No mundo moderno a pessoa não tem como evitar uma relação com uma instituição financeira, seja nos moldes tradicionais de bancos físicos ou nos do mundo atual como fintechs, blockchain, e cartões virtuais. O contrato bancário está dentro da classificação de contratos cativos ou de longa duração da doutrinadora Cláudia Lima Marques, são aqueles contratos que são firmados por muito tempo por ter a característica de dependência do consumidor frente ao fornecedor, mormente quando estamos diante de serviços essenciais (contratos de seguros, bancários, previdência privada, água, energia, etc.).
Sendo assim, é comum a realização de operações de crédito com as financeiras seja o titular pessoa física ou jurídica, empréstimos, cartão de crédito, financiamentos, capital de giro, dentre outros contratos desse tipo são realizados todos os dias. O problema é que, em sua grande maioria, os consumidores e empresários estão sendo lesados, pagando juros abusivos, com prestações mensais que às vezes correspondem a mais que o dobro do que deveria ser pago.
Vamos entender melhor. No Brasil, existe a lei da Usura DECRETO Nº 22.626, DE 7 DE ABRIL DE 1933 que dispõe sobre os juros nos contratos e dá outras providências, essa lei limita a taxa de juros que deve ser utilizada nos contratos. No entanto, ela não se aplica à instituições financeiras como nos leciona a tese 17 da Edição 48 de Direito Civil da ferramenta jurisprudência em teses do STJ - As instituições financeiras não se sujeitam à limitação dos juros remuneratórios estipulada na Lei de Usura (Decreto n. 22.626/33). Ou seja, as financeiras podem estipular livremente a taxa de juros nos seus contratos.
Mas você pode questionar, e agora? Aí é que está, apesar de não ser sujeita a lei da Usura, as financeiras devem seguir a taxa média de mercado divulgada pelo Banco Central mês a mês. Essa tabela divulgada pelo BACEN é utilizada pelo Poder Judiciário como parâmetro a fim de aferir no caso concreto se há ou não uma abusividade. Esse é o entendimento consolidado na tese 12 da Edição 48 de Direito Civil "jurisprudência em teses do STJ" - "É admitida a revisão das taxas de juros remuneratórios em situações excepcionais, desde que caracterizada a relação de consumo e que a abusividade (capaz de colocar o consumidor em desvantagem exagerada - art. 51, §1 º, do CDC) fique cabalmente demonstrada, ante às peculiaridades do julgamento em concreto".
Se a taxa de juros pactuada no seu contrato estiver maior do que a informada pelo bacen para o mesmo tipo de operação de crédito, significa que você pode pleitear uma Ação Revisional de juros a fim de recuperar o valor que foi pago a maior nos últimos cinco anos, bem como restabelecer o equilíbrio contratual pagando a partir da entrada da Ação o valor que entende correto realizando o depósito em juízo (desde que deferida uma liminar nesse sentido, o que será averiguado caso a caso).
E como você pode fazer essa comparação de juros? Leve o seu contrato para um advogado para que ele possa analisar o seu caso e te orientar da forma correta como proceder. Essa análise preliminar é importante, pois se a taxa de juros do contrato estiver de acordo ou abaixo da média de mercado a Ação judicial não terá êxito. Dúvida bastante comum é se para ingressar em juízo com uma Ação Revisional é preciso estar com parcelas em atraso. A resposta é Não. Uma situação independe da outra.
Seguindo o raciocínio, falaremos sobre a capitalização de juros ou também conhecida como anatocismo, ou juros sobre juros ou juros compostos. Se você observar, por exemplo, o banco promete no seu contrato uma taxa juros de 1,8% ao mês, mas nunca vai bater essa taxa, pois ele coloca 1,8% a.m. e 30% ao ano. Ou seja, você está pagando na verdade 2,5% ao mês sem perceber (esses dados são exemplificativos).
E o pior disso tudo é que para os tribunais superiores a capitalização de juros é válida, desde que esteja prevista no contrato. E basta que a previsão contratual seja dessa forma como exemplificado no parágrafo anterior, ou seja, muito fácil de "ludibriar" o consumidor e estar coberto juridicamente. É o que diz a tese 9 do STJ - "A previsão no contrato bancário de taxa de juros anual superior ao duodécuplo da mensal é suficiente para permitir a cobrança da taxa efetiva anual contratada". (Súmula n. 541/STJ). Assim, o consumidor deve estar atento a essa cláusula contratual no momento de fechamento do contrato.
Outra questão é sobre a abusividade na cobrança da taxa de abertura de crédito TAC e na taxa de emissão de carnê TEC ou qualquer outra denominação que a financeira utilize para o mesmo fato gerador dessa cobrança. É que até 2008 essas cobranças eram válidas, mas após a alteração que houve na regulação desse setor por meio da Comissão de Valores Mobiliários, essas taxas passaram a ser consideradas abusivas. É o que nos ensina a tese 7 do STJ - "Nos contratos bancários celebrados até 30.4.2008 (fim da vigência da Resolução CMN 2.303/96) era válida a pactuação das tarifas de abertura de crédito (TAC) e de emissão de carnê (TEC), ou outra denominação para o mesmo fato gerador, ressalvado o exame de abusividade em cada caso concreto". (Tese julgada sob o rito do art. 543-C do CPC/1973 - Tema 618). Percebe-se na prática que os bancos continuam cobrando por esses serviços nos seus contratos, o que é abusivo e passível de discussão judicial com recuperação dos valores pagos, haja vista a nulidade desse tipo de cláusula.
Por fim, esse breve texto teve a intenção de informar ao consumidor e ao empresário sobre a existência da abusividade de juros em contratos bancários. Cada caso concreto vai corresponder a uma solução, por isso se está com alguma dúvida em relação ao seu contrato, procure um advogado para te orientar. Até mais!
Referências
AgRg no AREsp 413345/SP,Rel. Ministro ANTONIO CARLOS FERREIRA, QUARTA TURMA,Julgado em 15/10/2015,DJE 22/10/2015
AgRg no REsp 1543201/SC,Rel. Ministro MOURA RIBEIRO, TERCEIRA TURMA,Julgado em 06/10/2015,DJE 09/10/2015
AgRg no AREsp 719675/DF,Rel. Ministro MOURA RIBEIRO, TERCEIRA TURMA,Julgado em 01/10/2015,DJE 13/10/2015
AgRg no REsp 1532484/PR,Rel. Ministro RICARDO VILLAS BÔAS CUEVA, TERCEIRA TURMA,Julgado em 08/09/2015,DJE 11/09/2015
AgRg no AREsp 353605/RS,Rel. Ministro ANTONIO CARLOS FERREIRA, QUARTA TURMA,Julgado em 20/10/2015,DJE 23/10/2015
AgRg no AREsp 572596/RS,Rel. Ministro MARCO BUZZI, QUARTA TURMA, Julgado em 06/10/2015,DJE 14/10/2015
AgRg no AREsp 720099/MS,Rel. Ministro MOURA RIBEIRO, TERCEIRA TURMA,Julgado em 01/09/2015,DJE 11/09/2015
AgRg no REsp 1385348/SC,Rel. Ministro ANTONIO CARLOS FERREIRA, QUARTA TURMA,Julgado em 04/08/2015,DJE 13/08/2015
AgRg no AREsp 615810/MS,Rel. Ministro RICARDO VILLAS BÔAS CUEVA, TERCEIRA TURMA,Julgado em 18/06/2015,DJE 05/08/2015