CIDADANIA UMA LUTA CONSTANTE


02/01/2015 às 22h15
Por Dra. Frida Carla

RESUMO

Este trabalho tem a pretensão de estudar a luta pela conquista da cidadania que vem acontecendo desde a antiguidade na época da sociedade romana, onde os plebeus após alguns conflitos adquiriram seus direitos sociais, alcançando assim a cidadania. Introduzindo também como esse avanço contribuiu para a evolução social dentro de um contexto histórico, desenvolvemos de forma fundamentada os paradigmas históricos de como no decorrer do tempo essa evolução foi alcançando século a século até chegar aos dias de hoje. Chegando-se a conclusão que a conquista da cidadania trouxe também a constituição de 1988, e através da luta popular foi instituída a democracia onde essa evolução foi englobando várias classes sociais como os índios, os escravos e até mesmo as mulheres alcançaram seus direitos, no sentido social, político e econômico, transformando indivíduos em sujeito de direito.

PALAVRAS-CHAVE: CIDADANIA; DIREITOS; CONSTITUIÇÃO; DEMOCRAÇIA; EVOLUÇÃO.

INTRODUÇÃO

O presente trabalho tem como objetivo analisar e expor de forma fundamentada a questão da luta pela cidadania, dentro de um contexto histórico iremos também discutir sobre a evolução social a partir da participação popular, onde surgiram alguns conflitos, viabilizando o alcance de direitos sociais, políticos e civis. Tais conflitos trouxeram a criação de determinadas leis, onde através destas foram favorecidas classes como, os índios, os escravos, os camponeses, as mulheres, todos almejavam gozar de seus direitos plenos. Veremos também como a sociedade romana lidou com a questão da cidadania, chegando a ser dividida em duas classes sociais. Trataremos também das fontes do direito geradas a partir dos conflitos romanos.

Tomaremos como ponto de partida o direito juntamente com a soberania e a democracia, nos embasaremos também no pensamento de alguns autores, cuja opinião foi de extrema importância para essa evolução histórica. Trataremos da importância da participação popular, em meio a tanta hierarquia, e observaremos também como se deu a construção de uma nova constituição em 1988, onde os três princípios fundamentais são justiça, liberdade e igualdade.

1. O QUE É CIDADANIA?

Analisando a cidadania na antiguidade Funari{C}[1] , toma como ponto de partida, a fundação da cidade de Roma em 753 a.C. em que a sociedade romana composta por vários povos foi dividida em duas camadas sociais, uma denominada os Patrícios (detentores da nobreza de sangue), e a outra os Plebeus (artesãos e comerciantes).

Em meio aos romanos, os Patrícios pertenciam a grandes famílias, conhecidas como gentes, descendentes de antepassados comuns, onde os tornavam unidos. Eram o grupo dos proprietários de terras que ocupavam os cargos públicos e religiosos, tornando-os assim os únicos cidadãos de pleno direito.

Destaca que a família patrícia formava uma unidade econômica, social e religiosa, comandada pelo pai de família, onde este possuía autoridade moral, e poder sobre toda a família, esposa, filhos, escravos. Cada família patrícia tinha autoridade para possuir inúmeros agregados, que trabalhavam auxiliando os Aristocratas, em tempos de paz e de guerra, Funari [2]também comenta que:

“Os Patrícios eram os únicos autorizados a usar sinais de distinção social, como o anel de ouro, uma faixa púrpura na túnica e a capa adotada pelos cavaleiros, onde também desenvolviam um papel militar único e detinham o grosso das presas de guerra, formavam também o conselho de anciãos, o Senado, composto originalmente pelos pais de família patrícios. Eram os únicos que podiam exercer as magistraturas, como pretores, cônsules ou ditadores, e até quando não patrícios, passaram a ser aceitos no Senado, com o decorrer do período da República, foram chamados de “conscritos” impedidos de votar”.

Os grandes proprietários rurais, os oligarcas romanos não aceitavam nenhuma atividade urbana, até mesmo o fruto do trabalho na terra, que não fosse desenvolvido por escravos ou agregados subalternos, no período monárquico (753-509 a.C.) e no início da República (509-31 a.C.). Essa elite da sociedade romana era constituída por uma nobreza de sangue, hereditária. Durante muito tempo este foi um grupo fechado que não permitia nenhum tipo de acesso, onde a partir daí originou-se conflitos sociais e lutas, por parte de outros componentes da sociedade, devido aos direitos pertenceram apenas aos patrícios.

A outra parte da população romana era formada por plebeus, clientes e estrangeiros considerados subalternos excluídos da sociedade, e com o passar do tempo adquiriram nomes próprios, “povo”. Em partes, podemos observar que a historia da cidade de Roma é construída a partir de uma luta pelos direitos sociais e pela cidadania, entre aqueles que gozavam de direitos civis plenos e os demais grupos, pois de início os direitos de cidadania apenas eram atribuídos aos proprietários rurais. Nessa população havia uma massa, ou seja uma multidão composta pelo povo e a plebe, destaca o autor que o conceito de plebe derivou-se:

Através de toda uma luta dentro da historia romana, onde essa luta era combater os privilégios dos patrícios, esta foi uma idéia para abranger todos os cidadãos romanos que eram privados de seus direitos ( p. 51)

Dentro dessa luta houve uma junção entre os camponeses livres de poucas posses, os artesãos urbanos e os comerciantes, há indícios também de que a plebe era composta por estrangeiros que residiam em Roma, em meio a essa divisão entre patrícios e plebeus, havia mais dois grupos: os clientes e os escravos.

Para Funari{C}[3] os clientes são “aqueles que obedecem a um patrício”, mantendo relação de fidelidade ao patrono, a quem deviam serviços e apoios diversos e de quem recebiam terra e proteção, podendo até ganhar independência vindo a integrar a plebe, porém isso era incomum.

Já os escravos até o século III a.C. eram totalmente domésticos, onde eram integrantes de um conjunto de propriedades do patriarca e faziam parte da família. A escravidão entre os camponeses e trabalhadores urbanos, era derivada de muita pobreza, porém mesmo a sociedade romana sendo radical, havia mudança de posição entre os pobres, onde muitas vezes regrediam a uma situação pior a que eles se encontravam, como de livre para escravo ou de plebeu para cliente. É dentro desse contexto histórico, podemos compreender a grande luta existente entre patrícios e plebeus durante o período da República romana.

Nos seus comentários destaca que a partir dessa luta surgiram grandes transformações históricas na República, durante dois séculos (V e IV a.C.), onde uma parte da plebe urbana, conquistaram riquezas através do artesanato e do comércio, mesmo assim ainda não tinham acesso aos seus direitos perante os patrícios. Os plebeus urbanos estavam preocupados em alcançarem seus direitos políticos e sociais, onde almejavam ocupar cargos, votar no Senado, e até mesmo casar-se com patrícios, apesar dos interesses contraditórios, os plebeus não encontraram dificuldades para unir-se contra os patrícios na luta pela cidadania.

Os conflitos dentro da sociedade romana tornaram-se mais evidentes a partir do momento em que os romanos passaram a guerrear em outras cidades,o poder da plebe aumentou uma vez que o exército passou a depender de seus soldados, resultantes desse ocorrido as chamadas secessões da plebe, ameaçava não mais defender a cidade caso os patrícios não abrissem mão dos direitos civis. A partir daí em 494 e 449 a.C. abriu-se os caminhos para a conquista da cidadania.

Após um longo período de muitas lutas, vieram as conquistas tão almejada, o povo conseguiu instituir o Tribunado da Plebe no século V, magistratura com poder de veto às decisões dos patrícios, os plebeus criaram suas próprias reuniões, os “concílios da plebe”, assim como adotar resoluções, os plebiscitos.

Um dos importantes avanços da cidadania ocorreu quando os plebeus conseguiram dividir os romanos em tribos geográficas, e não mais hereditárias.

No período do século V a.C. foi publicada a Lei das Doze Tábuas,onde todos podiam recorrer a um texto escrito, para reclamar seus direitos independente da boa vontade dos superiores, porém mesmo com o intuito de codificar a legislação tradicional,onde era previsto grande poder aos patriarcas, essa lei veio a estabelecer o importante princípio da lei escrita.

Chegando-se ao final do século V a.C. a sociedade romana ainda possuía características de uma cidade arcaica, mesmo após as mudanças sociais geradas através da luta entre patrícios e plebeus.

Decorrendo o século IV a.C. eram cada vez mais intensos os conflitos sociais, porém foi resultante da expansão romana no interior da Península Itálica, já que as novas terras conquistadas pelos plebeus, não eram distribuídas pelos cidadãos em geral, passando assim às mãos dos grandes proprietários de terras, a ponto de Funari[4] afirmar que:

Em meio a essas sedições, esse povo valoroso merece admiração. Lutou por sua liberdade, por sua honestidade, por sua dignidade de nascimento e também pelos cargos e suas honras, mas, acima de tudo, bateu-se de forma mais valente pela salvaguarda da liberdade (P.55).

Vários cargos que até o presente momento eram resguardados aos patrícios passaram a ser exercidos pelos plebeus, uma lei começou a regulamentar o relacionamento entre devedores e credores, proibindo quaisquer cidadão a receber do Estado mais do que 500 jeiras, ou seja 125 hectares de terras públicas. Já no âmbito religioso os livros sagrados, também conhecidos como (livros sibilinos), mantidos sob o controle dos patrícios, passaram aos cuidados de uma comitiva de dez pessoas, conhecidos como “os decêmviros” onde cinco deles eram compostos por plebeus,

De acordo com Funari[5] “tais leis foram importantes, e ficaram conhecidas como: Licínias Séxtias, votadas pela assembléia popular, com aprovação do Senado, onde este tinha o poder de anular, as decisões da assembléia popular”. Porém em 339 a.C. criou-se a Lei Publília, onde esta proibia o direito de veto do Senado, somente em 300 a.C. os plebeus obtiveram livre acesso a todos os cargos políticos e religiosos, através da Lei Ogúlnia. Uma das medidas importantes adotadas no presente momento, foi o fato de um cidadão condenado à pena máxima, passa a ter o direito de recorrer à assembléia popular em busca de perdão ou diminuição de sua pena, fazendo-se com que os líderes populares não se submetessem a ditadura dos patrícios.

A ponto de afirmar que: “todas essas medidas significaram um grande avanço para os direitos de cidadania”.

Através dessas medidas houve uma reforma agrária, uma vez que era limitado o tamanho para as propriedades agrícolas, com isso foi permitido aos camponeses o acesso às terras conquistadas pelos romanos, garantindo-lhes o sustendo e a independência, vale ressaltar também uma outra importante medida para a sociedade para Funari[6]:

A abolição da servidão por dívida, conquistada através da Lei Poetélia, de 326 a.C. pois até o momento os cidadãos pobres eram privados de sua própria liberdade, uma vez escravizados mesmo que provisoriamente,eram privados de todos os seus direitos civis.

Aponta o mesmo autor que última grande conquista plebéia, foi a aprovação da Lei Hortênsia, em 287 a.C. resultante de um conjunto de agitações e secessões, onde essa lei permitia que os plebiscitos tivessem força de lei, mesmo sem a admissão final do senado.

Comenta que o século III a.C. foi testemunhas de grandes avanços na cidadania romana, favorecendo exclusivamente as classes de plebeus superiores, que a partir desse momento integraram a elite aristocrática. Deixa claro que “de um jeito ou de outro, a questão de cidadania sempre esteve em jogo nesses embates, pois mesmo os escravos alforriados intitulavam-se cidadãos e lutavam por seus direitos”. Entende-se por cidadania, o fato de gozar plenamente de todos os seus direitos, sejam estes civis, sociais, políticos e econômicos, exercendo a soberania popular dentro do ofício de cada um.

Podemos observar através do que foi exposto até o presente momento, de acordo com o pensamento de Funari [7]( 2003 ) que devido a muitas lutas e conflitos sociais, geraram algumas leis, onde os plebeus adquiriram seus direitos, e de certa forma foi estabelecida a igualdade formal entre os patrícios e os plebeus, surgindo assim um grande avanço em direção a cidadania.

Os conflitos gerados pela segregação da maioria da população romana, geraram a conquista de vários direitos. Esses direitos podem ser classificados como fontes do direito?

A expressão fontes do direito para Venosa (2003 p.34) tem dois sentidos: “origem histórica ou diferentes maneiras de realização do direito”. Aqui no sentido que hora interessa, temos o aspecto de fonte criadora do direito ou de onde brota o direito, a ponto de destacar a necessidade de se distinguir fontes primárias ou fontes diretas primárias, ou ainda fontes imediatas de secundárias ou mediatas.

Para este autor “as primeiras tem força para gerar regra jurídica”, é o que podemos observar nas fontes geradas na antiguidade fruto dos conflitos em torno do direito de ser incluído como cidadão romano.

Quando comenta as fontes secundárias e mediatas, explica que estas apesar de não terem a mesma força das fontes primárias, “esclarecem os espíritos dos aplicadores da lei e servem de precioso substrato para a compreensão e aplicação do direito”.

Há aproximação entre fonte primária e mediata porque a primeira estatui a lei e o costume e a segunda às cita.

Já o autor Miguel Reale[8], classifica as fontes do direito como material e formal. Material significa que as fontes nascem do contexto social.

Como se vê, o que costuma indicar com a expressão “fonte material” não é outra coisa senão o estudo filosófico ou sociológico dos motivos éticos ou dos fatos econômicos que condicionam o aparecimento e as transformações das regras de direito.

É o que podemos relacionar com as fontes primárias para depois serem formalizadas. Divergindo com o pensamento de Venosa, o autor Reale[9] vem a denominar fontes do direito como mecanismos utilizados para tornar positivas as regras jurídicas e dar a elas legítima força de lei, tornando-as vigente e eficaz, dentro do seu plano constitucional.

Na construção das fontes do direito foi-se formando indivíduos ou sujeito?

Venosa (2003), afirma que “sujeito de direito são as pessoas dotadas de personalidade jurídica que representam um papel dentro da sociedade ou seja se relacionam dentro da sociedade, podendo praticar pessoalmente atos da vida civil”, portanto é correto afirmar que com a construção das fontes do direito dentro desse contexto histórico, marcado por conflitos e avanços na história do direito no Brasil, formou-se sujeito, pois cada vez mais pessoas vão alcançando e conquistando seu lugar perante a sociedade, subordinando-se a uma ordem jurídica, relacionando-se juridicamente, cumprindo seus direitos e obrigações. O autor ainda destaca que:

Os romanos não possuíam termo específico para designar os sujeitos de direito, pois persona (pessoa) é usado nos textos com a significação de ser humano em geral, aplicando-se também aos escravos que não eram sujeitos da relação jurídica; eram considerados coisas (res) (p.138).

Salienta o autor que “quando o indivíduo se torna titular de um direito, o ser humano é guindado à posição de sujeito de direito”.Tratamos aí de direito subjetivo,onde este direito está inserido em todas as relações jurídicas vivenciadas por nós sujeitos de direito.

Para que haja uma relação jurídica é sempre necessário a presença de duas ou mais pessoas, “sendo essas relações simples ou complexas estaremos sempre assumindo a posição de titulares de direitos e obrigações”.

Como a Constituição Federal de 1988 trata a cidadania?

A Constituição Federal de 1988, “Constituição Cidadã”, na expressão de Ulysses Guimarães, Presidente da Assembléia Nacional Constituinte que a produziu intitulou dessa forma, porque na sua elaboração teve ampla participação popular, voltada para a plena realização da cidadania, em atendimento às reivindicações do povo brasileiro, que foi ás ruas impulsionados pela campanha das “diretas já”.

O povo reclamava por mudanças sociais e políticas, em busca de um Estado Democrático de Direito, fundado no principio da soberania popular, aclamado expressamente pelo parágrafo único do art. 1º “Todo poder emana do povo, que o exerce por meio de representantes eleitos ou diretamente, nos termos desta Constituição”.

Para melhor entendimento quanto ao Estado Democrático Social de Direito, não é demais fazer a transcrição da lição de Carlos Ari Sundfeld[10], com referencia a identificação dos seus elementos conceituais:

a) criado e regulado por uma Constituição;

b) os agentes públicos fundamentais são eleitos e renovados periodicamente pelo povo e respondem pelo cumprimento de seus deveres;

c) o poder político é exercido, em parte diretamente pelo povo, em parte por órgãos estatais independentes e harmônicos, que controlam uns aos outros;

d) a lei produzida pelo Legislativo é necessariamente observada pelos demais Poderes;

e) os cidadãos, sendo titulares de direitos, inclusive políticos e sociais, podem opô-los ao próprio Estado;

f) o Estado tem o dever de atuar positivamente para gerar desenvolvimento e justiça social.

E ainda nesse contexto, não é demais deixar aqui registrado que o Estado Democrático de Direito, está vinculado a cidadania, visto que o seu valor supremo é a dignidade da pessoa humana.

Em assim sendo, torna-se necessário falarmos um pouco mais sobre o Estado Democrático de Direito, para melhor explicar essa expressão inscrita na nossa Constituição.

O Estado Democrático de Direito reúne os princípios do Estado Democrático e do Estado de Direito.

Para melhor entendimento, primeiramente vamos falar sobre o Estado de Direito numa concepção liberal, servindo de apoio aos direito do homem, convertendo os súditos em cidadãos livres,.tendo como características básicas: a) a submissão ao império da lei, considerando a lei como ato emanado do Poder Legislativo, formado por representantes dôo povo-cidadão; b) divisão de poderes e c) enunciado e garantia dos direito individuais.

Esse Estado Liberal de Direito, viu-se obrigado, com o curso da historia, a sofrer mudanças, voltada para uma consciência da necessidade da justiça social, devido aos movimentos sociais do século passado e deste especialmente, transformando-se em Estado social de Direito, conforme nota Lucas Verdú[11], que acrescenta:

Mas o Estado de Direito, que já não poderias justificar-se como liberal, necessitou, para enfrentar a maré social, despojar-se de sua neutralidade, integrar, em seu seio, a sociedade, sem renunciar ao primado do Direito. O Estado de Direito, na atualidade, deixou de ser formal, neutro e individualista, para transformar-se em Estado material de Direito, enquanto adota uma dogmática e pretende realizar a justiça social.

Entretanto, esse Estado Social de Direito, ainda não se configura o ideal do povo-cidadão, que muito lutou ter os seus direito estabelecidos pelo Estado.

Esse povo deseja a concretização de um Estado Democrático configurado na nossa Constituição de 1988, que se funda no principio da soberania popular.

O Estado Democrático se contrapõe ao Estado Liberal, como lembra Paulo Bonavides[12], “a idéia essencial do liberalismo não é a presença do elemento popular na formação da vontade estatal, nem tampouco a teoria igualitária de que todos têm direito igual a essa participação ou que a liberdade é formalmente esse direito”.

Daí, a concepção que mais se adéqua às lutas e anseios do povo é de um Estado Democrático de Direito, como Estado legitimidade justa, fundante de uma sociedade democrática,, com o poro incorporado nos mecanismos do controle das decisões e de sua real participação nos rendimentos da produção.

E nesse ponto de vista, a Constituição de 1988 no seu art. 1º já está proclamando e fundando esse Estado, quando afirma que a Republica Federativa do Brasil se constitui em Estado Democrático de Direito, em que o poder emana do povo, e deve ser exercido em proveito do povo, diretamente ou por representantes eleitos.

O certo é que a Constituição de 1988, abre perspectivas de realização social profunda pela pratica dos direito humanos, que Le a inscreve, e pelo exercício dos instrumento que oferece à cidadania e que possibilita concretizar as exigências de um Estado de justiça social, fundado na dignidade da pessoa humana.

A nossa Constituição mudou toda a historia de um povo oprimido e reprimido, quando no seu artigo 1º, tem como princípios fundamentais: a soberania, a cidadania, a dignidade da pessoa humana, os valores sociais do trabalho e da livre iniciativa e o pluralismo político.

Essa nova Constituição transformou o homem em cidadão, garantindo ao povo brasileiro “a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade”, conforme se vê no seu art. 5º, objetivando a construção de uma sociedade justa, com a finalidade de acabar com a pobreza e diminui as desigualdades sociais.

Maria Victoria de Mesquita Benevides[13], conceitua cidadania quanto a teoria da Constituição moderna:

Na teoria constitucional moderna, cidadão é o individuo que tem um vinculo jurídico com o Estado. É o portador de direitos e deveres fixados por uma determinada estrutura legal (Constituição, leis) que lhe confere, ainda, a nacionalidade. Cidadão são, em tese, livres e iguais perante a lei, porem súditos do Estado. Nos regimes democráticos, entende-se que os cidadãos participaram ou aceitaram o pacro fundante da nação ou uma de nova ordem jurídica. (BENEVIDES, Maria Victoria de Mesquita[14], 1994).

Nesse contexto, é importante conceituar democracia e cidadania, sendo dois fatores preponderantes na consolidação da soberania e participação popular.

Por democracia diremos que é a “realização de valores (igualdade, liberdade e dignidade da pessoa) essenciais de convivência humana” (JOSE AFONSO DA SILVA[15], Curso de Direito Constitucional Positivo, 30ª edição, p. 112).

E por cidadania entendemos que, no sentido moderno, é uma idéia ligada ao exercício e a titularidade dos direitos políticos, onde o individuo deve estar integrado na sociedade para fiscalizar o poder público, devendo participar dos rumos da sociedade. A idéia de cidadania está atrelada com a de dignidade da pessoa humana.

Os princípios constitucionais, conquistados com muita luta, são de extrema importância para a consolidação da cidadania.

Partindo desses princípios, o povo exerce sua soberania através do voto direto e secreto, e, nos termos da lei, mediante o plebiscito, referendo, e iniciativa popular.

Pegando esse gancho dos direitos políticos que a nossa “Constituição Cidadã” atribui ao povo, inscritos no art. 1º, parágrafo único, quando diz que o poder emana do povo, que exerce por meio de representantes eleitos ou diretamente, podemos dizer que o cidadão não é somente um individuo integrado na sociedade com direitos, esse individuo tem também deveres com a sociedade, fiscalizando o por publico e encarnando o poder que dispõe para interferir na estrutura governamental, através do voto.

É preciso que esse cidadão seja ativo titular dos direitos políticos de votar e de ser votado.Esses direito de cidadania são adquiridos através do alistamento eleitoral na forma da lei, que se faz mediante a qualificação e inscrição da pessoa como eleitor perante a Justiça Eleitoral, o que é obrigatório paras os brasileiros de ambos os sexos maiores de 18 anos de idade e facultativos para os analfabetos, os maiores de setenta anos e maiores de dezesseis e menores de dezoito anos (art. 14, § 1º, I e II da CF/88). Não sendo alistáveis como eleitores os estrangeiros e os conscritos durante o serviço militar obrigatório (art. 14, § 2º.

Dentro desse contexto, conclui-se que a cidadania se adquire com a obtenção da qualidade de eleitor, embora nem sempre possa exercer todos os direitos políticos.

Justiça, liberdade e igualdade

Não há como separar da concepção de cidadania, valores como justiça, liberdade e igualdade, estes são mais do que fortes características, são a base, são a essência da cidadania.Valores assim tão pungentes, foram discutidos, por diversas personalidades até os dias de hoje, em todo o mundo, em todas as épocas.

Justiça é uma palavra de origem latina ,do étimo latino justitia e significa estar conformidade com o direito, dar a cada um o que é devido, praticar a equidade.

Aristoteles[16] no livro V de seu livro Ética a Nicômaco,introduz sua concepção de justiça no seguinte enunciado:

Todos os homens entendem por justiça esta espécie de disposição que os torna aptos a realizar ações justas e que os faz agir justamente e desejar o que é justo; do mesmo modo, a injustiça é esta disposição que os faz agir injustamente e desejar o que é injusto.

Para compreendermos, mais claramente esta afirmação de Aristóteles[17], faz-se mister esclarecer o que seria para ele uma disposição de caráter Segundo Aristóteles[18] a alma, possui três estágios,a paixão, a faculdade e disposição de caráter.A paixão reporta-se ao sentimento que está dentro do individuo,porem ainda não manifesto, a faculdade,seria a paixão manifestada, e a disposição de caráter e o estágio em que esta manifestação se torna visível a olhos e julgamentos alheios.Por tanto a justiça para Aristóteles[19], seria um disposição de caráter, ou seja um sentimento pungente, e manifesto a ponto de ser notório aos demais, que nos torna aptos a realizar ações justas, que nos faz agir justamente e desejar o que é justo.Aristóteles[20] continua seu pensamento afrimando que:“A justiça é a virtude perfeita porque é o exercício da virtude perfeita: e é perfeita num grau especial, porque quem a possui pode praticar sua virtude em relação a outros e não apenas a si mesmo...”. Relacionando assim as virtudes justiça e igualdade, que devem ser vistas como direito de cada um. “... ‘Justo’ significa o que é lícito e o que é equânime ou imparcial...”, ou seja, a igualdade tem o sentido de proporcionalidade.

Para Aristóteles[21], a igualdade consistia em tratar igualmente os iguais e desigualmente os desiguais. Esse pensamento do celebre filósofo não tinha por finalidade fundamentar alguma espécie de preconceito, entre as tão plurais diferenças dos seres humanos, mas ao reconhecer a existência delas,acredita que devam ser tratadas como tais, com a finalidade de integrar a sociedade.

Como aprendido em sala de aula é atribuída a Aristóteles[22] a criação da primeira grande teoria filosófica sobre a liberdade, disposta em sua obra Ética a Nicômaco. Para ele livre é aquele que tem em si mesmo o principio para agir,ou seja, aquele se postula em si mesmo para optar por agir ou não. A liberdade é concebida como o poder pleno e incondicional da vontade para determinar a si mesma ou para ser auto-determinada.

Traduzindo assim a liberdade como um "escolher entre alternativas possíveis", realizando-se como decisão e ato voluntário. Em contrapartida ao necessário ou à necessidade, sob a qual o agente sofre a ação de uma causa externa que o obriga a agir sempre de uma determinada maneira, no ato voluntário livre o agente é a causa de si, isto é, causa integral de sua ação.

Para Rousseau[23], a justiça se traduz como um sistema de legislação, que acima de qualquer coisa deverá estar a serviço, da liberdade e da igualdade. Há em sua obra Contrato Social o seguinte trecho: “se considerarmos humanamente as coisas desprovidas de sanção natural as leis da justiça são vãs entre os homens. Produzem somente o bem do malvado e o mal do justo, quando este as observa para com todos sem que ninguém os observe para com ele. Por conseguinte tornam-se necessárias convenções e leis para unir o direito aos deveres e conduzir a justiça ao seu fim”.

E por compreender que não á possibilidade de execer sua liberdade sem o mínimo de organização social, que Rousseau[24] teoriza em cima de um contrato social. Este trecho ilustra esta perspectiva do autor: "(...) Quem quer que se recuse a obedecer à vontade geral deve ser compelido pelos seus concidadãos a obedecê-la. O que nada mais é do que dizer que pode ser necessário obrigar um homem a ser livre (...)

E não será um paradoxo, obrigar alguém a ser livre? Vale salientar que Rousseau (1712/1778) é forte influência em textos como a Declaração Universal dos Direitos do Homem e do Cidadão, produzida pela Revolução Francesa. Não era ele contra a liberdade, mas sabia que ela não se fazia possível sem um mínimo de organização social, que acaba por funcionar como agente limitador, das liberdades individuais.

Outro contratualista como Rousseau{C}[25], Hobbes[26] acredita ser liberdade uma ausência de oposição, ,ausência de algo que o impeça de mover-se, e agir como gostaria se não se encontrasse impedido. Para Hobbes[27] as leis atuam de modo coercitivo, no sentido em que o temor de ser punido, antecede a vontade do individuo de realizar ou não determinado ato, porem, o autor afirma que até mesmo o ato de optar por obedecer as leis, para não ser punido, também é uma escolha realizada pelo individuo na qual ele encontra-se exercendo a sua liberdade.No capítulo 21 de sua obra Leviatã Hobbes[28] cita Aristóteles[29] no intuito de reafirmar a sua visão negativa do estado, para Hobbes[30] quando se cria o estado, os indivíduos abrem mão de sua liberdade e direitos em favor de uma segurança, e conservação.

A similaridade do pensamento dos dois encontra-se no entendimento de que não existe liberdade civil, se esta for controlada por um soberano. Ainda explorando o conceito de cidadania, justiça e liberdade, encontramos outro teórico que dedicou toda sua vida acadêmica para responder o questionamento de como seria uma sociedade justa. John Rawls[31] acreditava que uma sociedade justa deveria conjugar os valores de liberdade e igualdade, e se pautar na equidade. Para Rawls[32] a desigualdade deverá existir unicamente com a finalidade de beneficiar quem estiver em pior situação. Sua idéia de sociedade justa compreende três pressupostos que são o reconhecimento fato do pluralismo, a escassez moderada de recursos, e o reconhecimento de todos os indivíduos da sociedade enquanto seres racionais e razoáveis.

Seu método de concepção de uma sociedade justa compreendia uma nova fora de contrato social divergente dos outros contratualistas aqui já citados.seu método envolvia um procedimento por ele chamado de posição inicial, onde os participantes decidem os princípios de organização das instituições básica sob um véu de ignorância,e são postos nesta posição sem conhecer suas respectivas posições na vida real,culminando assim numa imparcialidade do procedimento adotado, uma vez que devem decidir o que for melhor para todos já que não saberão em que situação irá se encontrar na sociedade.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Concluímos portanto que a cidadania não é meramente uma aspiração filosófica, e sim um bem buscado pela maioria dos indivíduos que não são por ela contemplados, que se postula num processo árduo de luta, e que por muitas vezes, necessita não apenas de um embate teórico, mas também de uma peleja física, e faz necessário observá-la afim de que não haja retrocessos, em face das muitas lutas que ainda estão por vir.

Cidadania nada mais é do que uma luta constante, fazendo com que indivíduos tornem-se sujeitos de direito. Uma sociedade cidadã, é uma sociedade justa e democrática onde seus cidadãos sejam tratados com igualdade, e o que podemos averiguar após tantas lutas, tantos conflitos por um objetivo, é que alcançamos o nosso objetivo maior, que é a democracia, ou seja é vivermos dentro de um Estado Democrático de Direito, porém o que podemos observar é que a nossa Constituição de 1988, veio a nos trazer todos esses direitos, sociais, civis, políticos, garantias fundamentais, portanto o que falta é a aplicabilidade dessas normas, pois atualmente vivemos sob a disfuncionalidade do direito.

  • Cidadania
  • Direito
  • Democracia
  • Evolução

Referências

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PINSKY, Jaime. História da Cidadania – São Paulo: 2ºed.  2003.

VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito Civil: parte geral/ Ed. Atlas,3º ed. -              2003.

MORAES, Alexandre de, Direito Constitucional, 19ª edição, São Paulo, Editora Atlas S.A- 2006.

SILVA, José Afonso da, Curso de Direito Constitucional Positivo, 30ª edição, Malheiros Editores.

ARAÚJO, Luiz Alberto David e JÚNIOR, Vidal Serrano Nunes, Curso de Direito Constitucional, 11ª edição, Editora Saraiva.

CONSTITUIÇÃO DA REPUBLICA FEDERATIVA DO BRASIL, 42ª edição  2009, Editora Saraiva.

ARISTÓTELES, Ética a Nicômaco   ed.Martin Claret – 2007.
ROUSSEAU, Jean Jacques,Do contrato social, ed. Martin Claret São Paulo-2006.
HOBBES,Thomas. Leviatã. Ed. Martin Claret, São Paulo, 2006.

RAWLS, Jhon. Uma teoria da justice, Ed. Martins Fontes, São Paulo: 1997.      

                                        

[1] Funari, Pedro Paulo, A Cidadania entre os Romanos in: Pinsky, Jaime e Tinsky, Carla B. História da Cidadania, 2ª Ed. SP: Contexto, 2003, p.53.

[2] Funari, Pedro Paulo, A Cidadania entre os Romanos in: Pinsky, Jaime e Tinsky, Carla B. História da Cidadania, 2ª Ed. SP: Contexto, 2003.

Ibidem, p.51

[4] Ibidem, p.54

[5] Ibidem, p.54

[6] Ibidem, p.54

[7] Ibidem, p.54

[8] Reale, Miguel

[9] Ibidem, p.140

[10] Sundfeld, Ari                                                                                                                                                      

[11] Verdú, Lucas

[12] Bonavides, Paulo

[13] Benevides, Maria Victória de Mesquita

[14] Ibidem, p.

[15] Silva, José Afonso da

[16] Aristóteles

[17] Ibidem, p.

[18] Ibidem, p.

[19] Ibidem, p.

[20] Ibidem, p.

[21] Ibidem, p.

[22] Ibidem, p.

[23] Rousseau

[24] Ibidem, p.

[25] Ibidem, p. 

[26] Hobbes

[27] Ibidem, p.

[28] Ibidem, p.

[29] Ibidem, p.

[30] Ibidem, p.

[31] Rawls, John

[32] Ibidem, p.


Dra. Frida Carla

Advogado - Vitória da Conquista, BA


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