Injúria racial no ambiente de trabalho e o mito da “brincadeira”: o novo posicionamento do TJDFT


16/12/2025 às 12h29
Por David Vinicius do Nascimento Maranhão Peixoto

  1. Decisão do TJDFT reforça que ofensas racistas no ambiente de trabalho configuram injúria racial, mesmo quando alegadas como “brincadeira”. O acórdão consolida o entendimento sobre racismo recreativo, valoriza a palavra da vítima e fortalece a proteção da dignidade humana

 

Introdução: a injúria racial e sua dimensão jurídica e social

A injúria racial é uma forma específica de discriminação que atinge diretamente a honra e a dignidade da pessoa, valendo-se de elementos ligados à raça, cor, etnia ou origem para humilhar ou inferiorizar a vítima. Não se trata de uma ofensa comum, mas de uma conduta carregada de significado histórico e social, marcada por séculos de exclusão e violência simbólica.

Por essa razão, o ordenamento jurídico brasileiro confere tratamento rigoroso ao tema, reconhecendo que expressões racistas, ainda que proferidas em contextos informais ou sob o rótulo de humor, possuem potencial lesivo suficiente para justificar a intervenção penal, sobretudo quando reproduzem estereótipos historicamente associados à opressão racial.

 

A relevância prática do tema e os conflitos no ambiente de trabalho

No cotidiano das relações profissionais, não são raras as situações em que trabalhadores se veem expostos a comentários ofensivos travestidos de brincadeiras, criando um ambiente hostil e discriminatório. Muitas vítimas deixam de buscar seus direitos por receio de retaliações ou por acreditarem que a informalidade do contexto impediria o reconhecimento da ofensa pelo Judiciário.

Esse cenário reforça a importância de decisões judiciais que enfrentem o problema de forma direta, demonstrando que o ambiente de trabalho não é um espaço imune à responsabilização penal quando há violação à dignidade da pessoa humana.

 

O caso julgado pelo TJDFT e a manutenção da condenação

Foi nesse contexto que a 1ª Turma Criminal do Tribunal de Justiça do Distrito Federal e dos Territórios julgou a Apelação Criminal nº 0739388-88.2023.8.07.0001. A ré buscava a absolvição da condenação por injúria racial, alegando que as expressões utilizadas contra a vítima teriam sido ditas em tom jocoso.

O Tribunal, contudo, negou provimento ao recurso e manteve a condenação, reconhecendo que o uso de termos como “macaca” e “macacada”, dirigidos à vítima no ambiente de trabalho, configura ofensa racial inequívoca, independentemente da tentativa de enquadramento como brincadeira.

 

O racismo recreativo e a irrelevância do suposto tom jocoso

Um dos fundamentos centrais do acórdão foi o reconhecimento do chamado racismo recreativo, expressão utilizada para designar condutas que buscam mascarar ofensas discriminatórias sob a aparência de humor. O Tribunal destacou que o dolo específico da injúria racial decorre da escolha consciente de palavras historicamente associadas à desumanização de pessoas negras.

Assim, ainda que o agressor alegue ausência de intenção ofensiva, o significado objetivo das expressões e seu contexto social revelam a intenção de menosprezar a vítima em razão de sua cor ou raça, afastando qualquer tese absolutória baseada em suposta descontração.

 

A suficiência probatória e o valor da palavra da vítima

Outro ponto relevante da decisão foi a reafirmação da suficiência do conjunto probatório. O TJDFT ressaltou que, em crimes dessa natureza, a palavra da vítima assume especial relevância quando coerente e corroborada por testemunhas, como ocorreu no caso concreto.

Não se exige prova impossível ou confissão do agressor, bastando que os elementos dos autos demonstrem, de forma segura, a prática da conduta ofensiva. Esse entendimento fortalece a proteção das vítimas e evita que a dificuldade probatória sirva como obstáculo à responsabilização penal.

 

A proteção constitucional da dignidade e os impactos práticos do precedente para vítimas e empregadores

A decisão dialoga diretamente com a Constituição Federal, especialmente com o princípio da dignidade da pessoa humana e com a vedação a qualquer forma de discriminação. A aplicação firme da Lei nº 7.716/89 demonstra que o Judiciário tem assumido papel ativo no enfrentamento do racismo estrutural, reafirmando que práticas discriminatórias não podem ser relativizadas nem normalizadas, sobretudo em ambientes profissionais, onde a vítima se encontra em posição de maior vulnerabilidade.

Do ponto de vista prático, o acórdão estabelece um importante precedente para casos de injúria racial no trabalho, deixando claro que o argumento da brincadeira não afasta a ilicitude da conduta. Para as vítimas, a decisão representa maior segurança jurídica e incentivo à busca por responsabilização. Para empregadores e colegas de trabalho, funciona como alerta de que comportamentos racistas, ainda que sutis ou disfarçados, podem gerar consequências penais relevantes.

 

Conclusão: a importância da orientação jurídica especializada

O entendimento consolidado pelo TJDFT reforça que a injúria racial é levada a sério pelo Poder Judiciário e que tentativas de minimizar ofensas por meio do humor não encontram mais espaço na jurisprudência. Diante de situações de discriminação racial ou ofensas no ambiente de trabalho, é fundamental buscar orientação jurídica especializada para avaliar o caso e adotar as medidas cabíveis.

A atuação técnica adequada pode ser decisiva para garantir a efetividade dos direitos violados. Se você enfrenta ou já enfrentou situação semelhante, entre em contato com o escritório Nascimento & Peixoto Advogados para uma análise cuidadosa do seu caso e para a adoção das providências necessárias à defesa da sua dignidade.

 

Em caso de dúvidas envie um e-mail para [email protected], entre em contato através do nosso Site ou pelo telefone e WhatsApp (61)99266-4446.

  • Injúria racial
  • Direitos fundamentais
  • Discriminação racial no trabalho
  • Dignidade humana
  • Ofensa racial
  • Racismo

Referências

Autor: David Vinicius do Nascimento Maranhão, advogado.



Comentários