O EXEQUENTE PODE PEDIR A IMPOSIÇÃO DE PRISÃO CIVIL COMO MEDIDA ATÍPICA DE EXECUÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER?


07/10/2015 às 11h55
Por Emanuella Faria Advogada

1. INTRODUÇÃO

Temos como regra em nosso ordenamento jurídico a vedação a prisão civil por dívida.

No aspecto legal, é expresso no artigo 5º, LXVII da CRFB/88 tal proibição, com exceção do devedor de alimentos e do depositário infiel. O Pacto de San Jose da Costa Rica, tratado internacional em que o Brasil faz parte, por sua vez só autoriza a prisão civil do devedor de alimentos, ficando excluído o depositário infiel.

No aspecto jurisprudencial, há súmula vinculante n.º 25 do STF: "É ilícita a prisão civil de depositário infiel, qualquer que seja a modalidade de depósito." - e súmula n.º 309 do STJ: "O débito alimentar que autoriza a prisão civil do alimentante é o que compreende as três prestações anteriores à citação e as que vencerem no curso do processo", que excluem a possibilidade de prisão do depositário infiel.

No aspecto doutrinário, temos três correntes que divergem sobre o tema, sendo a terceira posição, ainda não dominante, a mais razoável na questão em tela quando defende a possibilidade de prisão civil para cumprimento de prestação extrapatrimonial.

2. DESENVOLVIMENTO

O principal questionamento da doutrina seria o sentido da palavra "dívida" usada no art. 5º LXVII da CRFB pelo constituinte.

São três perguntas em busca da melhor interpretação: no sentido de vedação para dar cumprimento a todo e qualquer tipo de prestação; para dar cumprimento a prestação pecuniária de pagar quantia certa; apenas de prestação patrimonial, sendo pecuniária ou não.

A primeira corrente de Ouvídio Baptista, defende que o termo dívida foi utilizado no sentido de toda e qualquer prestação e por isso, seria proibida a prisão civil por dívida em qualquer hipótese. O argumento é de que ao excepcionar essa vedação para a dívida alimentar (pecuniária) e para o depositário infiel (não pecuniária), logo não caberia prisão civil para qualquer tipo de dívida.

Há uma pequena variação dessa primeira corrente, admitindo a vedação total a prisão civil para dar cumprimento a qualquer tipo de prestação, entretanto, seria possível, independente da natureza da prestação, para garantir obediência à ordem judicial e a autoridade do juiz.

A segunda corrente de Luiz Guilherme Marinoni, entende que quando se veda a prisão civil para cumprimento a todo e qualquer tipo de prestação, haverá uma proteção absoluta a liberdade do devedor, em detrimento de outros bens e direitos do credor que podem estar ligados a sua subsistência digna, a vida, a saúde, a igualdade, ao meio ambiente equilibrado entre outros.

Seria necessário, em cada caso concreto, fazer uma ponderação de valores para verificar se este meio de execução não se revelaria uma medida eventualmente razoável, adequada e necessária para dar cumprimento a obrigação. Porém, esta posição só admite esse tipo de ponderação quando se tratar de uma prestação não pecuniária, ou seja, o termo dívida é utilizado pelo constituinte no sentido de prestação pecuniária.

A terceira corrente, interpreta o termo dívida como prestação patrimonial, não somente como prestação pecuniária. Na verdade, parece ter sido usado de modo que se admita o uso, excepcional e em casos extremos, da prisão civil para dar cumprimento a prestações de natureza extrapatrimonial como as ligadas a preservação do meio ambiente equilibrado, ao direito de igualdade, preservação de vida, saúde, subsistência digna e outros valores que sejam tão ou mais importantes que a liberdade do devedor.

Deve-se atentar que a prisão civil deve ser utilizada apenas em situações extremas por ser medida violenta, não ser um meio prático, não existir regulamentação adequada de seu procedimento e por nossos presídios já serem super lotados.

A principal preocupação é de que o magistrado deve garantir o prévio contraditório e só a impor por uma decisão muito bem fundamentada, na forma do artigo 489, § 2º do Código de Processo Civil de 2015, demonstrando os princípios que estão em colisão e os critérios utilizados na ponderação à luz da razoabilidade.

3. CONCLUSÃO

Atualmente a regra é a vedação da prisão civil por dívida como meio de execução de prestação pecuniária, não pecuniária ou patrimonial, excepcionando-se apenas o devedor de alimentos.

Porém, é razoável o posicionamento de que a prisão civil por dívida, pode ser aplicada, eventualmente, para o cumprimento de prestação extrapatrimonial, quando bens jurídicos tão relevantes, quanto a liberdade individual do devedor, estiverem em colisão, devendo o magistrado garantir o contraditório e a decretar por decisão bem fundamentada, utilizando a técnica da ponderação.

  • Direito Processual Civil
  • Prisão Civil
  • Execução

Referências

4. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

A. BAPTISTA DA SILVA, Ouvidio; LUIZ GOMES, Fábio. Teoria Geral do Processo Civil. Brasil: 6 ed. Revista dos Tribunais, 2014.

MARINONI, Luiz Guilherme. Teoria Geral do Processo Civil. Brasil: 7 ed. Revista dos Tribunais, 2014.

DIDIER, Jr. Fredie et al. Coleção Novo CPC - Doutrina Selecionada - v.5 - Execução. Brasil: 1 ed. Juspodium, 2015.


Emanuella Faria Advogada

Bacharel em Direito - Rio de Janeiro, RJ


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