Resumo
O trabalho sistematiza o estudo do instituto da adoção, com ênfase nos institutos jurídicos brasileiro e norte americano. A problemática ora desenvolvida foca-se nas diferenças e possíveis semelhanças entre os dois ordenamentos jurídicos, baseando-se na forma de adoção ocorrida no filme Juno. Nesse diapasão, busca-se o sistema que melhor atende aos interesses das crianças ou adolescentes privados do convívio de suas famílias biológicas. Assim, tem-se que, independente do sistema jurídico de adoção utilizado, o importante é que as crianças e adolescentes colocados a disposição possam usufruir de uma família, seja ela consaguínea ou adotiva.
Palavras-chave: Adoção. Adoção no Brasil. Adoção norte americana. Juno.
Sumário
Introdução.
1 A adoção no Brasil.
1.1 Aspectos históricos da adoção.
1.2 Conceito e natureza jurídica.
1.3 Espécies de adoção.
1.3.1 Adoção à brasileira.
1.3.2 Adoção póstuma.
1.3.3 Adoção plena.
1.3.4 Adoção simples.
1.3.5 Adoção pronta.
1.3.6 Adoção tardia.
1.3.7 Adoção internacional
1.4 Requisitos para adotar.
1.5 Efeitos da adoção.
1.6 Comentários à Lei no 12.010/2009.
2 A adoção norte-americana..
2.1 Aspectos históricos da adoção.
2.2 Processo de adoção.
2.3 Espécies de adoção.
2.3.1 Adoção relacionada.
2.3.2 Adoção independente.
2.3.3 Adoção privada.
2.3.4 Adoção internacional
2.3.5 Adoção plena.
2.3.6 Adoção aberta.
3 Juno.
3.1 Juno: o filme.
3.2 Um comparativo entre a adoção no sistema jurídico brasileiro e no norte americano.
Conclusão.
Referências bibliográficas.
Introdução
A adoção é um instituto do direito de família que faz parte da história da humanidade. Portanto, o seu estudo é relevante para que a sociedade viabilize e se conscientize da necessidade de uma estrutura familiar através de outros vínculos que não somente o consanguíneo.
Necessário é, também, que a população reconheça o papel da adoção como um meio que possibilita à criança recriar um vínculo parterno-filial, após ser privada de manter relações com seus familiares.
O presente trabalho visa demonstrar o processo de adoção tanto no sistema jurídico brasileiro como no norte americano, a fim de que através de um comparativo entre os dois sistemas possam-se analisar os métodos utilizados por cada um e, assim, avaliar qual é o que atende melhor as necessidades da criança e dos pais que buscam a adoção como alternativa para criar uma relação familiar.
Desse modo, torna-se indispensável a análise dos sistemas jurídicos de adoção, para que fim de que se possa aplicado um procedimento capaz de proteger e garantir o interesse do adotado, pois a adoção nada mais é que uma forma alternativa de dar a criança uma família através de laços afetivos.
Assim, por meio do estudo do ordenamento jurídico brasileiro e o norte americano de adoção, busca-se a legislação que melhor atente aos interesses do adotando e que facilite o procedimento para o adotante, isso devido a necessidade de um procedimento específico de adoção capaz de garantir um processo justo e que atenda a situação de cada criança e adolescente de forma igualitária, protetiva.
O trabalho ora apresentado foi realizado por meio de uma revisão histórica do instituto da adoção nos sistemas jurídicos brasileiro e norte americano, analisando seus aspectos institucionais. Para tanto farão utilizadas pesquisas em obras literárias que abordam o tema, assim como livros, artigos, revistas, documentos e internet.
Por fim, a pesquisa realizada busca identificar quais são as semelhanças e as diferenças que podem ser estabelecidas entre o instituto da adoção no sistema jurídico brasileiro e o sistema jurídico norte americano, tendo em vista o procedimento da adoção apresentado pelo filme Juno.
1 A adoção no Brasil
1.1 Aspectos históricos da adoção
A adoção existe motivada por um procedimento anteriormente apresentado, qual seja o abandono de crianças e adolescentes por seus pais biológicos. Esse procedimento que rompe os laços familiares biológicos tem origem remota, sendo que já na Antiguidade as sociedades tinham por prática o abandono de crianças, sendo comum o infanticídio (WEBER, 2004, p. 22).
Acredita-se, contudo, que a primeira menção à adoção ocorreu na Bíblia, uma vez que são notórios vários casos de adoção na leitura de seu texto[1]. Já a primeira lei que institucionalizou a adoção foi o Código de Hamurabi, por volta de 2.283 a 2.241 a.C., que trazia como regra a irrevogabilidade da prática adotiva.
Tratando-se de adoção na legislação brasileira, a primeira regra que tratou sobre o tema foi a Lei de 22 de setembro de 1828, que deu competência aos juízes de primeiro grau para expedirem a carta de adoção ou de perfilhamento (GRANATO, 2003, p. 17).
No século XIX, os filhos tidos fora do casamento eram mal vistos pela sociedade e, portanto, muitas mães abandonavam esses filhos ilegítimos. Entregues a própria sorte, as crianças abandonadas eram entregues as Santas Casas de Misericórdia, que administravam a Roda dos Expostos ou dos Enjeitados[2], que existiu no Brasil até 1950 (RIZZINI, 1997, p. 52).
Em 1065, no Brasil, foi promulgada a Lei no 4.655, pela qual determinava que a adoção pudesse ser deferida quando o menor, com até sete anos de idade, fosse abandonado ou órfão não reclamado por qualquer parente no período mínimo de um ano, ou quando os pais fossem destituídos do pátrio poder[3], ou quando um filho natural reconhecido apenas pela mãe, que fosse impossibilitada de prover a criação da criança.
Apesar da evolução da sociedade em não mais distinguir os filhos tidos fora ou dentro do casamento, o abandono de crianças e adolescentes não teve fim, surgindo outros motivos surgiram para justificar os abandonos dessas crianças. Contudo, alguns casais socorriam essas crianças, proporcionando-lhes moradia, alimentação e educação. Dessa forma, o conceito de filho de criação foi legitimado, no Brasil, pelo Código Civil de 1916.
O Código Civil de 1916 sistematizou o instituto da adoção, passando a ser um marco no que se refere ao instituto, destacando o seu caráter privado, a possibilidade de dissolução ou revogação por manifestação de vontade das partes ou por ingratidão do adotado, desde que houvesse processo judicial, e, ainda, a possibilidade de adoção apenas para os casais que não podiam ter filhos biológicos. Contudo, tal Código estabeleceu diferenças entre os filhos de criação (adotivos) e os filhos biológicos, principalmente nos que ser referia à herança, além do que o vínculo parental era apenas entre o adotante e o adotado, pois não se estendia aos demais membros da família.
A Lei no 3.133/1957, denominada Estatuto da Adoção, instituiu mudanças significativas nas disposições sobre adoção no Código Civil de 1916. Dentre elas estava a redução da idade mínima do adotante de cinquenta para trinta anos de idade e a possibilidade de adoção por casais que já tivessem filhos, sendo que, no caso de existência de filhos biológicos, o adotado não teria direito a sucessão hereditária.
Com o objetivo de integrar totalmente o filho adotivo à família que o recebia, foi instituída em 1965 a Lei no 4.655, que traz a denominação Legitimação Adotiva, que posteriormente se transformou na adoção plena do Código de Menores ou Menorista.
O Código Menorista de 1979 classificou a adoção em simples e plena. A adoção simples era precedida da guarda do menor ao adotante e do estágio de convivência pelo período de um a seis meses. Já a adoção plena se aplicava ao menor com mais de sete anos e que já estivesse sob a guarda do adotante, além do que exigia o estágio de convivência no período mínimo de um ano, após esse período era definido o parentesco legal e irrevogável.
Até então, a adoção objetivava amparar o interesse único e exclusivo dos adotantes, o que foi modificado com a promulgação da Constituição Federal de 1988.
A Constituição Federal de 1988 modificou consideravelmente o instituto da adoção, passando a vigorar o princípio da igualdade e da proteção. Dentre as principais mudanças tem-se a constitucionalização do instituto da adoção, a obrigatoriedade da assistência do Poder Público, a igualdade entre os filhos biológicos e os adotivos e a proibição de qualquer ato discriminatório referente à filiação.
Com o objetivo de consolidar a extinção das distinções entre os filhos adotivos e os biológicos e propiciar a proteção das crianças e adolescentes privadas de uma família, já mencionada pela Constituição Federal de 1988, foi instituído o Estatuto da Criança e do Adolescente em 1990. Tal instituto foi baseado nas premissas da Constituição Federal de 1988 e, portanto, expos que a adoção deve priorizar as reais necessidades, interesses e direitos da criança e do adolescente, igualando os direitos de todos os filhos, fossem eles biológicos ou adotados.
Já em 2009, o Estatuto da Criança e do Adolescente sofreu sua primeira grande reforma. A Lei no 12.010/2009, Lei Nacional de Adoção, não revoga a Lei no 8.069/1990, mas sim incorpora mecanismos para fortalecer e preservar a integridade da família de origem, além de evitar ou diminuir ao máximo o período de acolhimento institucional de crianças e adolescentes.
Assim, perceptível que os institutos criados para regulamentar a adoção no Brasil sempre buscaram inovações para garantir os direitos e proteger as crianças e adolescentes, visando seu bem estar e a consolidação das famílias.
1.2 Conceito e natureza jurídica
O conceito de adoção varia de acordo com a época em que for definida, isso por ser um instituto antigo que remonta à antiguidade.
O primeiro conceito significativo para adoção encontra-se no Direito Romano, no qual a adoção era definida como um “ato solene pelo qual se admite em lugar de filho que pela natureza não é” (RODRIGUES, 2000, p. 22).
Clóvis Bevilacqua (apud SNICK, 1999, p. 43) afirma ser a adoção “o ato pelo qual alguém aceita um estranho na qualidade de filho”. Já Maria Helena Diniz (2002, p. 416) diz que a “adoção é um vínculo de parentesco civil, em linha reta, estabelecendo entre o adotante, ou adotantes, e o adotado um liame de paternidade e filiação civil”.
Tem-se ainda vários ramos de estudo sobre a adoção, os quais o definem de acordo com a sua área de atuação. Na psicologia, por exemplo, destacam-se os conceitos como o de Levinzon (2004), que afirma que o termo adoção tem origem no latim e significa considerar, cuidar, escolher. Já outros psicólogos afirmam que a adoção está ligada a criação de um relacionamento afetivo, com aspectos jurídicos, sociais e afetivos (REPOLDE e HUTZ, 2003).
Em cada época e cada doutrinador faz sua definição do instituto da adoção, levando em consideração os costumes, as tradições e os cultos do momento histórico e do lugar. Portanto, é importante destacar que adoção não é apenas um instituto que proporciona filiação, mas que objetiva ofertar àquele que foi privado de sua família biológica, um ambiente familiar favorável e estável, levando-se em consideração as necessidades básicas do adotado e a oportunidade dele ter um lar que lhe traga segurança e proteção.
Quanto à natureza jurídica da adoção, não há na doutrina um consenso. Clóvis Bevilacqua (apud GRANATO, 2003, P.27) afirma que o instituto da adoção trata-se de ato solene com consentimento do adotando ou do seu representante legal, ou seja, a adoção é um negócio bilateral. Assim, para a teoria contratualista, a adoção é um ato de vontade que exige o consentimento das partes interessadas, surgindo um contrato e seus efeitos jurídicos.
Por outro lado, a corrente institucionalista afirma que a adoção é um instituto de interesse do Estado, que atende a anseios de ordem social, portanto, é um instituo de ordem pública.
Desta forma, notório que tanto o conceito quanto a natureza jurídica da adoção estão diretamente ligados ao lugar e época em que forem analisados, cabendo lembrar que a adoção será, precipuamente, a constituição de um vínculo familiar irrevogável.
1.3 Espécies de adoção
A adoção é um instituto que busca a proteção e segurança da criança e do adolescente e, para tanto, várias foram as formas de adotar criadas pela lei ou mesmo pelos costumes, isso objetivando facilitar o acesso e convívio com a nova família.
Assim, diversas são as espécies de adoção instituídas no ordenamento jurídico brasileiro. Dentre elas tem-se a adoção à brasileira, a adoção póstuma, a adoção plena, adoção simples, a adoção pronta, a adoção tardia e a adoção internacional.
1.3.1 Adoção à brasileira
A adoção à brasileira é aquela que não atende aos requisitos impostos pela lei, ou seja, é uma modalidade de adoção ilegal. Dessa forma, a adoção à brasileira se concretiza com o registro do filho de outrem como se fosse filho biológico.
A adoção à brasileira é tida como o meio mais rápido de se adotar, tendo em vista a morosidade do processo legal de adoção, ou o receio de que ocorram dificuldades no decorrer do processo de adoção. Contudo, apesar da facilidade que a adoção à brasileira disponibiliza para àqueles que desejam adotar, esse meio de adoção também impõem consequências jurídicas para os que a praticam.
Na esfera cível pode ocorrer a anulação da certidão de nascimento, isso porque o registro de filho de outrem como se fosse próprio é realizado por meio de simulação, ato jurídico nulo. Pode também ocorrer da criança ser retirada do lar dos pais adotivos devido à simulação por eles realizada.
Já na espera penal, a penalidade para quem faz uma adoção à brasileira é mais severa, podendo levar os pais adotivos para a prisão.[4]
Embora existam punições para a prática da adoção à brasileira, as pessoas ainda a efetivam por estarem motivadas com sentimentos de nobreza, carinho e compaixão, o que as fazem deixar de lado quaisquer preocupações com as normas jurídicas. Tendo em vista esse posicionamento e a crescente adoção à brasileira motivada por gesto de nobreza e humanidade, foi que a Lei no 6.898/1981, acrescentou punições mais brandas, sendo possível inclusive o perdão judicial.[5]
Eunice Granato (2003, p.133) afirma que o parágrafo único do artigo 242 do Código Penal, ao utilizar-se da expressão ‘reconhecida nobreza’, “está englobando a adoção à brasileira, compreendidos os sentimentos de altruísmo e compaixão do ser humano”.
No entanto, mesmo com a facilidade de se realizar uma adoção à brasileira, atualmente sua prática não se justifica, isso porque existem outros meios de adoção eficazes, rápidos e sem riscos ou prejuízos ao adotado e ao adotante.
1.3.2 Adoção póstuma
A adoção póstuma surgiu no Estatuto da Criança e do Adolescente[6]. Trata-se da adoção realizada após a morte de um dos adotantes, se já havia processo judicial em curo e se o adotante falecido manifestou, em vida, sua vontade em adotar (OLIVEIRA, 2000, p. 186).
Desta forma, o Estatuto da Criança e do Adolescente impõe a presença de dois requisitos para que a adoção póstuma seja concretizada, quais sejam a manifestação de vontade inequívoca por parte do adotante e a existência de procedimento de adoção já instaurado.
A Lei no 12.010/2009, que revogou grande parte do Código Civil no que se refere a adoção e reformou o Estatuto da Criança e do Adolescente, também corrobora com o entendimento de que pode haver a adoção pelo adotante falecido, desde que ele tenha manifestado a vontade de adotar.
Pelos ensinamentos de Leoni Lopes Oliveira (2000, p. 186) “seria possível afirmar, na adoção póstuma, que o legislador introduziu a figura do filho adotivo póstumo; pois o nascimento da adoção, que se dá, como informa o art. 47 do ECA, com a sentença judicial, surge posteriormente à morte do adotante”.
É importante destacar nesse tipo de adoção que não pode pairar dúvidas sobre a intenção do adotante falecido em concretizar a adoção. Não havendo dúvidas em relação a esse requisito a adoção será plenamente deferida.
1.3.3 Adoção plena
A adoção foi unificada pelo Estatuto da Criança e do Adolescente e o Código Civil de 2002, passando a existir apenas a adoção plena, uma vez que a adoção simples presente no Código Menorista de 1979 fora revogada.
A adoção plena é aquela em que todos os vínculos anteriores a adoção passam a ser inexistentes, ou seja, a criança adotada não terá nenhum vínculo com a família biológica, passando a ser filho do adotante para todos os efeitos jurídicos e legais.
O instituto da adoção sofreu ao longo da história várias modificações com o intuito de sempre atender aos anseios da sociedade, principalmente das crianças e adolescentes privadas de uma família. Dessa forma temos no início um instituto de adoção não satisfatório, uma vez que o adotado era, frequentemente, dividido entre a família adotante e a biológica, principalmente no que diz respeito à educação, afeto e herança.
Dessa forma, houve a necessidade de uma adoção que integrasse totalmente o filho adotivo à família adotante. Tentando solucionar tal problema surgiu em 1965 a Legitimação adotiva[7], que foi substituída pela adoção plena no Código de Menores.
Portanto, pela adoção plena os vínculos entre o adotado e a família biológica são apagados e o adotado é tido como filho “pleno” da família adotante. Daí o registro de nascimento do adotado é alterado de forma que o parentesco criado pela adoção seja único, produzindo todos os efeitos na esfera jurídica e social.
1.3.4 Adoção simples
Antes do advento do Estatuto da Criança e do Adolescente existiam duas espécies de adoção, eram elas a adoção plena e a simples, conforme previsão do Código Menorista.
A adoção simples refere-se apenas ao vínculo de filiação estabelecido entre o adotado e o adotante, sendo que o parentesco constituído com a família biológica era mantido, podendo inclusive ser extinta por vontade das partes.
Adoção simples ou restrita era concernente ao vínculo de filiação que se estabelecia entre adotante e adotado, que pode ser pessoa maior ou menor entre 18 e 21 anos (Lei n. 8.069/90, art. 2o, parágrafo único), mas tal posição de filho não era definitiva ou irrevogável. Era regida pela Lei n. 3.133 de 8 de maio de 1957, que havia atualizado sua regulamentação pelo Código Civil de 1916 (DINIZ, 2002, p. 418).
No entanto, atualmente não há mais distinção entre adoção plena e adoção simples, fato esse garantido pela Constituição Federal em seu artigo 227, § 6o, que protege a igualdade entre os filhos biológicos e os adotivos.[8]
1.3.5 Adoção pronta
Pela adoção pronta, a mãe biológica escolhe quem serão os pais adotivos de seu filho.
A adoção pronta realiza-se quando os pais biológicos vão ao Poder Judiciário acompanhados daqueles que desejam adotar simplesmente para legalizar uma adoção que na prática já existe, pois a criança já está convivendo com os pais adotivos.
A vantagem da efetivação da adoção pronta está na preservação dos vínculos afetivos criados entre o adotante e o adotado, uma vez que apenas se legaliza uma situação já existente.
1.3.6 Adoção tardia
A adoção tardia ocorre quando a crianças está acima de dois[9] anos ou quando já são adolescentes.
Geralmente a adoção tardia se efetiva com crianças que foram abandonadas pelos pais biológicos quando já estavam grandes, ou quando o Estado determina que os pais não tem condições de manterem o poder familiar, ou quando a criança fica por período longo em instituições aguardando que a sua situação se resolva por meio da adoção ou para voltar a seu lar de origem.
Um dos problemas da adoção tardia é a dificuldade em se encontrar pais adotivos que almejem adotar crianças já grandes, desenvolvidas, pois a maioria dos pretensos adotantes busca crianças recém nascidas. Diante dessa situação tais crianças ficam a mercê da sorte, sendo que na maioria das vezes tornam-se maiores sem encontrar uma família que as acolham.
1.3.7 Adoção internacional
A adoção internacional é a que ocorre quando os adotantes são estrangeiros, estando submetidos à aprovação da Comissão Estadual Judiciária de Adoção Internacional da qual deverão está inscritos.
A adoção internacional só será homologada após todas as tentativas de adoção por pessoas brasileiras ou por estrangeiros que possuam domicílio no Brasil.
É exigido como requisitos para a adoção internacional a comprovação do domicílio em que haja habilitação para adotar do estrangeiro adotante, obedecidas às legislações do país do candidato à adoção, há ainda a exigência de estudo psicossocial realizado no país de origem, assim como o estudo e análise dos documentos do adotante pela Comissão Estadual Judiciária de Adoção Internacional e, por fim, o estágio de convivência entre o adotante e o adotado em território nacional pelo período de no mínimo 30 dias.
Assim para que a adoção internacional se concretize é necessário que o candidato a adotante possua autorização que comprove sua habilitação em seu país de origem, preenchidos todos os requisitos exigidos pela lei.
1.4 Requisitos para adotar
A adoção exige um procedimento pelo qual o adotante e o adotado devem se submeter para que haja a sua efetivação legal.
Primeiramente, como requisito para adotar deve-se observar a idade do adotante. O artigo 42 do Estatuto da Criança e do Adolescente afirma que “podem adotar os maiores de 18 anos, independentemente do estado civil”. Cabe ressaltar que o artigo 1619 do Código Civil foi modificado pela Lei no 12.010/2009, e não aborda mais o tema referente a diferença de idade entre o adotante e o adotado. Tal artigo traz em sua redação que o maior de 18 anos poderá ser adotado desde que haja “assistência efetiva do poder público e sentença constitutiva” da adoção. Conduto, o artigo 42, § 3o do Estatuto da Criança e do Adolescente não foi revogado e afirma que “o adotante há de ser, pelo menos, dezesseis anos mais velho do que o adotando”.
Apesar da diferença de idade exigida pela lei entre adotante e adotando, a jurisprudência tem aplicado esse requisito de acordo com o caso concreto, podendo a diferença de idade ser menor que 16 anos, desde que atenda as necessidades da criança ou do adolescente.
Outro requisito que deve ser destacado no processo de adoção trata-se do consentimento do adotado. O consentimento do adotado referido pelo Estatuto da Criança e do Adolescente em seu artigo 45 e parágrafos 1o e 2o não admite o suprimento judicial. No caso de o adotado ser absolutamente incapaz, a manifestação de vontade será dada pelos pais, tutores ou curadores. No entanto, se o adotando for maior de 12 anos, ele poderá manifestar sua opinião em relação a sua adoção[10].
O artigo 40 do Estatuto da Criança e do Adolescente afirma que a adotando deve ter no máximo 18 anos na época em que ocorrer o pedido de adoção. Contudo, se o adotando tiver mais de 18 anos e já estiver sob a guarda ou tutela do adotante pode haver o requerimento da adoção[11].
Nesse sentido Omar Kauss (2000, p.73) expressa sua opinião:
Para atingir o fim colimado pela lei, parece nos que a guarda ou tutela deve ter sido iniciada antes dos dezoito anos porque, se ao depois, não sendo a idade abrangida pelo novo sistema, valer-se do abrandamento seria um mero artifício para burlar a proibição legal ou escopo da regra.
O estágio de convivência é um dos principais requisitos que deve ser lembrado para que possa se efetivar a adoção. Assim, ao ser deferida a adoção, o magistrado deve observar a convivência do adotando com o adotante[12]. Esse período de convivência possibilita a aferição da adaptação do adotando com a nova família, permitindo-o conhecer a nova forma de vida que lhe será propiciada.
Atualmente o estágio de convivência não tem prazo determinado pela lei, ficando a critério do magistrado o tempo destinado a convivência inicial ou até mesmo podendo dispensá-la nos casos em que o adotando for menor de um ano ou se ele já estiver por tempo razoável convivendo com o adotante.
Assim, preenchidos os requisitos impostos pela lei, a adoção será deferida, produzindo seus efeitos legais perante todos.
1.5 Efeitos da adoção
A adoção gera consequências tanto na esfera patrimonial quanto na pessoal. Um dos efeitos pessoais que se destaca é em relação o desfazimento do vínculo de parentesco entre o adotado e sua família biológica, ressalvados os impedimentos para o matrimônio.[13] Esse efeito atende a finalidade da adoção, qual seja a de constituição familiar, principalmente para a criança ou adolescente abandonado, além do tratamento legal igualitário para os filhos biológicos e adotivos.
O desfazimento do vínculo de parentesco entre o adotado e a sua família biológica foi uma inovação do Código Civil de 2002, uma vez que o Código anterior trazia em seu texto que somente cessava o pátrio poder, hoje poder familiar, permanecendo os demais vínculos.
Outros efeitos na esfera pessoal dizem respeito ao nome e ao domicílio do adotado. O artigo 47, parágrafos 5o e 6o do Estatuto da Criança e do Adolescente afirma que o adotado receberá o nome do adotante, sendo possível a modificação de seu prenome desde que haja sua manifestação de vontade.[14] Ainda tem-se que o domicílio do adotado será o mesmo do adotante (DINIZ, 2002, p. 425).
Em relação aos efeitos patrimoniais destaca-se o direito sucessório, pois, assim como visto anteriormente, a Constituição Federal de 1988 equiparou os filhos, independente da sua origem afetiva ou biológica. Desta forma, os filhos adotivos terão o direito à herança na mesma forma que os demais filhos.
Como efeito patrimonial tem-se, ainda, a responsabilidade dos pais adotivos em relação à administração dos bens do adotado, assim como a obrigação de sustento, educação e responsabilidade pelos atos praticados pelo adotado.
Os efeitos da adoção iniciam-se com o trânsito em julgado da sentença que a defere, com exceção no caso em que a adoção é deferida após a morte do adotante que manifestou sua vontade de adotar em vida e teve o pedido deferido. Nesse caso, os efeitos serão retroativos a data do óbito do adotante.[15]
Uma consequência de destaque da adoção é sua irrevogabilidade, que bem destaca Maria Helena Diniz (2002, p. 422):
Mesmo que os adotantes venham a ter filhos, aos quais o adotado está equiparado, tendo os mesmos direitos e deveres, inclusive sucessórios, proibindo-se qualquer designação discriminatória relativa a filiação. A adoção é irreversível, entrando o adotado definitivamente para a família do adotante. A morte do adotante não restabelecerá o poder familiar do pai natural.
Desta forma, ficam claro os efeitos da adoção, cabendo àqueles que almejam realizá-la pesar os prós e contras do instituto para daí, conscientemente, constituir uma família sólida e bem estruturada.
1.6 Comentários à Lei no 12.010/2009
A Lei Nacional de Adoção foi instituída após dezenove anos do Estatuto da Criança e do Adolescente, que, com a nova Lei, teve sua primeira grande reforma. A Lei no 12.010/2009 alterou não só a Lei no 8.069/90, como também a Lei no 8.560/92 que aborda a temática sobre a averiguação oficiosa de paternidade, além de revogar praticamente toda a parte que dispõe sobre adoção do Código Civil de 2002 (DIGIÁCOMO, 2009).
Um dos objetivos da nova Lei, segundo as palavras de Murillo José Digiácomo (2009), é garantir o “direito à convivência familiar, em suas mais variadas formas, a todas as crianças e adolescentes, sem perder de vista as normas e princípios instituídos” pelo Estatuto da Criança e do Adolescente consagrados.
A Lei Nacional de Adoção buscou incorporar no Estatuto da Criança e do Adolescente meios que garantisse sua efetiva aplicabilidade, estabelecendo regras que fortalecem e preservam a integridade da família de origem, e busca minorar ou até evitar o tempo de acolhimento em instituições destinadas a manter criança e adolescente que foram privados de suas famílias biológicas.
As inovações trazidas pela nova Lei se constituem na ênfase dos princípios já abordados na Lei no 8.069/90, além dos deveres dos órgãos e autoridades públicas responsáveis pela garantia do “efetivo exercício do direito à convivência familiar para todas as crianças e adolescentes” (DIGIÁCOMO, 2009).
Destacam-se, na Lei Nacional de Adoção, as atribuições do Poder Judiciário, que são obrigados a manter cadastros de adoção, tanto no âmbito nacional como estadual, a desenvolver cursos ou programas de orientação para àqueles que desejam adotar, além de avaliar periodicamente
a situação de cada criança ou adolescente abrigada, na perspectiva de sua reintegração à família de origem ou, se comprovadamente impossível tal solução, sua colocação em família substituta, em qualquer de suas modalidades (guarda, tutela ou adoção) ou seu encaminhamento a programas de acolhimento familiar (DIGIÁCOMO, 2009).
A Lei 12.010/2009 traz um novo conceito de família, qual seja a família extensa ou ampliada. A família extensa ou ampliada constitui-se numa entidade formada por parentes de convívio das crianças ou adolescentes, quem mantém com eles um vínculo de afinidade e afetividades[16].
Outras inovações trazidas pela nova Lei dizem respeito às precauções que se deve ter em relação à adoção de crianças e adolescentes indígenas e na observância da Convenção de Haia para a realização da adoção internacional.
A Lei Nacional de Adoção busca acabar com práticas abusivas que afastam as crianças ou adolescente do lar sem um procedimento adequado e que atenda aos princípios do contraditório e da ampla defesa, além das adoções ilegais realizadas, principalmente, pelos profissionais de saúde.
Por fim, outra importante inovação trata-se da obrigação de o Estado manter políticas públicas intersetoriais, que possam prevenir ou minorar o tempo de acolhimento em instituto para crianças e adolescentes, sendo que esse período deve ser no máximo de dois anos, além de promover o exercício da paternidade responsável, sem delegar tal função ao Estado.
As regras trazidas pela Lei Nacional de Adoção buscam enfatizar a manutenção da criança ou do adolescente em sua família natural, sem que para isso haja algum tipo de rompimento dos vínculos familiares. Ou seja, a Lei no 12.010/2009 prioriza a convivência familiar de forma que haja uma cooperação mútua entre os profissionais que atuam na área da infância e juventude e a sociedade, para que possam oferecer um futuro digno às crianças e adolescentes institucionalizados.
2 A adoção norte-americana
2.1 Aspectos históricos da adoção
Conforme visto anteriormente, a prática da adoção ocorre desde a Antiguidade. Nos Estados Unidos, uma das primeiras notícias que se tem de tal prática ocorreu em 1693, quando o então governador de Massachusetts adotou uma criança.
Em 1769, havia a prática de entregar os órfãos aos seus parentes ou a pessoas da comunidade para que esses a criassem como servos ou até mesmo como filhos, contudo sem os adotar legalmente (AMERICAN EXPERIENCE, 2009).
Posteriormente, um fato marcante para o instituto da adoção ocorreu em 1850, quando o adotado passou a ter os direitos a herança do adotante.
Em 1851, ocorreu o primeiro caso legalizado de adoção nos Estados Unidos, mais especificamente no Alabama. Apesar da constante diferenciação entre filhos adotados e filhos biológicos, nessa adoção a criança teve decretado os mesmos direitos dos filhos biológicos da família adotante (LISBOA, 2002, p.12).
Nesse período, exigia-se idade mínima de 50 anos para ser adotante, sendo que a adoção deveria oferecer vantagens notórias ao adotado. Além disso, para que a adoção fosse legal, ela deveria ser manifestada por um contrato escrito entre as partes e submetido à análise do Tribunal de Justiça.
Em 1854, foi criado o comboio órfão. O objetivo desse comboio era levar os órfãos que estavam nas cidades urbanas para as áreas rurais, que pelo caminho eram expostas pelo caminho a fim de que famílias as adotassem ou as acolhessem. O comboio órfão teve seu fim em 1929 (AMERICAN EXPERIENCE, 2009).
A análise pessoal realizada sobre os pais adotivos somente tornou-se obrigatório em 1891, no estado de Michigan. Até então não se havia uma investigação da vida daqueles que desejavam adotar, apenas lhes eram entregues os adotantes observando-se apenas a vontade em adotar.
Em 1909, insatisfeito com as condições insalubres dos orfanatos, o Presidente Roosevelt convocou a primeira Conferência da Casa Branca sobre o cuidado de crianças dependentes, estabelecendo tal situação uma questão política nacional onde as crianças órfãs deveriam ser colocadas em lares adotivos permanentes.
Holt Holt Internacional da Criança é uma organização sem fins lucrativos que foi a pioneira na adoção internacional em 1956, a qual aprovou a adoção de crianças coreanas. Em 1961, passaram a constar disposições legais na imigração e na nacionalidade sobre a adoção internacional, que teve maior ênfase quando, em 1973, foi legalizado o aborto, pois a número de crianças americanas disponíveis para a adoção diminuiu consideravelmente, restando as crianças estrangeiras para aqueles que desejavam adotar (AMERICAN EXPERIENCE, 2009).
Durante toda a história Norte Americana houve manifestações sobre a adoção, mas foi em 1968, em Nova Iorque, foi instituído o primeiro programa de assistência para as crianças à espera da adoção. E em 1972 foi fundado o Centro Nacional de Adoção com o objetivo de promover a adoção de criança nos Estados Unidos da América.
O Conselho Nacional para a Adoção foi criado, em 1980, para promover a adoção e seus procedimentos, assim como fornecer maiores informações para os interessados (AMERICAN EXPERIENCE, 2009).
Estabelecendo normas uniformes para a proteção das crianças adotadas, foi aprovada a Convenção de Haia sobre a adoção internacional em 1993, que somente foi ratificada pelos Estados Unidos em 1994.
Já em 1997, o então Presidente Bill Clinton assina a lei sobre a segurança das famílias adotantes. E em 2001, um balaço foi realizado e concluiu-se que em média são adotadas 130.000 crianças nos Estados Unidos da América por ano, sendo que cerca de 19.000 são de origem estrangeira (AMERICAN EXPERIENCE, 2009).
2.2 Processo de adoção
O processo de adoção nos Estados Unidos da América de institui de forma simples se comparado com o processo de adoção brasileira, dependendo apenas de não haver contestações sobre a adoção.
Para aprovação da adoção, o interessado deve apresentar uma petição solicitando o seu deferimento, declinando as pessoas que possivelmente seriam afetadas a fim de realizarem uma audiência. Cabe ressaltar que cada estado norte americano possui normas específicas para o instituto da adoção, sendo mantida a Lei Uniforme de Adoção que rege os princípios básicos e as normas gerais do instituto.
A Lei Uniforme de Adoção prever que qualquer pessoa pode adotar, devendo apenas se maior de idade e submeter-se a aprovação do Tribunal. Contudo, com a possibilidade dos estados elaborarem leis específicas para a adoção, muito deles proíbem que pessoas deficientes físicos e mentais, homossexuais, dentre outros, possam adotar.
O interessado em adotar requererá ao Tribunal de Justiça que este lhe defira a adoção pretendida e, para isso, deverá apresentar provas que preencham todos os requisitos impostos pela lei, além de provar que a adoção atende ao melhor interesse da criança. Após esse procedimento, a agência de adoção do estado realizará uma investigação sobre os pretensos pais e apresentará um relatório com recomendações ao Tribunal.
Antes de deferir ou indeferir o pedido dos adotantes, o Tribunal intimará os pais biológicos para se manifestarem sobre a adoção. Caso os pais biológicos não sejam encontrados, o Tribunal usará dos meios cabíveis para notificá-los na perda do poder familiar.
Existem várias espécies de adoção, em algumas ela se concretiza por meio de uma agência ou de uma empresa privada. As agências são responsáveis pela fiscalização dos cuidados das mães biológicas que desejam abdicar de seus filhos, oferecem os serviços de apoio à família adotiva e aos pais biológicos depois de efetivada a adoção. São elas responsáveis, também, pela liberação da carta de adoção, contendo as recomendações ao Tribunal referente aos pretensos adotantes.
O processo de adoção por meio de empresas privadas é mais célere do que a realizada em uma agência. Nela o interessado nomeia um advogado, que irá em busca de pais biológicos que desejam entregar seus filhos para a adoção.
Para que a adoção seja efetivada são necessários dois consentimentos por parte da mãe biológica. O primeiro consentimento pode ser revogado até 48 horas ou 72 horas, dependo das regras que regem o estado, sendo que a Lei de Adoção Uniforme estabelece que a revogação possa ocorrer até oito dias após o nascimento da criança. O segundo consentimento somente pode ser revogado se a mãe biológica demonstrar que houve fraude ou coação em sua manifestação de vontade.
O consentimento do pai biológico também é requisito para a efetivação da adoção. Contudo, esse consentimento somente será necessário se o pai for conhecido. Se o pai biológico é conhecido e não é notificado para manifestar sua vontade, ele terá o prazo de seis meses[17] após o nascimento da criança para solicitar a revogação da adoção.
Depois de finalizado o processo de adoção, a família adotiva passa a ser reconhecida com a única família da criança adotada. Contudo, algumas peculiaridades podem ser observadas no processo de adoção norte americano. Assim, a lei permite que os pais adotivos decidam como será o contato do adotante com sua família biológica depois de concretizada a adoção, podendo ser enviadas cartas e fotos para que os pais biológicos acompanhem o desenvolvimento da criança.
2.3 Espécies de adoção
Assim como no Brasil, o ordenamento jurídico norte americano instituiu algumas espécies de adoção. Entre elas destacam-se a adoção relacionada, adoção independente, adoção privada, adoção internacional, adoção plena e adoção aberta.
2.3.1 Adoção relacionada
As adoções relacionadas são aquelas em que o adotante e adotado possuem alguma afinidade ou afetividade entre si. Geralmente ocorrem quando o padrasto ou madrasta desejam adotar seus enteados, ou seja, quando há o desejo de se legalizar o que já ocorre de fato.
Para o deferimento desse tipo de adoção basta que não haja nenhuma contestação a sua aprovaç