Família Anaparental


24/04/2018 às 19h34
Por Cleusa de Magalhães Carvalho Godinho

Em decorrência das rápidas mudanças sociais e da democratização do Direito de família, o instituto familiar vive em eterna mutação. Com isso, o legislador fica impossibilitado de normatizar as condutas sociais, não possuindo de pronto soluções para todas as questões familiares que surgem. E novas modalidades de famílias vêm se formando, a exemplo da família anaparental, sobre a qual explicarei um pouco. Aqui surge a possibilidade ou não de essa família ter proteção estatal como uma entidade familiar, tal como têm as espécies de famílias do rol do artigo 226 da Constituição Federal, ou seja, a constituída pelo casamento civil ou religioso com efeitos civis, a união estável e a família monoparental (a que se restringe à convivência de apenas um dos ascendentes com seu descendente).

A família anaparental é a família sem pai e sem mãe. Pais morreram e os filhos têm por tutores os avós. Estes novos arranjos são as denominadas famílias sócio-afetivas, que se fundam no afeto, dedicação, carinho e ajuda mútua, transformando estas convivências em verdadeiras entidades familiares. Essa realidade é crescente no Brasil, mas não ganhou a devida atenção dos estudiosos do direito e nem do próprio Estado. Muitos irmãos passam a conviver juntos após o falecimento de seus pais, um cuidando do outro, formando por esforço mútuo patrimônio comum sem possuir, em tese, a mesma proteção estatal das famílias do rol do artigo 226 da Constituição Federal, já citado acima. Reflitam: o fato de uma criança que perdeu os pais e foi morar com uma Tia, tendo nesta a figura da mãe, não é merecedora de amparo Estatal por não se enquadrar no rol das espécies de famílias reconhecidas Constitucionalmente?

A família anaparental não se restringe somente aos parentes.  Há o exemplo de amigas aposentadas e até viúvas que decidem compartilhar a velhice juntas, convivência que se caracteriza pela ajuda material, emocional e pelo sentimento sincero de amizade sem conotação sexual. Estes conviventes também, infelizmente, não gozam da proteção do Ordenamento Jurídico pelo mesmo fato de não estarem no rol das espécies de entidades familiares da Constituição Federal.

Quando se trata de família, novas situações sempre surgem, já clamando por amparo no ordenamento jurídico. Amparo este que nem sempre se encontra na letra da lei. Independente disto, clara é a ideia da valorização do elemento afetividade nas relações familiares. Não há como negar que hoje a família possui um novo paradigma, ela é o instrumento para se buscar a felicidade, a realização pessoal de seus membros. E podemos afirmar ainda que, seja qual for o modelo de família, ela não mais se restringe às constituídas pelos laços consanguíneos ou de matrimônio, mas se valem de vínculos de afetividade, amor, carinho e principalmente companheirismo entre os entes que a compõem.

Falando um pouco mais sobre esses avós queridos que, por uma triste ventura, tiveram de criar seus netos, vale lembrar: muitas vezes são esses avós que asseguram a transmissão de grandes valores aos netos – agora filhos também – e o fazem com muita sabedoria e carinho, sem quebrar os laços com a história de suas vidas. Os avós são a memória viva da família, sua própria raiz.

Como se vê, a família anaparental é como uma família alargada, que acolhe os filhos sem pais, onde serão criados com muito amor pelos membros da mesma família como irmãos, avós e parentes. Nessa família o amor, mais que nunca, precisa ser animado e levar a todos a se apoiarem mutuamente nas alegrias e nas dificuldades.

Cleusa Magalhães

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Cleusa de Magalhães Carvalho Godinho

Advogado - Divinópolis, MG


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