O DESPREZO ÀS CONDIÇÕES DE GÊNERO NO SISTEMA PRISIONAL BRASILEIRO[1].
Danilo da Silva Magalhães²
Antônia Leonida Pereira de Oliveira²
Adriano Damasceno ³
RESUMO
O presente artigo tem por escopo analisar a violência de gênero dentro do sistema prisional brasileiro, verificando as condições precárias, a ausência de estabelecimento adequado para o cumprimento de pena relativa à figura da mulher. Por meio de pesquisas bibliográficas e levantamento de dados, pode-se verificar que sistema prisional brasileiro não possui estrutura para receber mulheres criminosas, uma vez que, por sua condição biológica, as prisões femininas demandam infraestrutura estrutura própria e além disso, não possui vagas suficientes para todas, inclusive quando progridem de regime, não podendo cumprir em regime mais gravoso. Diante do que foi supramencionado, foi realizado um histórico da figura feminina no sistema prisional, todas os aspectos que influenciam até mesmo a construção de cadeias que não se adequem a condição de mulher. Ainda, foi-se analisado a súmula 56 do STF, que refrata sobre a ausência de vagas, e aplicando para as mulheres, foi possível compreender a problemática envolvendo a progressão de regime. Por fim, fez-se indispensável um levantamento e análise de dados com base no INFOPEN, sobre o crescente aumento da população carcerária feminina, concluindo assim, que o sistema prisional não está apto para a demanda e também para tratar as mulheres de forma digna, lhes oferecendo o mínimo para sua sobrevivência.
Palavras-Chave: Sistema Prisional. Gênero. Histórico. Legislação. Aumento.
1 INTRODUÇÃO
O Brasil possui a quinta maior população carcerária feminina do mundo. Segundo dados do Departamento Penitenciário (2014) em todo território nacional somam-se cerca de 37.380 detentas, 6,4% da população prisional total. Nos últimos anos o percentual de mulheres encarceradas vem crescendo espantosamente e tem sido motivo de grande preocupação para o Estado, ensejando numa pressão maior para a criação de projetos voltados para melhorias infraestruturais do sistema carcerário e para o combate ao crescimento exacerbado que alcançou uma variação de cerca de 547% nos últimos anos. (DEPEN, 2014).
No que diz respeito as condições do sistema prisional, é possível observar aspectos estruturais voltados para necessidades masculinas, pois os valores predominantes são machistas e conservadores. Assim, a problemática das condições estruturais das prisões femininas não é algo recente, a estrutura que não se adequa as condições biológicas das mulheres decorre de um processo onde não se pensa no corpo da mulher para que as necessidades sejam atendidas, levando em consideração ainda, que a população criminosa feminina é em menor número que a masculina e mesmo assim não se tem estruturas que adequem as mulheres.
Destarte, o caráter ressocializador da pena se torna ineficaz, uma vez que o cumprimento da pena se torna um violador de garantias, e quando se aplica essa realidade as mulheres se torna mais difícil ainda, pois as condições de gênero desencadeiam necessidades diferenciadas e estabelecimentos penais próprios para recebimento da população feminina. (PIMENTEL, 2008).
Diante do que fora supramencionado, percebemos que o sistema punitivo brasileiro encontra-se a quem de um sistema prisional justo, digno e igualitário, verifica-se a ineficácia do estado ao oferecer infraestrutura decente aos estabelecimentos penais e o despreparo para o recebimento da alta demanda de mulheres nas prisões respeitando suas particularidades e necessidades específicas, a partir disto questiona-se de que forma pode-se entender a dinâmica do sistema prisional brasileiro frente às questões de gênero.
Este estudo é relevante para a sociedade, pois é uma fonte de esclarecimento da atual conjuntura do sistema prisional e seu desprezo em relação a condição de mulher, dos preconceitos sofridos, pelas péssimas condições de estrutura das unidades prisionais, e ainda, através desse artigo, poderemos mostrar o quão omisso o Estado tem sido na tomada de atitudes para resolução ou melhoramento dessa situação, e a falta de mecanismos estatais para acolhimento da demanda da sociedade no que se refere ao grande número de presas por cela.
A importância acadêmica deste artigo, decorre do fato de este ser fonte de conhecimento aos juristas e estudantes sobre a referida temática, fazendo uma abordagem analítica para demonstrar a questão histórica e comparando dados de população carcerária, para que seja esclarecida da melhor forma como a legislação e Estado se posicionam frente a situação inconstitucional de coisas do sistema carcerário brasileiro.
Destarte, a razão pessoal de escolha do artigo originou-se pela curiosidade em analisar a forma que a mulher tem sido tratada, frente a sua condição de gênero, afim de que possamos compreender o cenário atual do sistema carcerário, com o intuito de haver enriquecimento sobre o tema. Ainda, a ausência de materiais de estudo sobre as mulheres traficantes no sistema prisional do Brasil, despertou-se grande curiosidade, pois é um tema de grande polêmica, mas que carece de estudos, tanto pelas origens patriarcais e conservadoras, quando pela discriminação e segregação enfrentada por elas.
Para tanto, partiu-se do seguinte objetivo geral: analisar o desprezo às condições de gênero no sistema prisional brasileiro. Afim de alcançá-los foram desenvolvidos os seguintes objetivos específicos: estabelecer uma perspectiva histórica das mulheres no sistema carcerário, demonstrar o aumento da população carcerária feminina nos anos de 2000 a 2014 com base nos dados do INFOPEN e explicar a problemática da insuficiência de vagas no sistema carcerário brasileiro.
Quanto aos objetivos, a pesquisa caracteriza-se como exploratória. Quanto aos procedimentos, caracteriza-se como bibliográfica. A metodologia utilizada neste artigo tem como escopo responder à questão principal através de material publicado, formado por livros, artigos periódicos, entrevista e também por materiais disponíveis na internet. (GIL, 2002).
2 PERSPECTIVA HISTÓRICA DAS MULHERES NO SISTEMA CARCERÁRIO
De início, é relevante salutar que a gênese das prisões femininas no Brasil tem base num discurso religioso e moral pregado e defendido na antiguidade. Entre os séculos XIX e XX, as mulheres consideradas prostitutas eram rigorosamente punidas, assim como as que eram acusadas de bruxaria, uma vez que eram condutas consideradas desviantes dos padrões socialmente impostos. Essa discriminação da mulher era legitimada por um Direito Penal que tinha, e tem, bases patriarcais e machistas. (ESPINOZA, 2003).
Por muito tempo as mulheres não tiveram uma legislação específica que regulamentasse sobre um regime especial e desde o surgimento das instituições prisionais houve a necessidade da separação carcerária entre homens e mulheres, pois o motivo da pena era diferente. (PINHEIRO, 2012).
Apenas no ano de 1940, com o Código Penal e Processual Penal, que surgiu a primeira norma legal, disposta no art. 29, parágrafo 2º, determinando que as mulheres cumpririam pena em um estabelecimento especial, em secção adequada ou prisão comum. (BRASIL, 1940). Este mesmo Código deu legitimidade ao crime de vadiagem, que era interpretado de forma extensiva e englobando as prostitutas, fazendo com que muitas mulheres fossem presas nessa época. (PIMENTEL, 2008).
Essa noção que se tinha de isolamento das mulheres delinquentes tinha a justificativa de “purificação”, era como se a mulher que tivesse condutas desviantes fosse contra sua “natureza”, contra os padrões, sendo tratada como uma pessoa “suja”, que poderia contaminar as outras mulheres, e a prisão tinha o escopo de reprodução desses padrões femininos criados pela sociedade. (PINHEIRO, 2012, p. 50)
De acordo com Espinoza, “com essa medida buscava-se que a educação penitenciária restaurasse o sentido de legalidade e de trabalho nos homens presos, enquanto, no tocante às mulheres, era prioritário reinstalar o sentimento de pudor”. (2004, p. 39).
Portanto, a intenção das prisões femininas era de domesticação das mulheres, da transformação das mulheres “pecadoras” em mulheres “modelo”, reportando sempre a moral e bons costumes, quando o objetivo da prisão fosse atingido elas retornariam à sociedade, ou para a vida religiosa, caso fossem solteiras, idosas e etc. (COELHO NETTO; BORGES, 2002).
Mas a taxa de criminalidade das mulheres sempre foi menor em relação aos homens, por que acreditavam que elas não evoluíram como os homens. Posteriormente, foi criada a classificação das punições para certos crimes, e foi assim que a mulher passou a ser vista como criminosa, sendo punida como o homem também é punido. Entretanto, por volta do séc. XX a figura da mulher criminosa chama de “vítima” foi criada. Nessa classificação, as mulheres não eram capazes biologicamente de cometer os crimes, mas eram cumplices dos homens, exercendo papéis de lealdade. Hodiernamente, os crimes deixaram de estar na seara privada, agora são públicos, as mulheres têm sido personagens em crimes de tráfico de drogas, roubo, furto e homicídio. (MARTINS, 2009).
É sabível que a noção de proteção e segurança do sistema prisional, expressos na legislação infraconstitucional e na Carta Magna, são teorias que não se aplicam a realidade fática, vez que a privação de liberdade se torna desumana na medida que viola condições básicas de sobrevivência como alimentação e higiene. As penitenciarias femininas vivem em condições degradantes, ainda mais por ensejarem num tratamento distinto, levando em conta o aspecto biológico, sem refratar que ao direcionar a ótica para as presas grávidas e parturientes se torna um assunto de maior gravidade, pois a situação de contaminação se torna um perigo para o recém-nascido, que pode contrair doenças pela imundice do estabelecimento penitenciário e não pode deixar a mãe pois necessita dela para sobrevivência. (COELHO NETTO; BORGES, 2013).
Apesar dessa situação humilhante, o atual Código Penal pesa aspectos femininos na punição, pois leva em consideração a constituição hormonal da mulher e reconhece que em determinados períodos ela fica mais sujeita a transtornos que influenciam no seu comportamento. Estes períodos se dividem em quatro: período menstrual, período de gravidez e parto, puerpério e menopausa, estes momentos são analisados no momento do crime. (PIMENTEL, 2008).
O ordenamento jurídico vigente compete, no art. 11, ao Estado a atribuição de fornecer diversas formas de assistências ao encarcerado, sejam sociais, saúde, religiosa, educacional, entre outras, que são de suma importância, pois quando o indivíduo tem sua liberdade restringida ele não é capaz de desempenhar os direitos fundamentais que lhe são intrínsecos. (BRASIL, 1988).
A legislação ainda era muito genérica, não tinha de forma mais especifica o tratamento devido as mulheres presas, até que o 1º Congresso das Nações Unidas adotou regras mínimas para o tratamento dos presos, tendo como objetivo estabelecer regras de boa organização penitenciaria, inovou no que se refere a concepção dos detentos com sujeitos de direitos, e trouxe particularidades concernentes as mulheres presas. Em respeito aos direitos humanos, todos os países signatários deveriam aplicar o que foi exposto.
(to acrescentando esses artigos)
Em 17 de outubro de 1994, o Brasil passou por um grande avanço referente as diretrizes nacionais de execução penal e seguindo os princípios constantes na Declaração Universal dos Direitos do Homem, estabeleceu a Resolução nº 14 do Conselho Nacional de Política Criminal e Penitenciária – CNPCP, dispondo sobre as Regras Mínimas para o Tratamento do Preso no Brasil, distribuídas em 65 artigos que acrescentaram algumas previsões de atendimento de gênero omissas na LEP, entretanto tais normativas ainda estão longe de serem regulamentadas em nível nacional.
Em relação a mulher, as normas da citada Resolução assim dispuseram:
As mulheres cumprirão pena em estabelecimentos próprios (Art. 7º parágrafo 1º);
Serão asseguradas condições para que a presa possa permanecer com seus filhos durante o período de amamentação dos mesmos. (Art. 7º parágrafo 2 º);
Aos menores de 0 a 6 anos, filhos de preso, será garantido o atendimento em creche e em pré-escola (Art. 11);
O estabelecimento prisional destinado a mulheres disporá de dependência dotada de material obstétrico para atender à grávida, à parturiente e à convalescente, sem condições de ser transferida a unidade hospitalar para tratamento apropriado em caso de emergência. (Art. 17).
Mesmo diante de todas essas garantias legais conferidas as mulheres encarceradas, sua vulnerabilidade e necessidades especiais, fez surgir em outubro de 2010 uma complementação as Regras Mínimas para tratamento de pessoas presas, aprovadas na 65a Seção da Assembléia Geral das Nações Unidas, chamada de “Regras de Bangkok” (Regras mínimas da ONU para o tratamento de mulheres presas), verdadeiro marco normativo internacional de proteção às mulheres encarceradas
Com base nisso, é possível notar, que a mera reprodução de presídios masculinos não resolve o problema, mas a construção de prisões especificas para mulheres, que se adequem a sua condição biológica se mostram primordiais para que se respeite a dignidade da pessoa humana, mas o que se ver é o completo desrespeito até mesmo a condição de ser humano, mesmo sendo menos populosas que as prisões masculinas, os benefícios nunca saem do papel, e cada vez mais estas mulheres sofrem agressões físicas e torturas, prejudicando seu regresso ao seio familiar.
3 O AUMENTO DA POPULAÇÃO CARCERÁRIA FEMININA NOS ANOS DE 2000 A 2014 COM BASE NOS DADOS DO INFOPEN
Em junho de 2014, o Departamento Penitenciário Nacional- Ministério da Justiça (DEPEN) lançou a primeira versão do INFOPEN- MULHERES com dados referentes à população carcerária feminina num intervalo de tempo que vai de 2000 a 2014. É interessante frisar que esse é o primeiro informativo voltado para análise exclusiva da figura da mulher no sistema prisional, com nuances de comparação entre gêneros e que visa conceder maior visibilidade a essa temática (DEPEN, 2014).
A conclusão geral do INFOPEN- MULHERES é que o Brasil conta com uma população prisional de 607.731 pessoas, somando os custodiados em carceragens de delegacias ou estabelecimentos similares mais os que se encontram no Sistema Penitenciário, sendo que 37.380 mulheres estão nesta modalidade de sistema (DEPEN, 2014).
No período de 2000 a 2014 o aumento da população feminina foi de 567,4%. Esse percentual é crescente entre a população prisional feminina e gera certa apreensão frente a esse assustador aumento de mulheres nas prisões do Brasil. Em um comparativo com a população prisional masculina temos que a média de crescimento foi menos da metade, 220,20% (DEPEN, 2014).
A partir dos dados do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) podemos estipular que existem cerca de 1.424 estabelecimentos penais (AGÊNCIA CNJ DE NOTÍCIAS, 2015). O INFOPEN- MULHERES leva ao conhecimento do leitor que apenas 7% destes são penitenciárias femininas e que em 17% são cadeias mistas (DEPEN, 2014), compreendemos, assim, que a população prisional feminina carece de alojamentos próprios, e transparece a despreocupação estatal para construções de prisões exclusivamente femininas, principalmente no que tange ao significativo aumento dessa população e as necessidades e particularidades que lhes são específicas.
Ao traçar o perfil das mulheres nas penitenciárias brasileiras, o DEPEN também chega à conclusão de que são, geralmente, jovens mães solteiras, com baixa escolaridade que se desempenham trabalho sem remuneração fixa, sem vinculo empregatício e advém de classes sociais baixas (2014).
Frente aos dados supramencionados, percebemos o completo despreparo e a calamitosa infraestrura das penitenciárias femininas no Brasil. O poder público parece desprezar as questões de gênero oferecendo um "pacote padrão" com alto gral de similitude às prisões masculinas, nas quais são ignoradas as especificidades femininas como menstruação, maternidade, cuidados específicos de saúde, dentre outras (SILVA, 2014).
Um documento nominado “Reglas de las Naciones Unidas para el tratameiento de las reclusas y medidas no privativas de la libertad para las mujeres delincuentes”, proferido pela ONU, versa sobre algumas regras acerca das particularidades femininas nas cadeias e prioriza o respeito ao princípio de “não descriminação” sempre se atendo às necessidades específicas da figura da mulher, garantido o efetivo respeito ao princípio da isonomia em seu sentido material (BORGES, 2011).
Paulo Cezar Correa Borges ainda expõe que o tratamento diferenciado entre homens e mulheres não se trata de ações de desigualdade, ao contrário, refere-se à situação como “descriminação positiva” devido à precisão de cuidados diferenciados em face das diferenças biológicas entre os gêneros (2011, p.62).
A regra 5 das “Reglas de Bangkok” estabelece que:
A acomodação de mulheres presas deverá conter instalações e materiais exigidos para satisfazer as necessidades de higiene específicas das mulheres, incluindo toalhas sanitárias gratuitas e um suprimento regular de água disponível para cuidados pessoais das mulheres e crianças, em particular às mulheres ocupadas com a cozinha e às mulheres grávidas, que estejam em amamentação ou menstruação (ONU, 2011. [tradução]).
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Contudo, assevera Elaine Pimentel, o sistema penitenciário feminino brasileiro encontra-se defasado, em desacordo com toda a abstração de garantias mínimas idealizadas. Pode-se perceber que o estado despreza as questões de gênero, visto que a dinâmicas prisional brasileira oferece estabelecimentos penais iguais para acolher homens e mulheres, isto é revelado nas adaptações feitas pelo poder público com o advento das cadeias mistas, demonstrando a despreocupação com a estadia de mulheres que nos estabelecimentos penais e com suas necessidades particulares de gênero, negligenciando todo o aparato necessário para a permanência delas nas prisões, aumentando o rico de vida e saúde na permanência de mulheres nas cadeias brasileiras (2015).
O Departamento penitenciário (2014) também divulgou dado a respeito do aumento da população carcerária por estados, mostrando a variação em um intervalo de sete anos, de 2007 a 2014, apresentaram também a comparação entre gêneros e suas progressões percentuais. Conforme os dados, o Brasil teve um aumento da população carcerária feminina de 19.034 mulheres para 37.380, um crescimento percentual de 96%. Destaque para o Paraná que apresentou redução na população carcerária em 43%. Atenção ao estado de Alagoas que apresentou o maior aumento nesses sete anos contemplados na tabela, alcançando a marca de 444%, com uma população prisional ainda insignificante de 337 mulheres perto da maior população carcerária feminina que é nos estado de São Paulo que é de 14.810 mulheres.
O Maranhão apresenta uma variação preocupante de 134% alcançando o numero de 229 detentas. É importante mencionar que o sistema penitenciário do Maranhão encontra-se defasado em relação à alta demanda de mulheres no sistema prisional, contando apenas com uma penitenciária feminina e com mais 3 unidades mistas que acolhe mulheres envolvidas com o crime no estado (DEPEN, 2014).
Conforme o plano diretor do estado (MARANHÃO, 2008) existe apenas uma penitenciária feminina e em torno de seis estabelecimentos mistos que comporte um quantitativo de aproximadamente 229 detentas. No ano de 2008 foi verificado que de 86 mulheres presas no Maranhão 26 encontravam-se em regime fechado dispondo de, somente, uma penitenciária destinada aos devidos fins. Em 2014 o INFOPEM MULHERES identificou que houve um aumento de 134% no numero de sentenciadas ao cumprimento de pena. Visualizamos que passados oito anos, com o numero de presas chegando à 229, quase o triplo do apurado em 2008, o Maranhão permanece estagnado com o mesmo numero de penitenciária feminina demonstrando violação aos direitos humanos, e o descaso com o sistema penitenciário maranhense frente às questões relativas ao gênero.
Por conseguinte, compreendemos que a situação carcerária brasileira e maranhense não atende a demanda de mulheres sentenciadas ao cumprimento de penas, são baixos os números de estabelecimentos penais oferecidos e ainda encontram-se em estado precário, desrespeitando diversas garantias individuais previstas na constituição. É notório o desrespeito à condição biológica das mulheres, principalmente em virtude da superlotação dos presídios e despreocupação com politicas públicas que respeitem a condição de mulher e afira a real função social da pena, que é a ressocialização.
4 A PROBLEMÁTICA DA INSUFICIENCIA DE VAGAS NO SISTEMA CARCERÁRIO BRASILEIRO
Ao analisar o cenário do sistema prisional brasileiro, um dos problemas mais notórios e debatidos é em relação a estrutura física dos presídios. Há algum tempo vem se notando que a população carcerária tem crescido de forma rápida por diversos fatores, sejam sociais, econômicos, políticos, etc. A conjuntura das prisões demonstram superlotação, higiene precária, estruturas antigas e que apresentam risco de desabamento, falta de saneamento, assistência médica, psicológica, entre outros. Sendo que a prisão tem a função primordial de ressocializar, é sem dúvidas majoritário o entendimento que toda a noção de legitimação de penas privativas de liberdade, de recolocar o indivíduo no convívio social, tem padecido de efetividade, de longe podemos afirmar isso, pois ao analisar o local desumano em que esses infratores são despejados, é conclusiva ideia de quem a prisão tem sido a pior alternativa, até mesmo analisando os números de reincidentes é possível concluir que existe um estado inconstitucional de coisas. (COELHO NETTO; BORGES, 2013).
No que se refere as pressões femininas, não tem sido nada diferente, é possível notar que em relação a população carcerária o número é menor, mas mesmo assim as prisões femininas não possuem as mínimas condições de vida honrada. A nossa Magna Carta prevê que é devido o acesso à justiça a todos, entretanto são numerosos os processos criminais em que os apenados progridem de regime mas continuam no mais gravoso por não haver acompanhamento, as vezes por que os advogados não exercem sua função, ou por que a por que as maioria dos indivíduos encarcerados são hipossuficientes e precisam de assistência jurídica, e considerando que a demanda tem sido cada vez maior, a máquina jurídica tem sido inerte em garantir que os direitos sejam assegurados e exercidos. (PIMENTEL, 2008).
Mediante a conjuntura decadente do sistema carcerário acima examinado, é importante que façamos uma concatenação dessa situação de progressão de regimes com a sumula 56 do STF. No entanto, previamente é importante abordarmos o regime de penas disposto no Código Penal e Lei de Execução Penal.
Segundo o art. 33 do Código Penal, que regulamenta as penas privativas de liberdade, o regime fechado deve ser cumprido em estabelecimento de segurança máxima ou média, por penas superiores a oito anos; o regime semiaberto tem severidade intermediária, e é cumprido em colônia agrícola, industrial ou estabelecimento similar, sendo direcionada aos apenados com penas privativas de liberdade superiores a quatro e inferiores a oito anos, sendo condenados primários, e também aos que progridem de regime, do fechado para o aberto, cumprindo 1/6 ou, se for crime hediondo, 2/5 réu primário e 3/5 se for reincidente; o regime aberto é menos rigoroso de todos e deve ser cumprido em casa de albergado, sendo direcionado aos apenados primários com penas iguais ou inferiores a quatro anos ou aos que progridem de regime. (BRASIL, 1940).
Posto isto, vimos que, em tese, quando a reclusa apresentasse bom comportamento e obtivesse o tempo necessário, progrediria de regime e seria transferido para o local respectivo ao regime. Assim, ela começaria no regime fechado, por exemplo, em um presídio, seria retirada do convívio social para ser ressocializada, depois seria transferida para um estabelecimento menos restritivo, e depois para o regime aberto, até que se acostumasse por meio dessa gradação a ter maior liberdade e conforme seu comportamento e tempo cumprido da pena ele retornaria a sociedade totalmente ressocializada e apta ao convívio social. (ALMEIDA, 2014).
Contudo, na prática, é muito comum que não existam colônias agrícolas e industriais e casas de albergado, unidades prisionais previstas na Lei como sendo as adequadas para o cumprimento da pena nos regimes semiaberto e aberto. Então, a súmula 56 do STF discute que “A falta de estabelecimento penal adequado não autoriza a manutenção do condenado em regime prisional mais gravoso, devendo-se observar, nessa hipótese, os parâmetros fixados no RE 641.320/RS”. (BRASIL, 2016, p.?)
Como visto, adotamos o sistema progressivo, do mais gravoso para o menos gravoso. Todavia, o STF destacou que esse sistema progressivo não tem funcionado, pois há falta de vagas nos regimes semiaberto e aberto, e por conta disso os presos estão sendo mantidos no regime fechado, violando duas garantias constitucionais: a individualização da pena (art. 5, XLVI) e a legalidade (art. 5, XXXIX). (BRASIL, 1988).
Quando o condenado é mantido em regime mais gravoso do que é o correspondente é caracterizado como “excesso de execução”, havendo violação ao direito do apenado. Assim, não é possível que com a justificativa de manutenção da segurança pública os direitos do condenado sejam relativizados. A noção proteção a integridade da pessoa e ao seu patrimônio está diretamente ao Estado Constitucional, a execução de penas corporais só é legítima em nome da segurança pública se for em estrita legalidade. Se for permitido que o Estado excute a pena de forma excessiva o princípio maior da dignidade da pessoa humana é renegado, mesmo que o crime seja grave, a condenação não afasta a humanidade da pessoa condenada, mesmo que certos direitos sejam afastados. (CAVALCANTE, 2016).
É importante mencionar sobre a discussão envolvendo a nomenclatura de estabelecimento similar e estabelecimento adequado, a Lei de Execucoes Penais trata sobre isso nos arts. 91 a 95. Como na realidade existem poucas colônias agrícolas e industriais, os Estados mantem os presos que estão no regime semiaberto em estabelecimentos similares, que são na verdade unidades prisionais que disponibilizam mais liberdade que o regime fechado. (CAVALCANTE, 2016).
A situação é a mesma nas Casas de Albergado, como não existem, os detentos estão no regime aberto ficam em unidade diferentes dos demais presos. Todavia, essa “solução” tem sido muito discutida e os magistrados do STF que possuem competência para decidir se determinado estabelecimento é adequado ou similar, se forem considerados os presos podem ficar neste. (BRASIL, 2016)
O entendimento do STF foi, in verbis:
Os juízes da execução penal podem avaliar os estabelecimentos destinados aos regimes semiaberto e aberto, para qualificação como adequados a tais regimes. São aceitáveis estabelecimentos que não se qualifiquem como “colônia agrícola, industrial” (regime semiaberto) ou “casa de albergado ou estabelecimento adequado” (regime aberto) (art. 33, § 1º, b e c, do CP). No entanto, não deverá haver alojamento conjunto de presos dos regimes semiaberto e aberto com presos do regime fechado. STF. Plenário. RE 641320/RS, Rel. Min. Gilmar Mendes, julgado em 11/5/2016 (repercussão geral) (Info 825). (SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL, 2016).
Havendo insuficiência de vagas no estabelecimento adequado deve ser determinada: 1) a saída antecipada de sentenciado no regime com falta de vagas; 2) a liberdade eletronicamente monitorada ao sentenciado que sai antecipadamente ou é posto em prisão domiciliar por falta de vagas; 3) o cumprimento de penas restritivas de direito e/ou estudo ao sentenciado que progrida ao regime aberto. (STF. Plenário. RE 641320/RS, Rel. Min. Gilmar Mendes, julgado em 11/5/2016).
Assim, o STF determinou que uma solução seria antecipar a saída de sentenciados que já estão no regime semiaberto ou aberto, abrindo vaga para aquele que acaba de progredir, pois o critério isonômico tem que ser levado em conta.
Desta forma, quando as apenadas são colocadas em regime mais gravoso que o devido por possuir vagas no estabelecimento adequado ou similar, os princípios que lhe são atribuídos são negados, a legalidade, a sua dignidade, pois além da pena não cumprir com seu caráter ressocializador, a superlotação faz com que o sistema de progressão de regime não seja efetivo.
5 CONCLUSÃO
(fazendo)
REFERÊNCIAS
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