O medicamento Stivarga ou Regorafenibe é indicado como terceira linha de tratamento para pacientes oncológicos e a dificuldade na sua aquisição decorre do seu alto custo, da falta de inserção na lista de medicamentos fornecidos pelo SUS, bem como da negativa de planos de saúde em dar continuidade ao tratamento.
Inicialmente, cumpre esclarecer que o direito à saúde deve ser assegurado minimamente a todos, de modo que fatores políticos, administrativos, burocráticos ou orçamentários devem ser superados, pois o que está em jogo é a dignidade da pessoa humana, valor supremo no Brasil.
Com base nessa premissa, a Constituição estabeleceu em seu Art. 196, que a saúde é direito de todos e dever do Estado, ou seja, cabe ao poder público estabelecer, por meio de políticas públicas, quais serviços e tratamentos serão fornecidos a população.
Ocorre que, deixando de lado valores maiores, o Estado, ao formular suas políticas públicas, baseia-se apenas em critérios econômicos e utilitaristas. O raciocínio feito é basicamente o de custo benefício, buscando as soluções menos onerosas e que atendam ao maior número de pessoas possíveis.
Quando falamos de saúde, o problema é muito mais complexo, pois uma parcela da população, que acaba sendo atingida por doenças incomuns, necessita de tratamento específico de alto custo, mas se veem desamparadas, em razão do seu tratamento não estar abrangido pelas políticas públicas vigentes.
A situação é ainda mais séria quando se trata de câncer, pois longe de ser uma doença incomum, o Estado acaba fornecendo um tratamento incompleto, impondo que pessoas que estão em um estágio mais avançado da doença aceitem seu diagnóstico e, simplesmente, aguardem a morte, impedindo-as de avançar com tratamentos, que podem aumentar a qualidade de vida dos pacientes.
Assim, não resta outra alternativa senão ingressar com uma ação contra o Estado, a fim de avançar no tratamento.
A jurisprudência dos tribunais superiores (STJ e STF) acata a tese de que é possível adquirir medicamentos não fornecidos pelo SUS para pessoas que não tem condições financeiras de adquiri-los.
Vale destacar que, tanto o STF quanto o STJ estabelecem praticamente os mesmos parâmetros para se auferir a obrigação do poder público de fornecer medicamentos não incorporados em atos normativos do SUS.
Vamos nos ater ao tema repetitivo 106 do STJ, o qual estabelece que a concessão dos medicamentos não incorporados em atos normativos do SUS exige a presença cumulativa dos seguintes requisitos ( ED no REsp 1657156/RJ):
- Comprovação, por meio de laudo médico fundamentado e circunstanciado expedido por médico que assiste o paciente, da imprescindibilidade ou necessidade do medicamento, assim como da ineficácia, para o tratamento da moléstia, dos fármacos fornecidos pelo SUS;
- Incapacidade financeira de arcar com o custo do medicamento prescrito;
- ·Existência de registro do medicamento na ANVISA, observados os usos autorizados pela agência.
Conforme o título desse artigo, a partir deste momento, vamos tratar especificamente dos parâmetros necessários para compelir o poder público a fornecer o medicamento (STIVARGA®) ou Regorafenibe.
Um teste feito em 152 hospitais de 21 países com 573 pacientes demonstrou que o Regorafenibe aumenta em 38% a taxa de sobrevida de pacientes com câncer de fígado quando outras alternativas falham, ou seja, quando a doença progride e não restam alternativas terapêuticas, de modo que este é o único medicamento que apresentou resultados positivos para este tipo de câncer nos últimos 10 anos.
O Regorafenibe é a droga exclusiva aprovada para tratamento de terceira linha de cancer carcinoma hepatocelular após falha de quimioterapia, geralmente com 5-Fluoruracila, oxaliplatina e irinotecano.
Esse medicamento foi aprovado pela ANVISA recentemente e ainda não possui parecer da CONITEC, sobretudo em razão do pequeno impacto em sobrevida (ganho de apenas 1.4 meses). Essa droga também não foi incorporada no ROL da ANS de 2021.
Conforme já exposto, fazendo um paralelo com os requisitos exigidos pelas cortes superiores, tem-se o seguinte:
Adequação e imprescindibilidade
Para que o poder público conceda o Regorafenibe, na prática, será necessário um parecer por meio de nota técnica elaborada Núcleo de Apoio Técnico ao Judiciário - NAT - JUS, avaliando a situação do paciente, com base em todo o histórico de tratamento contido no prontuário médico.
A elaboração dessa nota técnica, nas palavras do Desembargador Federal Cândido Alfredo S. Leal Jr. no julgamento dos EDAG n.º 5000055-86.2015.404.0000, "eleva a discussão acerca da judicialização da saúde, para que aspectos técnicos também sejam analisados, não podendo o Poder Judiciário furtar-se ao seu exame sob o frágil argumento de que cabe ao médico prescritor escolher aquilo que é melhor para o paciente".
Nessa nota técnica são analisados os seguintes quesitos: (i) Evidências sobre a eficácia e segurança da tecnologia; (ii) Benefício/efeito/resultado esperado da tecnologia; (iii) Recomendações da CONITEC para a situação clínica do demandante.
As conclusões desse parecer devem ser favoráveis, com base no diagnóstico do câncer e deve ser auferido a falha de tratamento com FOLFOX E FOLFIR (fármacos fornecidos pelo SUS).
Deve ficar constatado que o paciente já foi submetido a diversas linhas de tratamento, em progressão neoplásica, que, por se mostrarem ineficazes, culminaram na recomendação de uso da medicação REGORAFENIBE.
Como se vê, a nota técnica deve chancelar a recomendação dos médicos assistentes, atestando a adequação e imprescindibilidade na dispensação do fármaco ao paciente
Ademais, são avaliadas as evidências científicas (que no caso do Regorafenibe existem) e se alegação de urgência é plausível, conforme definição de Urgência e Emergência do CFM (ponto crucial nesse tipo de demanda).
Hipossuficiência para custeio do tratamento
A hipossuficiência da parte autora para arcar com o custo do tratamento é evidenciada por orçamentos e documentos, que devem ser apresentados nos autos, comprovando a renda auferida.
Vale destacar que, devido ao alto custo dessa medicação (cerca de R$22.000,00 - vinte e dois mil reais) pessoas que possuem uma renda acima da média da população em geral, também poderão pleitear esse remédio do poder público, pois não se exige situação de extrema pobreza, mas sim ausência de recursos para custear o tratamento.
Registro na ANVISA e tratamento experimental
O medicamento REGORAFENIBE possui registro perante a ANVISA como antineoplásico (n.º 170560108), com a seguinte indicação em bula:
"1. INDICAÇÕES Stivarga® (regorafenibe) é indicado para o tratamento de pacientes adultos com: - tumores estromais gastrintestinais (GIST) metastáticos ou não ressecáveis, que tenham progredido ou experimentaram intolerância ao tratamento prévio com imatinibe e sunitinibe. - carcinoma hepatocelular (CHC) que tenham sido previamente tratados com sorafenibe. - câncer colorretal (CCR) metastático que tenham sido previamente tratados com, ou não sejam considerados candidatos para, as terapias disponíveis. Estas incluem quimioterapia à base de fluoropirimidinas, terapia anti-VEGF e terapia anti-EGFR."
Portanto, a obtenção desse medicamento, depende da adoção imediata das medidas necessárias para o ingresso com uma ação judicial, as quais devem ser tomadas de maneira célere, pois é perfeitamente possível obrigar o poder público a fornecer essa medicação em tempo hábil para atender o paciente, fazendo com que o Estado arque com o ônus da demora processual, pois, com base no risco concreto e iminente de vida, não há como ser de outro modo.
Por isso, recomenda-se que não se aguarde muito tempo esperando respostas ou soluções por parte do poder público, sobretudo quando o paciente tiver a convicções de que os procedimentos do qual necessita, são negados com frequência pelo estado por não se tratar de remédio fornecido pelo SUS, apesar de possuir registro na ANVISA.
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Por David Vinicius do Nascimento Maranhão.