CÔNJUGES CASADOS NO REGIME DE SEPARAÇÃO OBRIGATÓRIA DE BENS EM VIRTUDE DE IDADE SUPERIOR A SETENTA ANOS: Efeitos jurídicos decorrentes da doação entre esses nubentes.
Tássio Paulino Oliveira Santos¹
RESUMO: O presente projeto de pesquisa tem como tema os efeitos jurídicos da doação entre cônjuges casados no regime de separação obrigatória de bens em decorrência de idade superior a 70 anos, objetivando mostrar diferentes pontos de vista no que tange a essa celeuma de suma importância para o campo jurídico, uma vez que há plausíveis justificativas para os que entendem pela possibilidade da doação, tanto para aqueles que acham inviável essa ação. Partirá de uma análise do negócio jurídico mais solene do ordenamento jurídico cível, que é o casamento, dissertando sobre suas questões patrimoniais em virtude do regime de bens, para posterior estudo acurado sobre o Regime de Separação Legal, seus fundamentos e origem, primando pela verificação de como o direito tem se comportado na evolução da sociedade acerca do tema. Em seguida será averiguado o contrato de doação, com foco nos seus requisitos de validade e da especificidade imposta aos maiores de 70 anos. A metodologia envolvida no trabalho abrangerá pesquisa bibliográfica em livros de Direito Civil e Direito Constitucional, paralelo entre o Código Civil de 1916 e de 2002 no que concerne ao tema da pesquisa, estatísticas, outras legislações, jurisprudência e sites jurídicos, no escopo de maximizar o conhecimento, possibilitando uma análise crítica sobre o tema.
Palavras-chave: SEPARAÇÃO OBRIGATÓRIA DE BENS. CONTRATO. DOAÇÃO.
1 CONSIDERAÇÕES INICIAIS
O presente artigo aborda os efeitos jurídicos da doação entre cônjuges casados no regime de separação obrigatória de bens, analisando a especificidade imposta aos maiores de 70 anos, em decorrência do artigo 1641, inciso II do Código Civil Brasileiro de 2002 que impõe a esses indivíduos a obrigatoriedade do regime de separação obrigatória quando da contração de núpcias.
O Código Civil de 1916 positivava, por intermédio do seu artigo 226, a proibição aos nubentes casados no regime de separação obrigatória, de realizarem doações mutuamente. Entretanto do Código Civil vigente ocorreu a supressão do indigitado artigo, logo sendo omisso nesse ponto.
Dessa forma, há lacuna no texto legal no que tange ao tema da doação tratada, sendo, portanto alvo de divergência doutrinária e jurisprudencial, dividindo opiniões entre aqueles radicais que consideram inconstitucional a determinação do artigo 1641 do CCB/2002, em detrimento de outros que o considera necessário para a efetividade da aplicação do citado artigo, a recepção implícita do artigo 226 do CCB/1916.
Outrossim, analisa-se os princípios constitucionais que abarcam o tema, bem como as disposições do Estatuto do Idoso e o entendimento doutrinário e jurisprudencial, no escopo de encontrar o melhor entendimento perante o assunto, nos moldes do ordenamento jurídico pátrio.
2 CASAMENTO E O REGIME DE BENS.
Dentre as definições de casamento, que sofre mutações em decorrência das novas formas de constituição das famílias no tempo, cumpre destacar a definição de Rodrigues:
Casamento é o contrato de direito de família que tem por fim promover a união de homem e da mulher, de conformidade com a lei, a fim de regularem suas relações sexuais, cuidarem da prole comum e prestarem mútua assistência. Tal conceito nada tem de original, antes é tirado dos elementos que a lei fornece e das numerosas outras definições que a partir de Modestino tem sido apresentada por todos os escritores (RODRIGUES, 2006, p.19).
Para Pereira (2006, p. 51-66), o casamento é um negócio jurídico complexo realizado por homem e mulher que gera efeitos pessoais e patrimoniais com a finalidade de constituir família em condições plenas. Os efeitos pessoais do casamento são o da legitimidade da família, prestação de auxílio mútuo, procriação dos filhos e educação da prole. Importante para o nosso estudo são os efeitos patrimoniais, que doravante passa-se a tratar.
De acordo com Gonçalves (2012, p. 422-423), o estatuto que regula as relações patrimoniais ente cônjuges, bem como entre estes e terceiros é o regime de bens.
As funções precípuas desse sistema é a administração dos bens trazidos antes do casamento, assim como os obtidos, após as núpcias, pelos cônjuges.
O indigitado autor, ainda ensina que é indispensável a existência de um regime de bens, não podendo o casamento subsistir sem ele. O Código Civil de 2002 disciplina a variedade de regimes de bens com as seguintes opções aos nubentes: Comunhão parcial (Arts.1658 a 1.666); Comunhão Universal (Arts. 1667 a 1.671); Participação final nos aquestos (Arts. 1672 a 1.686); e Separação de bens (Art. 1.687 e 1.688). Nos casos em que os cônjuges não se manifestam, a lei supre essa omissão por meio do art. 1640 do Código Civil, que dispõe: “Não havendo convenção, ou sendo ela nula ou ineficaz, vigorará, quanto aos bens entre os cônjuges, o regime de comunhão parcial” (BRASIL, 2002).
Rodrigo (2006, p. 137) descreve que a escolha do regime terá validade mediante o pacto antenupcial, trata-se de um contrato solene que deverá ser realizado antes do casamento, o qual as partes dispõem sobre o regime de bens que vigorará entre elas, sendo que podem optar por um dos regimes ou mesclar regras de um com outro.
O pacto antenupcial, conforme parágrafo único do artigo 1640 do Código Civil, deverá ser efetivado por escritura pública, pois, do contrário, o regime será necessariamento o da comunhão parcial. Mas se no artigo seguinte há previsão expressa dos casos em que o regime de bens será obrigatoriamente o da separação, fica claro que não há necessidade de pacto antenupcial para tal mister, haja vista que nesse caso a Lei impõe.
Assim que, os contemplados do artigo 1.641 do Código Civil Brasileiro, não precisam de pacto antenupcial para contrair núpcias no regime de separação obrigatória de bens, pois o regime de bens imposto decorre da própria Lei.
Salienta-se que os princípios norteadores dos regimes de bens, na lição de Gonçalves (2012, p. 424-430) são imutabilidade absoluta, variedade de regimes, livre estipulação.
O citado autor destaca que o princípio da imutabilidade absoluta, chamada por alguns autores de mutabilidade motivada ou irrevogabilidade, vem ao longo do tempo sofrendo alterações. No Código Civil de 1916, a inalterabilidade do regime de bens deveria ser mantida enquanto perdurasse o casamento. A sustentabilidade dessa idea se dava pela natureza intrínseca do contrato de casamento, baseada na vontade dos cônjuges no momento de contrair o matrimônio.
O Código Civil de 2002 trouxe a possibilidade da alteração do regime em caráter excepcional, mediante pedido motivado de ambos os cônjuges, analisando a procedência das razões invocadas e ressalvados os direitos de terceiros. É válido ressaltar que a alteração não será admitida em se tratando de regime obrigatório de separação de bens. (BRASIL, 2002) .
O princípio da liberdade de escolha no que tange ao regime de bens, nos moldes do artigo 1.639 do Código Civil de 2002 prescreve: “ É lícito aos nubentes, antes de celebrado o casamento, estipular, quanto aos seus bens, os que lhe aprouver” (BRASIL, 2002). Entretanto, em algumas situações, não se permite essa liberalidade, tratando o próprio legislador, de forma exclusiva, estipular o regime que deverá ser adotado.
De tal modo, a classificação do regime de bens, quanto a sua origem, pode ser legal, quando advém da Lei, ou convencional, quando é um acordo entre as partes.
2.1 O regime de separação de bens
De acordo com Pereira (2006, p. 188-190), o regime de separação de bens poderá ocorrer por estipulação entre os cônjuges, por intermédio de pacto antenupcial, assim como em decorrência da Lei.
Nesse regime, cada um dos cônjuges conserva a posse e propriedade, se mantendo na administração dos seus bens, atendendo as disposições do pacto antenupcial, conforme disposição do art.1687 do Código Civil de 2002: “Estipulada à separação de bens, estes permanecerão sob a administração exclusiva de cada um dos cônjuges, que poderá livremente alienar ou gravar de ônus real” (BRASIL, 2002).
Ademais, a Lei ainda estipula para esse regime, que ambos os cônjuges ficam obrigados a contribuir para as despesas do casal na proporção dos rendimentos de seu trabalho e de seus bens, salvo estipulação em contrário, prevista no pacto antenupcial (BRASIL, 2002).
Observa-se que esse regime faz completa distinção entre os patrimônios do cônjuges, autorizando a administração exclusiva de cada um deles, sem a necessidade de autorização do outro para alienar, mesmo que se trate de bens imóveis, não sendo compatíveis com a finalidade do casamento, conforme destaca Venosa:
Esse regime isola totalmente o patrimônio dos cônjuges e não se coaduna perfeitamente com as finalidades da união pelo casamento. De qualquer modo, afora o regime dotal, letra morta em nosso ordenamento no passado, não é utilizado entre nós (VENOSA, 2003, p.197).
Quando esse é o regime adotado, pode-se dizer que deixaremos de ter os efeitos do casamento em sua plenitude, uma vez que os nubentes unem suas vidas, mas no campo patrimonial, prevalece a incomunicabilidade dos bens.
2.2 Separação obrigatória de bens
O regime de separação obrigatória de bens irá ocorrer por imposição legal. Tem-se aqui uma exceção à regra do art. 1640 do Código Civil que impõe que na ausência de pacto antenupcial, prevalecerá o regime de comunhão parcial de bens.
Dentre as hipóteses elencada no art.1641, observa-se o inciso I, tratando da inobservância das causas suspensivas da celebração do casamento, nos moldes do art. 1523 do Código Civil:
Art.1523. Não devem casar:
I - O viúvo ou a viúva que tiver filho do cônjuge falecido, enquanto não fizer inventário dos bens do casal e der partilha aos herdeiros;
II- a viúva, ou a mulher cujo casamento se desfez por ser nulo ou ter sido anulado, em até dez meses depois da viuvez, ou da dissolução da sociedade conjugal.
III- o divorciado, enquanto não houver sido homologada ou decidida a partilha dos bens do casal;
IV- o tutor ou curador e os seus descendentes, ascendentes, irmãos, cunhados ou sobrinhos, com a pessoa tutelada ou curatelada , enquanto não cesar a tutela ou curatela, e não estiverem saldadas as respectivas contas.
Parágrafo único: É permitido aos nubentes solicitar ao juiz que não lhes sejam aplicadas as causas suspensivas previstas nos incisos I,III, e IV deste artigo, provando-se a inexistência de prejuízo, respectivamente, para o herdeiro, para o ex- cônjuge e para a pessoa tutelada ou curatelada; no caso do inciso II, a nubente deverá provar nascimento de filho, ou inexistência de gravidez, na fluência do prazo (BRASIL, 2002).
Interessante é a novidade trazida pelo parágrafo único do citado artigo que demonstra a intenção do legislador em minimizar a severidade que impunha o Código de 1916. Com essa inovação, o juiz poderá fazer uma análise do caso concreto e observar a inexistência de prejuízo, dispensando a causa suspensiva e consequentemente a imposição do regime legal.
A segunda hipótese descrita pelo inciso II do art. 1641 é o casamento o qual um dos cônjuges possui idade superior a setenta anos.
Nas palavras de Rodrigues (2006, p. 143-146), os nubentes ficam irrestritamente sujeitos ao regime de separação, independentemente de pacto antenupcial, conforme era previsto expressamente no art. 226 do Código Civil de 1916. Ainda afirma que se a separação é imposta por lei, qualquer meio utilizado para invalidar o preceito da norma, como a doação entre os cônjuges, não será permitido.
O célebre autor esclarece que é nítida a intenção do legislador ao impor tal norma, uma vez que busca de forma protetiva , evitar a ocorrência de um enlace matrimonial com a finalidade puramente financeira.
Válido trazer à baila o disposto no artigo 226 do Código Civil de 1916: “No casamento com infração do art. 183, XI a XVI é obrigatório o regime da separação de bens, não podendo o cônjuge infrator fazer doações ao outro” (BRASIL, 2002).
Essa disposição é alvo de intermináveis discussões, dividindo opiniões entre aqueles que consideram tal dispositivo uma afronta aos princípios constitucionais como igualdade, dignidade da pessoa humana e autonomia da vontade, em outro diapasão há doutrinadores que encaram o dispositivo como uma prudência do legislador que visa de forma protetiva, colocar a salvo um grupo determinado de pessoas que devido à idade avançada, estão mais vulneráveis à carência afetiva, evitando que ocorra um casamento por mero interesse patrimonial.
A terceira hipótese de igual forma possui um caráter protetivo, dessa vez para aqueles que dependem de autorização judicial para casar.
Art.1517- O homem e a mulher com dezesseis anos podem casar, exigindo-se autorização de ambos os pais, ou de seus representantes legais, enquanto não atingida a maioridade civil.
Art.1519- A denegação do consentimento , quando injusta, pode ser suprida pelo juiz (BRASIL, 2002)
Conforme Gonçalves (2012, p. 448) inicialmente esse dispositivo foi interpretado considerando a comunicação dos bens adquiridos a título oneroso na constância do casamento, conforme a súmula 377 do STF que assim dispõe: “No regime de separação legal de bens, comunicam-se os adquiridos na constância do casamento”.
A princípio essa súmula foi aplicada em sua integralidade, mas com o decorrer do tempo começou-se a exigir o esforço comum dos cônjuges, ou seja, uma sociedade de fato, a simples existência da vida em comum por si só não iria caracterizar a comunicação dos bens.
Preconiza o artigo 1.647, inciso III do Código Civil Brasileiro:
Art. 1.647. Ressalvado o disposto no art. 1.648, nenhum dos cônjuges pode, sem autorização do outro, exceto no regime da separação absoluta:
(...)
III - prestar fiança ou aval;
Dessa forma, analisando conjuntamente a súmula 377 do Supremo Tribunal Federal, com o citado artigo, entende-se que deve ser mitigada a interpretação do mesmo. Ora, se ao prestar a fiança ou aval, um dos cônjuges casados no regime de separação legal de bens possuir bens comunicáveis com seu consorte, se a penhora recair sobre esses bens, entende-se que há necessidade de autorização deste, pois conforme Gonçalves (2012, p. 372) o consentimento do outro cônjuge evita-se o comprometimento dos bens do casal, em razão de graciosa garantia concedida a débito de terceiro.
Válido ainda ressaltar que nesses casos após completar a maior idade, com a possibilidade da mutabilidade do regime de bens, poderá obedecido os requisitos pleitear a alteração do regime adotado no momento do casamento, uma vez que satisfeita a causa motivadora para a determinação do regime, não restará sustentação legal para proibição de alteração se assim entenderem por bem dispor.
3 A DOAÇÃO
A doação é um contrato em que uma pessoa, por liberalidade, transfere a outrem parte do seu patrimônio. Esse contrato é regulado pelo Código Civil nos artigos 538 a 564 e traz vários limitadores e requisitos para sua validade.
Conforme Gonçalves (2012, p. 270-271), para se caracterizar a doação é necessária a existência do animus donandi, que tem o significado de ação desinteressada de dar a outrem, sem estar obrigado, parte do próprio patrimônio.
A transferência de bens pode ser verificada à medida que o donatário deverá se locupletar e o doador empobrecer. É indispensável a aceitação, podendo ser ela tácita, expressa, presumida ou ficta.
É expressa quando manifestada no próprio documento que aceita o benefício. É tácita quando se pode observar pelo comportamento do donatário. É presumida quando fixado o prazo para aceitação ou não da doação, o donatário fica inerte, consciente da existência do prazo. A aceitação ficta é aquela referente a doação à incapaz, a qual não é necessária a aceitação, desde que se trate de doação pura.
3.1 Requisitos de validade.
A validade jurídica do contrato de doação dependerá de três fatores que estão previstos no artigo 104 do Código Civil que são: agente capaz; objeto lícito e possível, determinado ou determinável; forma prescrita ou não defesa em Lei. Trata-se aqui dos requisitos gerais do contrato.
3.2 Restrições da liberalidade de doar
Além dos requisitos acima tratados, para a validade contratual da doação, a Lei impõe algumas limitações a essa liberalidade que visa preservar o interesse da coletividade, das partes e de terceiros, sendo defesa a doação do devedor já insolvente; a doação da parte inoficiosa; a doação de todos os bens do doador; a doação do cônjuge adúltero a seu cúmplice.
Insta salientar a previsão do artigo 544 do Código Civil Brasileiro: “ Art. 544. A doação de ascendentes a descendentes, ou de um cônjuge a outro, importa adiantamento do que lhes cabe por herança.”
Importante trazer a tona no presente trabalho, que no regime de separação obrigatória de bens, o cônjuge não concorre na sucessão, assim é que Gonçalves (2012, p. 273) conclui “que podem ser doados por um cônjuge ao outro: no regime de separação absoluta, convencional ou legal, todos os bens, em virtude da inexistência de bens comuns”.
Claro é o entendimento do preclaro doutrinador no que tange à redação do artigo 544 do Código Civil, uma vez que não haverá adiantamento da legítima, a doação a alguém que não concorre na sucessão.
4 PRINCÍPIOS CONSTITUCIONAIS E O ESTATUTO DO IDOSO
Os princípios constitucionais devem servir de parâmetro para a criação de toda e qualquer forma, inclusive as normas constitucionais. São eles que irão direcionar os meios que serão utilizados para alcançar os objetivos do Estado.
Para Bastos (1999, p. 184), os princípios constitucionais guardam os valores e fundamentos da ordem jurídica e não visam regular situações específicas, mas servir como parâmetro para todo o mundo jurídico e, dessa forma, ele é mais abrangente que uma norma estabelecedora de preceitos. Por tanto, o que o princípio perde de carga normativa, ganha como força valorativa.
5 ENTENDIMENTO DOUTRINÁRIO E JURISPRUDENCIAL ACERCA DA DOAÇÃO ENTRE CÔNJUGES CASADOS NO REGIME DE SEPARAÇÃO OBRIGATÓRIA DE BENS
A doação entre cônjuges casados no regime de separação obrigatória de bens não vai de encontro com nenhum dispositivo sobre sua validade, nem mesmo se enquadra em nenhuma das restrições da liberdade de doar, entretanto a nulidade ocorre com base em uma interpretação extensiva do art. 1641, inciso II. Interpretação que visa fazer com que a intenção do legislador seja cumprida, haja vista que perderia toda a razão de existir do dispositivo se ocorresse a comunicação dos bens vedada pela Lei.
Assim impõe o Código Civil em seu art. 1641:
É obrigatório o regime de separação de bens no casamento:
I) das pessoas que o contraírem com a inobservância das causas suspensivas da celebração do casamento;
II) da pessoa maior de 70 (setenta) anos;
III) de todos que dependerem para casar de suprimento judicial.
O Código Civil de 1916 proibia expressamente através de seu art. 226 a doação entre cônjuge no regime de separação legal, o que não ocorre no atual, entretanto a obrigatoriedade do regime de separação legal aos considerados idosos foi mantida, sendo alterada apenas a distinção que era feita entre homens e mulheres, igualando para ambos os sexos a idade de 60 anos.
Recentemente foi aprovada Lei 12.344, de 9 de Dezembro de 2011 que apenas alterou a redação do inciso II do art. 1641 onde a imposição do regime de separação obrigatória de bens passa a ser para os maiores de 70 anos, demonstrando claramente a intenção do legislador em manter a situação protetiva aos idosos.
Conforme Monteiro (2012. p 298), a manutenção do citado artigo, é uma prudência legislativa de forma protetiva a um grupo de pessoas que devido à idade avançada estão mais vulneráveis a carência afetiva, evitando assim que o casamento ocorra por mero interesse patrimonial:
No direito Romano, a Lei Papia Poppaea proibia o casamento das pessoas que houvesse ultrapassando certo limite de idade. Mas tal disposição que representava grave limite a liberdade dos cidadãos, foi revogado por Constantino e seus sucessores. Atualmente, podem casar-se aqueles contraentes. As restrições, outrora existentes, desapareceram. Tendo em conta, porém, sua idade, com o intuito de pô-los a salvo de qualquer propósito subalterno ou menos digno, o legislador prudentemente prescreve o regime de separação. (MONTEIRO, 2012, p 298)
O renomado doutrinador esclarece que se deve buscar, para a aplicação do citado artigo, a vontade da norma, que nada mais é que a proteção do próprio idoso e de seus familiares contra pessoas com o mero interesse patrimonial. Assim qualquer manobra utilizada que possa corromper a eficácia da norma não deverá ser permitida:
[...] cabe ajuntar ainda que os nubentes ficam irrestritamente sujeitos ao regime da separação, nos casos citados, independentemente de pacto antenupcial. Seus efeitos são incontornáveis mediante doações de um cônjuge ao outro, o que era disposto expressamente no Código Civil de 1916, no art.226. Se imposta por lei a separação, não se permite as partes iludir a proibição legal por meios dessas liberalidades (donatio propter nuptias), que anulam completamente o preceito, gerando verdadeira comunhão de fato [...] (MONTEIRO, 2002, p 300)
Ainda para debater com aqueles que alegam ser o art. 1.641 do Código Civil uma afronta ao direito da liberdade, e defendem que de forma alguma pode-se estender o sentido da norma de forma a impedir a doação entre os cônjuges no regime de separação obrigatória, o autor, assim descreve:
[...]é preciso lembrar que o direito a liberdade , tutelado na Lei Maior, em vários incisos do art. 5º , é o poder de fazer tudo o que se quer,nos limites resultantes do ordenamento jurídico.Portanto, os limites a liberdade individual existem em várias regras desse ordenamento, especialmente no direito de família, que vão dos impedimentos matrimoniais (art. 1521,I a VII), que vedam o casamento de certas pessoas, até a fidelidade, que limita a liberdade sexual fora do casamento (art. 1566, I) (MONTEIRO, 2012, p.301).
Nesse sentido, é defendida a impossibilidade do casamento baseado meramente no interesse patrimonial, partindo de um pressuposto de tratar de uma matéria de interesse público, já que o casamento é uma instituição que pode ser considerada como a menor célula responsável pela formação da sociedade:
É ainda de salientar que não pode o direito de família aceitar que, seja reconhecido os maiores atrativos de quem tem fortuna, um casamento seja realizado por meros interesses financeiros, em prejuízo de cônjuges do idoso e de seus familiares (MONTEIRO, 2012, p.301).
O renomado autor evoca o parecer do Senador Josapth Marinho na manutenção do citado artigo, o qual discorreu muito bem sobre a necessidade de sua permanência:
Conforme bem justificou o Senador Josaphat Marinho na manutenção do art. 1641, II do atual código civil, trata-se de prudência legislativa em favor das pessoas e de suas famílias, considerando as idades dos nubentes. É de lembrar que, conforme os anos passam, a idade avançada acarreta maiores carências afetivas e, portanto, maiores riscos corre aquele que tem mais de setenta anos de sujeitar-se a um casamento em que o outro nubente tenha em vista somente vantagens financeiras, ou seja, em que os atrativos matrimoniais sejam pautados em fortuna e não no afeto. Possibilitar, por exemplo, a adoção do regime de comunhão universal de bens, num casamento assim celebrado, pode acarretar conseqüências desastrosas ao cônjuge idoso numa dissolução inter vivos de sociedade conjugal, ou mesmo a seus filhos, numa dissolução causa mortis do casamento. (MONTEIRO, 2012, p.301.)
Pontes de Miranda (2001) comunga do mesmo posicionamento sobre a doação entre cônjuges nessas situações, sendo ao idoso permitido dispor de seus bens da maneira que melhor lhe prouver, desde que atenda aos requisitos do contrato de doação, no entanto a interpretação do artigo 1641 deve ser feita de forma extensiva, vedando qualquer doação que ocorrer entre cônjuges nesse limite de idade, para fazer valer a hermenêutica do artigo acima citado, assim justificando seu posicionamento:
[...] para evitar explorações, consistentes em levar ao casamento, para fins de comunhão de bens, mulheres em idade vulnerável, ou homens em fase de crise afetiva, a lei cortou cerce a possibilidade das estipulações convencionais de ordem matrimonial e excluiu o regime comum. É cogente o da separação de bens. (MIRANDA, 2001, p.219)
O autor ensina que, apesar da proibição constante no art. 312 do código anterior tratar das doações antenupciais, em uma interpretação extensiva, buscando a finalidade da norma, engloba-se também, as doações ocorridas na constância do casamento:
É certo que o art. 312 do Código Civil trata das doações antenupciais, não fazendo referencia a doações durante a vigência do casamento. Mas, está subentendido, por força de extensão, que a proibição compreende também as liberalidades na constância do casamento, porque, do contrário, não haveria razão para a lei vedar as doações antenupciais. Seria uma inutilidade. Sem razão não se interpretam leis sem se entenderem. Como seria antijurídico assentir ou autorizar doações a si mesmo, a anuência, se é necessária na espécie deve ser supri mental. (Miranda, 2001, 432)
Apesar de todas as justificativas encontradas por aqueles que consideram plausível reduzir a autonomia do indivíduo sobre os seus bens ao longo da vida, é indiscutível, que apenas a velhice, não tem o condão de sujeitar o ser humano a incapacidade. Assim, como no entender do jurista Coelho (2003, p.178), mesmo que a pessoa esteja em idade avançada, ela tem total capacidade para cuidar de seus negócios, se estando em plena sanidade mental pode optar por gastar boa parte do que tem como bem entender, sem que filhos ou outros herdeiros venham a intervir, afinal não se pode considerar pródigo, aquele que não tendo responsabilidade pelo sustento e educação de mais ninguém, gaste conscientemente as economias construídas durante a vida.
Assim a jurisprudência vem considerando essas proibições descabidas por falta de fundamentos sustentáveis, além de ser uma verdadeira afronta ao estatuto dos idosos e a vários princípios constitucionais basilares.
Entretanto, existem julgados que decidem de forma a proibir a doação, seja negando a existência de ferir princípios constitucionais, ou apenas, ratificando a proibição, considerando a norma protetiva.
Nesse sentido, o Tribunal de Justiça de Santa Catarina (TJSC), por intermédio do Desembargador Luiz Carlos Freyesleben assim decidiu:
CIVIL. ANULATÓRIA DE ATO JURÍDICO. DOAÇÃO REALIZADA ENTRE CÔNJUGES APÓS O CASAMENTO. REGIME DA SEPARAÇÃO OBRIGATÓRIA DE BENS (CC/1916, ART. 258, PARÁGRAFO ÚNICO, II). AFRONTA À PROIBIÇÃO CONSTANTE DO ART. 312 DO DIPLOMA CIVIL REVOGADO. ANULAÇÃO DEVIDA. RECURSO DESPROVIDO.
[...] a interpretação que obedece à finalidade da norma conduz à conclusão de que pouco importa se a doação realizou-se no pacto antenupcial ou após a celebração do casamento. A mens legis deve ser mantida intacta, ou seja, o que se pretende é impedir que os cônjuges burlem o regime da separação obrigatória de bens coercitiva, realizando doações recíprocas após a celebração do casamento. (TJSC, Apelação Cível Nº2005.024270-6{C} 3ª vara cível, Desembargador Luiz Carlos Freyesleben, DP 12/12/07.)
De igual forma em excelente aresto do STJ, da relatoria da Ministra Nancy Andrighi, pontuou-se que:
[...] DIREITO CIVIL. REGIME DE SEPARAÇÃO DE BENS. SEXAGENARIO. ART.258,INCISO II DO CÓDIGO CIVIL. DOAÇÃO DE IMOVEL AO CONJUGE.VIOLAÇAO DE ORDEM DE NORMA PUBLICA.NULIDADE. SIMULAÇÃO DE COMPRA E VENDA CONTRATO DISSIMULADO DE DOAÇÃO. VÍCIO SOCIAL. ART.104 DO CODIGO CIVIL.LEGITIMIDADE DO DOADOR, SEXAGENÁRIO, EM VIRTUDE DE DISPOSIÇÃO LEGAL DE NATUREZA PROTETIVA. FALTA DE CAPACIDADE ATIVA PARA PROCEDER A DOAÇÃO. AUSENCIA DE REQUISITO DE VALIDADE DO ATO JURÍDICO. [...].
[...] Viola o art. 258, inciso II do Código Civil a disposição patrimonial gratuita (simulação de contrato de compra e venda, encobrindo doação) que importe em comunicação de bens não adquiridos por esforço comum, independentemente da natureza do negócio jurídico que importou na alteração da titularidade do bem, porque é obrigatório, no casamento de maior de setenta anos, o regime obrigatório de separação quanto aos bens entre os cônjuges. Tratando-se de ato simulado, malicioso, com infração de ordem pública de natureza protetiva de uma das partes , esta- que pretendeu contornar a norma protetiva, instituída em seu favor, buscando renunciando o favor legal por via transversa – tem legitimidade para requerer sua declaração de nulidade. Há possibilidade jurídica no pedido de supressão da doação, ainda que esta não tenha sido feita por escritura pública, porque a causa de pedir é a invalidade do negócio jurídico que importou em transferência gratuita de bem imóvel , e em conseqüência, de todos os atos que o compõe, violadores do regime obrigatório de separação de bens do sexagenário. O fundamento jurídico da nulidade do contrato que importou em disposição patrimonial é o distanciamento , a burla, a contrariedade do regime do art. 258, II do Código Civil. ( BRASIL, Superior Tribunal de Jusitiça, REsp. 260462PR 2000/0051074- 2 Rel. Ministra Nancy Andrighi, DJ 17/04/2001)
Em contrapartida, conforme já citado, tal posicionamento sofre severas críticas, sendo farta a jurisprudência contrária à proibição da doação, inclusive por ser incompatível com o estatuto do idoso que assim dispõem em seu artigo 10, § 2º:
Art.10. É obrigação do Estado e da sociedade, assegurar à pessoa idosa a liberdade, o respeito e a dignidade, como pessoa humana e sujeito de direitos civis, políticos, individuais e sociais, garantidos na Constituição e nas leis.
[...] § 2º. O direito ao respeito consiste na inviolabilidade da integridade física e moral, abrangendo a preservação da imagem, da identidade, da autonomia, valores, idéias e crenças, dos espaços e objetos pessoais (BRASIL, 2003).
Conforme Dias (2010, p.246) a restrição a livre escolha do regime para contrair núpcias é uma tentativa de impedir a ocorrência do casamento para as pessoas já de idade avançada:
Trata-se de mera tentativa de limitar o desejo dos nubentes mediante verdadeira ameaça. A forma encontrada pelo legislador para evidenciar sua insatisfação frente à teimosia de quem desobedece ao conselho legal e insiste em realizar o sonho de casar é impor sanções patrimoniais. [...] Parece que a intenção do legislador é evitar qualquer possibilidade de entrelaçamentos de patrimônios. (DIAS, p.246)
Pode-se observar que esse dispositivo tem fundamentos nos resquícios do direito Romano onde existia a proibição do casamento após certo limite de idade.
A renomada autora, com total propriedade, defende com afinco a não aplicabilidade do art.1641, II do Código Civil, assim como qualquer interpretação extensiva decorrente de sua existência, alegando que o dispositivo restringe indevidamente a autodeterminação do idoso, com um fundamento eminentemente patrimonialista:
[...] das hipóteses em que a lei determina o regime de separação obrigatório de bens, a mais desarrazoada é a que impõe tal sanção aos nubentes maiores de 60 anos (CC 1641, II), em flagrante afronta ao Estatuto do Idoso. A limitação da vontade, em razão da idade, longe de se constituir uma precação (norma protetiva), se constitui uma verdadeira sanção. [...] com relação aos idosos, há presunção jure et de jure de total incapacidade mental. De forma aleatória e sem buscar sequer algum subsídio probatório, o legislador limita a capacidade de alguém exclusivamente para um único fim: subtrair a liberdade de escolher o regime de bens quando do casamento. A imposição da incomunicabilidade é absoluta, não estando prevista nenhuma possibilidade de ser afastada a condenação legal. (DIAS, p.247)
Na mesma esteira, o autor Rodrigues (2006), fortalece o entendimento que qualquer restrição fundamentada exclusivamente na idade, não se sustenta por se mostrar atentatória à liberdade individual:
Tal restrição se mostra atentatória da liberdade individual. A tutela excessiva do Estado sobre pessoa maior e capaz decerto e descabida e injustificável. Aliás, talvez se possa dizer que uma das vantagens da fortuna consiste em aumentar os atrativos matrimoniais de quem a detém. (RODRIGUES, 2006, p 142)
De grande relevância é apresentar o entendimento do julgado do TJMG que teve como relatora a Desembargadora Vanessa Verdolin Hudson Andrade.
ANULAÇÃO DE DOAÇÃO - PRELIMINARES - REJEIÇÃO - CASAMENTO REALIZADO PELO REGIME DA SEPARAÇÃO OBRIGATÓRIA - CONJUGÊ SEXAGENÁRIO - VALIDADE DA DOAÇÃO FEITA À ESPOSA DESDE QUE OBSERVADA A LEGÍTIMA - PRINCÍPIO DA LIVRE DISPOSIÇÃO DOS BENS.
[...] alargar o sentido da norma prevista no artigo 1.641, II, do Código Civil para proibir o sexagenário, maior e capaz, de dispor de seu patrimônio da maneira que melhor lhe aprouver, em atentado contra a sua liberdade individual. A aplicação da proibição do cônjuge, já de tenra idade, fazer doação ao seu consorte jovem, deve ser aplicada com rigor naquelas hipóteses onde se evidencia no caso concreto que o nubente mais velho já não dispõe de condições para contrair matrimônio, deixando claro que este casamento tem o único objetivo de obtenção de vantagem material. (TJ/MG – Ap. 1.0491.04.911594-3/001, Rel. Vanessa Verdolin Hudson Andrade, DJ de 29/03/2005).
Bem pontuou a referida sentença apelada, que nos permite aferir que embora não tenha entrado no mérito quanto a aplicabilidade da obrigatoriedade do regime de bens, no momento do casamento, considerou válido a doação do cônjuge ao outro, já que não encontrou razão de subsistir a proibição, uma vez que na análise do caso concreto não se evidenciou a incapacidade do doador.
No mesmo diapasão decidiu o Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo (TJSP), nos processo de Relatoria do Desembargador José Carlos Ferreira Alves:
DECLARATÓRIA DE NULIDADE DE DOAÇÃO - Autores visam reconhecimento da vedação de doação de idoso a cônjuge quando casados no regime de separação legal de bens - Vedação não condizente com a atual ordem constitucional - Idoso não pode ser considerado como incapaz, a priori - Alegação de inoficiosidade da doação Ônus da prova incumbe ao autor interessado na anulação - Requereu o julgamento antecipado da lide - Ausência de provas quanto à inoficiosidade - Sentença mantida Apelo desprovido
Quanto à impossibilidade da doação, não merece prosperar a tese dos apelantes. Aliás, cumpre consignar que nesse sentido a r. sentença de 1ª instância foi primorosa em sua fundamentação, o que até faz desnecessária uma discussão aprofundada neste momento. A doutrina e jurisprudência já vêm, há muito, pronunciando-se contra a norma que impede a doação de um cônjuge a outro, quando presente o regime da separação legal de bens. A própria obrigatoriedade desse regime de bens para os idosos já é, em si, bastante questionável e muito criticada, vez que presume, de maneira absoluta, a incapacidade do idoso para administrar seus próprios bens. É verdade, sim, que um idoso pode ser ludibriado por alguém que não tenha qualquer interesse afetivo por ele (ou ela), almejando apenas expandir seu patrimônio ao estabelecer uma relação com alguém mais rico. Mas também é verdade que isso pode ocorrer com pessoas mais jovens, porque a paixão muitas vezes sobrepõe-se à razão. Assim, a norma em questão é de constitucionalidade muito duvidosa, embora tenha permanecido no Código Civil de 2.002. (TJ/SP –Apelação nº 9077843- 44.2007.8.26.0000, da Comarca de Guarujá, Des. Jose Carlos Ferreira Alves, DJ 08/11/11)
Como se pode observar, as decisões contrárias à proibição da realização da doação têm sobressaído, pautando pela inconstitucionalidade de reduzir a autonomia de uma pessoa que está em plenas condições mentais, gozando de perfeita capacidade. Conforme o entendimento de Pereira (2006, p.), essa proibição não se sustenta, haja vista que o enlace patrimonial ocorrido por mero interesse patrimonial, poderá acontecer em qualquer fase da vida, assim não tem como o legislador de maneira absoluta e sem analisar a peculiaridade de cada caso, presumir a incapacidade.
6 CONSIDERAÇÕES FINAIS
Diante do exposto, resta evidenciada a grande divergência que ocorre quanto a aceitabilidade da determinação legal, impondo a um grupo específico o regime de bens a ser adotado no enlace matrimonial. O tema ganha ainda maior visibilidade devido ao fato das diversas alterações que vem acontecendo no âmbito das famílias brasileiras, em que cada vez mais é comum se observar a dissolução de um casamento e a constituição de um novo em alternados tipos de idade.
Frente às intermináveis divergências quanto à aplicabilidade do art. 1671, II do Código Civil, tem-se no contrato de doação uma saída para solucionar, ou no mínimo minimizar a crítica daqueles que são contrários a aplicabilidade do citado artigo.
Entende-se ser aceitável a aplicabilidade do art. 1671, II do Código Civil, posto que essa diferenciação pode ser aceita como constitucional, de acordo com o conceito subjetivo do fim razoável a que se destina, bem como pode ser verificado ao longo do trabalho, pelas determinadas situações, o entendimento doutrinário e jurisprudencial se manifestam nesse sentido, embasando na liberdade e autonomia do indivíduo nos limites da lei, outrossim, pesa-se o fato de não se aceitar a banalização do casamento.
Esse fundamento, entretanto não se mostra convincente no que tange a realização de doação, afinal se o casamento ocorreu de acordo com a determinação da norma em vigor e prosperou independentemente do regime que teve de ser realizada, a proteção normativa alcançou a sua finalidade. Deste modo, entende-se que para a realização da doação, será necessária a observância apenas dos requisitos próprio para a efetivação do contrato de doação, quais sejam a não disposição do doador de todos os seus bens; em se tratando de doador com herdeiros necessários, há também de se respeitar a legítima, ou seja, cinquenta por cento de seus bens deverão ser reservados para os herdeiros necessários; também não poderá ocorrer a doação de cônjuge adúltero ao seu cúmplice. Ademais, será necessário verificar a capacidade das partes para a validade do contrato.
Portanto, se a pessoa que estiver realizando a doação não estiver no gozo de plenas condições mentais, apta a gerir os seus bens, não será possível a concretização do contrato, noutras palavras, já são muitos os cuidados quanto a esse contrato específico, não sendo necessário impor uma restrição meramente presumida de incapacidade decorrente da idade, sem um mínimo fundamento que ensejaria em um tratamento diferenciado.
Imperativo reconhecer que não encontraria justificativa plausível a proibição da doação entre cônjuges casados no aludido regime, uma vez que o Código Civil de 2002, apenas determina o regime de casamento a vigorar no enlace matrimonial dessas pessoas determinadas, mas em momento algum, ele dispõe sobre a proibição da realização da doação entre os cônjuges nessa situação. Com isso não se considera razoável, estender o sentido da norma, de forma a restringir direitos.