O VOLUNTARIADO NA CAUSA ANIMAL


17/02/2016 às 10h08
Por Nathalia Matoso Balsamao

Aos oito anos testemunhei um acidente terrível. Um carro passou por cima de um filhote de cachorro. Acredito que o condutor do veículo nem percebeu, pois dez segundos depois da tragédia, eu já não o avistava. Instintivamente peguei o pequeno acidentado e sai perambulando pelas ruas em busca de socorro. Com auxílio de alguns familiares, depois de árduas tentativas, consegui chegar a uma clínica veterinária. Esperança latente, coração apertado, mas, infelizmente, o filhote não sobreviveu aos ferimentos.

Quando tinha quatorze anos presenciei outro atropelamento de cachorro. O carro da frente ao que eu estava tentou desviar, porém, o desespero do cão para tentar atravessar, contribuiu para a fatalidade. Lamentavelmente, nesse caso nada pude fazer; estava no banco do passageiro e, infelizmente, não consegui convencer minha mãe a parar o carro em plena BR para tentar salvá-lo. Esses dois fatos me traumatizaram e permaneceram em minha memória, deixando-me com o sentimento de incapacidade.

Passaram-se os anos e, ainda hoje, deparo-me com vários outros contextos voltados aos problemas enfrentados pelos animais: abandono, maus-tratos, violência sexual, doenças, crueldade, entre outros. Assistindo diariamente e exaustivamente a notícias desses problemas acima, resolvi assumir uma postura proativa no auxílio e em prol da mitigação dos problemas na causa animal.

Atualmente, iniciei a concretização de um sonho antigo; a criação de um projeto social, intitulado de “Caridade em Ação”, com circulação em rede social – Facebook - que tem contribuído consideravelmente para a reunião de voluntários para a causa animal. O trabalho consiste em ajudar no resgate de animais abandonados, na manutenção da saúde de animais que sofreram maus tratos ou foram atropelados, bem como no processo de adoção (somente depois que o animal foi castrado, vermifugado e vacinado) com a devida assinatura do “Termo de Compromisso de Zelo e de Responsabilidade”.

Iniciei esse artigo com uma exposição real da minha experiência como voluntária na causa animal, justamente para contextualizar a motivação que levam várias pessoas a se dedicarem aos seres vulneráveis que nos circundam cotidianamente e muitas vezes passam despercebidos nos grandes centros.

O que movimenta milhares de voluntariados, protetores e ativistas a lutarem pelos direitos dos animais é a compaixão emocional sofrimento de seres sensíveis, bem como demonstrar especial presteza com aqueles que sofrem.

Corriqueiramente, deparamos-nos com diversas situações que alastram sofrimentos e os animais não escapam; são cavalos que transportam carroças com sobrecarga, cachorros jogados em rios ou abandonados em estradas, gatos sendo envenenados, touros amarrados em rodeios, animais silvestres sendo contrabandeados, macacos e ratos usados em laboratórios, abate cruel de bois e porcos nos frigoríficos, entre inúmeros e variados outros exemplos. Em muitos casos, obtivemos êxito na causa animal com auxílio de voluntariados, ONGs e órgãos municipais, estaduais e federais, mas a gritante realidade é outra.

Para se efetivar o direito à proteção de uma vida animal é preciso elaborar normas e torná-las efetivas. No ordenamento jurídico Brasileiro, pouco se fala em Direitos dos Animais. A Constituição da República de 1988, em seu § 1º, VII, art. 225, incumbiu ao Poder Pública a proteção da fauna e da flora e proibiu expressamente qualquer prática que coloque em risco a função ecológica, provoque a extinção de espécies ou que submeta os animais à crueldade. Há diversas outras leis infraconstitucionais que dispõem sobre o direito dos animais, no entanto, a efetivação de políticas públicas que garantam e dão a devida punição às pessoas que violam o texto da lei ainda é tímida.

Por essa razão, o voluntariado na causa animal torna-se ainda mais relevante e essencial, pois somente a partir do inconformismo que gera manifestações que visam à aplicação de medidas tanto preventivas quanto coercitivas, é que se concretizará o amparo e o resguardo dos direitos dos animais no tocante à sua proteção. Implantando tais medidas, certamente a atuação dos voluntários seria mais eficiente, eficaz e efetiva, afinal, o que desanima qualquer movimento voltado para a proteção de direitos é justamente a impunidade.

Independentemente do auxilio do Poder Público (teórico - elaboração de lei – ou prático – aplicação da lei no caso concreto), o voluntariado na causa animal precisa conscientizar as pessoas de que elas são capazes de doarem o melhor de si. Um voluntário tem como missão a atuação com empenho, disposição e transparência, visando o auxilio e o real beneficio ao animal resgatado de qualquer contexto danoso. Não se mede esforços para salvar uma vida, utiliza-se de mecanismos que garantam sua sobrevivência e o resultado geralmente é satisfatório. A felicidade de fazer o bem e colher resultados é o que mantém cada voluntario agradecido pelo dever cumprido. Afinal, ajudando à coletividade, na verdade, ajudamos a nós mesmos.

É preciso ter discernimento para saber separar “o joio do trigo”. Infelizmente, há vários falsos protetores que ludibriam pessoas dispostas a pratica da caridade e da colaboração e acabam desviando as finalidades de um projeto social ético. Por isso, faz-se necessário buscar referências de confiabilidade das fontes a que se queira contribuir para o auxilio dos animais e principalmente, quando se tratar de ajuda financeira, solicitar recibo de cada atividade (consulta médica) realizada ou utilitário (medicamento, cobertas, casinhas, ração) comprado. Transparência sempre será o cartão de visita de um bom voluntário e certamente os legítimos prezarão pelo beneficio exclusivo do animal.

Cumpre, por fim, ressaltar meu enorme contentamento pela expansão do movimento voluntário na causa animal. São notáveis os avanços que os voluntários, protetores e ativistas têm conseguido em prol da defesa destes. Objetivando uma harmonização entre os seres humanos e os seres irracionais, a fim de que todos tenham uma vida digna, caminhamos triunfantes rumo a uma sociedade com visibilidade ampliada, garantindo e resguardando os direitos de todos os animais.

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Referências

Artigo publicado na Revista Quaó - O voluntariado transformador.


Nathalia Matoso Balsamao

Advogado - Belo Horizonte, MG


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