1.A RESPONSABILIZAÇÃO NA GESTÃO FISCAL DOS MUNICÍPIOS
A Lei de Responsabilidade Fiscal estabelece condutas para os gestores municipais que passarão a obedecer normas de finanças públicas e limites para administrar essas verbas, prestando contas de quanto e como gastam os recursos da sociedade. Dessa forma, a Lei de Responsabilidade Fiscal disciplina a gestão dos recursos públicos atrelando maior responsabilidade aos seus gestores, constituindo, pois, um código de conduta gerencial a ser observado na condução da coisa pública.
Segundo análise de Gustavo Santos Barbosa (2001), a criação de um sistema de disciplina fiscal reside no fato de responsabilizar o administrador público pelo desempenho de gestão financeira.
A par dos termos da lei complementar nº 101/00, a responsabilização deverá ocorrer sempre que houver o descumprimento de regras estipuladas durante a gestão fiscal onde os gestores municipais sofrerão penalidades. Dessa forma, um enorme passo foi dado para o processo de modernização dos municípios pois a responsabilização fiscal atrai o comportamento do administrador no sentido do zelo com as verbas públicas. Havendo efetividade, fica demonstrado essencial instrumento de inovação no modo de administrar os recursos municipais, na medida em que favorece mudanças na cultura administrativa e práticas de gestão municipal em consonância com a sociedade.
Nessa linha de pensamento, Luiz Emygdio F. da Rosa Jr. (2002) explicita que imprescindível elemento da LC 101/00 é o estabelecimento de novo padrão fiscal no país, procurando configurar o que, para muitos, significa um choque de moralidade na gestão pública, pois enseja a responsabilização pelos gastos e demais providências de natureza administrativa.
Nesse diapasão, a Lei de Responsabilidade Fiscal ao estabelecer diretrizes de procedimento para o uso dos recursos municipais impõe limites as despesas, define regras para o cumprimento dos orçamentos, obriga a transparência das contas e traz sanções para os desvios de conduta, inclusive de ordem criminal. Assim, reforça-se o ideal administrativo que exige o fim do descontrole de gastos que tantos prejuízos trazem a população brasileira.
Nas palavras de Carlos Valder do Nascimento (2004, p.4), "a Lei de Responsabilidade Fiscal tem por escopo sedimentar o regime de gestão fiscal responsável, mediante implementação de mecanismos legais que deverão nortear os rumos da administração pública."
Nesse contexto, servindo de extremo incentivo ao uso correto do dinheiro público para que estes sejam aplicados em benefício da sociedade, vejamos reportagem da revista Época (2004, p. 35) que trata a Lei de Responsabilidade Fiscal como um dos maiores avanços para uma fiel execução orçamentária dentro do setor público:
Um dos maiores avanços para combater os desvios de finalidade das verbas públicas é a Lei de Responsabilidade Fiscal, aprovada em 2000. A medida limita os gastos de governantes evitando assim que maus administradores deixem suas cidades endividadas para o próximo prefeito ou governador. No governo Lula o passo importante foi a criação da Controladoria Geral da União (CGU), ligada à Presidência da República. O Orgão juntou duas repartições que tinham como função apenas protocolar e criou uma estrutura para vigiar a aplicação dos repasses federais para os municípios. Em um ano e nove meses, a controladoria passou o pente-fino em 310 cidades, escolhidas por sorteio. Descobriu que 98% delas eram prejudicadas por fraudes ou por incompetência de seus prefeitos. Sendo assim, a Lei de Responsabilidade Fiscal, batizada de Robin Hood, criou um sistema de pontuação que dá nota para a aplicação dos recursos. Em resumo, para receber mais verba o prefeito precisa provar que gastou com eficiência o dinheiro que já tinha recebido.
Na verdade, acompanhada à lei está a pretensão de impedir que todo gestor de verbas públicas gaste mais do que se arrecadee de que tome consciência dessa responsabilidade fiscal. Além disso, trata-se de proposta que auxilia e se faz necessário com a participação da sociedade para fazer valer as normas da Lei de Responsabilidade Fiscal.
A questão da responsabilização do gestor municipal junto a Lei de Responsabilidade Fiscal é importantíssima pois impõe respeito à regulamentação dos recursos públicos e prevê penalidades que estão inseridas na própria lei complementar 101/00 e em outros diplomas legais.
Consoante dispõe o artigo 73 da lei complementar 101/00 no tocante as sanções, sob esse ângulo de análise, é que a boa prática administrativa deve ser exercida e obedecida pelos gestores municipais servindo a lei, portanto, como um procedimento para a regularização de condutas, especialmente, pela falta de mecanismos de controle e responsabilização adequados, pois não é muito difícil de verificarmos comportamentos de autoridades públicas contrárias a real destinação legal das verbas municipais, sem desvios nem subterfúgios que possam implicar em favorecimento pessoal.
Ao refletir sobre a matéria no tocante a responsabilização do gestor, Carlos Pinto Coelho Motta (2000, p. 51) leciona:
A responsabilidade passa, com a Lei de Responsabilidade Fiscal, a ser personificada e personalizada, sem prejuízo do princípio da impessoalidade da gestão, otimizando não só o cumprimento da vontade do povo, consagrado no orçamento pelos seus legítimos representantes, quanto pela tutela legal, que se de um lado imputa sanções ao ente federado que não cumprir aos ditames da responsabilidade fiscal, também dá espaço para a ação do controle definir o agente que por meio da federação violou a norma e alcança-lo.
Ainda, sobre o importante alicerce da responsabilidade na gestão pública municipal, Jessé Torres Pereira Júnior (2001, p. 173) esclarece que:
A Lei de Responsabilidade Fiscal, veio não só estabelecer uma nova espécie de responsabilidade, mas estatuir condições, termos e requisitos para o regular exercício da gestão financeira e patrimonial do poder público, cujo eventual descumprimento, atraíra, em processo administrativo regular, juízos de reprovação a ilícitos administrativos, com possíveis repercussões nos campos da responsabilização civil dos Estados e da responsabilização penal e pessoal do gestor municipal. A violação nos procedimentos previstos na Lei de Responsabilidade Fiscal ensejará, portanto, apuração nas esferas de responsabilidade, a iniciar-se pela administrativa, qualificando-se o objeto pelo fato de constituir ilícito contra a gestão pública.
As cobranças de responsabilidade, na maioria das vezes, atribuídas aos prefeitos e câmaras municipais, não tem sido totalmente eficazes para evitar a sangria dos cofres públicos, entretanto, essa responsabilização estabelecida pela lei complementar 101/00 pelas condutas dos gestores municipais começa a criar uma nova mentalidade e cultura no funcionalismo como um todo pois a responsabilizaçãotambém é do gestor sendo chamado a responder frente à justiça caso seus procedimentos fujam aos recomendados nas normas que lhe foram ministradas junto a Lei de Responsabilidade Fiscal.
2.DAS PRESTAÇÕES DE CONTAS
Devem prestar contas, o prefeito e o Presidente da Câmara Municipal, às quais será dada ampla divulgação, conforme artigo 56 e seguintes da Lei Complementar nº 101/2000, sendo exercido esse controle pela própria administração pública, as quais serão encaminhadas, em separado, aos Tribunais de Contas respectivos para o devido parecer prévio.
Geraldo Ataliba (1973, p.59) assim define a medida:
O Princípio democrático, por nós adotado tradicionalmente com grande ênfase, a ponto de se colocar em posição de relevo no sistema constitucional supõe necessariamente a prestação de contas de todo e qualquer agente público, sem exceção, em toda e qualquer matéria: política, administrativa, financeira e técnica.
Após os devidos pareceres, os resultados da apreciação das contas julgadas ou tomadas terão de ser amplamente divulgados, sendo estas aprovadas, aprovadas com ressalvas ou até mesmo reprovadas.
Sendo o escopo maior da Lei Complementar nº 101/2000 a busca do equilíbrio financeiro das contas públicas, a eficácia da prestação de contas se dará através da emissão do parecer do Tribunal de Contas que evidenciará não só o desempenho da receita prevista em relação à despesa realizada, mas também destacar as medidas corretivas que foram tomadas pelo gestor para evitar e combater a sonegação, ao aprimorar sua fiscalização acarretando, dessa forma, um destaque especial à gestão das receitas próprias municipais, reforçando a avaliação de que parte importante do ajuste fiscal dos municípios poderá ocorrer via melhor aproveitamento de seu potencial tributário.
Destarte, é importante o município desenvolver sua política tributária responsável cobrando efetivamente todos os tributos que são de sua competência.
3.DO AJUSTE POLITÍCO E DA FISCALIZAÇÃO DAS CONTAS PÚBLICAS
A fiscalização das contas públicas de forma constante proporciona um sistema de controle de normas capazes de estabelecer um real ajuste fiscal dos recursos sociais.
Destarte, a ação fiscalizadora para o cumprimento da observância das normas e limites da Lei Complementar nº 101/2000 fica a cargo do Poder Legislativo, diretamente ou com o auxílio do Tribunal de Contas e do sistema de controle interno de cada poder, além do Ministério Público conforme artigo 59.
A fiscalização há de ser rigorosa e contínua sendo tanto um direito quanto um dever, uma vez que o descontrole de gastos do setor público, a criação de artifícios para cobrir rombos ao erário de uma má administração dos entes políticos municipais, bem como os constantes atos de ilegalidades e irregularidades dos gestores não têm local e nem momento para serem praticados.
Por isso coube a incumbência aos Tribunais de Contas órgãos colegiados autônomos- a responsabilidade de julgar a boa e regular aplicação dos recursos públicos, fiscalizando e controlando a fiel execução orçamentária.
Entretanto, esta instituição exerce a função de auxiliar técnico do Poder Legislativo, na realização do controle externo da Administração Pública e no julgamento das contas anuais dos Chefes do Poder Executivo . Não que esta seja sua função, pois seu titular, conforme dispõe o artigo 70 da Constituição Federal, é o Congresso Nacional mediante controle externo e este a exerce com o auxílio do Tribunal de Contas.
Ademais, junto com o Ministério Público, a sociedade conta com este outro órgão para coibir com as imoralidades na administração pública.
Nesse contexto, ressalta Flávio Régis Xavier de Moura e Castro (2000) que os sistemas de controle deverão ser capazes de tornar efetivo e factível o comando legal, fiscalizando a direção da atividade administrativa para que esta corra em conformidade com as novas normas.
Os Tribunais de Contas alertarão os poderes, entes da federação ou órgãos, quando constatarem que o nível de gastos esteja próximo aos limites fixados pela Lei de Responsabilidade Fiscal.
Na opinião de Regis Fernandes de Oliveira (2001, p. 92):
Vê-se que a função dos Tribunais de Contas é meramente preventiva e fiscalizadora devendo acompanhar continuamente e rigorosamente as metas, limites e condições estabelecidas, tanto para o controle do Executivo quanto para o controle da Câmara Municipal, devendo se manifestar imediatamente e não apenas após concluído o exercício, quando da transgressão às regras estabelecidas na Lei Complementar nº 101/2000.
Nesse prisma, sendo de fundamental importância para garantia de que os bens e rendas públicos estão sendo aplicados segundo a correspondente destinação legal, sem desvios que possam implicar em favorecimento pessoal, vejamos reportagem do jornal O Globo (2004, p. 23), que enfoca o aumento das atribuições dos Tribunais de Contas no tocante a sua função preventiva e fiscalizadora, agindo com rigidez e punindo aqueles que não seguem as orientações:
Com a Lei de Responsabilidade Fiscal, as atribuições dos Tribunais de Contas Municipais, Estaduais e da União aumentaram muito e os Tribunais ficaram mais rígidos. Os sete conselheiros do Tribunal de Contas do Estado do Rio de Janeiro emitiram 4.986 notificações em 2003, uma espécie de fiscalização preventiva, que somados os valores chegam a quase R$ 1 bilhão. As notificações são processos em que o Tribunal de Contas verifica uma irregularidade, comunica ao administrador e pede que mude o procedimento para evitar punição.
Nos valores, a prefeitura com maior número de débitos é a de São Gonçalo. Foram 11 débitos em 2003 que somados chegam a R$ 7,9 milhões, além de 16 multas. O valor é alto, quase 3,5% da arrecadação total do município. Mas os casos são graves. Numa das condenações, o Tribunal de Contas do Estado encontrou irregularidades na Fundação Municipal de Saúde. Numa fiscalização em 2002, os técnicos não encontraram notas de recebimento de medicamentos comprados e o funcionário que teria atestado o recebimento disse que não reconhecia a própria assinatura. O Tribunal de Contas do Estado condenou a ex-presidente do órgão a devolver R$ 582 mil.
Assim, os Tribunais de Contas, além da ação preventiva, que tem por claro evitar o endividamento dos cofres públicos, compete a estes órgãos, ainda, a verificação da observância dos cálculos dos limites da despesa total com pessoal, dívidas, concessão de garantias, além de operações de crédito de cada ente da federação e de cada poder, devendo apresentar o resultado das contas, em linguagem simples e objetiva e acesso facilitado por meio de ampla divulgação à sociedade que poderá cobrar e julgar se estão procedendo de forma fiscalmente responsável.
4.DA PRESERVAÇÃO DO PATRIMÔNIO PÚBLICO
Inteligentemente, objetivando preservar o patrimônio público, a Lei de Responsabilidade Fiscal coibiu a utilização dos recursos públicos que causem lesão ao erário.
É sabido que as receitas públicas decorrem do ingresso de recursos, isto é, da entrada de valores ou de outras verbas ao erário, integrando-se ao patrimônio público sem quaisquer reservas. Sendo assim, visando a preservação desse patrimônio, a utilização da receita derivada da alienação de bens para o financiamento corrente não poderá ser realizada por nenhum ente da federação, ou seja, está vedada a venda de um patrimônio público por ação ou omissão, dolosa ou culposamente, ainda que não receba direta ou indiretamente qualquer vantagem para pagar as despesas de custeio tais como, pagamento de pessoal, serviços de terceiros, encargos, além de outros.
Isto porque as receitas servem para compensar as despesas onde, por exemplo, da alienação de um bem, uma dívida pode ser amortizada ou novos investimentos podem ser realizados como obras públicas, programas especiais de trabalho dentre outros, coibindo, dessa maneira, irregularidades à destinação do patrimônio público como doações oriundas desse patrimônio a fim de alcançar promoção ou vantagem pessoal, a utilização desses recursos para fins de campanha política, ordenar ou permitir a realização de despesas não autorizadas em lei ou regulamento, etc.
Corroborando nesse prisma, Regis Fernandes de Oliveira (2001, p.89) leciona:
Outrora, era comum que agentes públicos irresponsáveis desapropriassem bens de qualquer maneira e como a lei exigia apenas o depósito do valor venal, sem possibilidade do juiz aferir, através de avaliação, o correto montante, os desapropriados ficaram espoliados em seu patrimônio. Como as desapropriações demandavam longo tempo, de vez que exigem a realização de prova pericial, os expropriados jamais recebiam a tempo o valor real de retirada compulsória de seu bem. [...] Agora, no entanto, a lei exige o depósito efetivo do valor da indenização. Terminam as desapropriações irresponsáveis ou de cunho meramente político.
Destarte, buscando a preservação do erário público, a administração deverá providenciar, antecipadamente, a finalidade destinada àquele recurso advindo do patrimônio alienado, bem como, a justa indenização ao desapropriado, isto é, o gestor não deverá desapropriar sem dotação orçamentária e disponibilidade financeira.
Concernente ao explicitado, Carlos Maurício Cabral Figueiredo (2001) esclarece que conquanto não assegure a realização plena dos programas contidos nos planos e instrumentos orçamentários, a concepção orçamentária programática vincula a Administração a dar-lhes cumprimento tão logo estejam disponíveis os recursos financeiros necessários, sem se desviar do plano traçado.