidade do réu ser condenado, devem ser considerados os seguintes aspectos na dosimetria da pena a ser imposta. De acordo com o art. 68 do Código Penal, a dosimetria da pena deve respeitar o procedimento trifásico.
Da análise das circunstâncias judiciais do artigo 59 do Código Penal, verifica-se que todas são favoráveis ao acusado, não havendo elementos nos autos para que se possa fazer um juízo valorativo objetivo sobre a personalidade do acusado, razão pela qual a defesa pugna pela aplicação da pena-base no mínimo legal.
Na Segunda Fase da Dosimetria, não há atenuantes e agravantes a serem consideradas. Da mesma forma, na terceira fase não há causas de diminuição ou aumento a serem consideradas.
Quanto ao regime inicial para cumprimento da pena, a Defesa requer a aplicação do regime aberto, nos termos do art. 33, § 2º, alínea c, do CP, tendo em vista a primariedade do acusado e o montante da pena a ser aplicada.
A defesa pleiteia, ainda, a substituição da pena privativa de liberdade pela pena restritiva de direitos, nos termos do art. 44 do Código Penal, e aplicação subsidiária do art. 77 do CP, haja vista estarem preenchidos todos os requisitos legais para a concessão da medida.
Por fim, pugna pela dispensa da reparação dos danos materiais, em razão da hipossuficiência do acusado.
II - DOS PEDIDOS
Ante o exposto, requer a defesa:
a) A absolvição do réu com base no art. 386, III do CPP, uma vez que a conduta do réu é atípica;
b) A absolvição do réu com base no art. 386, IV do CPP, pois ele não colaborou com a empreitada criminosa;
c) Subsidiariamente, a fixação da pena-base no mínimo legal, eis que, da análise do art. 59 do CP, conclui-se que as circunstâncias do caso em tela são favoráveis ao réu;
d) A fixação do regime aberto para início de cumprimento de pena, com base no art. 33, § 2º, alínea c, do CP;
e) A substituição da pena privativa de liberdade pela restritiva de direitos, nos termos do art. 44 do CP, e aplicação subsidiaria do art. 77 do CP;
f) A dispensa da reparação de dano material, em razão da hipossuficiência do acusado.
Brasília, 04 de junho de 2018.
IVONILDO REIS SANTOS
OAB/DF - 17.026E