RESUMO: Este artigo trata da responsabilidade civil do advogado sob a interpretação da Teoria da Perda de uma Chance. Matéria que vem sendo discutida pela doutrina e aplicada reiteradamente pela jurisprudência nos Tribunais brasileiros, quando viabilizam a possibilidade de reparar o dano pela perda de uma chance, isto é, a compensação de uma oportunidade ou de uma conquista perdida, ou até mesmo de um prejuízo que venha a causar danos ao cliente. Analisa-se a relação contratual existente entre cliente e advogado, decorrente da responsabilidade subjetiva do profissional do direito, assim como sua obrigação de meio e não de resultado.
PALAVRAS – CHAVE: RESPONSABILIDADE – CIVIL – PERDA – CHANCE – ADVOGADO.
INTRODUÇÃO
O presente trabalho traz um estudo da responsabilidade civil do advogado à luz da teoria da perda de uma chance, pois os danos que tratam da perda de uma chance causados ao patrimônio jurídico dos clientes, através de advogados constituídos fazem parte de uma realidade cada vez mais presente na justiça brasileira, o que evidencia a falta de percepção necessária ao exercício da advocacia, e até o despreparo de alguns advogados acarretando uma má qualidade na prestação dos serviços advocatícios.
A teoria da perda de uma chance revela uma nova característica de dano, ensejando a indenização procedente da supressão de uma oportunidade futura de aquisição de um benefício, ou até mesmo de evitar um prejuízo. Com o intuito de solucionar alguns conflitos que versam sobre o presente tema, bem como tutelar os direitos da população que carecem dos serviços advocatícios, a Doutrina e a Jurisprudência pátria passaram a adotar a Teoria de origem francesa intitulada “Teoria da Perda de uma Chance”. Através dela é admitida uma indenização por um dano, independente da certeza, todavia, é necessária a comprovação de que a chance perdida era considerada séria e real.
Vale ressaltar que apesar da legislação brasileira não prever expressamente a aplicabilidade da Teoria da Perda de uma Chance aos operadores do direito, tal aplicação não contraria nenhum texto nem princípio constitucional. O entendimento é de que a utilização dessa teoria de certa forma beneficia o Poder Judiciário no que concerne ao julgamento dos litígios, pois além de reparar o dano sofrido pelos clientes, permite também identificar a falha processual dos advogados, ou seja, em qual circunstância o profissional do direito faltou com a sua responsabilidade civil.
O objetivo deste trabalho é analisar os fundamentos jurisprudenciais acerca da responsabilidade civil do advogado pela perda de uma chance, buscando destacar o conceito de responsabilidade civil, mormente destacando também a concepção da perda de uma chance, bem como identificar na doutrina e na legislação os elementos constitutivos da responsabilidade civil do advogado pela perda de uma chance, levando em conta os princípios norteadores e o reconhecimento doutrinário. A preocupação com essa temática surgiu em 2012 na aula de Responsabilidade Civil, ministrada pela professora Thais Requião, na Faculdade Batista Brasileira, quando da discussão sobre a Responsabilidade Civil do Advogado pela perda de uma chance. Debateu-se em sala de aula a possibilidade de dano causado a clientes pela desídia de seus advogados, configurando assim a perda de uma chance. O mesmo tema foi adotado para a apresentação do seminário acerca da responsabilidade civil do advogado, em que eu finalizei com uma breve exposição sobre a Teoria da perda de uma chance.
Iniciando a minha pesquisa percebi as crescentes demandas no Poder Judiciário que aduzem a perda de uma chance, a partir deste momento tomei ciência de algumas decisões judiciais fundamentadas na Teoria da Perda de uma Chance, como também na responsabilidade civil do advogado pela perda de uma chance. Através da leitura de decisões judiciais e artigos já publicados, juntamente com doutrinas que abordam o presente estudo, gradativamente surgiram questionamentos para serem elucidados, razões estas que me levaram a escolha deste tema.
As indagações fomentadas pela discussão do assunto em epígrafe versam sobre os requisitos fundamentais para a responsabilização civil do advogado pela perda de uma chance, bem como qual o posicionamento doutrinário e jurisprudencial acerca da responsabilidade civil do advogado pela perda de uma chance. Qual o conceito de responsabilidade civil e quais os fundamentos jurídicos que originam a aplicabilidade da teoria da perda de uma chance.
Pretende-se provar com a elaboração deste trabalho, a constitucionalidade da teoria da perda de uma chance diante dos fundamentos jurisprudenciais, bem como dos argumentos da doutrina que reconhece a aplicabilidade dessa teoria, com o objetivo de dirimir demandas que versam sobre a responsabilidade civil do advogado.
Fundamenta-se este trabalho bibliográfico nos estudos realizados através de doutrinadores como Carlos Roberto Gonçalves que nos traz um resumo acerca do surgimento da responsabilidade civil, expondo em sua doutrina os aspectos relevantes na responsabilidade civil do advogado. Apontamos também o autor Sérgio Savi, que conceitua a teoria da perda de uma chance, explanando a sua origem numa discussão sobre a adequada aplicação da teoria da perda de uma chance sob a responsabilidade civil, tal como os motivos para a admissão da indenização das chances perdidas no Brasil.
Corroborando com o desenvolvimento deste trabalho fundamenta-se também com os ensinamentos do doutrinador Sérgio Cavalieri Filho, cuja doutrina aborda a natureza do dano na perda de uma chance, o autor defende uma concepção de lucro cessante. Concomitantemente utiliza-se a obra do autor Rafael Peteffi da Silva para a elaboração do presente artigo, em que o mesmo explica o reconhecimento doutrinário, explanando as novas concepções de dano que englobam a teoria da perda de uma chance. A insigne professora Maria Helena Diniz acrescenta ser de meio e não de resultado a obrigação do causídico.
O doutrinador Sílvio de Salvo Venosa, igualmente nos auxilia na construção deste trabalho com a sua prestigiosa interpretação ao Código Civil brasileiro de 2002, assim como os considerados autores Pablo Stolze, Rodolfo Pamplona Filho e Anderson Schreiber, agregam conhecimentos doutrinários a este trabalho. Para melhor fundamentação realizou-se também uma pesquisa jurisprudencial onde foram encontradas decisões judiciais de diferentes tribunais brasileiros que adotaram a aplicabilidade da “Teoria da Perda de uma Chance” no que toca a responsabilidade civil do advogado.
A RESPONSABILIDADE CIVIL
Desde os primórdios quando se tratava de um dano prevalecia um juízo de vingança contra o seu causador, ou seja, a justiça era conclamada pelas próprias mãos, assim determinava a lei de talião “olho por olho, dente por dente”, imperando a violência na sociedade primária. É tanto que Carlos Roberto Gonçalves (2012,p.24) destaca que “essa era a forma primitiva, selvagem, mas humana de reação espontânea e natural contra o mal sofrido; solução comum a todos os povos nas suas origens, para a reparação do mal pelo mal”. Posteriormente ficou claro que essa não era a melhor forma de solucionar os problemas entre os cidadãos daquela época, pois a prática dessas condutas vingativas só provocava um dano maior, trazendo resultados negativos para a sociedade.
Seguidamente ocorreu o período da composição, isto é, uma compensação em dinheiro, em que o prejudicado é compensado economicamente, segundo Gonçalves (2012, p.25) “este era o período onde a vingança era substituída pela composição a critério vítima”. Salienta-se que neste momento à culpa ainda não era considerada. Logo surge o Código de Manu e a Lei das XII Tábuas, e a composição de voluntária passa a ser obrigatória, reinando a culpa objetiva.
Acrescenta o autor que “o estado assume o controle proibindo a vítima de fazer justiça com as próprias mãos, impondo a obrigatoriedade de uma indenização pecuniária com o objetivo de compensar o dano sofrido” (GONÇALVES 2012, p.26). No ano de 572 provavelmente final do século III a.C. surgiu a Lex Aquilina, a partir daí o sistema Romano da responsabilidade fora aperfeiçoado pelo direito francês, estabelecendo o princípio que pune a culpa por um dano injustamente provocado independentemente de uma relação obrigacional preexistente.
A partir deste momento origina-se a responsabilidade extracontratual ou aquiliana, cujos objetivos era o ressarcimento dos prejuízos causados por um dano, isto é, o direito a reparação, distinguindo assim a responsabilidade civil da responsabilidade penal. Gonçalves (2012, p.2) afirma em sua doutrina que “a essência da responsabilidade está ligada à noção de desvio de conduta”, nasce também à ocorrência de uma culpa contratual por descumprimento das obrigações, corolário da imperícia, negligência ou imprudência.
Com o Código de Napoleão em 1804 instituiu uma diferenciação entre a culpa delitual e contratual, é nesse momento que o conceito de responsabilidade civil encontra amparo na culpa, cujo fundamento difundiu-se por toda sociedade. Com a chegada da Revolução Industrial os danos tornaram-se cada vez mais plurais, acarretando a criação de novas teorias intentadas a tutelar o direito das vítimas, como a teoria do risco, teoria da responsabilidade civil subjetiva, também intitulada de teoria da culpa etc. Diante de crescentes transformações jurídicas, sociais, ideológicas e econômicas é patente que o instituto da responsabilidade civil viu-se compelido a acompanhar tamanha evolução, neste sentido o autor Rafael Peteffi (2009, p.73) declara em sua doutrina que (...) “o novo paradigma solidarista, fundado na dignidade da pessoa humana, modificou o eixo da responsabilidade civil, que passou a não considerar como seu principal desiderato a condenação de um agente culpado, mas a reparação da vítima prejudicada”. Destaca-se que o Código Civil brasileiro de 2002 com o escopo de proteger os interesses jurídicos dos indivíduos, prevê tanto a responsabilidade civil subjetiva quanto a objetiva.
Observa o considerado Carlos Roberto Gonçalves (2012, p.14) que a função da responsabilidade civil é “restabelecer o equilíbrio jurídico-econômico pré-estabelecido entre o agente e a vítima, recolocando o prejudicado no statu quo ante”, repondo a vítima à situação anterior a lesão.
Ocorre que em se tratando dos danos causados pela perda de uma chance numa relação contratual advocatícia, objeto do nosso estudo, não há possibilidade de recolocar o cliente a situação vivida por ele anteriormente. Uma vez frustrada a sua chance na obtenção de um resultado positivo no final da demanda judicial, não haverá como reverter à decisão desfavorável. Assim sendo, será arbitrada a título de compensação uma indenização na proporção do dano, ou seja, proporcional à perda da sua chance.
Neste sentido Rafael Peteffi (2009, p. 104) em sua doutrina afirma que “a perda definitiva da vantagem esperada não pode ser indenizada, tendo em vista que a conduta do réu, nos casos de perda de uma chance, nunca se caracteriza como uma condição sine qua non”. Desta forma, é notório que a conduta desidiosa do advogado, seja omissiva ou comissiva, consiste no nexo de causalidade para o dano na perda de uma chance, ou seja, é causa fundamental para um resultado negativo ao final do processo, também chamado de dano final.
A RESPONSABILIDADE CIVIL OBJETIVA E SUBJETIVA
A responsabilidade civil objetiva é isenta de culpa, logo pautada na teoria do risco, Cavalieri Filho (2012, p.18) afirma que “importantes trabalhos vieram, então, à luz na Itália, na Bélgica e, principalmente, na França sustentando uma responsabilidade objetiva, sem culpa baseada na chamada teoria do risco, acabou sendo também adotada pela lei brasileira em certos casos”. Destarte o artigo 927 do Código Civil, especificamente em seu parágrafo único também dispõe acerca da responsabilidade civil objetiva, in verbis.
Parágrafo Único: Haverá obrigação de reparar o dano, independentemente de culpa, nos casos especificados em lei, ou quando a atividade normalmente desenvolvida pelo autor do dano implicar, por sua natureza, riscos para os direitos de outrem.
Conforme disposição supramencionada fica evidente que na conduta do agente que motivou do dano, é irrelevante a presença do dolo ou culpa na responsabilidade objetiva, desta maneira “somente será necessária à existência do elo de causalidade entre o dano e a conduta do agente responsável para que surja o dever de indenizar” (STOLZE, PAMPLONA, 2012, p.14). Nesta mesma linha de raciocínio o autor Anderson Schreiber (2013, p. 30) afirma que (...) “verifica-se uma crescente conscientização de que a responsabilidade objetiva consiste em uma responsabilização não pela causa (conduta negligente, conduta criadora de risco etc.), mas pelo resultado (dano)”.
Ainda nesta concepção o doutrinador Carlos Roberto Gonçalves (2012, p.48) afirma em sua doutrina clássica (...) “ser indispensável à relação de causalidade entre a ação e o dano, uma vez que, mesmo em caso de responsabilidade objetiva, não se pode acusar quem não tenha dado causa ao evento”. Diante os ensinamentos dos autores que tratam da responsabilidade civil, não há que se olvidar que o nexo causal entre a conduta e o resultado do agente torna-se requisito fundamental para a reparação do dano na teoria objetivista.
No que concerne à responsabilidade civil subjetiva, esta encontra fundamento na teoria da culpa, sendo a mesma o seu principal pressuposto, ao passo que a vítima só obterá a reparação do dano se provar a culpa ou dolo do agente. “A prova da culpa do agente passa a ser pressuposto necessário do dano indenizável”. (GONÇALVES, 2012, p.48).
Apesar do Código Civil brasileiro de 2002 em regra adotar a responsabilidade civil objetiva (teoria do risco), a responsabilidade civil subjetiva (teoria da culpa), encontra disposição no artigo 186 in verbis.“Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito”. Analisando a redação do artigo transcrito, é perceptível a evidência dos quatro elementos substanciais da responsabilidade civil, sendo eles a ação ou omissão, a culpa ou dolo do agente, o nexo causal e o dano sofrido pela vítima. Neste sentido Gonçalves (2012, p.51) defende que “deve ser reconhecida a responsabilidade subjetiva como norma, pois o indivíduo deve ser responsabilizado, em princípio, por sua ação ou omissão, culposa ou dolosa”.
Diferentemente da responsabilidade objetiva, cuja culpa ou dolo é dispensável para a caracterização do dano, na responsabilidade subjetiva faz-se necessário não só a relação de causalidade entre ato e resultado, como também a comprovação da culpa do agente, para assim mensurar-se um dano passível de reparação. Isto posto, entende-se que a responsabilidade civil é uma resposta instigada pela infração de um dever preexistente.
A RESPONSABILIDADE CIVIL CONTRATUAL E EXTRACONTRATUAL
Não há dúvidas que a responsabilidade civil contratual decorre do descumprimento de uma relação obrigacional preexistente, (...) “em matéria de culpa contratual, o dever jurídico consiste na obediência ao avençado”. (GONÇALVES 2012, p.58). Sendo assim, pode-se afirmar que na responsabilidade contratual já existia uma vinculação entre as partes, isto é, uma norma jurídica contratual, cujo dano é resultado do descumprimento obrigacional fixado no contrato.
Os artigos 389 e 395 ambos do Código Civil trazem uma referência a responsabilidade civil contratual conforme redações explícitas abaixo:
Art. 389 “Não cumprida a obrigação, responde o devedor por perdas e danos, mais juros e atualização monetária segundo índices oficiais regularmente estabelecidos, e honorários de advogado”.
Art. 395 “Responde o devedor pelos prejuízos a que sua mora der causa, mais juros, atualização dos valores monetários segundo índices oficiais regularmente estabelecidos, e honorários de advogado”.
Ante os dispositivos mencionados acima, ressalta-se que o inadimplemento da obrigação contratual, estabelecidos numa relação negocial preexistente, caracteriza a responsabilidade civil contratual, o que gera um dano passível de indenização. Já na relação civil extracontratual, também chamada de responsabilidade civil aquiliana haverá a violação direta de uma norma legal. “Na culpa aquiliana, viola-se um dever necessariamente negativo, ou seja, a obrigação de não causar dano a ninguém”. (STOLZE, PAMPLONA 2009, p.18). Vale ressaltar que o Código Civil brasileiro faz menção a responsabilidade extracontratual ou aquiliana em seus artigos 186 a 188 e 927 e seguintes.
Destaca-se que ao configurar-se a responsabilidade civil extracontratual ou aquiliana, far-se-á necessário a comprovação da culpa do agente, diferentemente da responsabilidade contratual que em regra a culpa será presumida, cabendo a vítima comprovar que a obrigação não foi cumprida e ao agente que não agiu com culpa, caso inverta-se o ônus da prova.
A OBRIGAÇÃO DE MEIO E DE RESULTADO
Caracteriza-se a obrigação de meio quando o profissional ao assumir uma relação obrigacional adquire o dever de agir com diligência, zelo e cautela no decorrer da sua atividade, contudo, não possui este o dever de obter um resultado final inteiramente positivo.
Salienta-se que mesmo agindo de forma dedicada, o resultado final pode não ser favorável ou parcialmente favorável, não correspondendo assim às expectativas do seu cliente. Neste caso não há que se falar em dano reparável, uma vez sendo a sua obrigação de meio e não de resultado e provada à conduta assídua e cuidadosa do profissional.
O mesmo não ocorre na obrigação de resultado, em que o profissional ao assumir uma obrigação perante o cliente, adquire o dever de alcançar um resultado final positivo, ao passo que caso o resultado não seja o esperado, e restando provada a sua culpa, terá o profissional o dever de indenizar o dano causado ao seu cliente.
A RESPONSABILIDADE CIVIL DO ADVOGADO
Na legislação brasileira o profissional da advocacia possui a responsabilidade civil subjetiva decorrente de uma relação contratual com os seus clientes, adquirindo assim uma obrigação de meio. Portanto para que o cliente pretenda qualquer tipo de ressarcimento oriundo da conduta do seu advogado, configurando a responsabilidade civil do procurador sob um dano que lhe fora causado, far-se-á necessário à comprovação da sua culpa ou dolo, pois no que concerne aos profissionais do direito a responsabilidade civil é subjetiva conforme preleciona o art. 32 da Lei 8.906/94 (Estatuto da Advocacia e da OAB). “O advogado é responsável pelos atos que, no exercício profissional, praticar com dolo ou culpa”. Destarte o § 4º do art. 14 da Lei 8.078/90 (Código de Defesa do Consumidor). “A responsabilidade pessoal dos profissionais liberais será apurada mediante a verificação de culpa”.
Para a melhor compreensão e amplitude da responsabilidade civil do advogado a seguir daremos o conceito desse instituto na visão de alguns doutrinadores. Segundo o autor Cavalieri Filho a responsabilidade Civil consiste num “dever jurídico sucessivo que surge para recompor o dano decorrente da violação de um dever jurídico originário” (CAVALIERI FILHO 2010, p.2).
Os autores Pablo Stolze Gagliano e Rodolfo Pamplona Filho conceituam responsabilidade como sendo:
“A responsabilidade, para o Direito, nada mais é, portanto, que uma obrigação derivada de um dever jurídico sucessivo de assumir as consequências jurídicas de um fato, consequências essas que podem variar (reparação dos danos e/ou punição pessoal do agente lesionante) de acordo com os interesses lesados.” (STOLZE E PAMPLONA 2009, p.3)
Corroborando com a concepção dos autores citados acima a prestigiosa Professora Maria Helena Diniz nos contempla com a sua definição acerca da matéria responsabilidade civil:
A aplicação de medidas que obriguem alguém a reparar dano moral ou patrimonial causado a terceiro em razão de ato próprio imputado, de pessoa por quem ele responde, ou de fato ou coisa de animais sob sua guarda ou, ainda, de simples imposição legal. ( DINIZ 2009, p.34).
Diante dos conceitos explícitos acima, vale ressaltar que a essencialidade do advogado no que tange a sua importância a administração da justiça está referida na Constituição Federal de 1988 especificamente no art. 133 que aduz: “O advogado é indispensável à administração da justiça, sendo inviolável por seus atos e manifestações no exercício de profissão, nos limites da lei”. Salienta-se, portanto que a teoria da perda de uma chance será aplicada sempre que ficar provado à desídia do advogado que resulte no insucesso da causa.
Ainda que, sendo o advogado um profissional liberal, e embora o Código de Defesa do Consumidor em seu artigo 14, § 4º dispor da responsabilidade civil dos profissionais liberais, o entendimento não é pacífico entre os tribunais brasileiros e o Superior Tribunal de Justiça STJ acerca do exercício da advocacia como relação de consumo, conforme decisões e acórdãos explícitos abaixo.
Discute-se acerca de uma Ação de advogado que busca receber honorários advocatícios por ter sido contratado como profissional liberal tratando-se de relação de consumo e não relação de trabalho. Este foi o entendimento do Ministro Aloysio Corrêa da Veiga ao negar provimento a embargos do advogado José Domingos de Sordi contra a Cooperativa de Economia e Crédito Mútuo dos Médicos e demais Profissionais da Saúde do Vale das Antas Ltda. - Unicred Vale das Antas. Devido a divergências de entendimento, o recurso chegou a ser conhecido, isto é, admitido para julgamento. Ao julgar o mérito, entretanto, a SDI-1 negou provimento aos embargos.
Para o relator, ministro Aloysio Corrêa da Veiga, neste caso o trabalho não é o essencial no contrato entre as partes. "A competência da Justiça do Trabalho estará assegurada apenas quando não houver, pela natureza dos serviços realizados, relação contratual de consumo". O relator, ministro Veiga, após mencionar algumas premissas que caracterizam a relação de trabalho e a distinguem da relação de consumo, definiu que “os serviços do advogado, assim como do médico em uma cirurgia estética ou reparatória, tanto quanto o conserto ou assistência técnica, enfim, todos esses serviços caracterizam relação de consumo”.
A conclusão do julgado é que "a ação de cobrança no contrato de mandato de honorários advocatícios é uma relação de consumo, e não de trabalho, sendo, portanto, de competência da Justiça Comum".
PROCESSO Nº TST-RR-781/2005-005-04-00.5
fls. 1 PROCESSO Nº TST-RR-781/2005-005-04-00.5
A C Ó R D Ã O (Ac. 3ª Turma) RED.DESIG.CARP/FB/ac
RECURSO DE REVISTA. INCOMPETÊNCIA DAJUSTIÇA DO
TRABALHO. AÇÃO DE COBRANÇA DE HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS .
A Justiça do Trabalho somente será competente para resolver os litígios oriundos da relação de trabalho quando houver vínculo entre a causa de pedir e a prestação de serviços inserida na atividade produtiva do tomador, pois nesta hipótese se manifesta a inferioridade do trabalhador, quer pela dependência econômica, quer pela subordinação. Caso concreto em que a Ré ou Reclamada é cooperativa de economia e crédito mútuo dos médicos e demais profissionais da saúde do Vale das Antas/RS, enquanto o Reclamante e/ou Autor presta serviços de advocacia em ações junto à Justiça Federal visando isentar o cliente do pagamento de contribuições de PIS e COFINS. Precedentes. Recurso de Revista conhecido, mas não provido .
Vistos, relatados e discutidos estes autos de Recurso de Revista nº TST-RR-781/2005-005-04-00.5 , em que é Recorrente JOSÉ DOMINGOS DE SORDI e Recorrida COOPERATIVA DE ECONOMIA E CRÉDITO MÚTUO DOS MÉDICOS E DEMAIS PROFISSIONAIS DA SAÚDE DO VALE DAS ANTAS LTDA. - UNICRED VALE DAS ANTAS .
Foi o seguinte o relatório aprovado em Sessão: -O Eg. Tribunal Regional do Trabalho da 4ª Região, pelo acórdão de fls. 401/404, negou provimento ao recurso ordinário do Reclamante, mantendo a sentença, pela qual foi declarada a incompetência da Justiça do Trabalho para apreciar o feito, e determinou a remessa dos autos à Justiça Comum.Recorre de revista o Reclamante, pelas razões de fls. 407/430, com fulcro nas alíneas a e c do art.896 da CLT. Admitido o recurso pelo despacho de fls. 458/459. Contra-razões a fls. 485/491. Os autos não foram encaminhados ao D. Ministério Público do Trabalho (RI/TST, art. 83).-
V O T O
1. CONHECIMENTO. Tempestivo o recurso (fls. 405 e 407); advoga o Reclamante, advogado OAB/RS, em causa própria; não houve condenação ao pagamento de custas. Logo, preenchidos os pressupostos genéricos de admissibilidade, passo ao exame dos específicos previstos no artigo 896 da CLT. 1.1. AÇÃO DE COBRANÇA DE HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. INCOMPETÊNCIA DA JUSTIÇA DO TRABALHO . O TRT da 4ª Região negou provimento ao recurso ordinário do Reclamante, mantida a sentença pela qual a Vara do Trabalho declarou a incompetência da Justiça do Trabalho para processar e julgar a ação. Fundamenta-se em que (fls.401-404): (http://www.jus.com.br)
Neste julgado a sentença declarou a incompetência da Justiça Trabalhista para processar e julgar a ação, ao fundamento de que “a prestação de serviços de advocacia constitui-se em relação jurídica de consumo, que não integra a ampliação da competência da Justiça do Trabalho decorrente da alteração do art.114 da Constituição Federal de 1988, por força da Emenda Constitucional nº 45, de dezembro de 2004”. Logo mais apreciaremos uma decisão contrária demonstrando assim a discordância nos tribunais brasileiros no que tange a relação entre cliente e advogado no direito consumerista.
Superior Tribunal de Justiça RECURSO ESPECIAL Nº 532.377 - RJ (2003/0083527-1) EMENTA
PROCESSO CIVIL. AÇÃO DE CONHECIMENTO PROPOSTA POR DETENTOR DE TÍTULO EXECUTIVO. ADMISSIBILIDADE. PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS ADVOCATÍCIOS.
INAPLICABILIDADE DO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR.
O detentor de título executivo extrajudicial tem interesse para cobrá-lo pela via ordinária, o que enseja até situação menos gravosa para o devedor, pois dispensada a penhora, além de sua defesa poder ser exercida com maior amplitude. Não há relação de consumo nos serviços prestados por advogados, seja por incidência de norma específica, no caso a Lei n° 8.906/94, seja por não ser atividade fornecida no mercado de consumo. As prerrogativas e obrigações impostas aos advogados - como, v. g., a necessidade de manter sua independência em qualquer circunstância e a vedação à captação de causas ou à utilização de agenciador (arts. 31/ § 1° e 34/III e IV, da Lei n° 8.906/94) - evidenciam natureza incompatível com a atividade de consumo. Recurso não conhecido. (http://www.jus.com.br)
Como podemos observar o direito contemporâneo traz uma disposição um tanto quanto polêmica sobre a aplicabilidade da relação consumerista ao exercício da advocacia, havendo posições heterogêneas não só jurisprudenciais como também doutrinárias acerca dessa discussão. Por conseguinte o doutrinador Sérgio Cavalieri Filho defende que (...) “O Advogado, não há dúvida, é um prestador de serviços aos seus clientes, pelo que submete-se também aos princípios do Código de Defesa do Consumidor, principalmente o da boa fé (objetiva), da informação, da transparência e do sigilo profissional”. (CAVALIERI FILHO 2012, p.431). Diversamente a Advogada e Conselheira Federal da OAB Gisela Gondim Ramos afirma “entre advogado e cliente, não se estabelece uma relação de consumo, seja porque a advocacia constitui-se um múnus público, disciplinada por lei especial, seja porque, em última análise, não encontramos nela os elementos subjetivos e objetivos capazes de inseri-la no mercado de consumo”.
Nas decisões dos julgados expostos acima constatamos que enquanto o relator Aloysio Corrêa da Veiga nega procedência a um recurso sob o fundamento de que a competência é da justiça comum, entendendo ser de consumo a relação entre cliente e advogado, incorrendo, portanto nas implicações previstas no CDC, o Superior Tribunal de Justiça delibera pela inaplicabilidade do Código de Defesa do Consumidor ao julgamento de recurso especial interposto em face de um advogado.
O relator Cesar Asfor Rocha prisma pela independência do exercício da advocacia, embora sendo o operador do direito um profissional liberal, o mesmo não é regido pelo CDC, uma vez que não há mercantilismo na advocacia, conforme preleciona o artigo 16 do Estatuto da Advocacia e da OAB, não estando à mesma disponível no mercado de consumo, sendo disciplinada por legislação especial, haja vista a Lei 8.906/94 (Estatuto da Advocacia e da OAB). Logo é inegável que compete privativamente à Ordem dos Advogados do Brasil o controle para disciplinar o exercício da advocacia no país, englobando a relação entre cliente e advogado.
É bem verdade que os atos e deveres dos profissionais do direito devem ser pautados nos mandamentos e formalidades estabelecidos no Estatuto da Advocacia e da OAB e no Código de Ética e Disciplina, sendo assim, subentende-se que suas condutas são fundamentadas nos princípios éticos e morais com fulcro art. 33 do Estatuto da Advocacia e da OAB. in verbis.“O advogado obriga-se a cumprir rigorosamente os deveres consignados no Código de Ética e Disciplina”.
Parágrafo Único: O Código de Ética e Disciplina regula os deveres do advogado para com a comunidade, o cliente, o outro profissional e, ainda, a publicidade, a recusa do patrocínio, o dever de assistência jurídica, o dever geral de urbanidade e os respectivos procedimentos disciplinares.
Cavalieri Filho (2012, p. 430) afirma em sua doutrina que (...) “O artigo 133 da Constituição Federal de 1988 assegura a inviolabilidade pelos atos e manifestações do advogado, nos limites da lei. Mas em contrapartida, deve responder pelos seus atos quando violadores de deveres profissionais”.
Ocorre que porventura num momento posterior, a conduta do advogado pode se mostrar diferentemente da que lhe é exigida, vindo a causar um dano ao seu cliente. Neste caso é indubitável que o profissional da advocacia deverá ser responsabilizado pelos prejuízos provocados ao seu cliente. Ficando comprovada a má fé do causídico, este poderá responder nos termos dos artigos 16, 17 e 18 do Código de Processo Civil, podendo responsabilizar-se não apenas disciplinar e civilmente como também na esfera penal dependendo da gravidade do seu ato e a extensão do dano causado, como aduz o art. 944 do Código Civil brasileiro: “A indenização mede-se pela extensão do dano”. Destarte o autor Roberto Gonçalves afirma que: (...) “O advogado deve ser diligente e atento, não deixando perecer o direito do cliente por falta de medidas ou omissão de providências acauteladoras” (GONÇALVES 2012, p.273).
Gonçalves (2012, p.274) também destaca em sua doutrina que o advogado não será responsabilizado civilmente por um erro ínfimo no curso do processo, ou seja, não é qualquer erro que motivará uma ação de ressarcimento por perdas e danos concatenada com a teoria da perda de uma chance. Não obstante deverá ser cabalmente comprovada a inépcia e a irresponsabilidade do advogado como nexo causal ao dano provocado. Em sua doutrina o autor ainda afirma que: (...) “O advogado não pode ser responsabilizado civilmente pelos eventuais conselhos que deu, convicta e honestamente, ao seu cliente, só porque não houve sucesso na ação que em seguida propôs, mas perdeu” (GONÇALVES 2012, p. 274).
Isto posto, fica claro que sendo a responsabilidade civil do profissional liberal de natureza subjetiva, condizendo assim também ao profissional do direito, é fundamental que seja apurado pelo magistrado se há um nexo de causalidade entre a conduta do advogado e o possível dano suportado pelo cliente. É curial assinalar que na sociedade jurídica contemporânea os profissionais do direito associam-se a empresas prestadoras de serviços advocatícios, formando assim as sociedades de advogados, Como bem menciona o art. 17 do Estatuto da Advocacia e da OAB, in verbis.
Art. 17 “Além da sociedade, o sócio responde subsidiária e ilimitadamente pelos danos causados aos clientes por ação ou omissão no exercício da advocacia, sem prejuízo da responsabilidade disciplinar em que possa incorrer”.
Desta forma, os danos causados corolário a má atuação do advogado deriva de uma responsabilidade subsidiária estendendo-se à pessoa jurídica para a qual presta serviços, e atingindo os demais sócios, cabendo ação de regresso contra o causador do dano, se assim previsto em cláusula contratual. Neste sentido Cavalieri Filho (2012, p.431) esclarece que:
(...) a responsabilidade do advogado é contratual, salvo quando atua com vínculo empregatício (advogado de empresa), ou como defensor público ou procurador de entidades públicas (Estado, Município, autarquia, advogado da União etc.), casos em que, pelos danos causados, responderá a pessoa jurídica de Direito Público ou Privado em nome da qual atua. (CAVALIERI FILHO 2012, p.431).
Ao firmar um mandato judicial para figurar como representante de um cliente o advogado assume a responsabilidade civil de natureza contratual, uma vez que o mandato é uma das formas de contrato previstas no Código Civil brasileiro de 2002, como aduz o art. 653 in verbis.“Opera-se o mandato quando alguém recebe de outrem poderes para, em seu nome, praticar atos ou administrar interesses. A procuração é o instrumento do mandato”.
Segundo o autor Carlos Roberto Gonçalves a responsabilidade imputada ao advogado é puramente contratual, o autor chega a comparar em sua doutrina a responsabilidade civil do advogado com a responsabilidade do médico, afirmando que o advogado não assume a obrigação de sair vitorioso na causa. Contudo, responde pelos erros de fato e de direito praticados no exercício do mandato. Enfatizando o mesmo entendimento a professora Maria Helena Diniz (2004, p.284) assevera que: (...) “será contratual, pois aos profissionais liberais ou manuais se aplicam as noções de obrigação de meio e de resultado, que partem de um contrato”.
Desta forma sendo o mandato um contrato que requer a manifestação consensual e bilateral de vontade, vem a demonstrar uma ideia de confiança, ou seja, o objetivo central do mandato judicial é que um sujeito confia a outro a realização de um ato em prol de interesses mútuos, conferindo assim um dever ao advogado.
As obrigações atribuídas ao advogado no exercício da advocacia são consideradas obrigações de meio e não de resultado, suas obrigações contratuais consistem em defender as partes em juízo e dar-lhes conselhos profissionais. O advogado deve representar o cliente em juízo defendendo pela melhor forma possível os interesses que este lhe confiou conforme estabelece o art. 2º, § 2ª, da Lei 8906/94 (Estatuto da Advocacia e da OAB) in verbis. “O advogado é indispensável à administração da justiça”. §2º EAOAB “no processo judicial, o advogado contribui, na postulação de decisão favorável ao seu constituinte, ao convencimento do julgador, e seus atos constituem múnus público”.
O advogado não será responsabilizado uma vez que os meios de defesa por ele utilizados poderão ser sustentados judicialmente, ainda que o resultado da causa não seja positivo, pois a obrigação do causídico consiste em postular dentro dos parâmetros estabelecidos pelo judiciário. (GONÇALVES 2012, p.275). Salienta-se que o advogado só será responsabilizado caso fuja da sua obrigação, nos moldes do art.389 do Código Civil, in verbis. “Não cumprida a obrigação, responde o devedor por perdas e danos, mais juros e atualização monetária segundo índices oficiais regularmente estabelecidos, e honorários de advogado”.
O artigo citado acima é patente ao declarar que caso haja inexecução desse compromisso pelo advogado, responderá este por perdas e danos ocasionados ao cliente, da mesma maneira como sucede com qualquer obrigação contratual.
A TEORIA DA PERDA DE UMA CHANCE
A perda de uma chance é uma teoria de origem francesa aplicada pela primeira vez na década de 60 com o objetivo de dirimir situações que envolviam erros médicos, sendo propagada na Itália e posteriormente aplicada por toda a Europa. Nesse contexto Sérgio Savi (2012, p.4) estabelece que: “Os julgados franceses e a discussão doutrinária neste país fomentaram questionamentos acerca da teoria da responsabilidade civil por perda de uma chance em outros países da Europa”.
No Brasil essa teoria surgiu na década de 90 através de uma conferência no Rio Grande do Sul, ministrada pelo professor François Chabas, um grande estudioso francês da presente teoria. Desde então a teoria da perda de uma chance vem sendo objeto de inúmeras divergências e discussões no poder judiciário brasileiro. Sem dúvidas a aplicabilidade da teoria da perda de uma chance no ordenamento jurídico europeu, de certa forma influenciou a adoção dessa teoria nos tribunais brasileiros. Contudo antes de analisarmos os diversos entendimentos doutrinários acerca deste assunto, buscaremos um amplo conceito da perda de uma chance no âmbito jurídico.
Considera-se perda de uma chance a possibilidade séria e real, porém fracassada por um erro notório, por parte de um agente, cuja obrigação de meio deixou de cumprir, consequentemente provocando o insucesso da demanda. Como bem expõe o doutrinador Sérgio Savi conceitua a perda de uma chance como: “Perda da oportunidade sofrida pelo cliente, suscitada pelo profissional do direito, de ver examinada em juízo uma pretensão, ou de ver reformada em seu favor uma decisão judicial, que lhe foi desfavorável e contra a qual ainda cabia recurso” (SÉRGIO SAVI 2012, p.35). Diante do conceito explícito, considera-se que a Responsabilidade Civil pela Perda de uma Chance consiste na possibilidade de reparar a perda dessa chance, em outras palavras, o ressarcimento pela perda da oportunidade de conquistar uma determinada vantagem ou evitar certo prejuízo.
Cavalieri Filho (2012, p. 81) caracteriza essa perda de uma chance quando, “em virtude da conduta de outrem, desaparece a probabilidade de um evento que possibilitaria um benefício futuro para a vítima”. Ressalta-se que o propósito fundamental dessa teoria é a obrigação legal que cada um tem de reparar os prejuízos decorrentes de seus atos em face de terceiros, com fulcro nos artigos 186 e 927 do Código Civil brasileiro. Acerca da teoria da responsabilidade civil por perda de uma chance o ilustre autor Cavalieri Filho sustenta que:
“Caracteriza-se essa perda de uma chance quando, em virtude da conduta de outrem, desaparece a probabilidade de um evento que possibilitaria um beneficio futura para a vítima, como progredir na carreira artística ou militar, arrumar um melhor emprego, deixar de recorrer de uma sentença desfavorável pela falha do advogado, e assim por diante. Deve-se, pois, entender por chance a probabilidade de se obter um lucro ou de se evitar uma perda”. (CAVALIERI FILHO, 2008 p. 75)
Vale ressaltar que a perda de uma chance possui todos os pressupostos para a configuração da responsabilidade civil, sendo eles a conduta, o dano ou prejuízo e o nexo causal. Todavia sendo a responsabilidade civil do advogado de natureza subjetiva, faz-se necessário a comprovação da sua culpa. Por outro lado, o causídico não se responsabilizará pela perda da oportunidade se provar que o prejuízo ocorreria ao cliente ainda que houvesse agido de outra forma, isto é, cumprido as obrigações contratuais necessárias para o bom andamento da demanda.
A responsabilidade civil do advogado pela perda de uma chance é razão de inúmeras demandas no Poder Judiciário, trata-se de um tema ainda novo, mas que encontra amparo na doutrina e na jurisprudência pátria, e vem ganhando aplicabilidade pelos tribunais brasileiros, sendo assim uma nova tendência e um avanço no Instituto da Responsabilidade Civil. Os artigos 186 e 927 ambos do Código Civil determinam que:
Art. 186 “Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito”.
Art. 927. “Aquele que, por ato ilícito (arts. 186 e 187), causar dano a outrem, fica obrigado a repará-lo”.
É notório que a responsabilização pela perda de uma chance se difere das circunstâncias reais de perdas e danos, visto que esta última caracteriza-se pelos danos e perdas efetivamente causados a vítima. Já a perda de uma chance, não se sabe verdadeiramente a probabilidade do resultado de uma demanda judicial ter sido diferente do alcançado. Sendo assim a chance perdida para configurar em perdas e danos deve ser considerada séria a real, ou seja, quando a probabilidade de obtenção da vantagem esperada for superior a 50% (cinquenta por cento). Neste contexto o autor Rafael Peteffi da Silva declara em sua doutrina:
A teoria da perda de uma chance encontra o seu limite no caráter de certeza que deve apresentar o dano reparável. Assim, para que a demanda do réu seja digna de procedência, a chance por este perdida deve representar muito mais do que uma simples esperança subjetiva. (PETEFFI 2009, p.138).
Quanto à natureza jurídica do dano na perda de uma chance, primeiramente analisando as disposições constitucionais, destaca-se o princípio da dignidade da pessoa humana que deve ser observado sempre que alguém causar qualquer tipo de dano injusto a outrem. A teoria da perda de uma chance ainda é considerada um tema relativamente novo na doutrina e na jurisprudência, e apesar da sua aplicabilidade nos tribunais brasileiros, ainda não há um entendimento pacífico, principalmente no que concerne a natureza do dano causado em decorrência da perda de uma chance.
Apesar das várias decisões favoráveis reconhecendo a perda de uma chance ainda há que se observar uma celeuma em torno da natureza jurídica do dano causado a vítima. Há duas correntes doutrinárias, uma que defende ser patrimonial o dano causado decorrente da perda de uma chance, enquadrando-se aos lucros cessantes, portanto (...) “deve-se, pois, entender por chance a probabilidade de se obter um lucro ou de se evitar uma perda”. (CAVALIERI 2012, p.81) Uma segunda corrente sustenta ser um dano moral, ou seja, de cunho extrapatrimonial. O autor ainda acrescenta que:
Há forte corrente doutrinária que coloca a perda de uma chance como terceiro gênero de indenização, a meio caminho entre o dano emergente e o lucro cessante. Entre um extremo e outro caberia uma graduação, que deverá ser feita em cada caso, com critério equitativo e distinguindo a mera possibilidade da probabilidade. (CAVALIERI FILHO2012, p. 84).
De qualquer forma, é certo que a indenização deve ser pautada na própria chance perdida, e não na perda ou lucro que consequentemente dela era objeto, pois passível de reparação é a perda da chance de ter obtido um resultado vitorioso, e não a vantagem que traria esse resultado. Tal discordância ainda persiste nos tribunais brasileiros como podemos observar o entendimento do julgado a seguir.
Julgado de 2003 do Tribunal de Justiça do Rio deJaneiro (TJRJ, Apelação Cível nº 2003.001019138, 14ª Câmara Cível, Rel. Des. Ferdinaldo do Nascimento. J.em 7/10/2003) quando do julgamento da responsabilidade civil do advogado, está ementado da seguinte forma:
MANDATO. RESPONSABILIDADE CIVIL DO ADVOGADO. INDENIZAÇÃO POR DANOS CAUSADOS EM VIRTUDE DE PERDA DE PRAZO. DANOS MORAIS JULGADOS PROCEDENTES. A responsabilidade do advogado é contratual e decorre especificamente do mandato. Erros crassos como a perda de prazo para contestar, recorrer, fazer preparo do recurso ou pleitear alguma diligência são evidenciáveis objetivamente. Conjunto probatório contrário à tese do Apelante. É certo que o fato de ter o advogado perdido a oportunidade de recorrer em consequência da perda de prazo caracteriza a negligencia profissional. Da análise quanto à existência do nexo de causalidade entre a conduta do Apelante e o resultado prejudicial à Apelada resta evidente que a parte autora da ação teve cerceado o seu direito de ver apreciado o seu recurso à sentença que julgou procedente a reclamação trabalhista, pelo ato do seu mandatário, o qual se comprometera ao seu fiel cumprimento, inserido que está, no elenco de deveres e obrigações do advogado, aquele de interpor recurso à sentença contra a qual irresignou-se o mandante. Houve para a Apelada a perda de uma chance, e nisso reside o seu prejuízo. Estabelecida a certeza de que houve negligência do mandatário, o nexo de causalidade e estabelecido o resultado prejudicial demonstrado está o dano moral. RECURSO CONHECIDO E IMPROVIDO. (RIODE JANEIRO, 2003). (http://www.jus.com.br)
O julgado descrito acima dispõe que o fracasso de uma demanda cuja expectativa séria e real representa o aumento do patrimônio de alguém, deve ser declarado como dano moral. Entretanto, podemos encontrar no direito brasileiro outros julgados reconhecendo que a frustração dessa oportunidade pode gerar danos materiais.
Para Sérgio Savi o tema do presente estudo vem ganhando um espaço bastante amplo na doutrina, tanto é que o autor afirma “até a primeira publicação de seu livro no ano de 2006, a responsabilidade civil pela perda de uma chance não havia sido objeto de análise pelos estudiosos do direito civil em nosso país”. (SAVI, 2012, p.35). No entanto ao ser realizada uma pesquisa para o presente trabalho, podemos constatar que essa realidade é bem diferente nos dias atuais. Ratificando este entendimento afirma o autor Rafael Peteffi (2009, p.231) “A doutrina e a jurisprudência são unânimes em afirmar que o dano, para ser passível de reparação, deve ser certo”. O tema vem ganhando popularidade entre os juristas e acadêmicos de direito, ao passo que encontramos vários trabalhos publicados acerca das decisões judiciais abordando o objeto do nosso estudo.
O POSICIONAMENTO DOS TRIBUNAIS SOBRE A RESPONSABILIDADE CIVIL DO ADVOGADO PELA PERDA DE UMA CHANCE
A pesquisa jurisprudencial aponta as crescentes demandas acerca da responsabilidade civil do advogado pela perda de uma chance, ao passo que o autor Rafael Peteffi afirma que:
Pela farta jurisprudência relacionadas nas seções anteriores, mesmo que se leve em conta o fato de alguns tribunais brasileiros desconhecerem a teoria da perda de uma chance, observa-se que alguns tribunais pátrios ultrapassaram qualquer possível barreira sistemática, aplicando a teoria da perda de uma chance aos mais variados casos. (PETEFFI 2009, p.233).
De fato já se faz presente decisões sobre o tema em quase todos os tribunais brasileiros. Vejamos a seguir alguns julgados:
Responsabilidade Civil - Advogado - Negligência na atuação profissional. Caracterização. Ação trabalhista proposta só após o decurso do prazo de prescrição. Impossibilidade, entretanto, de avaliar o direito do reclamante. Indenização pela perda da chance de ver o pleito examinado pelo Judiciário.
Modalidade de dano moral. Recurso provido para julgar procedente a ação (1º TACIVIL - 8ª C.; Ap. n.º 680.655-1 Martinópolis; Rel. Juiz José Araldo daCostaTeles;j.23.10.1996).
Responsabilidade civil. Patrocínio de causa trabalhista por advogado que permite ser decretada prescrição. Dever de indenizar o cliente. Há reciprocidade de culpas se o cliente, a seu turno, não entrega toda a documentação exigida. 1. O fato, só por si, de o cliente não ter entregado toda a documentação pedida pela advogada, não a exime também de responsabilidade em face da prescrição ocorrida, porque a prova documental poderia ter sido complementada durante a instrução, sendo certo que o direito processual civil é fonte subsidiaria do direito trabalhista, não tendo, ademais, a causídica avisado seu cliente da possibilidade de ver sua ação prescrita. Reconhece-se a culpa recíproca, mas condena-se a advogada a pagar indenização apenas por dano moral, em face da perda da expectativa de ver o autor julgada sua pretensão trabalhista. 2. Impossibilitada a condenação pelos danos materiais, de difícil fixação, uma vez que não se pode afirmar que o autor viesse a ganhar a ação trabalhista, fixa-se o valor do dano moral em 50 s.m. vigentes à época do pagamento e se aplica a regra do art. 21, processual, quanto à sucumbência (TJRJ-Ap. Cív. 3933 /95 - Reg. 01/11/95 - Fls. 28667/28673 - Unân. - DES. GUSTAVO KUHL LEITE - Julg:15/08/95). (http://www.jus.com.br)
O voto do relator no julgado acima deixa claro o entendimento do dano moral como conceito de dano na perda de uma chance. Salienta-se que uma das situações mais recorrentes a perda de uma chance é a inércia do advogado na propositura de ação judicial, e a consequência disso é a prescrição ou decadência do direito do cliente. Ocorre que caso o cliente comprove a contratação do profissional bem como a disponibilidade de toda a documentação necessária para a demanda, no prazo tempestivo, restará evidente a desídia do mandatário, sendo tal conduta passível de uma indenização pautada na teoria da perda de uma chance.
MANDATO” - INDENIZAÇÃO - DANO MATERIAL - ADVOGADO - PERDADE PRAZO PARA COMPLEMENTAÇÃO DE PREPARO DE APELAÇÃO-HIPÓTESE DE PERDA DE UMA CHANCE PARA O CLIENTE-CARACTERIZAÇÃO DE DANO MORAL - DESACOLHIMENTO NASENTENÇA - INTERPOSIÇÃO DE APELAÇÃO - AUSÊNCIA -DESCABIMENTO
A negligência do advogado ao não providenciar a complementação do preparo teve como consequência a decretação de deserção do recurso, impedindo que em segunda instância fosse apreciado o apelo. É esta a chance que foi perdida, não os valores decorrentes da condenação. Descabe, sob este aspecto, a indenização por dano material. “Por outro lado, caberia indenização de ordem moral, que foi negada em primeiro grau, mas contra a qual não houve interposição de recurso, não podendo ser reapreciada” (Segundo Tribunal de Alçada Civil de São Paulo, Ap. c/ Rev.688.509-00/9 - 12ª Câm. - Rel. Juiz JAYME QUEIROZ LOPES - J. 18.11.2004).
(http://www.flaviotartuce.adv.br)
Não há que se olvidar que a cada dia os tribunais brasileiros recebem ações relacionadas à responsabilidade civil do advogado pela perda de uma chance, tema de estudo que vem ganhando espaço amplo também na doutrina. Peteffi ainda reitera que:
“a aceitação da perda de uma chance como uma espécie de dano certo aparece como o caminho que o direito nacional segue e continuará a seguir, eis que, no ordenamento brasileiro não se encontra qualquer dispositivo que possa tornar-se um óbice para a aplicação da teoria da perda de uma chance. Também se acredita que as propostas sobre a quantificação do dano, bem como as diferenciações em relação a modalidades de responsabilidade pela criação de riscos, estão em total conformidade”. (PETEFFI 2009, p. 233).
Não obstante, sendo embasada em diversos fundamentos, a perda da chance é adotada com uma única função, a de reparar um dano causado à vítima, seja considerado patrimonial ou extrapatrimonial, é certo que os resultados das demandas judiciais demonstram claramente a aplicabilidade da teoria da perda de uma chance nos tribunais brasileiros. Seguem ementas de julgados que reafirmam esse entendimento.
"MANDATO - INDENIZAÇÃO - DANO MORAL - ADVOGADO - AJUIZAMENTO INTEMPESTIVO DE AÇÃO TRABALHISTA PARA A QUAL HAVIA SIDO CONTRATADO - HIPÓTESE DE PERDA DE UMA CHANCE PARA O CLIENTE - DESÍDIA PROFISSIONAL -CARACTERIZAÇÃO - CABIMENTO. Advogado que, contratado para ajuizar reclamação trabalhista, não o faz a tempo, causando ao seu contratante a perda da chance de que seu pleito fosse conhecido, responde pelo prejuízo moral decorrente de sua conduta desidiosa" (Segundo Tribunal de Alçada Civil de São Paulo. Ap. c/ Rev. 648.037-00/9 - 5ª Câm. - Rel. Juiz DYRCEU CINTRA - J. 11.12.2002. SOBRE O TEMA: FONTE: Ap. c/ Rev. 606.170-00/5 - 5ª Câm. - Rel. Juiz LUÍS DE CARVALHO - J. 31.10.2001, com as seguintes referências: SAVATIER - "La Responsabilité Civile", 2éme ed., tomo II, Paris, 1951, pág. 8, nº 460 MAZEAUD - "Leçons de Droit Civil", 4ª ed. preparada por MICHEL DE JUGLARD, tomo II, pág. 351, nº 412 YVES CHARTIER - "La Réparation de Préjudice", Dalloz, 1983, pág. 31, nº 22 e 23 SÉRGIO SEVERO - "Os Danos Extrapatrimoniais", Saraiva, 1996,págs.11esegs.
ANTONIO JEOVÁ SANTOS - "Dano Moral Indenizável", Lejus, 2ª ed., pág. 110, nº 20.2. ANOTAÇÃO No mesmo sentido: Ap. c/ Rev. 606.170-00/5 - JTA (LEX) 192/576) (http://www.flaviotartuce.adv.br)
As decisões dos julgados acima demonstram claramente a pluralidade de entendimentos resultantes das demandas que tratam da perda de uma chance, evidenciando as divergências no que toca a natureza jurídica do dano na perda de uma chance. “Atualmente, uma simples chance possui valor pecuniário, assim como a perda desta mesma chance pode acarretar prejuízo extrapatrimonial”. (PETEFFI 2009, p. 232). Enquanto a 12ª Câmara do segundo tribunal da alçada cível do estado de São Paulo entende ser o dano de cunho material, atingindo o patrimônio material do cliente, a 5ª Câmara deste mesmo tribunal decide ser o dano pela perda de uma chance de caráter moral com fundamento na conduta desidiosa do advogado para com o seu cliente, caracterizando um dano extrapatrimonial.
CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO NO RECURSO ESPECIAL. RECEBIMENTO COM AGRAVO REGIMENTAL. RESPONSABILIDADE CIVIL. DANOS MORAIS. CONDUTA OMISSIVA E CULPOSA DO ADVOGADO. TEORIA DA PERDA DE UMA CHANCE. RAZOABILIDADE DO VALOR ARBITRADO. DECISÃO MANTIDA. 1. Responsabilidade civil do advogado, diante de conduta omissiva e culposa, pela impetração de mandado de segurança fora do prazo e sem instrui-lo com os documentos necessários, frustrando a possibilidade da cliente, aprovada em concurso público, de ser nomeada ao cargo pretendido. Aplicação da teoria da "perda de uma chance”. 2. Valor da indenização por danos morais decorrentes da perda de uma chance que atende aos princípios da razoabilidade e da proporcionalidade, tendo em vista os objetivos da reparação civil. Inviável o reexame em recurso especial. 3. Embargos de declaração recebidos como agravo regimental, a que se nega provimento.
(1321606 MS 2011/0237328-0, Relator: Ministro ANTONIO CARLOS FERREIRA, Data de Julgamento: 23/04/2013, T4 - QUARTA TURMA Data de Publicação: DJe 08/05/2013) (http://www.jus.com.br)
Analisando a decisão proferida no julgado descrito acima, observa-se que o quantum debeatur arbitrado ao dano pela perda da chance foi pautado nos princípios da razoabilidade e da proporcionalidade.
MANDATO - INDENIZAÇÃO - ADVOGADO - DANO MORAL - CONDUTA CULPOSA NA DEFESA DE DIREITOS DO CLIENTE - ATRASO DO ADVOGADO SEM MOTIVO JUSTIFICÁVEL EM AUDIÊNCIA DE INSTRUÇÃO - REVELIA E CONFISSÃO - OCORRÊNCIA - DANO MATERIAL - REMUNERAÇÃO INDEVIDA - OBRIGAÇÃO DE MEIO E NÃO DE RESULTADO - NEGLIGÊNCIA DO PATRONO QUE MOTIVA A PERDA DE UMA CHANCE - RESSARCIMENTO APENAS DO DANO MORAL - CABIMENTO. O atraso do advogado, sem motivo justificável, em audiência de instrução, determinando revelia e confissão, caracteriza falta grave, nos termos do artigo 34, inciso IX, do Estatuto da Advocacia e da Ordem dos Advogados do Brasil. Não é matematicamente certo que, se fosse diligente e cuidadoso o advogado, a autora sairia integralmente vencedora nas ações, sem condenação alguma. A obrigação do advogado é de meio, não de resultado. A negligência do advogado inviabilizou a chance de vencer as demandas e nada ser pago. É esta chance que foi perdida, não os valores decorrentes das condenações nas reclamações trabalhistas. Por isso, a indenização passível de ser cogitada é apenas de natureza moral" (Segundo Tribunal de Alçada Civil de São Paulo, Ap. c/ Rev. 620.806-00/0 - 3ª Câm. - Rel. Juiz FERRAZ FELISARDO - J. 25.6.2002. SOBRE O TEMA: FONTE: Ap. c/ Rev. 620.806-00/0 - 3ª Câm. - Rel. Juiz FERRAZ FELISARDO - J. 25.6.2002, com as seguintes referências: Artigo 844 da CLT VALENTIN CARRION -"Comentários à Consolidação das Leis do Trabalho", pág. 656 TST - RR 96.894/93.2 - Vantuil Abdala, Ac. 2ª T. 2.621/95 SAVATIER - "La responsabilité Civile", 2éme ed., t. II, Paris, 1951, nº 460 e 461, pág. 8) (http://www.jus.com.br)
O Relator Ferraz Felisardo ao julgar o recurso descrito acima fundamenta sua decisão alegando que, embora a obrigação imputada ao advogado seja de meio e não de resultado, não se pode provar que caso o causídico agisse de forma diligente e cautelosa alcançaria um resultado positivo na ação por ele proposta. Portanto a chance perdida em seu entendimento possui a natureza de um dano moral, uma vez que a displicência do advogado impossibilitou a chance de vencer as demandas.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Atualmente vivemos numa sociedade que reflete diversos conflitos, sejam eles sociais, religiosos, sexuais, culturais dentre outros. De modo que não nos surpreende a quantidade de demandas aglomeradas no poder judiciário. Ocorre que diante de tantos litígios judiciais ainda há os casos em que uma pessoa se vê privada da chance de obter determinada vantagem ou evitar um prejuízo, devido à negligência, ou até imperícia de um procurador. Acontece que atualmente a perda de uma chance desde que séria e real é examinada a título de efetiva e emergente lesão a uma perspectiva sujeita a indenização.
Com a constitucionalização do direito civil e a evolução do Instituto da Responsabilidade Civil, objetivando solucionar alguns litígios que versam sobre as perdas e danos causados pelos advogados ao patrimônio dos clientes, bem como a proteção dos interesses jurídicos da vítima, a doutrina e a jurisprudência adotou a aplicabilidade da Teoria Francesa “Perda de uma Chance”. Independentemente do resultado final, é possível presumir um dano passível de indenização. Para tanto, deve-se tratar de uma possibilidade de indenizar alguém por uma oportunidade perdida, sempre que considerada atual, séria e real a obtenção de certa vantagem.
Conferimos que a indenização prevista não é concedida pela vantagem perdida, e sim pela perda da oportunidade em conseguir esta vantagem, em que talvez houvesse logrado êxito, pois a reparação pela perda de uma chance não tem fundamento na certeza e sim na probabilidade de uma vantagem perdida, que de acordo com a doutrina em estudo deve ser de 50% para ser passível de reparação. Destaca-se ainda que na apreciação da perda de uma chance não se discute os lucros cessantes que porventura a vítima deixou de obter, e sim um dano emergente, iminente e atual que atinge a vítima no exato momento em que ela vê frustrada a sua única e talvez última chance de alcançar uma vitória ou até mesmo evitar um prejuízo que venha a diminuir o seu patrimônio jurídico.
De certa forma há uma coerência no que tange ao entendimento da perda da chance ser considerada um dano de natureza patrimonial, pois quando a perda dessa chance acarreta um prejuízo que de fato poderia ter sido evitado, este dano recai sob o patrimônio jurídico da vítima. Em contrapartida merece respeito o juízo que acata a perda da chance como dano extrapatrimonial, pois quanto não provoca um prejuízo, o dano pode se originar pela frustração de uma vantagem perdida, caracterizando um dano irreparável, não sendo possível retornar a vítima ao seu antigo status.
Concluímos que a relação entre o patrono e o cliente é de natureza contratual. Assim sendo o operador do direito deve responder pelos prejuízos causados ao patrimônio jurídico do cliente, por erros cometidos no desempenho de seu mandato, desde que reste comprovado que o mesmo agiu com dolo ou culpa, deixando de cumprir obrigação a que se vinculou. Também se faz necessário que o cliente demonstre o nexo de causalidade entre o dano suportado e a falha cometida pelo patrono.
Entende-se que assim como o Ordenamento Jurídico europeu, o Ordenamento Jurídico brasileiro foi muito feliz ao adotar a teoria da perda de uma chance, uma vez que o Código Civil dispõe favoravelmente a indenização dos danos emergentes, objeto de estudo ao qual se engloba o dano causado pela perda de uma chance, respeitando também o princípio da reparação integral dos danos inserido na legislação cível aplicável.