Bem de família poderá ser penhorado, quando comprovada a prática de blindagem patrimonial


17/10/2024 às 20h19
Por Beatriz Cristina Barbieri Büerger

O tema em questão foi objeto de julgamento em processo em trâmite no TRT da 2ª Região, em que os Executados agravaram decisão de IDPJ que os incluiu no polo passivo da demanda, alegando a suposta ilegalidade da medida, já que não teria havido abuso da personalidade jurídica caracterizado por desvio de finalidade ou por confusão patrimonial de sua parte.

 

Contudo, no Processo do Trabalho não é adotada a Teoria Maior da desconsideração da personalidade jurídica, não sendo imprescindível as provas de fraude, confusão patrimonial ou desvio de função na condução da sociedade (artigo 50 do CC), além disto, não é requisito que haja o esgotamento de todas as medidas executórias cabíveis contra a pessoa jurídica devedora principal para, só então, ser possível a desconsideração da personalidade jurídica e responsabilização dos sócios.

 

Pelo contrário, basta a inadimplência da sociedade diante da obrigação de pagar imposta na sentença trabalhista, conforme aplicação análoga ao § 5º, do artigo 28 da Lei 8.078/90.

 

A 12ª Turma do Tribunal da 2ª Região julgou pela manutenção da penhora sobre um bem avaliado em cerca de R$ 4,5 milhões, que fora adquirido pelo Executado antes do ajuizamento das reclamações trabalhistas.

 

Pela interpretação do colegiado, o devedor, prevendo problemas financeiros, realizou a compra para enquadrar o imóvel como bem de família, de forma fraudulenta, para obstaculizar uma futura execução de seu patrimônio.

 

Segundo ao Magistrado Richard Wilson Jamberg, é notável a prática de blindagem do patrimônio, quando há uma ação ilícita com vistas a ocultação patrimonial, que corriqueiramente ocorre previamente ao surgimento de dívidas, pontuando que: “Não é por outra razão que o artigo 169 do Código Civil prevê que a simulação não convalesce com o tempo, podendo ser declarada a qualquer momento”.

 

Neste sentido, o Magistrado Relator Flávio reafirmou a interpretação de primeiro grau, asseverando que a intenção de fraude fica mais evidente ainda, quando verifica-se que a aquisição do imóvel foi registrada em nome de sua filha, que era menor de idade à época do fato, com instituição do usufruto ao seu pai, Executado.

 

Com tais considerações, o Magistrado manteve a decisão que não reconheceu a propriedade como bem de família. Isto porque a própria lei que regulamenta esse instituto dispõe que suas previsões não se aplicam à pessoa que sabe ser insolvente e adquire, de má-fé, imóvel mais valioso para transferir a residência familiar (art. 4º da Lei 8.009 de 1990).

 

O caso envolve devedor comum em mais de 168 processos, e o valor atual da causa ultrapassa 17 milhões.

 

Confira a ementa:

 

EXECUÇÃO. FRAUDE. PENHORABILIDADE DO BEM DE FAMÍLIA. ART. 4º DA LEI Nº 8009/90. Embora a aquisição do imóvel de matricula nº 169.366 pelo pai da agravante tenha se dado anteriormente à propositura das ações que ensejaram a ação trabalhista, quando a agravante ainda era menor, com instituição de usufruto em favor do executado pai, resta evidente que o intuito ali foi apenas a ocultação e a blindagem patrimonial de futuras execuções. O pai da agravante, na condução das suas empresas, já antevia os problemas financeiros, eis que como destacou o MM Juízo de origem "...a maior parte das empresas que compõem o grupo econômico já existiam antes da aquisição do imóvel, conforme apontam as fichas cadastrais da JUCESP, pois a empresa Nautical Parts foi fundada em 07/05/1998 (ID 91f1db8), a Tec-Craft em 03/07/2002 (ID 96936b4), a Vernice e a Arte Ville em 07/01 /2004 (IDs 38f4c32 e cf96818) e a Hangar One em 08/01/2004 (ID 79ª7dc6)...". Portanto, a aquisição e a transferência da propriedade do imóvel de matricula nº 169.366, de valor vultoso (avaliado em R$ 4.416.000,00 (quatro milhões e quatrocentos e dezesseis mil reais - fl. 277) é uma fraude evidente, não podendo se beneficiar do sério instituto do bem de família, atraindo-se a aplicação do art. 4º da Lei 8009 de 29.03.1990 que dispõe: "Art. 4º Não se beneficiará do disposto nesta lei aquele que, sabendo-se insolvente, adquire de má-fé imóvel mais valioso para transferir a residência familiar, desfazendo-se ou não da moradia antiga." (TRT da 2ª Região/SP. Processo n.º 1000924-97.2020.5.02.0038, Agravo de Petição, 12ª Turma. Relator Flávio Laet).

 

Autoria de Beatriz Cristina Barbieri Büerger. Dúvidas à respeito do meu artigo? Contate-me através do link: https://conecta.bio/bea

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Beatriz Cristina Barbieri Büerger

Advogado - Balneário Camboriú, SC


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