Inicialmente, antes de adentrarmos no tema propriamente dito, cumpre destrinchar o tema começando pela definição de jornada de trabalho para o direito do trabalho brasileiro. Neste diapasão, o renomado doutrinador e jurista Maurício Godinho Delgado, define quea jornada de trabalhoé“[...]o tempo em que o empregado tem de se colocar em disponibilidade perante seuempregador, em decorrência do contrato, ou seja,o tempo, em suma, em que o empregador pode dispor da força de trabalho de seu empregado, em um período delimitado”[1].
A luz da Constituição da República Federativa do Brasil, o capítulo “Dos Direitos Sociais”, artigo 7°,incisos XIII e XIV[2],asseguram respectivamente que a duração de trabalho normal não pode ser superior a de oito horas diárias e quarenta e quatro horas semanais ou ainda de seis horas para o trabalho realizado em turnos ininterruptos de revezamento, salvo em negociação coletiva.
Assim, em tese, a legislação coloca que não se pode ultrapassar a jornada de 8 horas diárias, entretanto a norma citada foi silente quantoa duração de trabalho inferior a 6 horas diárias.Neste diapasão, a jornada em tempo parcial ganha espaço,mostrando ser possível a contratação com jornada inferior a seis horas por dia, dentro dos tramites legais.
Ultrapassado o conceito geral de jornada de trabalho, cabe aqui, em breves linhas, trazer a baila o que seria jornada de trabalho em tempo parcial e suapossibilidade de aplicação nas relações de trabalho e, por conseguinte, a permissão para seu funcionamento dentro do ordenamento jurídico pátrio.
A jornada em tempo parcial tem previsão legal nos artigos 58-A, § 1o , § 2°, Art. 59, § 4°, 130 das Consolidações das Leis Trabalhistas, sendo entendidacomo trabalho cuja duração não exceda a vinte e cinco horas semanais, com salário pago de forma proporcional àquela jornada trabalhada pelos empregados que cumprem na mesma função no tempo integral.
Nesse sentido,orienta a jurisprudência do TRT da 13ª Região, especialmente ao julgar o RO no processo nº 00697.2005.004.13.00-6, que recebeu a seguinte ementa:
JORNADA INFERIOR A OITO HORAS DIÁRIAS. REGIME DE TRABALHO POR TEMPO PARCIAL. AUSÊNCIA DOS REQUISITOS LEGAIS. DESCARACTERIZAÇAO. SALÁRIO NORMATIVO DA CATEGORIA. PAGAMENTO INTEGRAL. OBRIGAÇAO DO EMPREGADOR. A Consolidação das Leis do Trabalho, em seu artigo 58-A, permite a contratação de empregado sob regime de tempoparcial, onde o salário será adimplido proporcionalmente ao número de horas mourejadas pelo empregado.Não obstante, para que tal condição seja reconhecida na seara justrabalhista, imprescindível a configuração dos requisitos do pacto sui generis, quais sejam, o trabalhador apenas laborar no máximo por vinte e cinco horas semanais e restar demonstrada sua manifesta e legítima opção pelo mencionado método de contratação. Não configurados tais elementos, restam devidas as diferenças salariais perseguidas pelo empregado, entre o valor percebido e o importe total do piso salarial de sua categoria. Recurso ordinário desprovido. (Grifou-se)
Quanto à forma de contratação dos empregados que laboram sob o regime de jornada parcial, há que se ressaltar que o contrato de trabalho só será válidose estiver expresso no instrumento de contratação, devendo constar a jornada necessariamente inferior a 25 horas por semana, sob pena de sua descaracterização. Os empregados atuais poderão passar a laborar em regime de tempo parcial se houver previsão em instrumento coletivo.
No tocante a remuneração, não há na legislação instrumento que diz respeito a determinação do salário dos empregados da jornada parcial. Entretanto, a OJ n°358 do Tribunal Superior do Trabalho (abaixo transcrita), assevera a possibilidade do salário mínimo e do piso salarial serem proporcionais à jornada reduzida.
OJ Nº 358 SALÁRIO MÍNIMO E PISO SALARIAL PROPORCIONAL À JORNADA REDUZIDA. POSSIBILIDADE. DJ 14.03.2008 -Havendo contratação para cumprimento de jornada reduzida, inferior à previsão constitucional de oito horas diárias ou quarenta e quatro semanais, é lícito o pagamento do piso salarial ou do salário mínimo proporcional ao tempo trabalhado.
Da mesma forma, a jurisprudência da maioria dos Tribunais Regionais do país não discorda da proporcionalidade do pagamento, em especial:
JORNADA DE TRABALHO PARCIAL. PROPORCIONALIDADE DO SALÁRIO MÍNIMO. O pagamento de remuneração proporcional à jornada de trabalho, em regime de tempo parcial, previsto no art. 58-A, da CLT, não viola o inciso IV do art. 7º da Constituição da Republica Federativa do Brasil, porquanto, a garantia constitucional de que trata o referido dispositivo legal tem por base jurídica o tempo de duração do trabalho desenvolvido pelo empregado.
(TRT-6 - RO 0000077-49.2010.5.06.0007, Relator: Dione Nunes Furtado da Silva, Data de Publicação: 31/03/2011)
RECURSO DE REVISTA. SALÁRIO MÍNIMO PROPORCIONAL À JORNADA REDUZIDA. NECESSIDADE DE AJUSTE PRÉVIO.É possível o pagamento do salário mínimo de forma proporcional à jornada de trabalho reduzida. Faz-se imprescindível, no entanto, a existência de ajuste prévio entre as partes, pactuando-se essa condição de forma expressa. Não há notícia nos autos de que se tenha celebrado ajuste acerca da redução proporcional do salário mínimo. Inexistente tal pactuação, o salário mínimo deve ser pago na sua integralidade. Recurso de revista conhecido e provido. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS REVERTIDOS EM FAVOR DO SINDICATO. PREQUESTIONAMENTO. SÚMULA Nº 297, I, DO TST. A ausência de pronunciamento, por parte da Corte de origem, acerca de elemento essencial à tese veiculada no apelo torna inviável o seu exame, à míngua do indispensável prequestionamento. Hipótese de incidência do entendimento cristalizado na Súmula nº 297, I, desta Corte superior. Recurso de revista não conhecido.
(TST – RR 0131400-69.2005.5.07.0026, Relator: Lelio Bentes Corrêa, Data de Julgamento: 26/09/2007, 1ª Turma)
Um ponto que merece destaque e gera discussões é a questão das horas extras. O labor extraordinário seriapermitido na jornada em tempo parcial? Não!Caso contrário, que sentido teria em haver a redução da jornada? A jornada em tempo parcial é incompatível com o regime de horas extras. Esta negativa está expressa no artigo 59, §4° daCLT, pela obviedade de descaracterizar o tempo parcial laborado, nos seguintes termos:
Art. 59 - (....)
§ 4o Os empregados sob o regime de tempo parcial não poderão prestar horas extras.
Por sua vez, as férias deverão ser concedidas após o período de 12 meses na seguinte proporção:
“dezoito dias, para a duração do trabalho semanal superior a vinte e duas horas, até vinte e cinco horas;II - dezesseis dias, para a duração do trabalho semanal superior a vinte horas, até vinte e duas horas;III - quatorze dias, para a duração do trabalho semanal superior a quinze horas, até vinte horas;IV - doze dias, para a duração do trabalho semanal superior a dez horas, até quinze horas;V - dez dias, para a duração do trabalho semanal superior a cinco horas, até dez horas;VI - oito dias, para a duração do trabalho semanal igual ou inferior a cinco horas.”
Embora a jornada de trabalho em tempo parcial não seja muito comum, conclui-se que há possibilidade de contratação sob esta modalidade de trabalho. A legislação e a jurisprudência brasileirassão pacíficas neste sentido. Em breves linhas foipossível perceber que a jornada de trabalho em tempo parcial rege-se pelas normas das Consolidações das Leis do Trabalho, especialmente com as regras incluídaspela Medida Provisória n° 2.1464/2001.
Há que se destacar, todavia, que quando se falar em jornada em tempo parcial deverá necessariamente haver: a proibição quanto às horas extras laboradas, a possibilidade de pagamento proporcional às horas trabalhadas, e, ainda, para os casos de empregados que já laboram no regime integral, a obrigatoriedade de jornada parcial ser estipulada mediante norma coletiva de trabalho.