Em uma decisão proferida no último dia 8 de novembro, a 1ª Turma do Tribunal Superior do Trabalho (TST) negou provimento ao agravo interposto em recurso de revista, reconhecendo a validade de uma cláusula contida em norma coletiva que tratava da parcela "aluguel de veículo".
A questão girava em torno da natureza jurídica dessa parcela, que, segundo o Tribunal Regional, caracterizaria fraude.
O Tribunal Regional havia concluído que a cláusula, à qual indenizava o aluguel pela utilização dos veículos pertencentes aos próprios empregados para o trabalho, seria inválida, configurando uma tentativa de fraudar a legislação trabalhista.
Argumentou o tribunal que a prática visava retirar a natureza jurídica de contraprestação paga pelo empregador, sugerindo que, se a empresa necessitasse de veículos, deveria ter feito contrato com uma pessoa jurídica especializada em locação de veículos.
Nada obstante, o TST discordou dessa interpretação, destacando a ausência de elementos concretos e objetivos que configurassem a fraude. Nesses termos, ressaltou que o Tribunal Regional havia presumido a fraude sem um fundamento específico no caso.
Nesse sentido, o TST observou que o afastamento da fraude não contrariava a Súmula nº 126 do TST, pois decorreu do reenquadramento jurídico do quadro fático delineado no acórdão regional.
Ademais, a decisão do TST invocou a tese vinculante fixada pelo Supremo Tribunal Federal – STF, no Tema 1.046 da repercussão geral. O STF, ao julgar o Recurso Extraordinário com Agravo n.º 1.121.633/GO, estabeleceu que são constitucionais os acordos e convenções coletivas que, ao considerarem a adequação setorial negociada, pactuam limitações ou afastamentos de direitos trabalhistas, desde que respeitados os direitos absolutamente indisponíveis.
Nessa perspectiva, a 1ª Turma do TST concluiu que a fixação da natureza indenizatória da parcela referente ao aluguel do veículo do empregado pela via da negociação coletiva envolve um direito de indisponibilidade relativa, não protegido pela Constituição Federal.
Dessa forma, a simples pactuação da cláusula não pode ser considerada fraudulenta, mantendo-se a decisão que conheceu e proveu o recurso de revista para reformar o acórdão regional na parte em que havia julgado inválida a norma coletiva.
Ementa:
- “AGRAVO. RECURSO DE REVISTA. VIGÊNCIA DA LEI Nº 13.467/2017. NEGOCIAÇÃO COLETIVA. PARCELA ‘ALUGUEL DE VEÍCULO’. NORMA COLETIVA FIXANDO NATUREZA INDENIZATÓRIA. VALIDADE. APLICAÇÃO TESE VINCULANTE FIXADA PELO STF NO TEMA 1.046 DA REPERCUSSÃO GERAL. TRANSCENDÊNCIA POLÍTICA RECONHECIDA. 1. No caso, o Tribunal Regional concluiu que a cláusula que indeniza o aluguel pela utilização dos veículos dos próprios empregados para o trabalho seria inválida, pois caracterizaria fraude. Para tanto, assinalou ‘a prática se presta a fraudar a lei trabalhista, visando retirar a natureza jurídica de contraprestação paga pelo empregador, pois, se o veículo pertencia aos empregados e se a lei trabalhista admite que estes utilizem os seus próprios equipamentos, qual a finalidade do contrato de aluguel? Se a reclamada, para atender as necessidades do empreendimento, precisava alugar veículos, deveria ter feito contrato com pessoa jurídica que desenvolvesse tal objetivo social’. 2. Como se observa, não há um elemento concreto e objetivo, intrínseco ao caso, que tenha ensejado a fraude, o Tribunal apenas a presumiu por não concordar com a prática (em abstrato) e assinalar que, se a ré precisava alugar veículos, deveria tê-lo feito por intermédio de contrato com pessoa jurídica que atuasse no ramo da locação de veículos. Em tal contexto, o afastamento da fraude não implica contrariedade à Súmula nº 126 do TST, porquanto decorreu do mero reenquadramento jurídico do quadro fático delineado no acórdão regional. 3. No exame da temática atinente à validade de normas coletivas que limitam ou restringem direitos não assegurados constitucionalmente, o Plenário do Supremo Tribunal Federal, no julgamento do Recurso Extraordinário com Agravo n.º 1.121.633 /GO (leading case, Relator Ministro Gilmar Mendes), submetido à sistemática da repercussão geral (Tema 1.046), fixou a tese de que ‘são constitucionais os acordos e as convenções coletivos que, ao considerarem a adequação setorial negociada, pactuam limitações ou afastamentos de direitos trabalhistas, independentemente da explicitação especificada de vantagens compensatórias, desde que respeitados os direitos absolutamente indisponíveis’. 4. No caso, a fixação da natureza indenizatória da parcela alusiva ao aluguel do veículo do empregado pela via da negociação coletiva envolve direito de indisponibilidade relativa, não guarnecido pela Constituição Federal, de modo que não é possível admitir que a sua simples pactuação seja considerada fraudulenta. 5. Deve, pois, ser mantida a decisão que conheceu e proveu o recurso de revista para reformar o acórdão regional na parte em que havia julgado inválida a norma coletiva. Agravo a que se nega provimento.” (TST-Ag-RR-68600-96.2013.5.17.0009, 1ª Turma, rel. Min. Amaury Rodrigues Pinto Junior, julgado em 8/11/2023)
Notícia por Douglas Romero Souza de Oliveira, OAB-DF 45.606; David Vinicius do Nascimento Maranhão Peixoto, OAB-DF 60.672.
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