Ainda é muito comum vermos anúncios de escritórios de “advocacia”, no rádio ou na televisão, ofertando a “diminuição das parcelas do contrato de financiamento” e a “retirada do nome do consumidor de órgãos de proteção ao crédito”, ainda que tal tipo de propaganda seja vedada pela OAB.
Sabe-se que a ferramenta utilizada para “limpar o nome do consumidor” ou para “reduzir o valor das prestações mensais” é a ação revisional de contrato, sendo que o fundamento para tal ação é, em síntese, a abusividade do contrato, à luz do CDC, firmado entre o Banco/Financeira e a pessoa física.
No final dos anos 90 e início da década passada, época em que o Código de Defesa do Consumidor ainda era “jovem”, as ações revisionais de contratos de consumo, principalmente de financiamentos/empréstimos, tiveram seu ápice, sendo interpostas de forma massificada e padronizada principalmente por escritórios que se utilizavam (utilizam) da propaganda indevida.
Com o decorrer do tempo, os Tribunais pátrios, principalmente o STJ, passaram a adotar cada vez mais entendimentos favoráveis às instituições financeiras, acredita-se que para estancar o grande e crescente número de ações revisionais e cautelares que abarrotavam o judiciário. Hoje muitos consumidores, principalmente os que não possuem renda alta, ainda são atraídos pelas propagandas de serviços advocatícios realizadas em rádio/televisão e, muitas vezes, ao final não conquistam nenhum resultado útil com a demanda revisional, muito pelo contrário: se tornam devedores de uma quantia exorbitante em virtude da ausência de pagamento integral do contrato e de sua constituição em mora (estado de inadimplência).
Diante deste quadro, responde-se ao questionamento efetuado no título: vale a pena entrar com uma demanda revisional atualmente?
Depende.
O atual posicionamento consolidado do Superior Tribunal de Justiça é no sentido de que a mora do devedor tão somente é afastada se for constatada a abusividade de encargos do período da “normalidade contratual”, que são aqueles que, a grosso modo, incidem na formação e no transcurso normal (sem mora) do contrato. Na maioria dos casos são dois: juros remuneratórios e capitalização dos juros.
A capitalização dos juros nos contratos de financiamento é permitida caso haja cláusula expressa prevendo a incidência de juros capitalizados, o que atualmente é padrão na maioria dos contratos de adesão. Caso não haja a previsão expressa, há outro entendimento no sentido de ser permitida a capitalização caso a multiplicação por doze da taxa mensal de juros do contrato seja superior aos juros previstos anualmente. Assim, na prática, são raros os casos em que se consegue o afastamento da capitalização dos juros.
Os juros remuneratórios, por sua vez, somente serão considerados abusivos se forem muito discrepantes da taxa média do mercado divulgada pelo Banco Central na época da contratação. O Banco Central informa mensalmente as taxas de juros de todas as instituições financeiras que atuam no Brasil. Caso a taxa de juros do contrato seja muito superior à média cobrada naquele mês pelos Bancos, a chance de êxito na ação revisional é bastante alta.
A partir de tais elucidações, pode se dizer, a grosso modo, que a ação revisional de contrato “valerá a pena” (leia-se ‘terá maiores chances de êxito’) se os juros remuneratórios previstos no contrato forem substancialmente discrepantes da taxa média divulgada pelo BACEN à época da contratação.
A constatação de abusividade dos juros remuneratórios autoriza a concessão de uma decisão liminar na ação revisional para que o consumidor não seja inscrito em cadastros restritivos de crédito, possa depositar em Juízo os valores de acordo com a taxa de juros que entende devida e, caso se trate de financiamento de veículo, para que ele permaneça na posse do bem até o fim do processo.
E, mesmo com a procedência da ação, dependendo do número de parcelas pagas e dos valores depositados, ainda assim o consumidor pode ficar com alguma dívida ao final.
“Dr., existe a lista negra?”
Em tese as ações revisionais de contrato não tramitam em segredo de justiça, sendo que é possível consultar pelo nome em praticamente todos os Tribunais do país quais são os processos que a pessoa é parte, inclusive na busca do google pode aparecer. Então, considerando que a instituição financeira pode negar o crédito para o consumidor por sua liberalidade, não precisando sequer dar explicações para isso, existe a possibilidade, sim, de haver futura dificuldade na realização de financiamentos para aquele consumidor que já ajuizou alguma ação revisional.
Neste ponto, é importante que se entenda que nada há de ilegal na negativa de crédito pelo Banco/Financeira, pois, segundo o princípio da liberdade de contratar, nenhuma pessoa, física ou jurídica, é obrigada a firmar um contrato com quem não queira.
Portanto, a ação revisional, como qualquer outra demanda, exige uma análise minuciosa por parte do advogado acerca do contrato e uma explicação pormenorizada ao consumidor sobre os riscos e possíveis vantagens, não havendo como se prometer ao cliente que ele terá “o valor das parcelas reduzido” e que “não será inscrito em órgãos de proteção ao crédito”. Caso esteja pensando em ajuizar uma revisional, não seja atraído por promessas mágicas, busque sempre um profissional sério e da sua confiança.