Favorecimento Pessoal – O CRIME POR AMIZADE


02/09/2014 às 10h46
Por Pablo Roberto dos Santos - Advogado

Por mais estranho que se possa parecer, uma inocente dica, uma ajudinha ou uma simples cortesia, dependendo das circunstâncias e valores envolvidos, pode gerar dores de cabeça sem fim.

Embora o brasileiro não tenha o hábito de conhecer suas leis; fato culturalmente reprovável; seu desconhecimento traz inúmeros constrangimentos.

O favorecimento pessoal surge facilmente entre os amigos ou conhecidos de alguém que tenha praticado um crime.

O termo “favorecer”, pode ser simplesmente entendido como ajudar, trazer algum lucro ou benefício.

O efeito imediato desta ajuda é o impedimento da realização da justiça (impedindo de levar um crime a julgamento) e assim a segurança da comunidade.

Entretanto, se a comunidade e a Justiça devem ser preservadas, o “cidadão de bem”, também, com o entendimento correto da Lei, protegendo-se de acusações infundadas.

Não é todo tipo de “ajuda” que faz que uma pessoa seja incriminada. Um filtro lógico é necessário, o que se faz pelo conhecimento da letra da lei.

Este filtro é o que chamamos de Princípio da Legalidade (CF Art. 5º, XXXIX, LVII e LIV), que é a garantia de que ninguém pode ser chamado de criminoso se não praticar idêntico comportamento previsto na Lei Penal.

Lembre-se que esta não é garantia de “criminoso”, como a imprensa diz, é de todo cidadão. O problema é que o “criminoso” estuda a lei, o cidadão de bem não; nítida irresponsabilidade cultural brasileira;

Assim, o parecido não vale, devendo a conduta ser igual ao que a lei diz, por questões de honestidade, segurança e dignidade humana de todas as pessoas de bem.

Se lermos o Artigo 348 do Código Penal, onde está previsto o Favorecimento Pessoal, podemos claramente ver: Art. 348. Auxiliar a subtrair-se à ação de autoridade pública autor de crime a que é cominada pena de reclusão”.

Pena - detenção, de 1 (um) a 6 (seis) meses, e multa. § 1º Se ao crime não é cominada pena de reclusão: Pena - detenção, de 15 (quinze) dias a 3 (três) meses, e multa. § 2º Se quem presta o auxílio é ascendente, descendente, cônjuge ou irmão do criminoso, fica isento de pena.

No favorecimento pessoal, igualmente, se exige um “Crime Principal”, um fato criminoso prévio e independente, do qual não participemos, mas, que saibamos da existência e de seu responsável.

É importante esclarecer que outros “envolvidos” no “Crime Principal” também estão contemplados neste conceito de “Autor do Crime Principal”.

Com isso quero dizer, o “Autor do Crime Principal”, não corresponde apenas a quem o executou fisicamente, mas sim, outras pessoas ligadas a isso.

Nisto, o conceito de “Quem”, se aplica aos autores/coautores (os que diretamente praticam o crime – que roubam, furtam, matam e etc... - ou que planejam mentalmente ou se valem de outra pessoa sem discernimento, com problemas psíquicos ou mentais, ou ainda, que não saiba que está sendo usado como mera “marionete” para tanto). Também, aos participantes (os que fornecem auxílio para a prática do crime, sem o executarem diretamente, os que ajudam os autores/coautores, seja em seu transporte, fuga, treino, armas, financiamento, influência). A ajuda a qualquer pessoa inserida neste contexto já “enrola” o cidadão de bem.

Não existe perigo em ser amigo do autor deste crime principal, mas de ajudar este amigo a fugir da Justiça (Autoridades).

Esta simples amizade é inofensiva até a fronteira da simples afeição pela pessoa. Algo mais, o coleguismo excessivo, em ajudar ou “quebrar o galho” do amigo, escondendo-o em sua casa numa batida policial já pode complicar a vida de quem o fizer, caso saiba que o “colega” está sendo procurado pela justiça. Portanto, para Lei, ninguém é criminoso pelo simples fato de ter um amigo criminoso.

Este é o típico comportamento de “Auxiliar a Subtrair-se”, citado na Lei, em seu significado mais simples.

O significado de Autoridade Pública pode ser entendido como qualquer um que atue nas funções essenciais do Estado e tenha, por força da Lei, atribuições para submeter o “Autor do Crime Principal” às penas da Lei (ex: Juiz, Promotor, Polícias, Guardas Municipais e etc...).

O que visa a proibição deste “comportamento coleguista” é facilmente encontrado no adágio popular “quem não ajuda não atrapalha”. E a real intenção é não atrapalhar o trabalho das Autoridades, fazendo justiça e preservando a comunidade.

A mera conivência é insuficiente para enquadrar alguém no favorecimento pessoal. Assim, apenas o comportamento consciente de ajudar a fugir (Subtrair-se, conforme a Lei), impedindo que a Autoridade Pública chegue até o “Autor do Crime Principal”, consistirá na prática do Favorecimento Pessoal. Apenas desta forma que o crime é praticado!

A ignorância acerca do “Crime Principal”, ligada a simples ajuda, nada representa no contexto criminal.

Por final, observe-se que algumas pessoas jamais serão acusadas de favorecimento pessoal. No caso, ocorre como uma imunidade, uma forma de estar blindado à acusação.

Esta blindagem está prevista no §2º do Artigo 348 do CP (onde está previsto o crime de favorecimento).

Se o crime de Favorecimento Pessoal é praticado por ascendente (pais), descendente (filho), cônjuge (esposa/marido e companheiros) ou irmão, não se aplica qualquer punição (aí está a blindagem...).

Resolveu o legislador neste caso, por razões de política criminal, não punir atos de familiares pela simples questão de solidariedade instintiva e preservação dos laços de família.

No caso, inútil punir quem evidentemente mais protegerá a qualquer custo as pessoas do mesmo sangue/afinidade, do que a busca do justo aos olhos da Lei. Não se trata de gerar impunidade, mas sim, de proteger a família em geral, em especial, a do autor do crime que as Autoridades querem prender, pois ela não deve sofrer qualquer revés da escolha de seu integrante (o parente), por optar por praticar um crime.

E concluindo, esperamos que tenha sido explicado de forma simples e direta o que é o Crime de Favorecimento Real, quem pode e quem não pode ser acusado dele, bem como, garantir que as pessoas em geral conheçam o que realmente é proibido e o que nada representa para a Justiça.

  • DIREITO PENAL
  • FAVORECIMENTO PESSOAL
  • CRIME POR AMIZADE

Referências

A versão integral do artigo está em: http://jus.com.br/1027536-pablo-roberto-dos-santos/publicacoes


Pablo Roberto dos Santos - Advogado

Bacharel em Direito - Limeira, SP


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