Imagine que você, beneficiário de um plano de saúde, foi diagnosticado com Transtorno do Espectro Autista (TEA), uma condição médica crônica que requer tratamento contínuo e personalizado. O médico responsável prescreveu um plano de intervenções terapêuticas, incluindo terapia comportamental, terapia ocupacional e terapia da fala, todas essenciais para o seu desenvolvimento e bem-estar. No entanto, a operadora do plano de saúde opta por rescindir unilateralmente o contrato. Agiu corretamente a operadora do plano de saúde?
Introdução
O tratamento para Transtorno do Espectro Autista (TEA) pode variar dependendo das necessidades individuais da pessoa com autismo. Em muitos casos, o tratamento do TEA é contínuo, pois o autismo é uma condição crônica que pode afetar indivíduos ao longo de suas vidas.
O tratamento do TEA geralmente envolve uma abordagem multidisciplinar que pode incluir terapia comportamental, terapia ocupacional, terapia da fala, intervenção educacional e apoio médico, entre outras intervenções.
O plano de saúde pode cancelar o contrato durante o tratamento do Transtorno do Espectro do Autista (TEA)?
Apenas os planos de saúde coletivos com quantidade igual ou superior a 30 beneficiários poderão ser rescindidos unilateralmente e imotivadamente pela operadora, desde que o paciente não esteja no meio de um tratamento e cumpridos três requisitos: 1 - o contrato contenha cláusula expressa prevendo a possibilidade de rescisão unilateral; 2 - o contrato esteja em vigência por período de pelo menos 12 meses; 3- haja a prévia notificação da rescisão com antecedência mínima de 60 dias.
Esses requisitos estão previstos no art. 17 da Resolução Normativa DC/ANS 195/2009.
Em relação aos planos individuais e familiares, o art. 13 da Lei nº 9.656/98 proíbe a rescisão unilateral imotivada do plano privado de assistência à saúde individual ou familiar por iniciativa da operadora. Nessas modalidades, a rescisão somente pode se dar por fraude ou falta de pagamento.
O termo "tratamento médico garantidor de sua sobrevivência ou de incolumidade física" refere-se a cuidados médicos cruciais que desempenham um papel fundamental na preservação da saúde e na prevenção de danos físicos significativos. Esses tratamentos podem incluir procedimentos, terapias ou administração de medicamentos específicos destinados a lidar com condições médicas críticas, agudas ou crônicas.
Desse modo, o tratamento para o Transtorno do Espectro Autista (TEA) não pode ser interrompido, pois é uma jornada contínua, vital para manter a incolumidade física e psíquica dos pacientes.
Essas intervenções são projetadas para serem adaptáveis, evoluindo conforme o crescimento e as mudanças nas necessidades individuais ao longo do tempo.
O caráter contínuo do tratamento do TEA é fundamental, pois visa garantir o bem-estar físico e emocional dos pacientes, de modo que a interrupção do tratamento certamente conduz a piora do paciente, no tocantes as habilidades de comunicação, interação social, e autonomia funcional.
Reconhece-se que o TEA não é uma condição estática; portanto, o tratamento deve ser flexível e adaptável para acompanhar o desenvolvimento do paciente ao longo de sua vida. Essa abordagem contínua é essencial para maximizar o potencial de cada indivíduo com TEA, fornecendo-lhes os recursos e apoios necessários para uma vida plena e significativa.
Por tais razões, não poderá haver rescisão contratual unilateral imotivada. Esse é o posicionamento do STJ:
- A operadora, mesmo após o exercício regular do direito à rescisão unilateral de plano coletivo, deverá assegurar a continuidade dos cuidados assistenciais prescritos a usuário internado ou em pleno tratamento médico garantidor de sua sobrevivência ou de sua incolumidade física, até a efetiva alta, desde que o titular arque integralmente com a contraprestação devida. STJ. 2ª Seção. REsp 1.846.123-SP, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, julgado em 22/06/2022 (Recurso Repetitivo – Tema 1082) (Info 742).
Dessa forma, caso a operadora insista em rescindir o contrato, será merecedora de reprimenda imediata, notadamente por tal postura inadmissível colocar a vida de pessoas em risco.
Conclusão
A interrupção do plano de saúde durante um período de tratamento para o Transtorno do Espectro Autista (TEA) é uma medida que colide diretamente com os direitos fundamentais dos beneficiários. A legislação brasileira estabelece claramente as condições em que a rescisão unilateral do contrato é admissível, e em nenhum momento autoriza a interrupção arbitrária de tratamentos médicos essenciais.
A insistência na rescisão unilateral em casos em que o tratamento médico é garantidor da sobrevivência ou incolumidade física é não apenas juridicamente questionável, mas também moralmente repreensível e, por colocar os usuários em situação de extrema aflição, risco à vida e ao bem-estar, configura hipótese ensejadora de indenização por danos morais.
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Por David Vinicius do Nascimento Maranhão Peixoto