Família Mosaico


18/04/2018 às 17h32
Por Cleusa de Magalhães Carvalho Godinho

Família “mosaico” – famílias reconstituídas por pequenos “pedaços”: os meus, os seus e os nossos…

Após a falência de uma relação conjugal, cada um dos ex-cônjuges tende a iniciar um novo projeto de vida, de felicidade, embarcando em outro relacionamento. Com isso, afirma-se cada dia mais o conceito de família “mosaico”, que é aquela formada por um dos genitores e seus filhos com o novo companheiro e, em muitos casos, também com os filhos deste, sob o mesmo teto.

O termo “mosaico” origina-se da palavra alemã moussen, “próprio das musas”. Trata-se de um desenho feito de vários fragmentos de um material com a finalidade de preencher algum tipo de plano. No universo do Direito de Família, o termo “mosaico” serve para designar aquelas famílias formadas pela pluralidade das relações parentais, em especial as formadas em decorrência do divórcio, separação ou recasamento. Resumindo, esta família é formada pelos filhos trazidos de outra união, tendo ou não filhos em comum, em que se cunha a clássica expressão: “os meus, os teus, os nossos…”. Com este modelo de família, surge também uma multiplicidade de vínculos dignos da tutela jurídica, por tratar-se de uma família extensa, com novos laços de parentesco e uma variedade de pessoas exercendo praticamente a mesma função, como duas mães, dois pais, meio-irmãos, várias avós e assim por diante. Para os que vivem numa família tradicional, as relações de parentesco se definem pela consanguinidade. Já para a família “mosaico”, não se fala em árvore genealógica, uma vez que ela resulta de diversos troncos distintos. Ser parente na família “mosaico” não significa ter consanguinidade. Basta o respeito, a proximidade e, principalmente, o afeto. Outro fator importante: nas famílias primitivas todas as regras estão disciplinadas em lei. As funções são predeterminadas, todos sabem o lugar da mãe, do pai,  dos filhos e dos demais parentes, como avós, tios e primos. Na família “mosaico” as regras e funções são estipuladas com o passar do tempo e não se solidificam de imediato. É com a convivência que o papel de cada um se estabelece. O afeto – e não a consanguinidade – é o responsável pela criação dos laços entre os membros dessa nova família. Se já é difícil consolidar uma família a dois, imagine duas em uma só se não houver entre seus membros, como base, o afeto, o amor e a verdade.

A psicologia já vem estudando o fenômeno da família “mosaico”, demonstrando a grande necessidade dos pais recém-separados analisarem os erros cometidos na relação anterior antes de entrarem num novo relacionamento.  E nós, como sociedade, não podemos nos omitir em discutir o quadro formado por essas relações pluriparentais, trazendo à tona temas como a alteração do nome de família, a divisão do poder familiar, a guarda dos menores, a adoção, o dever alimentar, o direito a visitas, os direitos sucessórios, o seguro saúde e muito mais… Problemas, e não poucos, podem surgir pela escassez de normatização sobre o tema exposto hoje. Por exemplo, na ausência da figura do pai e ocorrendo uma separação da família “mosaico”, poderia vir o pai a ser chamado para prestar alimentos ao menor? Poderá haver divisão do poder familiar e guarda dos menores entre cônjuge, genitor e o ex-companheiro? É preciso pensar e repensar sobre os rumos que a família do século 21 vem tomando.  Sabemos que há casos em que a separação é inevitável, por vezes até necessária quando se trata de defender o cônjuge mais frágil, ou os filhos pequenos das feridas mais graves causadas por violências, prepotências, humilhações ou pela indiferença. A separação é um remédio extremo? Sim, mas necessário depois de considerado em vão todas as tentativas razoáveis de reconciliação.

Concluo lembrando que a família é o conjunto de pessoas com comunhão plena de vida e com doação recíproca de seus membros. O contrário não é família, é a individualidade, é o egoísmo. E como mencionei acima, é preciso muito amor e afeto. É o afeto que vem se afirmando como o grande sustentáculo do Direito de Família, sendo o elemento identificador da nova família “mosaico”.

Autora: Cleusa Magalhães


    Cleusa de Magalhães Carvalho Godinho

    Advogado - Divinópolis, MG


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