por Aline Marques Marino*
Etimologicamente, o termo "eutanásia" vem do grego e significa "morte digna". Após, verificamos que, com o tempo, o significado original tornou-se obsoleto, eis que existem diversas classificações propostas pelos estudiosos da área, sendo que a "ortotanásia" é a modalidade que guarda maior similitude com o significado original, designando a morte natural, com os cuidados paliativos ordinários de praxe.
Além da ortotanásia, há também outras modalidades. Há aquelas que são mais divulgadas pela mídia, muitas vezes como sinônimas, sem se preocupar com os aspectos técnicos. Há a eutanásia positiva, a eutanásia negativa, a distanásia, a mistanásia e a eutanásia coletiva (econômica, criminal, experimental, profilática e solidária).
Embora o termo "eutanásia" seja razoavelmente recente, há contextos na história, sobretudo entre os povos da antiguidade, que podem ser enquadrados dentro do conceito de "eutanásia", o que comprova que desde os tempos mais remotos a prática entre humanos era até mesmo comum. Ganha destaque o contexto da Alemanha Nazista, em que o sacrifício de pessoas, sobretudo as portadoras de necessidades especiais, era, inclusive, previsto nas normas legais, o que conduz à reflexão sobre a Justiça e a legitimidade do Direito.
A preocupação com o assunto, contudo, cresceu com a difusão do cristianismo. O Vaticano, em documentos oficiais, mais especificamente
a Declaração sobre Eutanásia, datada de 1980, trouxe à baila posicionamento que se aproxima da defesa pela ortotanásia, e que se deve evitar o sofrimento inútil a pacientes terminais.
A polêmica quanto ao assunto se instaurou no Brasil quando o Conselho Federal de Medicina (CFM) publicou a Resolução 1.805/2006, principalmente pela redação genérica, sem quaisquer especificidades, o que abre margem a interpretações amplas no que tange à decisão dos médicos em proceder ou não à prática da eutanásia. Esta Resolução foi alvo de críticas pela Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), que chegou a colocar a discussão sobre a hierarquia entre o Código Penal (decreto-lei, recepcionado pela Constituição Federal de 1988 como lei ordinária federal) e a Resolução (norma administrativa), sendo que, ao adotar esta Resolução, o sistema do escalonamento normativo (Pirâmide
de Kelsen) seria desrespeitado.
No Brasil, ainda não há legislação que trata sobre a "eutanásia" de forma específica. Entretanto, a depender da análise do caso concreto, pode-se configurar situações que se enquadrariam no conceito de "eutanásia", como o homicídio privilegiado (CP, art. 121, §1º, relevante valor moral) e a atenuante genérica (CP, art. 122 (auxílio) c.c. art. 65, III, “a”, relevante valor moral").
Em que pese inexistir legislação brasileira específica, há projetos de lei, como o Anteprojeto do Código Penal, que prevê a eutanásia como modalidade de homicídio privilegiado e a ortotanásia como causa de exclusão da ilicitude.
No Direito Comparado, no Peru, no Uruguai e na Colômbia, há previsão legal do perdão judicial para o homicídio eutanásico. Já na Holanda e na Bélgica a eutanásia é legalizada, porém com algumas condições.
Um dos casos que merece destaque é o de Ramón Sampedro, ocorrido na Espanha, país contrário à prática da eutanásia. O caso ficou mundialmente conhecido, tendo em vista a divulgação do livro biográfico "Cartas do Inferno" (2005) e o filme "Mar Adentro", ganhador do Oscar em 2005. Embora haja divulgação deste caso como se fosse eutanásia, pela observação mais apurada, podemos colocar em xeque as afirmações
divulgadas, pois Sampedro ficou tetraplégico aos 22 anos e somente aos 54 anos ingressou com ação judicial, requerendo o direito de realizar
a eutanásia (pedido negado), o que traz a dúvida quanto à caracterização do "sofrimento", bem como se a ingestão proposital de cianureto de potássio, em 1998, poderia ou não configurar o suicídio.
* Aline Marques Marino é advogada, graduada em Direito pelo UNISAL-U.E. de Lorena, Especialista em Direito Administrativo pelo AVM Faculdade Integrada e WDireito, e Mestranda em Concretização dos Direitos Sociais, Ecnômicos e Culturais e dos Direitos de Titularidade Difusa e Coletiva pelo UNISAL-U.E. de Lorena. Contatos: (12) 98867-9398; [email protected]