Hoje irei abordar um tema de grande utilidade para os advogados que atuam na área consumerista: Pagamento indevido da Comissão de Corretagem em Contrato de Promessa de Compra e Venda de Imóvel.
O crescimento e o poder das grandes construtoras, perante todo o país, deram origem a um número imensurável de novos empreendimentos imobiliários lançados no mercado de consumo. Por consequência, as negociações de vendas de imóveis também foram elevadas.
As empresas desse ramo atentam-se mais com a lucratividade nas vendas, não investindo em uma assessoria jurídica preventiva, erguendo, cada vez mais, o número de demandas judiciais por parte dos consumidores.
Uma das práticas abusivas adotadas na comercialização daquelas unidades imobiliárias é a imposição, pela própria construtora, de “corretores” para a concretização do negócio.
Dispõe o artigo 722 do Código Civil vigente:
Art. 722. Pelo contrato de corretagem, uma pessoa, não ligada a outra em virtude de mandato, de prestação de serviços ou por qualquer relação de dependência, obriga-se a obter para a segunda um ou mais negócios, conforme as instruções recebidas.
Pela leitura de tal dispositivo, verifica-se que o contrato de corretagem somente irá existir, caso o corretor contratado (aquele quem está obrigado a obter um ou mais negócios) não tenha nenhum vínculo (mandato, prestação de serviços ou qualquer relação de dependência) com a pessoa que o contrata.
Nessa vertente, a efetiva prestação do serviço de corretagem vincula-se a uma condição: o corretor não possuir nenhuma relação de dependência com quem o contrata. Ele, de maneira independente, irá adotar medidas para que duas pessoas realizem algum negócio.
Não é o que ocorre quando os consumidores vão comprar algum imóvel novo, ou seja, que ainda esteja “na planta”: os supostos corretores já estão de plantão no “stand” de vendas (aguardando os compradores), atuando como vendedores, ou seja, pessoas ligadas à própria construtora.
Além disso, a negociação não é realizada caso as partes contratem outro corretor. Aquela acontecerá somente por “intermediação” dos corretores impostos pelas construtoras, privando o consumidor na escolha de outro profissional. Quem compra o imóvel não aufere nenhum tipo de vantagem com a suposta intermediação.
Essas condutas, por si só, já são abusivas, mesmo previstas nos contratos. Não obstante, as construtoras transferem o ônus do pagamento pelos “serviços de corretagem” ao consumidor, o que, por óbvio, só piora a situação.
Mas e se a empresa descontar o valor pago, a título de Comissão de Corretagem, no valor do imóvel adquirido ? A prática continuaria sendo abusiva? A resposta é sim.
Neste caso, o consumidor estaria adquirindo um bem, de valor menor, pagando um preço maior .
Destaca-se: mesmo que o contrato tenha diversas cláusulas, deixando o comprador ciente do ônus pelo pagamento dos serviços de corretagem, aquelas são abusivas.
É o entendimento da maioria dos arestos sobre o tema:
“DIREITO DO CONSUMIDOR. CONTRATO DE COMPRA DE VENDA DE IMÓVEL. PRELIMINAR DE ILEGITIMIDADE PASSIVA REJEITADA. CONSTRUTORA / INCORPORADORA IMOBILIÁRIA. COMISSÃO DE CORRETAGEM. AGENTES ATUANDO SOB AS INSTRUÇÕES DO FORNECEDOR. DESNATURAÇÃO DO CONTRATO DE CORRETAGEM. TRANSFERÊNCIA AO CONSUMIDOR DE SERVIÇO QUE NÃO LHE FOI PRESTADO. ABUSIVIDADE DE CLÁUSULA EM CONTRATO DE ADESÃO. COMISSÃO DE CORRETAGEM. COBRANÇA INDEVIDA. (…) 2. A obrigação de pagar a taxa de corretagem pressupõe a prestação de serviço de mediação imobiliária, como definido no art. 722 do Código Civil: “pelo contrato de corretagem, uma pessoa, não ligada a outra em virtude de mandato, de prestação de serviços ou por qualquer relação de dependência, obriga-se a obter para a segunda um ou mais negócios, conforme as instruções recebidas”. 3. A comissão de corretagem é ônus de quem contratou os serviços do intermediador. O fornecedor não pode transferir esse encargo aos consumidores, se optou por não incluir esse custo no preço cobrado, sobretudo quando não os informou adequadamente sobre esse ônus. 4. Se o consumidor procura o próprio vendedor para a realização do negócio, descaracteriza-se a mediação imobiliária, conforme define o art. 726 do Código Civil. 5. Assim, é abusiva, por representar vantagem exagerada (art. 51, inciso IV. do CDC), a existência de cláusula, em contrato de adesão, que impõe o pagamento de valor, a título de taxa de corretagem, se não há prova da intermediação imobiliária concretizada por iniciativa do comprador. 6. Em verdade, sequer houve a prestação de serviços de corretagem, mas simples atuação de prepostos da empresa, uma vez que a corretagem exige que o corretor não esteja subordinado por qualquer relação de dependência com o contratante, violando o disposto no art. 722 do Código Civil. 7. Recurso CONHECIDO. PRELIMINAR REJEITADA. IMPROVIDO. Sentença mantida pelos seus próprios fundamentos. Custas e honorários advocatícios pela recorrente, fixados em 10% (dez por cento) sobre o valor da condenação. Acórdão elaborado de conformidade com o disposto no art. 46 da Lei nº 9.099/1995. (Acórdão n.653407, 20120910254374ACJ, Relator: ISABEL PINTO, 2ª Turma Recursal dos Juizados Especiais do Distrito Federal, Publicado no DJE: 15/02/2013. Pág.: 227)”.
DIREITO DO CONSUMIDOR. REJEITADA A PREJUDICIAL DE MÉRITO DE PRESCRIÇÃO. PRETENSÃO DE REVISÃO DE CLÁUSULA CONTRATUAL E DEVOLUÇÃO EM DOBRO DOS VALORES INDEVIDAMENTE COBRADOS. AUSÊNCIA DE HIPÓTESE ESPECÍFICA NO ART. 206 DO CÓDIGO CIVIL. PRAZO DECENAL. ART. 205 DO CÓDIGO CIVIL. IMÓVEL. COMISSÃO DE CORRETAGEM. COMPRA E VENDA. TRANSFERÊNCIA AOS CONSUMIDORES DE SERVIÇO QUE NÃO LHES FOI PRESTADO. CLÁUSULA ABUSIVA. VIOLAÇÃO À BOA-FÉ OBJETIVA. INFORMAÇÃO INADEQUADA. VIOLAÇÃO AO DEVER DE INFORMAÇÃO. REPETIÇÃO DO INDÉBITO DEVIDA. ART. 42, PARÁGRAFO ÚNICO, CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR. RECURSO IMPROVIDO.
(Acórdão n.710934, 20130110371697ACJ, Relator: HECTOR VALVERDE SANTANA, 3ª Turma Recursal dos Juizados Especiais do Distrito Federal, Data de Julgamento: 13/08/2013, Publicado no DJE: 13/09/2013. Pág.: 308)
CONSUMIDOR. AQUISIÇÃO DE IMÓVEL NA PLANTA. COMISSÃO DE CORRETAGEM. PRELIMINARES DE ILEGITIMIDADE PASSIVA E INÉPCIA REJEITADAS. COBRANÇA ABUSIVA. ÔNUS DO VENDEDOR.
(…)
4. MÉRITO: É abusiva a cláusula que transfere ao adquirente o ônus do pagamento de comissão de corretagem sob o argumento de que o serviço foi por ele contratado, pois é sabido que a contratação foi pactuada entre a construtora e o corretor, não havendo liberdade de escolha pelo consumidor.
5. O consumidor não aufere qualquer proveito com a suposta intermediação empreendida pelo corretor, pois a aquisição é pactuada diretamente com a construtora. O corretor não age, nesta hipótese, como intermediário ou prestador autônomo de serviço, mas como verdadeiro preposto da construtora, de modo a facilitar a atividade empresarial desta.
6. Tratando-se de cobrança indevida feita a consumidor, a devolução deve ser dobrada, conforme preceitua o art. 42, parágrafo único, do Código de Defesa do Consumidor.
7. Os fornecedores consorciados para a realização de atividade comercial conjunta respondem solidariamente pelos danos causados ao consumidor, a teor do art. 7º, parágrafo único do Código de Defesa do Consumidor. Portanto, uma vez demonstrada a cobrança abusiva da comissão de corretagem, o consumidor pode exigir a devolução tanto à construtora como à empresa vendedora, que auferiram proveito com a venda.
8. Recurso conhecido e desprovido. Sentença mantida pelos seus próprios fundamentos.
9. Arcará a recorrente com as custas processuais e os honorários advocatícios, estes fixado em 10% (dez por cento) do valor atualizado da condenação, conforme art. 55 da Lei 9.099/95.
(Acórdão n.713140, 20130310159430ACJ, Relator: ANTÔNIO FERNANDES DA LUZ, 2ª Turma Recursal dos Juizados Especiais Cíveis e Criminais do DF, Data de Julgamento: 17/09/2013, Publicado no DJE: 20/09/2013. Pág.: 312)
DIREITO DO CONSUMIDOR. CONSTRUTORA/ INCORPORADORA IMOBILIÁRIA. COMISSÃO DE CORRETAGEM. AGENTES ATUANDO SOB AS INSTRUÇÕES DO FORNECEDOR. DESNATURAÇÃO DO CONTRATO DE CORRETAGEM. TRANSFERÊNCIA AOS CONSUMIDORES DE SERVIÇO QUE NÃO LHES FOI PRESTADO. PRÁTICA ABUSIVA. VIOLAÇÃO À BOA-FÉ OBJETIVA. CONSUMIDORES NÃO INFORMADOS ADEQUADAMENTE. VIOLAÇÃO AO DEVER DE INFORMAÇÃO. REPETIÇÃO DO INDÉBITO DEVIDA. ART. 42, PARÁGRAFO ÚNICO, CDC. RECURSO PROVIDO. SENTENÇA PARCIALMENTE REFORMADA. 1 – A controvérsia deve ser solucionada sob o prisma do sistema jurídico autônomo instituído pelo Código de Defesa do Consumidor (Lei nº 8.078/1990), que por sua vez regulamenta o direito fundamental de proteção ao consumidor (art. 5º, XXXII, da Constituição Federal). 2 – Fixadas as normas e princípios que regulam o caso concreto, a pretensão dos recorrentes deve ser amparada com base no princípio da boa-fé, art. 4º, III, e art. 51, IV, do Código de Defesa do Consumidor, e no princípio da informação adequada, art. 6º, III, também do Código de Defesa do Consumidor. 3 – O fornecedor tem o dever de informar qualificado, em que não basta o mero cumprimento formal do oferecimento de informações, mas o dever substancial de que o consumidor efetivamente as compreenda. 4 – A conseqüência do descumprimento de cláusula que viole o dever da boa-fé objetiva e o dever de informar adequadamente é a declaração de nulidade da respectiva cláusula, reconhecimento que pode ser feito a pedido ou de ofício. 5 – A comissão de corretagem é ônus de quem contratou os serviços do intermediador. O fornecedor não pode transferir esse encargo ao consumidor, se optou por não incluir esse custo no preço cobrado, sobretudo quando não lhe informou adequadamente sobre esse ônus. 6 – As recorridas não comprovaram que os serviços de corretagem foram efetivamente prestados aos consumidores. 7 – Nas relações de consumo é desnecessária a prova da má-fé para aplicação da sanção do art. 42, parágrafo único, do Código de Defesa do Consumidor, porquanto basta a falha na prestação do serviço, consubstanciada na cobrança indevida (ato ilícito) do fornecedor, para que seja devida a reparação. 8 – Recurso provido. Sentença parcialmente reformada. (Acórdão n.663243, 20120710218185ACJ, Relator: HECTOR VALVERDE SANTANA, 3ª Turma Recursal dos Juizados Especiais do Distrito Federal, Data de Julgamento: 12/03/2013, Publicado no DJE: 25/03/2013. Pág.: 455)
A cláusula que atribui ao consumidor o ônus do pagamento da Comissão de Corretagem em Contrato de Promessa de Compra e Venda de Imóvel é nula de pleno direito, pois transborda abusividade consumerista, infringindo o artigo 51, inciso IV da Lei 8.078/90 (Código de Defesa do Consumidor).
O consumidor não é obrigado a arcar com um serviço que não contratou, muito menos, remunerá-lo por isso, pois não irá aferir qualquer proveito em seu benefício.
Condicionar a venda do imóvel ao corretor que esteja vinculado à empresa (mesmo que informalmente) é praticar Venda Casada, conduta proibida por nossa legislação. (art. 39, I do CDC)
Em outras palavras: quando a construtora impõe algum “corretor” para a conclusão da negociação (sem dar opção ao consumidor de escolher pessoa diversa), ela está condicionando a venda do imóvel aos serviços de seus próprios corretores (o imóvel somente será vendido caso a negociação seja realizada pelos profissionais ligados à empresa), desrespeitando os preceitos contidos no artigo supra.
O risco dos serviços de corretagem não poderá ser repassado ao consumidor. Nesse sentido, importante destacar o ensinamento do Douto Desembargador José Joaquim dos Santos (TJSP), in verbis:
“Passar o risco da corretagem à autora, como consumidora, traduz-se em venda casada e inadmissível (TJSP – 2ª Câmara de Direito Privado Apelação nº. 0001787-47.2011.8.26.0562, rel. Des. JOSÉ JOAQUIM DOS SANTOS, j.13.12.2011).”
Em todos os fatos mencionados no presente artigo, o consumidor terá direito à repetição do indébito (caso já tenha efetuado o pagamento da Comissão de Corretagem) ou à declaração de nulidade de cláusula contratual, obrigando que a empresa pague a Comissão de Corretagem.
Ressalto, mais uma vez, que cada caso deve ser analisado minuciosamente por advogado qualificado.