SIMPLES NACIONAL 2018: MODIFICAÇÕES ESSENCIAIS – PARTE 2 – ICMS e ISS


09/08/2018 às 18h29
Por Paulo Felintro

1. Alteração do Sublimite de Receitas para fins de Recolhimento de ICMS e ISS

Continuando nossa série de comentários sobre as alterações no Simples Nacional a partir de 2018, trazidas pela LC nº 155/2016, falaremos nesse artigo sobre as modificações no sublimite de receita para fins de recolhimento do ICMS e ISS dentro do regime simplificado, bem como seus reflexos no dia-a-dia das empresas.

A LC nº 123/2006 e a Resolução do Comitê Gestor do Simples Nacional (CGSN) nº 94/2011, em seus artigos 19 e 9º, respectivamente, previam a existência de um sublimite de receita para fins de recolhimento do ICMS e do ISS, correspondente a limite inferior ao previsto para enquadramento no Simples Nacional. Esse sublimite era facultativo aos Estados e Municípios com participação anual no Produto Interno Bruto (PIB) brasileiro menor que 5% até 2017.

Como visto no artigo anterior (https://goo.gl/xZ3Ehz), o limite para enquadramento no Simples Nacional até 2017 era de R$ 3.600.000,00 (três milhões e seiscentos mil reais) e com isso os Estados e Municípios que se enquadrassem na regra acima poderiam adotar sublimites entre R$ 1.800.000,00 (um milhão e oitocentos mil reais) ou R$ 2.520.000,00 (dois milhões, quinhentos e vinte mil reais) em relação ao ICMS e ISS, conforme previa o art. 19, incisos I a III, da LC nº 123/2006 (com redação dada pela LC nº 147/2014) e art. 9º, incisos I e II, da Resolução 94, CGSN nº 94/2011 (com redação dada pela Resolução CGSN nº 117/2014).

Ocorre que, a partir da LC nº 155/2016, a adoção do sublimite previsto em lei passará a ser obrigatório para todos os Estados e Municípios que não adotaram facultativamente o sublimite de R$ 1.800.000,00 e para aqueles cuja participação no PIB brasileiro seja superior a 1%, devendo tais entes federativos observar compulsoriamente o sublimite de receita no valor de R$ 3.600.000,00 (três milhões e seiscentos mil reais), como dispõe o novo § 4º, do art. 19, da LC nº 123/2006 e seu correspondente na Resolução 94 do CGSN[1], senão vejamos:

Art. 19. Sem prejuízo da possibilidade de adoção de todas as faixas de receita previstas nos Anexos I a V desta Lei Complementar, os Estados cuja participação no Produto Interno Bruto brasileiro seja de até 1% (um por cento) poderão optar pela aplicação de sublimite para efeito de recolhimento do ICMS na forma do Simples Nacional nos respectivos territórios, para empresas com receita bruta anual de até R$ 1.800.000,00 (um milhão e oitocentos mil reais).

(...)

§4º Para os Estados que não tenham adotado sublimite na forma do caput e para aqueles cuja participação no Produto Interno Bruto brasileiro seja superior a 1% (um por cento), para efeito de recolhimento do ICMS e do ISS, observar-se-á obrigatoriamente o sublimite no valor de R$ 3.600.000,00 (três milhões e seiscentos mil reais).

(grifos nossos)

Significa dizer que, muito embora o limite para enquadramento no Simples Nacional tenha passado a ser de R$ 4.800.000,00, o sublimite dos Estados e Municípios para fins de recolhimento de ICMS fixar-se-á facultativamente em R$ 1.800.000,00 e obrigatoriamente em R$ 3.600.000,00, a partir de 2018. Isso também se aplica ao ISS, de acordo com o disposto no art. 20 da mesma lei[2].

Modificar o sublimite máximo de receita de R$ 2.520.000,00 (dois milhões, quinhentos e vinte mil reais) para R$ 3.600.000,00 (três milhões e seiscentos mil reais) já afeta sobremaneira a arrecadação dos Estados, porque dentro do Simples Nacional a alíquota máxima do ICMS é de 3,97% e fora pode chegar até 25%, a depender do produto comercializado.

Isso explica o porquê de a nova lei não ter equiparado os sublimites de receita ao novo limite de faturamento para fins de enquadramento no Simples Nacional (que passou a ser de R$ 4.800.000,00), visto que isso afetaria ainda mais diretamente os próprios cofres dos Estados, que sofreriam drástica diminuição na arrecadação do ICMS caso o sublimite para fins de recolhimento do imposto fosse aumentado na mesma proporção do limite de enquadramento.

Quanto ao ISS, porém, as empresas já podem pagar a alíquota máxima de 5% mesmo dentro do Simples Nacional, de modo que a alteração não traduz grande impacto aos Municípios.

Outro detalhe importante é que as receitas brutas de mercado interno e de mercado externo devem ser consideradas separadamente. Desse modo, ao sublimite de mercado interno de R$ 3.600.000,00 soma-se outro, no mesmo valor, de exportações de mercadorias e serviços.

Contudo, não é demais relembrar que o sublimite de receita bruta aplica-se somente ao recolhimento do ICMS e do ISS, não interferindo no recolhimento dos demais tributos, que continuam limitados ao teto de R$ 4.800.000,00 (novo limite a partir de janeiro/2018).

A mera existência dessa obrigatoriedade de sublimite para fins de apuração do ICMS e do ISS no Simples Nacional traz consigo um fator de complicação para as empresas de consultoria e de contabilidade tributárias, visto que cria a possibilidade de existência de empresas enquadradas no Simples Nacional que tenham de fazer o recolhimento do ICMS e do ISS como uma empresa normal, isto é, como optantes do Lucro Presumido ou Real.

No caso de empresas em início de atividade, o sublimite será proporcional, ou seja, apurar-se-á pelo número de meses compreendidos entre o início de atividade e o final do respectivo ano-calendário multiplicado por R$ 150.000,00 (cento e cinquenta mil reais) ou R$ 300.000,00 (trezentos mil reais), consideradas as frações de meses como um mês inteiro, de acordo com o previsto no recém-incluído § 1º-A, do art. 12, da Resolução CGSN nº 94/2011[3].

Por fim, vale ressaltar que os Estados e o Distrito Federal devem se manifestar anualmente, até o último dia útil de outubro (art. 11, da Resolução CGSN nº 94/2011), quanto à adoção de sublimites, com efeitos para o ano-calendário seguinte e os sublimites adotados pelos Estados são obrigatoriamente válidos para os Municípios neles localizados. Para 2018, seguindo as regras descritas acima, adotarão o sublimite facultativo de R$ 1.800.000,00 os Estados do Acre, Roraima e Amapá, sendo que os demais estados terão sublimite de R$ 3.600.000,00, obrigatoriamente.

2. Efeitos da Superação do Novo Sublimite de Receitas

As empresas que ultrapassarem o sublimite de receita previsto para fins de recolhimento do ICMS e ISS pelo Simples Nacional ficarão impedidas de recolher esses tributos na forma do dito regime simplificado a partir do mês subsequente ao que tiver ocorrido o excesso, salvo se o excesso verificado não superar a 20% do sublimite (podendo chegar ao patamar de até R$ 4.320.000,00), conforme §§ 1º e 1º-A, do art. 20, da LC nº 123/2006. Nessa hipótese excepcional os efeitos do impedimento somente ocorrerão no ano-calendário subsequente (como acontece na situação de exclusão do Simples Nacional) e durante o ano-calendário de ocorrência da superação a empresa poderá continuar recolhendo normalmente pelo Documento de Arrecadação do Simples (DAS).

É de se atentar que o parâmetro para ultrapassagem do limite ou do sublimite não é a receita bruta acumulada dos últimos 12 meses anteriores ao Período de Apuração de cálculo (RBT12), mas a receita bruta acumulada no ano calendário anterior (RBAA) ou a receita bruta acumulada no ano corrente (RBA), incluindo a do mês.

Mas atenção! Empresas que iniciarem suas atividades em 2018 e fizerem opção pelo Simples Nacional devem estar ainda mais atentas a este sublimite, posto que o excesso de faturamento em patamar superior a 20% do sublimite previsto em lei corresponderá não apenas ao impedimento de se recolher o ICMS e o ISS dentro do Simples, mas também incidirão efeitos retroativos ao início da atividade (art. 12, §§ 2º e 3º, da Resolução CGSN nº 94/2011), obrigando tais empresas a recalcular e recolher esses impostos pelo Lucro Presumido ou Real desde a data de início das atividades.

Por certo, o Fisco Estadual e o Municipal dispõem de mecanismos para se recuperar ou compensar os valores de ICMS e ISS pagos pelo Simples até a data da superação do sublimite em caso de efeitos retroativos, contudo, caso se encontre dificuldades exageradas para a recuperação desse crédito tributário, seja por ineficiência do processo administrativo local, dos sistemas eletrônicos disponibilizados para esse fim ou mesmo por interpretação equivocada da lei, caberá ao contribuinte fazer valer os seus direitos através dos meios judiciais cabíveis.

Todavia, no âmbito federal, consta na página do Simples Nacional importante informação quanto ao funcionamento do sistema eletrônico do PGDAS-D 2018 nessas hipóteses[4], esclarecendo que:

“Quando o sublimite é ultrapassado, o contribuinte não deve fazer nada em relação ao preenchimento do PGDAS-D,o próprio aplicativo identifica que o sublimite foi ultrapassado e apresenta uma mensagem esclarecendo que o ICMS e o ISS deixarão de ser recolhidos no Simples Nacional, e a partir de qual mês. Os tributos ICMS e ISS, que serão pagos "por fora", deverão ser calculados de acordo com as regras estabelecidas pelos estados e pelos municípios envolvidos, e recolhidos em guias próprias de cada um deles. Os demais tributos (federais) serão calculados pelo PGDAS-D e recolhidos em DAS.”

(grifos nossos)

De outra sorte, em relação ao ISS, pode ser vantagem em alguns casos o recolhimento fora do Simples Nacional, porque nesse regime a partir da 5ª faixa de faturamento (de R$ 1.800.000,00 a R$ 3.600.000,00), a alíquota aplicada passa a ser a máxima de 5%, ao passo que “fora” do Simples algumas empresas poderiam pagar alíquotas que variam entre 2% e 5%, conforme os serviços elencados na lei municipal correspondentes ao âmbito de atuação dessas empresas.

Cabe destacar que até 2017 não existia essa possibilidade de recolher ICMS e ISS separado do Simples Nacional e os demais impostos federais como IRPJ, PIS/Pasep, CSLL, Cofins e CPP dentro Simples Nacional.

Desse modo, há que se levar em consideração tais impactos na hora de se fazer o Planejamento Tributário e optar pelo Simples Nacional em 2018, visto que o empresário precisa compreender o risco econômico de poder ter que recolher o ICMS e o ISS fora do Simples Nacional, caso seu faturamento supere o sublimite compulsório e sua respectiva margem de 20% fixados a partir da LC nº 155/2016.

3. Obrigações Acessórias (SPED Fiscal) e Diferencial de Alíquotas do ICMS Interestadual

A Receita Federal do Brasil (RFB) e os entes federativos, como regra geral, não podem instituir obrigações tributárias acessórias ou estabelecer exigências adicionais e unilaterais além daquelas previstas na Resolução CGSN nº 94/2011, nos termos do art. 61-A. Entretanto, as empresas que superarem o sublimite em valor superior a 20% terão as mesmas obrigações acessórias de apuração de SPED Fiscal e demais exigências de prestação de dados por meio de escrituração fiscal digital em qualquer modalidade relativa ao ICMS e ao ISS, conforme § 5º, inciso II, alínea “a” e § 4º, do art. 61-B, da referida resolução, alterada pela Resolução CGSN nº 135/2017.

Ou seja, apesar de o cadastro da Receita Federal reconhecer a empresa como optante pelo Simples Nacional, no Estado, no Distrito Federal e no Município ela será enquadrada como sendo do Lucro Presumido ou Real para fins de recolhimento do ICMS e do ISS.

O Estado deve regulamentar a forma pela qual o contribuinte deve informar a superação do novo sublimite trazido pela LC nº 155/2016, possibilitando o acesso da empresa ao sistema de transmissão das obrigações acessórias.

É possível pensar também que empresas que ultrapassem o sublimite previsto em lei passarão a pagar o diferencial de alíquota nas relações interestaduais destinadas a não contribuintes do ICMS (EC 87/2015), porque atualmente as empresas do Simples Nacional estão dispensadas de pagar o diferencial quando vendem para fora do Estado para não contribuinte, conforme liminar do Supremo Tribunal Federal de 18 de fevereiro de 2016, nos autos da ADI/5464, proferida monocraticamente pelo Ministro Dias Toffoli.

Essa dispensa vale para o Simples Nacional em razão de a Corte Constitucional entender que a LC nº 123/2006 “... trata de maneira distinta as empresas optantes desse regime em relação ao tratamento constitucional geral atinente ao denominado diferencial de alíquotas de ICMS referente às operações de saída interestadual de bens ou de serviços a consumidor final não contribuinte. ...” e que “... a Carta Magna consagra o tratamento jurídico diferenciado e favorecido para as microempresas e para as empresas de pequeno porte, conforme arts. 179 e 170, inciso IX, prevendo, no âmbito tributário, que lei complementar defina esse tratamento, o que inclui regimes especiais ou simplificados, no caso do ICMS (Constituição, art. 146, m, d), não tendo havido qualquer modificação dessa previsão constitucional com o advento da Emenda Constitucional nº 87/2015 ...”, de modo que não seria justo pagar o diferencial de alíquota separadamente considerando esse fato.

Todavia, com a ultrapassagem do sublimite nos termos descritos acima, a empresa passará a ter tratamento normal pela legislação do ICMS e passará a responder também pelo diferencial de alíquotas partilhado, a partir do momento em que estiver impedida de recolher esse tributo pelo Simples Nacional, o que nos permite prever que as Procuradorias Estaduais e Municipais defenderão esse ponto de vista.

Por outro lado, a partir do momento em que a empresa estiver impedida de recolher ICMS pelo Simples Nacional, entendemos que a ela não se aplicará a vedação prevista no art. 24 da LC nº 123/2006 que proíbe a aplicação de benefícios fiscais aos optantes do Simples Nacional[5].

Conclusão

 Diante de tais mudanças os profissionais de Contabilidade e do Direito devem estar atentos aos possíveis problemas enfrentados por seus clientes, amparando-os sempre quanto às dúvidas geradas a partir dos novos valores de sublimite e suas implicações.

Ademais, deve-se conhecer os impactos dessas mudanças também em relação aos cálculos das alíquotas para fins de concessão de crédito de ICMS e retenção de ISS na fonte, tema este que trabalharemos no próximo artigo com maiores detalhes.

  • Simples Nacional 2018; Super Simples; ICMS; ISS; A

Referências

[1] Art. 9º, § 1º, da Resolução CGSN nº 94/2011, com redação dada pela Resolução CGSN nº 135/2017.

[2] Art. 20. A opção feita na forma do art. 19 desta Lei Complementar pelos Estados importará adoção do mesmo limite de receita bruta anual para efeito de recolhimento na forma do ISS dos Municípios nele localizados, bem como para o do ISS devido no Distrito Federal.

[3] Art. 12. A EPP que ultrapassar qualquer sublimite de receita bruta acumulada, seja no mercado interno ou em decorrência de exportação para o exterior, estabelecido na forma prevista no art. 9º, estará automaticamente impedida de recolher o ICMS e o ISS na forma prevista no Simples Nacional, a partir do mês subsequente àquele em que tiver ocorrido o excesso, relativamente aos seus estabelecimentos localizados na unidade da federação de vigência do sublimite, ressalvado o disposto nos §§ 1º a 3º. (Lei Complementar nº 123, de 2006, art. 3º, § 15, e art. 20, § 1º)

(...)

§ 1º-A No ano-calendário de início de atividade, cada um dos sublimites previstos no caput e no § 1º do art. 9º será de R$ 150.000,00 (cento e cinquenta mil reais) ou R$ 300.000,00 (trezentos mil reais), conforme o caso, multiplicados pelo número de meses compreendidos entre o início de atividade e o final do respectivo ano-calendário, consideradas as frações de meses como um mês inteiro.   (Incluído(a) pelo(a) Resolução CGSN nº 135, de 22 de agosto de 2017)

[4] Disponível em: https://goo.gl/zRRxd - acesso em 14/02/2018 às 21hs:46min.

[5] Como exemplo pode-se destacar o benefício do crédito presumido das micro cervejarias que fabricam mais 3 milhões de litro/ano de cervejas especiais, reduzindo a alíquota de ICMS de 25% para 12%.


Paulo Felintro

Advogado - São Paulo, SP


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