Alteração do Layout de Formação do Tribunal do Júri como Solução a Política de Encarceramento no Brasil
1 INTRODUÇÃO
Em consulta ao relatório de Informações Penitenciárias (INFOPEN, 2016), documento que remonta a atual situação do Sistema Carcerário no Brasil, as informações nele contidas revelam que a população de presos no regime brasileiro já ultrapassou a incrível marca dos 600 mil presos, o que estipula o país em 4º lugar, comparando com outros países, no número absoluto de reclusos. Vale ressaltar que destes, não foram incluídos no cálculo estatístico os presos a cumprir pena em regime aberto ou domiciliar, ressaltando a colocação do Brasil em 3º lugar no ranking.
Segundo Assis (2007), dado que o Sistema Carcerário no Brasil não apresenta uma realidade condizente com o objetivo de reeducação e inserção do presidiário na sociedade, haja vista a superlotação das celas, sua precariedade e a insalubridade, bem como a burocratização dos trâmites legais, faz-se notória a ineficiência do ambiente prisional quando comparados os índices de reincidência dos criminosos.
Diante dessa realidade alarmante, o presente trabalho visa expor uma visão crítica da atual Política de Encarceramento no Brasil, com foco ao processo do Tribunal do Júri e sua formação. A escolha por este tema se deu no fato de que, todos os crimes julgados no Tribunal do Júri, ou seja, crimes dolosos contra a vida, possuem uma maior probabilidade de transformarem o então réu em um preso recluso do sistema carcerário, onde passa a ser tutelado pelo Estado.
Um problema recorrente apresentado pelos estudiosos do Direito é em relação à formação dos jurados no plenário do Júri que, diante de sua composição, atuam os jurados cidadãos comuns sobrepostos a decidir sobre a inocência ou culpabilidade dos réus. De acordo com o Art. 447 do Código de Processo Penal, o Tribunal do Júri é composto por um juiz togado, seu presidente, e 25 jurados, dos quais apenas 7 são sorteados para fazer parte do Conselho de Sentença que, ao final, decidirão a responsabilidade do réu perante os fatos expostos.
Sendo assim, no intuito de propor alterações sustentadas e embasadas, os estudantes realçam o compromisso com o Tribunal do Júri em apresentar soluções que melhor decomponha a formação de jurados no plenário, como a mudança de 7 sorteados para 8 membros a compor o Conselho de Sentença. A ideia se justifica em um melhor aperfeiçoamento do julgamento dos acusados, bem como evitar falhas no processo, levando um inocente ao Sistema Carcerário Brasileiro.
2 PROBLEMATIZAÇÃO
Atualmente o alistamento dos jurados para o Tribunal do Júri é regulado pela Lei 11.689/08 que, em seu Art. 425 e 426 tratam da quantidade de julgados que deverão ser alistados, sendo este número determinado de acordo com o número populacional de cada comarca:
Art. 425 Anualmente serão alistados pelo presidente do Tribunal do Júri de 800 (oitocentos) a 1.500 (um mil e quinhentos) jurados nas comarcas de mais de 1.000.000 (um milhão) de habitantes, de 300 (trezentos) a 700 (setecentos) nas comarcas de mais de 100.000 (cem mil) habitantes e de 80 (oitenta) a 400 (quatrocentos) nas comarcas de menor população. (BRASIL, 2008).
Superada essa fase inicial de filtro populacional, no parágrafo § 2º o legislador outorga o poder de avaliação dos jurados através de informações levantadas sobre estes, a fim de avaliar se preenchem todas as condições para exercer a função de jurado:
Art. 425. § 2º O juiz presidente requisitará às autoridades locais, associações de classe e de bairro, entidades associativas e culturais, instituições de ensino em geral, universidades, sindicatos, repartições públicas e outros núcleos comunitários a indicação de pessoas que reúnam as condições para exercer a função de jurado. (BRASIL, 2008).
Quanto às tais condições ditas no referido parágrafo, encontra-se no Código de Processo Penal, mais respectivamente nos Art. 448 e 449 as respectivas premissas:
Art. 448. São impedidos de servir no mesmo Conselho:
I – marido e mulher;
II – ascendente e descendente;
III – sogro e genro ou nora;
IV – irmãos e cunhados, durante o cunhado;
V – tio e sobrinho;
VI – padrasto, madrasta ou enteado.
§ 1o O mesmo impedimento ocorrerá em relação às pessoas que mantenham união estável reconhecida como entidade familiar.
§ 2o Aplicar-se-á aos jurados o disposto sobre os impedimentos, a suspeição e as incompatibilidades dos juízes togados. (BRASIL, 1941)
No artigo seguinte, o legislador trata dos impeditivos ao jurado, onde o preenchimento de somente um destes é dado causa a impedimento para o jurado servir ao plenário do Júri:
Art. 449. Não poderá servir o jurado que:
I – tiver funcionado em julgamento anterior do mesmo processo, independentemente da causa determinante do julgamento posterior;
II – no caso do concurso de pessoas, houver integrado o Conselho de Sentença que julgou o outro acusado;
III – tiver manifestado prévia disposição para condenar ou absolver o acusado. (BRASIL, 1941)
Logo, o cidadão que por assim desejar participar do Tribunal do Júri como jurado, deve estar em pleno gozo dos direitos políticos e não ter sido criminalmente processado, além de prestar o referido serviço de maneira gratuita. Terminado a fase de explanação dos fatos entre os advogados, tendo ou não a réplica e a tréplica, chega-se à fase na qual o juiz explica os critério e quesitos a serem avaliados, destinando cinco perguntas aos 7 jurados que compõem o Conselho de Sentença.
Por fim, passado aos votos e a sua contagem, têm-se as seguintes possibilidades: se somados três votos de uma mesma afirmativa (sim ou não), o quarto voto é matéria de decisão, pois ambos os resultados (condenação ou absolvição do réu), partem dessa última escolha.
3 SUGESTÃO DE SOLUÇÕES
Aos jurados membros do Conselho de Sentença cabe a decisão com relação à autoria e a materialidade do delito, bem como uma possível incidência de excludente de ilicitude, ou mesmo de culpabilidade ou diminuição de pena. Em suma, os jurados têm enorme poder, decidindo a vida de inúmeros réus que passam pelo julgamento do Tribunal do Júri.
Segundo a situação explanada anteriormente, inegável premissa de solução seria a existência de 8 jurados ao invés de 7, onde o empate favoreceria o réu pelo in dubio pro reu, em que interpretação deve por regra seguir ao favorecimento daquele que está sendo acusado.
Neste sentido, Beccaria (1994, p. 89) bem explica seu ponto:
Quando o culpado e o ofendido estão em condições desiguais, os juízes devem ser escolhidos, metade entre os iguais do acusado e metade entre os do ofendido, para contrabalançar assim os interesses pessoais, que modificam, mau grado nosso, as aparências dos objetos, e para só deixar falar a verdade e as leis.
Nota-se que Beccaria (1994) argumenta que metade dos jurados seja escolhida pela vítima e metade dos jurados escolhida pelo réu como equilíbrio; porém, no atual panorama do Sistema Judiciário, o número ímpar de jurados impossibilita a aplicação desse modelo.
Assad (2010) apresenta modelos de desenhos propostos para uma visão autônoma baseada no conjunto simbólico de percepções, na qual o formato ideal contemplaria o número de 8 jurados, premissa também bastante defendida pelos estudantes do presente projeto.
Por conseguinte, é inegável no Júri brasileiro que se aflore a imparcialidade do julgamento. Entretanto, Kircher (2017) indaga que no Tribunal do Júri acaba por certo se sobrepondo os sentimentos pessoais de cada um dos jurados (paixões e antipatias), que decorrem de sua formação cultural e pessoal, assim se ignorando o que se busca na verdade em uma decisão judicial, que é em última análise a justiça por si em seu efeito prático, já que “toda atividade (...) mormente a sentença, é condicionada pelo inconsciente, sobretudo pelo inconsciente pessoal (...). É sua história pessoal, seus traumas e recalques projetados em seu discurso jurídico.” (COSTA, 2002).
Cada sessão se inicia com um favoritismo pré-definido e favorável à acusação, embora isso seja clara ofensa ao princípio do in dubio pro reu. Não existem, todavia, mecanismos capazes de filtrar tais sentimentos, além do que essa diferenciação é ainda mais visível quando envolvem casos de comoção nacional.
Para Kircher (2017), notadamente sabe-se da pressão que a mídia exerce nos processos criminais, tendo em vista que estes têm grande repercussão social e servem como âncoras para que se venda mais; ocorrendo em razão disto, em muitos casos, um verdadeiro julgamento antecipado dos réus, não tendo estes a mínima chance de defesa com base nas provas e de um julgamento conforme a justiça (uma pré-condenação).
O magistrado, em função de sua instrução jurídico-científica e das garantias a ele outorgadas, consegue com mais facilidade discernir o que é apresentado nos jornais da realidade fática do processo, mantendo sua imparcialidade. Isso ocorre em função de ter isenção maior que os jurados, pois está preparado para exercer o cargo e tem técnica para tal. (KIRCHER, 2017).
Não obstante, seria igualmente justo que o culpado pudesse recusar certo número de juízes que não lhe estime devida confiança. Porém, a prática constante desse direito é vista com reserva, mas a sua não utilização resultaria na condenação de si mesmo.
Quando se avalia a real finalidade da pena, qual seja reprimir os demais de ter tal atitude associada ao condenado, Beccaria (1994, p. 96) explica que a publicidade dos julgamentos faz parte de sua finalidade para que os demais tenham conhecimento dos efeitos de suas atitudes:
Sejam públicos os julgamentos; sejam-no também as provas do crime: e a opinião, que é talvez o único laço das sociedades, porá freio á violência e ás paixôes. O povo diré: Não somos escravos, mas protegidos pela lei. Esse sentimento de segurança, que inspira a coragem equivale a um tributo para o soberano que compreende os seus verdadeiros interesses.
Outro ponto a ser contestado é o fato de somente o advogado, na figura de defensor do acusado, e o promotor como membro do Ministério Público na função, são responsáveis por lei para oferecer acusação (denúncia) contra um indivíduo suspeito de contrariar a lei em um julgamento criminal, no intuito de defender, em juízo ou extrajudicialmente, os interesses coletivos da sociedade, individuais indisponíveis ou de incapazes.
Para tanto, a solução para estes e outros questionamentos que possam surgir, na medida em que o debate crítico acerca da formação do Tribunal do Júri se instaura, se embasa em: Nós queremos uma sociedade onde se restrinjam direitos (lei e ordem), com tolerância zero (punir o máximo possível), ou uma sociedade onde se busque a redução dos marginalizados, distribuindo o progresso e, a consequência disso, diminuir o número de pessoas que vivem à margem da sociedade, amparados em um sistema justo e fidedignos aos direitos e deveres prescritos na Constituição Brasileira?
4 CONSIDERAÇÕES FINAIS
Conclui-se, dessa forma, que o Tribunal do Júri é um órgão de 1ª Grau da Justiça Comum, Federal e Estadual, que tem como competência o julgamento dos crimes dolosos contra a vida, elencados nos artigos: Art. 121; b) instigação ou auxílio ao suicídio – Art. 122; c) infanticídio – Art. 123; d) aborto – e Art. 124 a 127 da Constituição Federal.
Tendo estes delitos a possibilidade das maiores penas aplicáveis, é de suma importância a busca constante pelo aperfeiçoamento do julgamento dos acusados a tais crimes, uma vez que a falha poderá acarretar no encarceramento por lapso no processo, ou mesmo o encarceramento de um inocente.
Diante do exposto, todo o trabalho e esforço dos legisladores e militantes do Direito são válidos na busca da redução da injustiça, uma vez que, embora o erro seja fato inerente ao ser humano, de igual avalia deverá ser constante a busca da perfeição pelo pleno em suas atividades, bem como servir a justiça dos homens.
Contudo, um dos problemas recorrentes da Instituição Judicial está na falta da fundamentação de suas decisões apoiadas em um número desigual de integrantes da Comissão de sentença. Deve-se, por conseguinte, buscar a boa fundamentação para que se evite o arbítrio e consiga-se exercer o justo grau de jurisdição de forma apropriada.
Ainda faz-se necessário ressaltar que, cada vez mais se busca o aperfeiçoamento e profissionalização de todos os setores científicos. Sendo assim, a ciência jurídica, por assim denominadas como Direito Penal e Processo Penal, não deixariam de estar fora dessa perspectiva. Não há consonância da prepotência do instinto em detrimento da racionalidade técnica jurídica, ainda mais inflamada em se tratando de crimes de comoção nacional.
Por fim, a conclusão deste projeto se pauta na necessidade de reformas para que o Tribunal do Júri cumpra com o seu princípio e fim absolutos: exercer a justiça. Assim, propõem-se alternativas de mudanças a serem implantadas nas escolhas numéricas de seus jurados para compor o Conselho de Sentença.