A OBRIGAÇÃO DE PROVER ALIMENTOS GRAVÍDICIOS SOB ASPECTO DA LEI Nº 11.804 DE 2008.


30/01/2023 às 10h50
Por Vitória Santana Juris

     2.1 FAMÍLIA SOB ASPECTO CONSTITUCIONAL

O conceito de família atualmente está atrelado a concepção constitucional, pois a Constituição de 1988 elenca no seu artigo 226 os novos arranjos familiares, sendo ainda previsto ao Estado protegê-la. Será visto e analisados algumas formas de se constituir uma entidade familiar, para que dessa forma possamos adentrar no tema central

A Constituição Federal abrangeu de forma explicita e implícita as novas famílias, que surgiram ao longo dos tempos, pois a sociedade modificou-se e vivência constantes transformações.

Diante disso, o nosso ordenamento jurídico ver-se obrigado a ir de encontro com tais mudanças, ao modo que a sociedade e o Poder Judiciário se comunicam perante aos casos concretos.

Nos ensina Silvio Neves Baptista (2014, p.26)

Com o surgimento da industrialização, ocorreu o processo de urbanização acelerada e o surgimento de movimentos de emancipação das mulheres. Daí em diante, ocorreram profundas transformações econômicas e sociais, consequentemente comportamentais, que puseram fim à instituição familiar nos moldes patriarcas.

 

É evidente que os novos arranjos familiares não estão mais atrelados dos havidos anteriormente, e para o Direito de Família, atualmente o modo patriarcal dos tempos remotos se demonstra ultrapassado, pois o novo texto constitucional traz em seu escopo outros meio de se constituir uma família, além do matrimonial que estava vinculado ao Código Civil de 1916, e agora vivenciamos um novo Código Civil de 2002, diferentemente do anterior.

Dentre as novas entidades familiares, de forma explicita a Constituição Federal de 88 abrange o casamento que antes já era previsto em códigos anteriores e agora se faz presente no art.226, §1° e §2°, CF, união estável um novo instituto ampliado no texto constitucional e previsto também no novo código civil (art.226, §3°, CF) e família monoparental (art.226, §4°, CF), já as outras entidades estão presentes de maneira implícita e serão vistas adiante.

Conforme Rolf Madaleno (2015, p.36)

A família matrimonializada, patriarcal, hierarquizada, heteroparental, biológica, institucional vista como unidade de produção cedeu lugar para uma família pluralizada, democrática, igualitária, hetero ou homoparental, biológica ou socioafetiva, construída com base na afetividade e de caráter instrumental.

 

O casamento matrimonial é a forma mais antiga do conceito de família, e sempre esteve presente na sociedade e no ordenamento jurídico, encontrando-se base legal no Código Civil em seu artigo 1.511, e atualmente o casamento sofreu desdobramentos e inovou-se ao passo que há a previsão jurisprudencial do casamento homossexual, algo que antes não era previsto e ganhou espaço e positivação no mundo jurídico.

Ao Estado cabe o dever de proteger as entidades familiares, mesmo que antes essa proteção era apenas prevista ao matrimonio, agora passou-se a abarcar todos os meios familiares.

Outra entidade familiar que carece de atenção é a união estável, presente no artigo 1.723 do Código Civil, e dá-se pela formação de pessoas heterossexuais e homossexuais, desde que preenchidos os requisitos legais para tal formação, onde deve haver convivência de modo público, continuo e duradouro, e essa hipótese prevalece mesmo que o casal não tenha a intenção de obter filhos.

A família monoparental é formada pelo ascendente, podendo ser o pai ou a mãe, e seu descendente, e encontra-se base legal no artigo 226, §4° da CF/88.

Ainda, há a formação da família anaparental, mesmo que havida de forma implícita, onde a jurisprudência é bastante corriqueira acerca desta, e nela podemos observar sua formação por pessoas mesmo que não possuindo a presença de um de seus ascendentes, e vivendo diante de uma estrutura organizada e psicológica, geralmente ocorre quando há a instituição de dois irmãos convivendo juntos.

Já a família reconstituída ou recomposta, ocorre da junção de outras famílias antes havidas e agora desconstituídas, um exemplo corriqueiro é o um casal divorciado de outros matrimônios que decidem se casarem novamente.

A última entidade familiar prevista é a unipessoal, que é formada por apenas uma pessoa, e que foi reconhecida pelos doutrinadores como “famílias single”, este tipo de família goza dos mesmos direitos e prerrogativas das outras entidades familiares.

    2.2 DO NASCITURO

Visto e entendido as entidades familiares abarcadas de forma explicita e implícita no contexto constitucional e no direito de família, passaremos a entender acerca do nascituro, seus direitos e prerrogativas.

A origem da palavra nascituro é derivada do latim “nascituru”, e nos remete a concepção do ser humano no ventre de sua mãe, e no nosso ordenamento jurídico, o Código Civil em seu artigo 2° faz menção a personalidade jurídica, como será visto adiante.

Entendemos por nascituro o ser humano em formação, mesmo que no ventre de sua genitora, onde o nascimento deste se aguarda como um fato futuro e certo. Encontramos previsão legal para este acontecimento no artigo 2° do Código Civil, enunciando o mesmo que “A personalidade civil da pessoa começa com o nascimento com vida; mas a lei põe a salvo, desde a concepção, os direitos do nascituro”.

Com isto, podemos analisar o primeiro questionamento, no qual enseja o direito do nascituro desde sua concepção, ensejando também direitos futuros, que serão condicionados ao seu nascimento com vida.

A doutrina nos ensina acerca de três possíveis teorias acerca do nascituro, havendo a Teoria Natalista, Teoria da Personalidade Condicional e a Teoria Concepcionista.

A primeira teoria nos remete ao direito de personalidade do nascituro, que somente poderá ocorrer com o nascimento com vida deste, seguindo o previsto no artigo 2° do CC.

Ainda, segundo esta teoria, o nascituro goza de proteção, porém não poderá sua progenitora disfrutar e exercer tais direitos enquanto se encontrar em mera concepção, pois segunda argumenta tal teoria, o nascitura que ainda não adquiriu sua vida completa, não poderá transmitir ou exercer obrigações, pois ainda não há uma personalidade jurídica concreta.

Já, segundo a Teoria da Personalidade Condicional, parte-se do pressuposto que ao nascituro há uma subordinação de seus direitos a condicional do nascimento deste com vida, a este cabendo o reconhecimento como pessoa.

Ambas teorias se demonstram como parecidas, porem uma difere da outra ao passo que a primeira se baseia em preceito legal, e a outra ocorre de forma diferente.

No que tange a Teoria Concepcionista, esta nos remete que ao nascituro cabe direitos e deveres desde sua concepção, divergindo das outras teorias, e esta é a teoria presente no ordenamento jurídico brasileiro.

Acerca desta teoria nos ensina Carlos Roberto Gonçalves (2009)

Essa situação deu origem a uma divergência doutrinaria em torno do início da personalidade, surgindo então a teoria concepcionista, sob influência do direito francês. Para os adeptos dessa corrente, dentre os quais se encontram Teixeira de Freitas e Clóvis Beviláqua, a personalidade começa antes do nascimento, pois desde a concepção já há proteção dos interesses do nascituro, que devem ser assegurados prontamente. 

 

Podemos observar ainda, o que enuncia o Estatuto da Criança e do Adolescente, que em seus artigos 7° e 8° fazem menção há alguns direitos estabelecidos, tais como: direito a proteção à vida, e a saúde, ainda, remetendo ao poder estatal o condão de estabelecer políticas públicas para que as gestantes tenham apoio e condições de um desenvolvimento saudável e progresso da criança.

O Pacto de São José da Costa Rica, estabelecido através de um acordo internacional, previu por meio do decreto 678/92, em seu artigo 4°, que a todos os seres humanos serão inertes o direito de respaldo a vida, estabelecendo que este deve ser previsto em lei, esclarecendo ainda, que o dever a vida será prestado desde o momento da concepção do ser humano, e tal decreto encontra-se abarcado pelo nosso ordenamento jurídico.

Segundo aborda Orlando Gomes, há uma personalidade presumida, e esta encontra-se ao nascituro, sendo protegido seus direitos por lei, conforme afirma: “ainda não tem personalidade, pois que esta começa com o nascimento, mas, desde a concepção, é como se a possuísse”.

Cabe ressaltar o disposto no artigo 542 do Código Civil, no qual dispõe: “A doação feita ao nascituro valerá, sendo aceita pelo seu representante legal”, ou seja, ao nascituro será concedido o direito de doação, ainda a respeito, a doação deverá ser aceita pelos seus representantes legais, onde após a aceitação, cabe o direito de posse e usufruto do bem doado.

Caso ocorra o falecimento do nascituro na insurgência do parto, a doação será novamente incorporada ao bem do doador, e não mais existirá no campo jurídico, conforme aduz o artigo 542 do CC.

Ao nascituro é assegurado o cunho de herança, tendo base legal no artigo 1.798 do CC: “O nascituro fica legitimado a suceder o ser concebido no momento da abertura da sucessão”, há alguns requisitos necessários, no qual que o nascituro nasça com vida no prazo de dois anos estabelecidos desde a abertura da sucessão, caso não haja outros meios estabelecidos pelo legatário.

Podemos observar e analisar um caso acerca do tema de sucessão proferido pelo Tribunal de Justiça de São Paulo (Apelação Cível n°0001804-08.2009.8.26.0060, Rel. Alexandre Lazzarini)

NASCITURO. SUCESSÃO LEGÍTIMA. NASCIMENTO COM VIDA. SEGURO OBRIGATÓRIO. 1- A sentença determinou que os avós entreguem ao neto valor indenizatório que receberam de seguro (DPVAT) em razão da morte do filho deles, pai do neto. 2- A criança, na época do falecimento do pai estava sendo gestada e, como nascituro nascido com vida, é sucessor do pai, excluindo os avós, ascendentes (CC, arts.2°, 1.798 e 1.829). 3- Apelação não provida.

 

Ou seja, o direito de sucessão é assegurado ao nascituro desde que nasça com vida, e será assegurado a este o direito de reaver o que lhe é devido por direito, um exemplo é o caso acima mencionado, sendo respaldado por base legal prevista no Código Civil.

Ainda, cabe ao nascituro o direito de se estabelecer um curador especial quando ocorra o falecimento do pai, e a mãe grávida não possuir condições de desempenhar o poder familiar. Podemos encontrar amparo legal no artigo 1.779 do CC: “Dar-se-á curador ao nascituro, se o pai falecer estando grávida a mulher, e não tendo o poder familiar”, ainda o parágrafo único do artigo mencionado aduz que o curador especial será o mesmo para a mãe do nascituro, quando esta não se encontrar em suas plenas condições.

Vimos que ao nascituro cabe direitos, e a teoria adotada no nosso ordenamento jurídico brasileiro é a teoria concepcionista, onde ao nascituro caberá direitos desde sua concepção e o mesmo adquirirá sua personalidade com o nascimento com vida, e deverão ser observados os direitos desde a concepção do nascituro como o direito à vida, a saúde e a alimentação, como será visto mais adiante.

2.3 ALIMENTOS GRAVÍDICOS

Grande parte da doutrina entende que o conceito de alimentos gravídicos está ligado ao dever de prestar auxílios necessários a genitora e consequentemente ao seu nascituro, prestação esta devida desde sua concepção.

Tais alimentos devidos a gestante, tem o condão de estabelecer uma prestação que abrange todas as necessidades desta, desde a concepção ao parto do nascituro, entre as prestações estão presentes o dever de garantir todas as assistências necessárias, como alimentos, assistência medica, medicamentos, teto, dentre outras que se demonstrarem indispensáveis para que haja um bom progresso no desenvolvimento do nascituro e sua genitora.

Com o implemento da Lei n°11.804 de 2008, a obrigação de prestar alimentos gravídicos passou a ser amparada legalmente, pois segundo esta, garante de forma expressa e taxativa os auxílios necessários a gestante e ao nascituro.

Conforme nos ensina Said Yussef Cahali (2012)

 A lei 11.804/08 procura proporcionar a mulher grávida um autêntico auxilio maternidade, sob a denominação latu sensu dos alimentos, representado por uma contribuição proporcional ao ser imposta ao suposto pai, sob forma de participação nas despesas adicionais do período de gravidez e que sejam delas decorrentes, da concepção ao parto, incLusive as referentes a alimentação especial, assistência médica e psicológica, exames complementares, internações, parto, medicamentos e demais prescrições prescritivas e terapêuticas indispensáveis, ajuízo do médico, além de outros que o juiz considere pertinentes.

 

O principal objetivo da implementação desta lei, foi desmistificar questionamentos acerca da possibilidade da prestação de alimentos gravídicos, onde antes de implementada esta lei, o legislador via-se obrigado a vincular casos desta natureza a lei de alimentos, que se demonstrava genérica e incapaz de estabelecer tais alimentos, sem que antes houvesse a prova do parentesco e da necessidade alimentar.

De forma ampla, a lei se demonstra positiva, pois não o que se questionar acerca do dever de prestar alimentos nesses casos, pois a proteção a genitora e ao nascituro foi o foco primordial do legislador, no que antes não havia previsão, tampouco base legal, mas que sempre careceu de atenção no âmbito judiciário.

Tal lei outorgou a legitimidade ativa para que a gestante possa proceder ação de alimentos gravídicos em face do pai do nascituro, buscando dessa forma o que for necessário para a manutenção e progressão do nascituro.

No atual cenário jurídico, a lei que regula os alimentos gravídicos, se estabelece de forma fundamental, se relacionando com normas constitucionais e ainda com o Direito de Família contemporâneo, atrelando-se aos princípios da dignidade da pessoa humana, da solidariedade familiar, melhor interesse da criança, da afetividade e função social da família.

Os alimentos gravídicos são estabelecidos no artigo 2° da Lei n°11.804/2008,

Art.2° Os alimentos de que trata esta Lei compreenderão os valores suficientes para cobrir as despesas adicionais do período de gravidez e que sejam dela decorrentes, da concepção ao parto, inclusive as referentes a alimentação especial, assistência medica e psicológica, exames complementares, internações, parto, medicamentos e demais prescrições preventivas e terapêuticas indispensáveis, a juízo do médico, além de outras que o juiz considere pertinentes. 

 

A proteção tanto da gestante quanto do nascituro é o objetivo central desta lei, pois mediante esta, a gestante pode ajuizar ação própria, pretendo o auxílio elencado no artigo acima citado, onde tais auxílios devem permanecerem da concepção até o parto, garantindo a vida digna do nascituro desde sua via intrauterina, até sua vida pós-parto.

A lei de alimentos gravídicos foi somente implementada no ano de 2008, porém já havia casos anteriores a respeito do tema, como ocorreu no ano de 2003, onde o Tribunal do Estado do Rio Grande do Sul, julgou de forma positiva e concedeu os alimentos necessários para o nascituro.

Cabe aqui transcrever parte do julgado (Agravo de instrumento n°70006429096, Rel. Sérgio Fernando de Vasconcelos)

Investigação de paternidade. Alimentos provisórios em favor do nascituro. Possibilidade. Adequação do quantum. 1. Não pairando dúvida acerca do envolvimento sexual entretido pela gestante com o investigado, nem sobre exclusividade sobre esse relacionamento, e havendo necessidade da gestante, justifica-se a concessão de alimentos em favor do nascituro. 2. Sendo o investigado casado e estando também sua esposa gravida, a pensão alimentícia deve ser fixada, tendo em vista as necessidades do alimentando, mas dentro da capacidade econômica do alimentante, isto é, focalizando tanto os seus ganhos como também os encargos que possui.

 

Logo, podemos observar que os alimentos gravídicos é um instituto presente no nosso ordenamento jurídico, mesmo sendo anterior a lei que o regulamenta, e os casos havidos anteriormente a referida lei, foram julgados de forma a proceder com a obrigação de prestar os alimentos necessários a gestante e ao nascituro.

No que tange, os alimentos gravídicos possuem natureza cautelar, entendidos como uma subespécie dos alimentos provisórios, que será visto e analisado a obrigação de alimentar posteriormente.

Ainda, a lei estabelece que ao alimentante fica obrigado o dever de prestar e manter a obrigação, mesmo que esta obrigação seja decorrente do afeto, ou da manutenção sentencial.

Ao promover o auxílio necessário por parte do pai para a gestante e ao nascituro, a lei em questão não visa destituir a gestante das suas obrigações para com seu nascituro, ao contrário, visa a manutenção e o desenvolvimento deste de forma voluntaria, onde tanto a gestante como o pai do nascituro devem se demonstrar de forma isonômica.

Essa forma de estabelecer os mesmos deveres entre os pais do nascituro tem previsão legal nos artigos 227 e 230 da Constituição Federal, in verbs,

Art. 227. É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança, ao adolescente e ao jovem, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de coloca-los a salvo de toda forma de negligencia, discriminação, exploração violência, crueldade e opressão.

 

Devemos observar que os alimentos gravídicos também repercutem aos ascendentes, por se tratar de uma obrigação sucessiva. Logo, caso o pai não seja capaz de arcar com as prestações de alimentos, fica condicionado o dever ao parente mais próximo deste.

Portanto, vimos acerca dos acerca dos alimentos gravídicos, sua origem, definição e requisitos, onde a lei n°11.804/2008 inovou ao trazer em seu artigo 2° quais seriam os alimentos que devem ser prestados, além de proporcionar uma maior proteção a gestante e ao seu nascituro, que possui direitos desde sua concepção.

 

 

2.3.1 Da obrigação de alimentar

Acerca da obrigação, no âmbito jurídico podemos observar duas divisões: a obrigação de dar e de fazer. No que tange a obrigação de fazer, espera-se desta um comportamento omissivo ou comissivo por parte do obrigado.

Conforme nos ensina Silvio Rodrigues (2004, p.380)

Alimentos, em direito, denomina-se a prestação fornecida a uma pessoa, em dinheiro ou em espécie, para que possa atender às necessidades da vida. A palavra tem conotação muito mais ampla do que na linguagem vulgar, em que significa o necessário para o sustento. Aqui se trata não só do sustento, como também do vestuário, habitação, assistência médica em caso de doença, enfim de todo o necessário para atender às necessidades da vida; e, em se tratando da criança, abrange o que for preciso para sua instrução.

 

Entendido o significado de alimento, segundo a doutrina, que no qual se demonstra pelo dever de prestar em dinheiro ou espécie, para que dessa forma supra as necessidades da vida, possamos então prosseguir e entender acerca da obrigação de prestação de alimentos e suas características.

O Código Civil disciplina em seus artigos 1.694 a 1.710, acerca dos direitos e obrigações sobre prestação alimentícia. Tratando sobre a legitimidade ativa e passiva de prestar alimentos.

Alguns princípios norteiam a obrigação de alimentar, tais como o da solidariedade humana e o dever familiar de mútua assistência. Onde ambos fazem referência ao dever recíproco por parte dos pais.

Uma das características importantes acerca da obrigação de alimentar, diz respeito ao prazo prescricional da propositura da ação, no qual antes do nosso atual Código Civil esse prazo era de cinco anos, e atualmente prescreve em dois anos.

Entretanto ao se tratar de ação de obrigação alimentar, temos um direito imprescritível, podendo a mesma ser acionada a qualquer momento, pois parte-se do pressuposto de que a qualquer momento pode haver uma necessidade de alimentos. No entanto, quando ao momento da sentença judicial acerca da obrigação alimentar, passa-se a um lapso prescricional.

É importante destacar que a obrigação alimentar tem caráter divisível, ou seja, pode haver a contribuição econômica dividida entre os parentes, quando o obrigado não conseguir arcar com as custas por completo, essa forma ocorre sem que haja a solidariedade de prestação, estando disposto nos artigos 1.696 e 1.697 do Código Civil.

In verbs Código Civil (arts.1.696 e 1.697)

Art.1.696 – O direito a prestação de alimentos é recíproco entre pais e filhos, e extensivo a todos os ascendentes, recaindo a obrigação nos mais próximos em grau, uns em falta de outros.

Art.1.697 – Na falta dos ascendentes cabe a obrigação aos descendentes, guardando a ordem de sucessão e, faltando estes, aos irmãos, assim germanos como unilaterais.

 

Para que haja o devido dever de prestação alimentar, deve-se ter alguns requisitos primordiais, nos quais ensejam no reconhecimento da necessidade, possibilidade, proporcionalidade e reciprocidade, havidos estes reconhece-se o dever prestacional.

Verificamos que há a necessidade quando fica evidente a escassez de bens e de alimentos, quando não há como suprir a manutenção destes ao alimentado.

Já a possibilidade, ocorre quando mesmo o alimentante prestando seu dever, não lhe falte seu próprio sustento de alimento, pois não cabe a obrigação de alimentar quando o alimentante não possa manter ao alimentado.

No artigo 229 da Constituição Federal de 88, está disciplinado acerca da reciprocidade, onde enuncia que é dever de ambos pais dar educação e assistência aos filhos menores.

 Ainda, podemos entender que a obrigação de prestação de alimentos vai além, pois visa o direito a vida, a relação afetiva, onde devem vim diretamente dos pais, ou quando um destes não tiver essa condição, o outro deve prover esse.

Segundo Maria Berenice Dias, entende-se que o dever de prestação de alimentar pode comportar vários critérios onde “são devidos por vínculo de parentalidade, afinidade e até por dever de solidariedade”.

Depreende-se que, os parentes como sendo vinculados entre si por meio do sangue ou da afetividade, tem a obrigação de alimentar, quando os pais e alimentantes do nascituro não proverem de condições para manter ao alimentante sustâncias básicas e inerentes ao ser desenvolvimento.

Portanto, a obrigação de prestação de alimentar é visada sempre que haja os elementos básicos para sua formação, no qual enseja suprir necessidades fundamentais a manutenção da vida.

2.3.2 Princípios norteadores dos alimentos gravídicos

Acerca da Lei que rege os alimentos gravídicos, há alguns princípios norteadores embasados no seio constitucional, no que tange aos direitos fundamentais do nascituro, no qual sejam: Princípio da Dignidade da Pessoa Humana, Princípio da Solidariedade Familiar e o Princípio da Proteção Integral e do Melhor Interesse da Criança.

 O Princípio da Dignidade da Pessoa Humana será o primeiro analisado, este se faz presente como basilar no âmbito jurídico, pois está presente em todas as relações jurídicas.

Encontramos base legal a este princípio na Constituição Federal de 88, em seu artigo 1°, III, onde aduz que tal princípio é um dos fundamentais no nosso ordenamento jurídico.

Acerca da Lei de Alimentos Gravídicos, o princípio da dignidade da pessoa humana demonstra-se com a necessidade de manutenção da vida, a partir do momento em que a vida do nascituro e da gestante se encontram em risco, daí o princípio está presente de forma direta e basilar nesses casos.

Conforme nos ensina Sílvio de Salvo Venosa (2010, p.357)

Em linha fundamental, quem não pode prover a própria subsistência nem por isso deve ser relegado ao infortúnio. A pouca idade, a velhice, a doença, a falta de trabalho ou qualquer incapacidade pode colocar a pessoa em estado de necessidade alimentar. A sociedade deve prestar-lhe auxílio. O Estado designa em primeiro lugar os parentes para fazê-lo, aliviando em parte seu encargo social. Os parentes podem exigir uns dos outros os alimentos e os conjugues devem-se mútua assistência. A mulher e o esposo, não sendo parentes ou afins, devem-se alimentos com fundamento no vínculo conjugal. Também os companheiros em união estável estão na mesma situação atualmente.

 

         Logo, podemos observar que o princípio da dignidade da pessoa humana remete ao indivíduo as necessidades básicas para a manutenção de sua vida, não podemos então, falar acerca deste princípio quando o indivíduo não consegue prover suas próprias necessidades.

Já acerca do Princípio da Solidariedade Familiar, este tem por objetivo de proteção e ajuda mútua no âmbito familiar, e esse dever surge desde a concepção do nascituro.

O interprete da lei utiliza esse princípio diante dos casos que versem sobre o Direito de Família, pois tal princípio rege as relações no âmbito familiar, onde há um dever de prestação mutua em aspectos morais e matérias.

Encontramos fundamento legal deste princípio na Carta Magna, presente em seus artigos 3°, 226, 227 e 230, onde ambos aduzem que o princípio da solidariedade é pertinente quanto ao direito alimentar.

Acerca do tema, nos ensina Carlos Roberto Gonçalves (2005, p.441)

O dever de prestar alimentos funda-se na solidariedade humana e econômica que deve existir entre os membros da família ou parentes. Há um dever legal de mútuo auxílio familiar, transformado em norma, ou mandamento jurídico. Originalmente, não passava de um dever moral, ou uma obrigação ética, que no direito romano se expressava na equidade, ou no officium pietatis, ou nas caritas. No entanto, as razões que obrigam a sustentar os parentes e a dar assistência ao conjugue transcendem as simples justificativas morais ou sentimentais encontrando sua origem no próprio direito natural.

 

Diante disso, podemos concluir que o princípio da solidariedade é fixo quanto aos casos de alimentos, direcionada pela perspectiva de solidariedade, fator este imprescritível.

Quanto ao Princípio da Proteção Integral e do Melhor Interesse da Criança, contém embasamento legal no artigo 227 da Constituição Federal de 88, assim como no artigo 3° do Estatuto da Criança e do Adolescente.

Tal princípio rege as crianças e aos adolescentes proteção aos direitos fundamentais conferidas a estes, sendo vedado qualquer tipo de violação de tais direitos.

Nesse sentindo, aduz Eliane Araque Santos (2007, p. 130-134)

Crianças e adolescentes são sujeitos especiais porque pessoas em desenvolvimento. O reconhecimento da criança e do adolescente como sujeitos de direitos, a serem protegidos pelo Estado, pela sociedade e pela família com prioridade absoluta, como expresso no art.227, da Constituição Federal, implica a compreensão de que a expressão de todo o seu potencial quando pessoas adultas, maduras, tem como precondição absoluta o atendimento de suas necessidades enquanto pessoas em desenvolvimento.

 

É possível então, compreender que acerca do princípio do melhor interesse da criança, é pertinente considerar aplicação deste de maneira ampla, e sempre visando o mais vantajoso a criança e ao adolescente.

 

          Logo, vimos os princípios norteadores dos alimentos gravídicos, passaremos então a uma melhor analise acerca da lei que regulamenta este instituto.

2.4 A LEI N°11.804 E SEUS ASPECTOS PROCESSUAIS

A Lei n° 11.804/2008 foi implementada com o objetivo de respaldar os alimentos gravídicos, que antes não havia previsão legal e tão menos a tutela para que estes fossem acionados em âmbito judicial.

No que tange as prestações que devem ser procedidas pela parte paterna, o artigo 2° da lei de alimentos gravídicos aduz qual a natureza do alimento prestado. Ainda, observamos que quanto ao artigo mencionado, houve mudanças no que tange a ampliar estes alimentos a gestante, que antes não era mencionada, e com a modificação contida no artigo, esta encontra-se respaldada.

Cabe mencionar o contido no artigo 2° da Lei n°11.804/2008

Art.2° - Os alimentos de que trata esta Lei compreenderão os valores suficientes para cobrir as despesas adicionais do período de gravidez e que sejam dela decorrentes, da concepção ao parto, inclusive as referentes a alimentação especial, assistência médica e psicológica, exames complementares, internações, parto, medicamentos e demais prescrições preventivas e terapêuticas indispensáveis, a juízo do médico, além de outras que o juiz considere pertinentes. Parágrafo único. Os alimentos de que trata este artigo referem-se à parte das despesas que deverá ser custeada pelo futuro pai, considerando-se a contribuição que também deverá ser dada pela mulher gravida [...].

 

Já nos artigos 3° ao 10° da lei em questão, podemos encontrar acerca dos aspectos processuais que regem os alimentos gravídicos. Onde, no que tange ao artigo 3° da lei, foi modificado acerca do foro competente para que a ação de alimentos seja proposta. Anteriormente, a previsão era no sentido de que o domicílio do alimentante era o foro competente, com anova redação do artigo, cabe ao domicílio do alimentado o foro competente, e tal mudança tem sua atribuição no artigo 53, II do CPC de 2015.

No artigo 4° da lei de alimento gravídicos podemos encontrar acerca dos requisitos imprescritíveis no momento da propositura da ação, onde observamos a presença do laudo médico como sendo um desses requisitos, no sentido de que este possa comprovar a gravidez e as circunstancias em que esta o nascituro e a saúde da gestante, ainda cabendo a gestante apresentar informações pertinentes de como deu-se a concepção do nascituro.

Ocorre que, o artigo 4° da referida lei em estudo, foi vetado por se demonstrar polemico, pelo fato do requisito contido nele se dá de maneira constrangedora a gestante, onde obrigava a esta prestar informações acerca de sua intimidade.

No que concerne ao artigo 5° da lei em estudo, este também foi vetado com o entendimento de que tal artigo contraria os princípios da celeridade e economia processual, pois o mesmo visava uma audiência de justificação, ao qual não sendo a mesma obrigatória as ações de alimentos de qualquer outra natureza, logo essa fase seria desnecessária.

O artigo 6° da lei em questão, estabelece quais os benefícios devem ser proferidos a gestante e ao nascituro, ocorrendo isto com a prova de paternidade.

Discorre o artigo 6° da Lei n°11.804/2008

Art. 6° - Convencido da existência de indícios da paternidade, o juiz fixará alimentos gravídicos que perdurarão até o nascimento da criança, sopesando as necessidades da parte autora e as possibilidades da parte ré.

Parágrafo único. Após o nascimento com vida, os alimentos gravídicos ficam convertidos em pensão alimentícia em favor do menor até que uma das partes solicite a sua revisão.

        

Já ao artigo 7° da lei em questão, cabe disciplinar acerca da citação da parte ré, no qual incumbirá aos mesmo cinco dias para apresentação de sua contestação. Observamos que o mencionado artigo desde sua formação, não logrou de nenhuma alteração ou veto, constituindo-se do mesmo texto.

O artigo 8° da referida lei também teve seu texto vetado, tendo em vista que tal artigo discorria acerca da realização de perícia medica quanto a paternidade, o que se demonstrava desnecessário e serviria apenas de comprovação probatória no curso do processo.

Acerca do tema, cabe mencionar entendimento jurisprudencial

Apelação cível. Alimentos gravídicos. Fixação. Exame de DNA. Desnecessidade. Meros indícios de paternidade. Cabe ao juiz decidir sobre a fixação de alimentos gravídicos com base em meros indícios de paternidade sendo desnecessária a realização de exame de DNA. A fixação de alimentos gravídicos não comporta majoração se não demonstrado nos autos a possibilidade do alimentante. (Apelação, Processo nº 0007967-10.2014.822.0102, Tribunal de Justiça do Estado de Rondônia, 2ª Câmara Cível, Relator (a) do Acórdão: Des. Marcos Alaor Diniz Grangeia, Data de julgamento: 18/08/2016).

 

Acerca do texto contido no artigo 9° da lei em estudo, o mesmo também foi vetado, e nem chegou a entrar em vigor, pois o mesmo contraria matéria processual. O texto anterior do artigo mencionado, versava que a prestação de alimentos gravídicos deveria ser estabelecida desde o momento da citação do genitor, gerando polemica, pois ao genitor não caberia defesa, e o alimento seria cabível antes de proferida a sentença.

O artigo 10 da lei em estudo, foi o último a ser vetado, e o mesmo discorria sobre a responsabilidade da parte autora nos casos em que coubesse danos morais, quando ocorresse a negativa da paternidade por provas comprovatórias.

Nos ensina acerca do tema Rolf Madaleno (2009)

Originariamente estava prevista a responsabilidade objetiva da autora da ação pelos danos materiais e morais causados ao réu pelo resultado negativo do exame pericial de paternidade, cujo dispositivo foi vetado por se tratar de norma intimidadora, eis que criaria hipótese de responsabilidade objetiva pelo simples fato de a ação dos alimentos gravídicos não ser exitosa, importando, portanto, na possibilidade de devolução dos valores pagos, dentre outras responsabilidades. Contudo, tal veto não descarta ser apurada a responsabilidade subjetiva da autora da ação, uma vez provado o dolo ou a culpa ao apontar o réu indevidamente como sendo o genitor do nascituro.

 

 Cabe mencionar que o pleito da ação de prestação de alimentos com tutela antecipada visa a garantia imediata do alimento ao nascituro, que objetiva o desenvolvimento e o direito do nascimento com vida a este.

Conclui-se que a lei de alimentos gravídicos implantada em 2008, de fato demonstra-se de grande valia, ao passo que antes desta, as ações de alimentos não abrangiam o direito do alimento gravídico, e com o advento desta, passou-se a garantia do dever de prestação de alimentos ao nascituro e consequentemente a sua genitora.

  • ALIMENTOS GRAVÍDICOS
  • DIREITO DE FAMILIA
  • PRINCÍPIOS DOS ALIMENTO

Referências

 

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Vitória Santana Juris

Bacharel em Direito - São Luís, MA


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