O que acontece com os bens de uma pessoa que sumiu? Entenda:


17/09/2020 às 10h58
Por Thayna Martins

Uma pessoa que desaparece deixa de existir civilmente?

 

Dispõe o artigo 6º, CC, que a existência da pessoa natural se finaliza com a morte, seja ela real (mediante o óbito comprovado), ou de forma presumida (através de decisão judicial).

A morte presumida tem duas hipóteses de ocorrência: com a declaração de ausência ou sem a declaração de ausência.

No último caso, o juiz declara presumidamente a morte da pessoa, se for extremamente provável que veio a falecer, diante das circunstâncias fáticas do caso (art. 7º, CC). É claro que a sentença judicial declaratória somente ocorrerá após o esgotamento de todas as buscas e investigações acerca do desaparecimento da pessoa.

Já no caso de declaração de ausência, o CC prevê um procedimento específico a ser seguido até, finalmente, a decretação da morte presumida daquele que desapareceu. Ocorre da seguinte forma:

Uma pessoa desaparece de seu domicílio sem deixar notícias. Assim, qualquer interessado (e somente neste caso, o CC não estabelece quem são os interessados), ou o Ministério Público, requererá, perante a autoridade judiciária, a declaração de ausência e a nomeação de curador para os bens deixados. O juiz analisará o contexto, e verificando a veracidade do sumiço da pessoa, e ainda, verificando que o ausente não deixou procurador ou mandatário com poderes suficientes para representar-lhe, deferirá o pedido do interessado.

 

O que acontece após a declaração judicial de ausência da pessoa?

Com a declaração da ausência e a nomeação do curador, o juiz procederá a arrecadação dos bens, que ficarão nesta condição por, pelo menos, um ano.

Quem pode ser curador?

A Lei estabelece uma ordem de preferência para a escolha do curador:

1º cônjuge do ausente (desde que não esteja separado judicialmente, ou de fato há pelo menos 2 anos);

2º os pais do ausente;

3º os descendentes (mais próximos possíveis).

Apenas na falta dessas pessoas preferenciais, o juiz nomeará livremente alguém para ser o curador.

Passado um ano da arrecadação dos bens, ou três anos da ausência daquele que tinha deixado um procurador/mandatário, poderá ser requerida a abertura da sucessão provisória, que é a segunda fase do procedimento de declaração de ausência.

Apenas o cônjuge, os herdeiros, os credores, o Ministério Público, ou aqueles que tem algum direito pendente sobre os bens do ausente, têm legitimidade para requerer a abertura da sucessão.

Assim, o juiz decretará a abertura da sucessão provisória, e após o trânsito em julgado dessa sentença, será iniciado o inventário e a partilha dos bens, oportunidade em que o patrimônio deixado dará satisfação às dívidas deixadas pelo ao ausente. Nesta fase, o juiz abrirá o testamento, se houver, e começará a dividir os bens existentes entre aqueles que forem herdeiros e credores. No entanto, os herdeiros ainda não poderão se imitir na posse dos bens.

Apenas 180 (cento e oitenta) dias após o trânsito em julgado da sentença de sucessão provisória, é que os herdeiros finalmente terão a posse dos bens partilhados.

Todavia, há, ainda, outro requisito para que os herdeiros apossem dos bens:

Aqueles que não sejam herdeiros necessários (cônjuge, ascendente e descendente), deverão prestar uma caução no valor do bem, podendo ser por penhor ou hipoteca. Se destes bens advirem frutos, os herdeiros não-necessários são obrigados a depositar judicialmente metade do que foi capitalizado. O que quer dizer com isso?

Se, por exemplo, um sucessor testamentário recebeu uma casa de herança, no valor de R$100.000,00 (cem mil reais), deverá prestar uma garantia no mesmo valor. Se ainda, esta casa for alugada por R$500,00 (quinhentos reais) por mês, o sucessor será obrigado a recolher R$250,00 (duzentos e cinquenta reais) de cada aluguel recebido, a título de garantia.

 

E se o sucessor não possuir condições para prestar tal garantia ou recolher a metade dos frutos?

Neste caso, o herdeiro será excluído da sucessão provisória, e o seu bem que lhe foi destinado será entregue ao curador (nomeado no começo da ausência), ou a outro herdeiro que o juiz escolher, devendo, neste último caso, tal herdeiro prestar uma garantia de restituição, eis que, ao final do processo de ausência, o herdeiro hipossuficiente retomará os direitos sobre o bem que lhe foi designado.

 

E os herdeiros necessários também terão que prestar garantia?

Não, de acordo com o CC, o cônjuge, ascendente, ou descendente, poderá ter a posse do bem sem prestar garantia, e ainda, terá direito à totalidade dos rendimentos que contrair.

É importante ressaltar que os bens não poderão ser vendidos durante o processo de ausência, sem autorização judicial, mesmo após a abertura da sucessão.

 

E se a pessoa que sumiu aparecer?

Se o ausente aparecer antes da sucessão provisória, será extinto o feito e desconstituído o curador, retornando todos bens ao "ausente" da forma em que estavam. Agora, se ele aparecer após a abertura da sucessão, terá direito a reaver todos os bens e a receber metade dos frutos que estavam sendo recolhidos por seus sucessores. Mas, se ficar provado que a pessoa sumiu por vontade própria e sem justificativa plausível, perderá o direito sobre os rendimentos que foram guardados, podendo os sucessores se beneficiar desse valor.

 

E quando os sucessores terão de fato a propriedade dos bens?

Após 10 anos do trânsito em julgado da sentença de abertura da sucessão provisória, os interessados poderão requerer a sucessão definitiva, que conceder-lhe-ás o direito de propriedade sobre a herança, podendo, inclusive, aliená-la.

É aqui então que é declarada a morte presumida.

Por fim, se o ausente regressar em até 10 anos após a sucessão definitiva, terá direito aos bens da forma em que se encontrarem ou, se houverem sido substituídos neste tempo, terá direito apenas àquilo que foi colocado em seu lugar.

Todo esse processo pode ser mais célere se o ausente contava com, pelo menos, 75 anos de idade quando sumiu sem deixar notícias. No entanto, neste caso é necessário aguardar pelo menos 5 anos para abertura de sucessão definitiva e a declaração de sua morte.

Há diversas peculiaridades sobre o instituto da ausência da pessoa. Note que o Código Civil visa resguardar o máximo possível os bens do ausente, para que não sejam prejudicados ou desfeitos durante esse tempo. No entanto, a qualquer momento em que fique efetivamente provada a morte daquela pessoa que desapareceu, será aberta a sucessão em favor dos herdeiros, não havendo mais o que se falar em ausência.

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Referências

https://thaynamp1.jusbrasil.com.br/artigos/922246538/o-que-acontece-com-os-bens-de-uma-pessoa-que-sumiu-entenda


Thayna Martins

Advogado - Goiânia, GO


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