TRANSEXUALIDADE: Análise jurídica da transexualidade no Brasil[1]
Antonia Leonida Pereira de Oliveira[2]
Nilvanete Gomes de Lima[3]
Sumário: 1 Introdução; 2 A transexualidade na jurisprudência; 3 A transexualidade e seu empenho quanto a alteração do nome e identidade de gênero; 4 A possibilidade do casamento aos transexuais; 5 Conclusão; 6 Referências.
RESUMO
Este trabalho tem por escopo analisar juridicamente a transexualidade no Brasil, utilizando de livros e artigos científicos. Pretende-se detalhar os avanços na jurisprudência e explicar as dificuldades e preconceitos sofridos por esta classe social. Tem como objeto também traçar os conceitos jurídicos e sociais estabelecidos para definir a conjuntura e direitos civis dos transexuais. Por fim, conclui-se que o amparo jurídico aos transexuais tem sido tímido e de pouca expectativa, fazendo com que se sintam excluídos.
Palavras-chave: Transexualidade. Jurisprudência. Preconceitos. Direitos Civis.
1 INTRODUÇÃO
Quando um indivíduo nasce é feita a visualização de sua genitália ou antes através da ultrassonografia definindo assim a qual sexo este pertencerá. Desta forma, no registro de nascimento constará se é menino ou menina, contudo não significa que o indivíduo estará conformado com o critério do sexo morfológico adotado pela sociedade, pois o homem não deve ser determinado por ter um pênis e mulher por ter uma vagina, o sexo de um indivíduo deve ser analisado não apenas pelo elemento biológico, mais sim, pelo elemento psicológico e comportamental.
A transexualidade é quando o indivíduo tem a identidade de gênero contrária à do nascimento, pois existe uma ruptura entre o corpo e a mente, existem casos onde desde a infância exista a tendência a não aceitação de seu corpo. Vale ressaltar que em outros casos só se tem essa mentalidade a não aceitação do sexo morfológico a partir da adolescência quando a maturidade é aflorada.
O transexual se considera parte do sexo oposto, sofrendo dentro de seu próprio corpo. Ele almeja desesperadamente modificar-se para que corresponda com seu interior, gerando rejeição ao sexo original e resultando em insatisfação. Assim, estas pessoas passaram a lutar há muito tempo para ter seus direitos e aparato judicial, pois até mesmo o entendimento sobre o assunto é complexo, considerando os valores da sociedade que ainda impedem novas visões de análise da transexualidade.
Desta forma questiona-se neste artigo: quais os mecanismos de integração jurídica e social podem ser considerados para garantir os direitos civis dessa classe social.
Na nossa sociedade há uma inclinação ao desagrado e uma desconfiança quanto ao que é diferente ou incomum, o que não deixa de dar a entender que o que é certo é o sentimento da maioria. Entretanto, os transexuais têm lutado arduamente por reconhecimento e amparo jurídico e social, sendo que há pouco tempo havia ainda a omissão legislativa.
Esta análise é relevante para sociedade, pois todo indivíduo deve ser tratado de forma isonômica e não deve ser tratado como um doente simplesmente por não aceitar o seu corpo, e em uma sociedade em processo de desenvolvimento tratar a identidade de alguém de forma conservadora e sem prerrogativas que não lhe acrescentem o direito de ser livre é contraditório, assim faz-se necessário a dissolução desse pensamento no instante em que estes interferem na socialização de um indivíduo ou de uma classe.
Na questão acadêmica, este artigo é de grande relevância, pois esta classe sofre por omissão e desamparo judicial, além disso, existe a supressão de assistência aos transexuais que acaba gerando a exclusão de alguns direitos fundamentais ao indivíduo como: direito de ir e vir, direito a intimidade, direito a dignidade da pessoa humana, direito a saúde, e o direito ao nome. Destarte, este artigo tem muita importância aos juristas e aos cidadãos em geral que buscam mais informações sobre esse tema.
O motivo pessoal pelo qual foi motivado neste artigo fora a exclusão destes indivíduos que ficam a margem da sociedade, desprotegidos e ridicularizados em seu sofrimento interno, e a falta de importância que se dá, não existindo sequer conscientização a prática do preconceito, desta forma impulsionou a curiosidade que levou a construção deste artigo para que exista mais fontes de pesquisa sobre o assunto.
Para tanto, partiu-se do seguinte objetivo geral: analisar juridicamente a transexualidade no Brasil. Afim de alcançá-los foram desenvolvidos os seguintes objetivos específicos: demonstrar a transexualidade na jurisprudência, descrever a transexualidade e seu empenho quanto a alteração do nome e identidade de gênero e estabelecer a possibilidade do casamento aos transexuais.
Metodologicamente, a pesquisa caracteriza-se quanto aos procedimentos é bibliográfica e quanto aos objetivos caracteriza-se como exploratória. Esta metodologia utilizada neste artigo objetiva responder à questão principal através de material publicado, formado por livros, artigos periódicos e também por matérias disponíveis na internet. (GIL, 2002)
2 A TRANSEXUALIDADE NA JURISPRUDÊNCIA
O alicerce fundamental de uma sociedade é construído em torno do núcleo familiar, tal alicerce parte dos valores passados de geração em geração por décadas onde o homem nascia e se preocupava em levar o alimento para a mesa da família e a mulher teria o encargo de cuidar dos filhos e da casa, zelando sempre pela moral e pelos bons costumes. Ao passar dos anos, todo esse contexto idealista e conservador passa a ser quebrado por causa dos pensamentos e visões divergentes. (PENA JÚNIOR, 2008)
A transexualidade com as invenções e avanços na medicina passou a ter cura, a cirurgia de resignação do sexo faz com que o indivíduo modifique seu corpo para que se pareça o mais possível que seja com o gênero que este deseja ser, durante anos houveram inúmeros experimentos para que pudesse ser realizada tal cirurgia.
Sendo assim, conclui-se que essa seria eficiente se fosse feita na transformação de homem para mulher, pois a mudança de mulher para homem ainda está em experimentação. Sendo direito de todo indivíduo a saúde, os transexuais passaram a entrar com ações judiciais para a autorização da cirurgia, entretanto por um bom tempo a cirurgia de resignação era vista como crime de lesão corporal constituindo crime.
Porém, ao passar dos anos a cirurgia de sexo não fora mais vista como crime de mutilação, no Código Penal, Art. 129, § 2, inciso III sobre o crime de mutilação expressa que é crime de natureza grave quando resulta na perda ou inutilização do membro, todavia, a cirurgia de resignação sexual explicita que a sua finalidade é inteiramente terapêutica, pois após anos de diagnóstico do transexual, sendo acompanhado por uma equipe de médicos e psicólogos, que se obterá a confirmação da transexualidade e teria assim a cirurgia como cura, desta forma não teria lógica prender o médico por realiza-la. (BRASIL, 1940). Contudo, esse avanço no campo médico não foi acompanhado pela legislação, tanto que tiveram casos de cirurgias clandestinas, e médicos que eram condenados por realizarem a mesma.
Sendo essa cirurgia efetuada para o bem-estar do indivíduo diagnosticado como transexual, ela é uma medida viável e ao mesmo tempo é a única cura, “conforme a OMS a saúde é o completo estado de bem-estar físico, psíquico e social” (DIAS, 2009, p. 240), ou seja, a intervenção cirúrgica visa o bem-estar do indivíduo e não o prejudicar para que assim se constitua crime, e sendo um direito garantido, este não deve ser ferido.
A atividade médica tem sempre por escopo a conservação da vida e da saúde do indivíduo mediante a cura das moléstias. Por isso, nas atividades médicas curativas, está ausente o dolo na prática de lesões corporais. Outrossim, a terapia cirúrgica, que visa à cura do doente, mesmo que ocorram mutilações, não se enquadra no tipo lesão corporal, descrito nos Códigos Penais. (SZANIAWSKI, 1998, p. 276)
Destarte, é notável que se tratando da saúde deste indivíduo a realização da cirurgia é legal, vale ressaltar a importância do acompanhamento com uma equipe especializada e que dará assistência ao transexual, incluindo procedimentos médicos para a possibilidade de adaptação ao corpo através de hormônios, pois é uma cirurgia que mudará a vida do indivíduo completamente, por isso se faz necessário o as etapas para constatação. Em 22 de fevereiro de 2013, com base na literatura científica visitada e nas resoluções do Conselho Regional de Medicina do Estado de São Paulo e do Conselho Federal de Medicina, foi proposto que:
-O adolescente com transtorno de identidade de gênero deve ser assistido em centro dotado de estrutura que possibilite o diagnóstico correto e a integralidade da atenção de excelência, que garanta segurança, habilidades técnico-científicas multiprofissionais e suporte adequado de seguimento;
-Essa assistência deve ocorrer o mais precocemente possível, iniciando com intervenção hormonal quando dos primeiros sinais puberais, promovendo o bloqueio da puberdade do gênero de nascimento (não desejado);
-Aos 16 anos, persistindo o transtorno de identidade de gênero, gradativamente deverá ser induzida a puberdade do gênero oposto. Para os jovens, a administração de 17 β estradiol oral (hormônio feminino) e para as jovens, a de testosterona intramuscular (hormônio masculino), conforme os protocolos detalhados no corpo deste parecer. (CONSELHO..., 2013, p [?])
Assim começou a batalha judicial por amparo, o Tribunal Regional Federal da 4º Região na Apelação Cível nº 2001.71.00.026279-9/RS determinou que as cirurgias de resignação sexual fossem custeadas pelo Sistema Único de Saúde essa explicita:
1 - A exclusão da lista de procedimentos médicos custeados pelo Sistema Único de Saúde das cirurgias de transgenitalização e dos procedimentos complementares, em desfavor de transexuais, configura discriminação proibida constitucionalmente, além de ofender os direitos fundamentais de liberdade, livre desenvolvimento da personalidade, privacidade, proteção à dignidade humana e saúde.
2 - A proibição constitucional de discriminação por motivo de sexo protege heterossexuais, homossexuais, transexuais e travestis, sempre que a sexualidade seja o fator decisivo para a imposição de tratamentos desfavoráveis.
3 - A proibição de discriminação por motivo de sexo compreende, além da proteção contra tratamentos desfavoráveis fundados na distinção biológica entre homens e mulheres, proteção diante de tratamentos desfavoráveis decorrentes do gênero, relativos ao papel social, à imagem e às percepções culturais que se referem à masculinidade e à feminilidade. Genitais, perder as características primárias e secundárias do próprio sexo e ganhar as do sexo oposto; 3. Permanência desses distúrbios de forma contínua e consistente por, no mínimo, dois anos;4. Ausência de outros transtornos mentais. (BRASIL, 2001, p.1)
Com base nessa ementa os custos seriam de responsabilidade dos cofres públicos, diminuindo assim a dificuldade para que a cirurgia fosse efetuada e este indivíduo obtivesse assim seu bem-estar físico e psíquico.
Enfim, o Novo Código Civil em seu Art. 13 afirma: “Salvo por exigência médica, é defeso o ato de disposição do próprio corpo, quando importar diminuição permanente da integridade física, ou contrariar os bons costumes” (BRASIL, 2002). Assim, o referido artigo permite que a cirurgia de resignação seja legal, pois ela é realizada por exigência médica e tem caráter terapêutico, consequentemente, após a cirurgia vem o desejo de alteração dos documentos, o que levará a uma outra etapa de lutas por direitos.
3 A TRANSEXUALIDADE E SEU ESFORÇO QUANTO A ALTERAÇÃO DO NOME E IDENTIDADE DE GÊNERO NO BRASIL
Os registros civis são extremamente importantes, neles que se fixam dados de identificação, e também de controle do Estado, é uma forma de organizar a sociedade para que todos que nela habitem possa ser distinguido particularmente.
De acordo com o Art. 16 do CC “Toda pessoa tem direito ao nome, nele compreendidos o prenome e o sobrenome” (BRASIL, 2002). O nome é o identificador da pessoa, e existe além disso um interesse privado em não confundir as pessoas, dessa forma o nome é a centralização da personalidade individual, e este tem que condizer com o estado pessoal, social e psíquico, por isso não pode ser ridicularizado.
Os transexuais após a cirurgia, passam a ter seus registros contrários à sua aparência e como se sentem, o nome da pessoa deve ser objeto de identificação e honra e não motivo de escárnio. Contudo no mesmo código em seu Art. 1.604 proíbe “vindicar estado contrário ao que resulta do registro de nascimento, salvo provando-se erro ou falsidade do registro” (BRASIL, 2002), sendo que não houve nenhum erro ou falsidade de registro, é indeferido o pedido de retificação.
Após a cirurgia da transgenitalização, o registro deve realizar a alteração sem a ressalva, sob pena de ofensa à dignidade humana, assim, a mesma destaca que a nova certidão de nascimento não deve considerar qualquer observação quanto à natureza das retificações decorridas, registrando-se somente a ressalva de que o assento foi modificado por sentença judicial em ação de retificação do registro, cujo teor é segredo de justiça, assim, sendo o nome a expressão da individualidade de um indivíduo, é também o substantivo que permite o exercício dos direitos e deveres. (DINIZ, 2006)
Contudo a adequação do indivíduo a ordem jurídica é indispensável, pois desde que não prejudique o sobrenome da família é válida a modificação.
O transexual não quer muito, quer apenas o mínimo essencial para uma sobrevivência digna, procurando o equilíbrio entre os direitos fundamentais e os sociais. O direito à busca do equilíbrio corpo-mente do transexual, ou seja, à adequação do sexo e prenome, está ancorado no direito ao próprio corpo, no direito à saúde e, principalmente, no direito à identidade sexual, a qual integra um poderoso aspecto da identidade pessoal. (VIEIRA, 1996, P.118)
O nome civil do transexual é tão importante quanto a cirurgia, pois irá selar sua integração a sociedade, assim esse indivíduo enfim consumará a felicidade de uma vida plena e digna sem ser submetido a vexames.
Destarte, como não existe legislação que regulamente a alteração imediata do registro civil após a cirurgia de resignação, só resta recorrer à justiça e esperar que o pedido seja deferido e que a alteração seja feita, além de ir contra os princípios da intimidade e privacidade que são violados ao permanecer com os documentos, que o transexual é obrigado a identificar-se acaba por não ter outra alternativa a não ser dizer que fez cirurgia tirando o direito desse indivíduo de omitir ou não a resignação. (DIAS, 2009)
A solução para este problema seria a criação de nova categoria de um terceiro sexo, esta não afronta os direitos e as garantias individuais constitucionalmente asseguradas e poderia suprimir a indicação do sexo nas certidões de nascimento, assim esse indivíduo não seria constrangido por ter em seu registro explicito que é transexual e teria seus direitos garantidos, assim o Estado continuaria tendo o controle sobre os indivíduos conscientes que são transexuais.
4 POSSIBILIDADE DO CASAMENTO AOS TRANSEXUAIS
O casamento atualmente ainda é tido como um rito conservador baseado em valores, assim, é notável que exista resistência para abertura de espaço para que os transexuais desfrutem do matrimônio, além disso, uma pessoa que se casa com um transexual pode não ter ciência disso por omissão do parceiro, desta forma, levando em conta a seriedade do casamento a possibilidade deste aos transexuais torna mais complexo o processo de integração ao matrimônio.
Se a análise se passasse na realidade do transexual, no que ele sempre foi internamente, então seria correto dar o direito de casar, mas se analisarmos anatomicamente o transexual, este ainda terá o gênero morfológico, pois a estrutura interna será do sexo de nascimento, assim se for um homem, este não poderá ter filhos, e se for mulher não gerará espermatozoides, dessa forma a estrutura interna de ambos não corresponderá com a aparência externa.
Por melhor e mais bem-sucedida que possa ser a cirurgia, ela só vai interferir na dimensão morfológica, deixando intacto o que, no nível biológico, marca o sexo do sujeito: o cromossomo XY ou o XX. Em outras palavras, independentemente dos milagres realizados pela medicina moderna e das futuras manipulações genéticas, um sujeito XY (do sexo masculino) jamais se transformará em XX (sexo feminino). Biologicamente, então, não se pode mudar um sexo de mulher a um homem e vice e versa. Assim, quando um sujeito evoca seu desejo de mudar de sexo, ou diz que já se submeteu à cirurgia corretiva, não podemos esquecer que, na verdade, a mudança de sexo deve ser compreendida como uma mudança de fachada de envelope, como dizem alguns transexuais, uma nova aparência dada ao aspecto exterior do indivíduo. É nesse sentido que se deve entender a expressão adequação do sexo ainda que, em alguns casos, a cirurgia atinja o interior do corpo [...] o cirurgião só intervém na estética, pois no mais profundo do sujeito, suas células sempre guardarão a marca de seu sexo cromossômico de origem. (CECACRELLI, 2008, p. 17)
Contudo, é importante ressaltar que este indivíduo não poderá procriar, mas isso não impede que este possa ter matrimônio, mesmo que um dos indivíduos tenha dúvidas isso questionará a validez do casamento e não a existência deste. (MIRANDA, 2006)
Desta forma, o sexo psíquico prepondera sobre o biológico e por isso é valido o casamento para transexuais, se a doutrina e a jurisprudência determinam que o indivíduo contatado como transexual pode ter a alteração de seus registros civis, então nada impede que este venha a constituir matrimônio com outrem. Vale ressaltar, que o direito de constituir família é garantido pelo Estado a todo indivíduo. (CHAVES, 1980)
Quanto ao casamento do transexual, ou seja, de pessoa que, embora biologicamente normal, identifica-se completamente com o sexo oposto e vive como se a ele pertencesse, deve-se considerar a possibilidade não só de sua existência, como também de sua validade e anulação. Senão vejamos: se a pessoa não declara a sua condição de transexual antes do casamento, poderá o outro cônjuge, alegando desconhecimento do fato, acionar o Judiciário mediante ação de anulação, por erro essencial quanto à qualidade daquela pessoa. Mas a solução é a anulação do casamento e não o reconhecimento da sua inexistência. Admitindo o transexual que por meio de procedimento médico cirúrgico alterou o seu estado sexual, e sendo o cônjuge do sexo oposto, além de conhecedor dessa situação, há de se reconhecer a validade desse casamento, especialmente depois de obtida na Justiça a mudança de nome e sexo, permitindo a retificação do registro civil. (PENA JÚNIOR, 2008, p. 111)
Assim, a omissão da verdade, onde o transexual omiti ao seu parceiro (a) a mudança de sexo, assim se este pedir separação valerá como justificativa, pois a vida comum do casal será abalada e se tornará insuportável, contudo não consistirá em anulação do casamento e sim em separação, pois não houve conduta desonrosa nem infringência aos deveres do casamento, como mostra o Art. 1.572 do Código Civil:
Qualquer dos cônjuges poderá propor a ação de separação judicial, imputando ao outro qualquer ato que importe grave violação dos deveres do casamento e torne insuportável a vida em comum.§ 1o A separação judicial pode também ser pedida se um dos cônjuges provar ruptura da vida em comum há mais de um ano e a impossibilidade de sua reconstituição.§ 2o O cônjuge pode ainda pedir a separação judicial quando o outro estiver acometido de doença mental grave, manifestada após o casamento, que torne impossível a continuação da vida em comum, desde que, após uma duração de dois anos, a enfermidade tenha sido reconhecida de cura improvável.
§ 3o No caso do parágrafo 2o, reverterão ao cônjuge enfermo, que não houver pedido a separação judicial, os remanescentes dos bens que levou para o casamento, e se o regime dos bens adotado o permitir, a meação dos adquiridos na constância da sociedade conjugal. (Brasil, 2002)
Além do mais, hoje em dia os casais geralmente têm contato físico antes do casamento, e não passaria despercebido as cicatrizes e modificações no corpo do transexual. Algumas vezes, o transexual, na tentativa vã de se adaptar a sociedade acaba por ter filhos e casa-se, somente depois que tem a consciência que é transexual acaba por se submeter a cirurgia de resignação sexual. Dessa forma, a situação é mais complicada, pois já se tem uma família e filhos no meio.
Quando a resignação sexual desse indivíduo envolve direitos de terceiros, tem-se que levar em conta o direito subjetivo do (s) filho (s), portanto, a adequação sexual desse indivíduo não diz respeito somente a ele quando se leva em consideração o direito de família, se a cirurgia for realizada antes do casamento ou união estável, discute-se a possibilidade ou não do estabelecimento da vida em comum, se houver concordância com o cônjuge poderia não ficar abalada a validade do casamento, mas inexistindo a concordância a solução seria a prévia separação ou o posterior divórcio. (CAHALI, 2002)
Para Araújo (2000), o transexual ter gerado filhos não trará nenhum reflexo na situação jurídica dos descendentes. O fato de ter sido casado e de ter gerado filhos não pode constituir como obstáculo a felicidade do transexual. Assim, o fato de o indivíduo ter tentado se adaptar ao seu corpo não significa que este seja obrigado a aceitar seu sexo morfológico, a felicidade desse indivíduo constitui-se pela aceitação de si mesmo, e se em uma família o pai não se sente bem, este deve procurar a felicidade, nunca deixando de dar assistência aos seus filhos, mas todo indivíduo é livre e pode fazer o que quiser pois tem o direito de ir e vir.
Todavia, não há como impedir que o genitor, após a cirurgia, busque a alteração na certidão de nascimento, e se o nome do genitor estiver um nos seus documentos e no da criança outra, acaba gerando sérios prejuízos. Vale ressaltar, que mesmo permanecendo inalterado o registro do filho, este ainda terá direitos sucessórios e pensão por alimentos, só que precisará da certidão do registro e da retificação. (DIAS, 2009)
Assim, cabe a cada um escolher e determinar a sua personalidade e identidade, não adianta impedir que os transexuais se casem por que eles constituíram união estável com seus parceiros que resultará em uma família, e se estes são sujeitos a terem seus deveres também necessitam de maior observância pois também compõem a sociedade.
5 CONCLUSÃO
Em virtude dos fatos mencionados, objetivou-se explicitar que o transexual é o indivíduo que tem seus princípios e direitos civis ignorados pelo meio social e jurídico, levando em conta a carência de artigos, pesquisas e livros sobre o tema, na legislação existe uma enorme omissão, que deixa a compreender que os direitos desta classe social são subjetivos, a dificuldade em alterar seus registros é tão grande que para conseguir eles necessitam entrar com ações judiciais, e até mesmo para se casar e ter uma família existe uma enorme burocracia, todos esses problemas acabam por impossibilitar que o transexual se integre na sociedade.
Dessa forma, a constante tentativa de adquirir direitos e serem vistos como indivíduos tem tido avanços lentos, à grande dificuldade em mudar essa situação resulta principalmente nos valores, na justiça e na sociedade, esses três itens tem falhado por serem omissos aos transexuais, a própria solução para que seja realizada a cirurgia é preconceituosa, pois para que seja feita, o SUS passa dois anos tentando converter o indivíduo a se adequar com algo que ele não aceita, mesmo que seja correta a identificação da transexualidade por não ter volta após o processo, tantos anos aplicando hormônios e tentando influenciar o indivíduo passa a ser tortura.
Assim, conclui-se que se faz necessário a conscientização da sociedade sobre o assunto, leis que incluam os transexuais e lhe assegurem seus direitos, programas de assistência aos transexuais que buscam a cirurgia de resignação sexual, incentivo à estudos científicos sobre o tema, assim esses indivíduos poderão sentir-se parte da sociedade e serem integrados a ela sem preconceitos, destarte, todos viverão de forma harmônica respeitando os direitos de cada um.
REFERÊNCIAS
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BRASIL, Apelação Cível nº 2001.71.00.026279-9/RS. Disponível em:. Acesso em: 23 maio 2015.
______. Novo Código Civil. (2002). Disponível em: Acesso em: 23 maio 2015.
______. Código Penal. 16. Ed. São Paulo: Saraiva, 2013.
CAHALI, Yussef Said. Divórcio e separação. 10. Ed. São Paulo: Ed. RT, 2002.
CECCARELLI, Paulo Roberto. Transexualismo. São Paulo: Casa do Psicólogo, 2008.
CONSELHO FEDERAL DE MEDICINA. Parecer CFM nº8/13. Disponível em:
. Acesso em: 26 maio 2015.
CHAVES, Antonio. Castração- esterilização mudança artificial de sexo. Revista dos Tribunais, São Paulo, vol. 542, 1980.
DINIZ, Maria Helena. O Estado atual do biodireito. São Paulo: Saraiva, 2006.
DIAS, Maria Berenice. União homoafetiva: o preconceito & a justiça. 4. Ed. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2009.
GIL, Antonio Carlos. Como elaborar projetos de pesquisa. 4. ed. São Paulo: Atlas. 2002.
MIRANDA, Jorge. Escritos vários sobre direitos fundamentais. Estoril: principia, 2006.
PENA JUNIOR, Moacir César. Direito das pessoas e das famílias: doutrina e jurisprudência. São Paulo: Saraiva, 2008.
SZANIAWSKI, Elimar. Limites e possibilidades do direito de redesignação do estado sexual – estudo sobre o transexualismo – aspectos médicos e jurídicos. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1998.
VIEIRA, Tereza Rodrigues. Mudança de sexo: aspectos médicos, psicológicos e jurídicos. São Paulo: Livraria Santos Editora, 1996.