David Hume e o Sistema de Liberdade Natural


13/01/2017 às 17h43
Por Rogério Wanderley Guasti

Rogério Wanderley Guasti*

Resumo: Este trabalho tem o objetivo de estudar a influência do pensamento de David Hume sobre o sistema de liberdade natural, projetando como marco teórico a utilidade pública enquanto Justiça, e o poder, e a propriedade, e principalmente a opinião, enquanto liberdade, como sendo os fatores de maior relevância em todas as questões relacionadas com o governo. É, portanto, nas opiniões de interesse público, direito ao poder e direito à propriedade, que todos os governos se fundam, bem como toda a autoridade de poucos sobre muitos. Foi isso que inspirou Adam Smith a inaugurar o chamado sistema de liberdade natural, que sumularmente concedia ao Estado três funções: defender o país contra agressão estrangeira; administrar a justiça; e, criar e preservar certos serviços públicos e instituições públicas. A metodologia utilizada no estudo foi a bibliográfica e a descritiva. Assim, temos que os principais resultados da pesquisa residem no fato de que: de um lado a livre atuação dos agentes privados garantia a “laissez-faire” segundo as regras naturais de comércio, e de outro lado, a atuação do Estado na defesa do mercado objetivava prevenir e coibir lesões à ordem econômica e, assim, garantir o direito de propriedade.

Palavras-chave: propriedade, utilidade pública, justiça, sistema de liberdade natural

Abstract: This work aims to study the influence of David Hume's thinking on the natural liberty system, projecting as a theoretical framework public utility as Justice, and power, and property, and especially opinion, as freedom, as being the factors of greater relevance in all matters related to the government. It is, therefore, in the opinions of public interest, right to power and right to property, that all governments are founded, as well as all the authority of a few over many. This was what inspired Adam Smith to inaugurate the so-called system of natural liberty, which, by the way, gave the state three functions: to defend the country against foreign aggression; administer justice; and, create and preserve certain public services and public institutions. The methodology used in the study was bibliographical and descriptive. Thus, the main results of the research reside in the fact that: on the one hand, the free action of private agents guaranteed "laissez-faire" according to the natural rules of commerce, and on the other hand, market was aimed at preventing and curbing damages to the economic order and, thus, guaranteeing the right to property.

Key words: property, public utility, justice, system of natural liberty

Classificação JEL: B10, B12, B31

1. Introdução

É simples constatar que os autores exageram nas idiossincrasias de seus personagens, espelhando-os, como espanéficos ou pusilânimes, com traços mais fortes do que se pode encontrar na natureza. Este tipo de pintura moral, para o palco, foi freqüentemente comparado a pintura de tetos e cúpulas, onde as cores são sobrecarregadas e cada detalhe é desenhado com excessiva grandeza, além da natural. As figuras parecem monstruosas e desproporcionais quando vistas de muito perto; mas se tornam naturais e regulares, se olhadas a distância, do ponto de vista para o qual elas foram intencionalmente concebidas. Por um motivo semelhante, quando os personagens são exibidos em representações teatrais, a necessidade de transmitir uma impressão de realidade os transforma, de alguma maneira. E, para compensar a sua frieza e falta de interesse, é muitas vezes necessário reforçar a sua substância, pela força do colorido. Assim ocorre na vida cotidiana; quando um homem permite se afastar alguma vez da verdade em suas narrativas[1], e esculturas que por vezes, possuem a força filosófica de proposições. Estabelecem formas de realidade, limites da representação, e exibem de maneira inevitável o lugar do observador. Todavia, para além desse conjunto básico de atributos, há casos hipotéticos nos quais litígios filosóficos são apresentados em seu mais alto grau de radicalidade. Assim, na pintura renascentista de Rafael Sanzio, no século XVI, é possível testemunhar talvez a mais pura expressão de desentendimento filosófico. Uma forma de lide à qual o cético grego Agripta, no século II antes de Cristo, aplicou o termo diaphonía[2], um tipo insolúvel de desacordo, posto que há entre as partes nele envolvidas terreno comum capaz de abrigar qualquer arbitragem.

Assim a bibliografia de David Hume traz para o liberalismo britânico enfoques filosófico, econômico e político, através de seus Essays. Discerne autores como Plínio J. Smith (1991) e A. O. Hirschman (1977), que apesar do ceticismo do iluminista escocês, seu panorama não alijava a credulidade na ideia de um jusnaturalismo que regulava a vida econômica, aportada, porém, na psicologia humana em vez de na realidade material. William D. Grampp (1948, p. 323), por sua vez, evidencia a perspectiva de Hume no interesse próprio dos indivíduos que, submetidos a compor a justiça a fim de acautelar a propriedade, fariam aflorar uma ordem desafetada da sociedade apta a cevar a segurança pública. Rogério Arthmar (2013, p. 1) chama a atenção para o fato de que William L. Taylor e Edgar A. J. Johnson aforam a colocação ímpar de Hume como autor de comutação no final da era mercantilista, indicando a sua defesa ocasional do protecionismo, mas aludindo também o relevo por ele concedido à ação dos fluxos de ouro (price-specie flow) em corrigir automaticamente a balança comercial, assim como aos privilégios mútuos do comércio entre as nações. Em sua correção das bases longínquas do liberalismo britânico, Grampp (1965, v. II, p. 47) restaura a observação política de David Hume, arrazoando que embora o “historiador” escocês rechaçasse a asserção do contrato social em obséquio da soberania determinada, isso não arredaria o princípio último de que os governos deveriam estar alicerçados na aprovação de seus subordinados, como prescrevido pelos autores liberais subsequentes.

Nesta senda, Hume avivou a parca deferência entre os estudiosos das convicções frugais, nequice tão mais alarmante quando se aceita ter sido este, com destino, um dos adros de ponderação de maior relevância do filósofo escocês. Ate porque conforme Arthmar (2014, p. 61), em fevereiro de 1752, Hume foi eleito responsável pela Biblioteca da Faculdade dos Advogados de Edimburgo, contendo um acervo de 30 mil volumes. E com a imobilidade econômica alcançada com o êxito de seus Essays, bem como o acesso a amplo e matizado cúmulo, assentiram-lhe, enfim, dar jusante aos esboços alentados desde esguia data de encaminhar as suas pesquisas pelo campo da história, principalmente, política e econômica (GRÜNE-YANOFF; MCCLENNEN, 2008, p. 94). Após ter deixado a função em 1757 e se mudado para capital britânica, Hume, ainda, se desvelou, por dez anos, na contextualização dos seis tomos do “best seller” renomado de History of England. O próprio Hume em ensaios retirados e não publicados, titulado “Do estudo da história”, disciplinava que:

Não existe nada que eu recomendaria com mais convicção às minhas leitoras do que o estudo da história por ser a ocupação, entre todas as outras, mais adequada não somente ao seu sexo como à sua educação, muito mais instrutiva do que os seus livros de entretenimento habituais e muito mais divertida do que aquelas composições sérias que geralmente se encontram em seus armários. Entre outras verdades importante, que elas podem aprender com a história, as leitoras podem se informar sobre duas em particular, cujo conhecimento contribuirá bastante para sua serenidade e repouso; [...][3]

Parece aconselhável, portanto, a título de unidade, perscrutarem-se as razões de Hume não apenas nos tradicionais aspectos filosófico, econômico e político, mas também no contexto da formação histórica da sociedade inglesa, cujo eixo, de acordo com ele, residiria na luta entre o poder autoritário e a liberdade. Então, toda a altercação em torno dos fundamentos do sistema de liberdade natural tão defendido por Adam Smith resumir-se-ia na seguinte citação, in verbis:

Segundo o sistema da liberdade natural, ao soberano cabem apenas três deveres; por certo, de grande relevância, mas simples e inteligíveis ao entendimento comum: primeiro, o dever de proteger a sociedade contra a violência e a invasão de outros países independentes; segundo, o dever de proteger, na medida do possível, cada membro da sociedade contra a injustiça e a opressão de qualquer outro membro da mesma, ou seja, o dever de implantar uma administração judicial exata; e, terceiro, o dever de criar e manter certas obras e instituições públicas que jamais algum indivíduo ou um pequeno contingente de indivíduos poderão ter interesse em criar e manter, já que o lucro jamais poderia compensar o gasto de um indivíduo ou de um pequeno contingente de indivíduos, embora muitas vezes ele possa até compensar em maior grau o gasto de uma grande sociedade.[4]

Deste modo, quem pretende falar em nome dos aludidos fundamentos estará sempre pressupondo como válidas uma determinada constelação de valores político-econômicos, uma determinada interpretação dos princípios morais e normas que compõem o sistema de liberdade natural, como: justiça, segurança, liberdade e propriedade (e, portanto, uma definição dos “bens jurídicos” por ela protegidos) e, finalmente, um determinado conjunto, que pode ser consistente ou não de proposições econômicas.

Sob outro espeque, é evidente que nem todas as concepções logicamente admissíveis o são também do ponto de vista de ordenamentos jurídicos específicos, existentes em um momento historicamente concreto. Assim, dado que neste debate nos interessa somente verificar e investigar quais as ideias de Hume influenciaram os fundamentos subjacentes do sistema de liberdade natural inaugurado por Adam Smith em sua principal obra Riqueza das Nações, deve-se, principalmente, tomar como pontos de partida e parâmetros de análise - supondo a sua existência - certos elementos comuns diagnosticáveis, ao menos tendencialmente e de maneira dominante, que são seus Essays.

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2. A influência do pensamento de David Hume no Sistema de Liberdade Natural

A grandeza de David Hume foi reconhecida em sua própria época, como é hoje. Mas os textos que tornaram Hume famoso não são, em grande medida, os mesmos que são responsáveis pela sua reputação atual. Deixando de lado suas Investigações, que foram amplamente lidas, então como agora, Hume é hoje conhecido principalmente por causa de seu Tratado da Natureza Humana e seus Diálogos sobre a Religião Natural. Contudo, o tratado foi pouco lido durante a vida de Hume, e os Diálogos só foram publicados após sua morte. Por outro lado, a maioria dos leitores de hoje dedica pouca atenção a vários livros e Ensaios de Hume e à História da Inglaterra, obras que foram lidas avidamente por seus contemporâneos. Porém, se alguém desejar formar uma visão equilibrada das idéias de Hume, é necessário estudar os dois conjuntos de textos. Pois, se negligenciarmos os Ensaios ou a História, então a nossa visão dos objetivos e das conquistas de Hume provavelmente será tão incompleta quanto aquela de seus contemporâneos.[5]

Nesta linha, um leitor dos Ensaios não pode deixar de se impressionar com a abrangência da erudição de Hume. Nos Ensaios, Hume vai muito além das grandes obras filosóficas, incorporando todas as áreas do conhecimento. Encontram-se evidências recorrentes de suas leituras dos clássicos gregos e latinos, bem como de sua familiaridade com as obras literárias de importantes autores ingleses, franceses, italianos e espanhóis. Os Ensaios refletem o íntimo conhecimento de Hume não somente da história da Grã-Bretanha, mas também de todo o conjunto da história européia. Ele conhecia os mais importantes tratados das ciências naturais e investigou os textos modernos, àquela época, sobre política econômica.

Na sua autobiografia, intitulada “Never say live!”, o economista, historiador e teórico político, David Hume[6] narra que:

É difícil para um homem falar longamente de si mesmo sem vaidade; portanto serei breve. Pode ser considerado um exemplo de vaidade o simples fato de eu pretender escrever a história da minha vida; mas esta Narrativa conterá pouco mais do que a História dos meus Textos; já que, de fato, quase toda a minha vida foi gasta em pesquisas e ocupações literárias. E o êxito inicial da maioria e meus escritos não era objeto de vaidade.

Neste diapasão, Hume foi com esmero, um filósofo, historiador e ensaísta britânico nascido na Escócia que se tornou célebre por seu empirismo radical e seu ceticismo filosófico. David Hume nasceu em 7 de maio de 1711 em Edimburgo, na Escócia, e faleceu em 25 de agosto de 1776. Era neto de sir David Faconer, presidente do Supremo Tribunal da Escócia. Inicialmente Hume pretendia seguir as carreiras jurídicas (mais por influência do avô), contudo, preferiu estudar filosofia e aprendizagem em geral.

Dedicou-se aos estudos, como autodidata, na França, onde completou a sua obra-prima, Tratado da Natureza Humana, com apenas 26 anos. Escreveu também, em 1748, Ensaios Filosóficos sobre o Entendimento Humano, que posteriormente teve o título alterado para Investigação sobre o Entendimento Humano[7]. A leitura deste livro teria feito Immanuel Kant - então um desconhecido professor universitário em Königsberg, já de idade avançada e sem qualquer obra relevante - afirmar que o fez acordar do seu "sono dogmático".

Na obra “Uma investigação sobre os princípios da moral” Hume já despertara a razão para o sistema de liberdade natural, quando mencionou que:

Em sociedades de jogo, requerem-se leis para a condução dos jogos, e essas leis são distintas para cada um deles. Admito que os motivos de tais sociedades são frívolos, e as leis são em grande medida — embora não totalmente — caprichosas e arbitrárias.

Neste ponto, há uma diferença importante entre elas e as regras de justiça, fidelidade e lealdade. As associações gerais de pessoas são absolutamente exigidas para a subsistência da espécie, e a conveniência pública que regulamenta a moral está inviolavelmente firmada na natureza do ser humano e do mundo no qual ele vive. A comparação, portanto, é bastante imperfeita quanto a esses aspectos. Ela apenas nos instrui sobre a necessidade de regras sempre que as pessoas mantêm quaisquer relações umas com as outras.[8]

Ao lado de John Locke e George Berkeley, Hume compõe assim, a famosa tríade do empirismo britânico, sendo considerado um dos mais importantes pensadores do chamado iluminismo escocês e da própria filosofia ocidental, mostrou sua competência e criatividade em várias disciplinas da área social, mas foi um mau juiz da própria obra. Cometeu pelo menos dois erros de avaliação. O primeiro foi quando renegou o Tratado sobre a Natureza Humana, um fracasso editorial. O segundo, quando apontou a Investigação sobre os Princípios da Moral como o "incomparavelmente melhor" de seus livros. Com todos os seus possíveis defeitos, o Tratado, obra de juventude, é há muito tempo considerado seu trabalho mais importante pelos leitores mais cuidadosos. O livro deveria corresponder a um projeto ambicioso. Segundo anunciou numa advertência, Hume pretendia discorrer sobre o entendimento, as paixões, a moral, a política e a crítica. A promessa foi parcialmente cumprida. Nos trabalhos posteriores sobre economia, política, história, crítica e religião, Hume[9] não só reexpôs, mas ampliou, aprofundou e enriqueceu tecnicamente as teses apresentadas no Tratado. Seus ensaios econômicos bastariam para garantir-lhe um lugar importante na história das ciências humanas, por suas contribuições às teorias sobre a moeda, os preços, o comércio internacional, o desenvolvimento, e o governo. Mas o livro de juventude se manteve como a grande matriz de uma obra ampla, diversa e claramente sistemática. O projeto de um sistema é indicado pelas conexões entre os grandes segmentos dessa primeira obra – Do Entendimento, Das Paixões e Da Moral – e pelo potencial explicativo atribuído a uns poucos princípios.[10]

Neste contexto, conforme o pensamento de Hume, ad litteram:

As percepções da mente humana se reduzem a dois gêneros distintos, que chamarei de IMPRESSÕES e IDÉIAS. A diferença entre estas consiste nos graus de força e vividez com que atingem a mente e penetram em nosso pensamento ou consciência. As percepções que entram com mais força e violência podem ser chamadas de impressões; sob esse termo incluo todas as nossas sensações, paixões e emoções, em sua primeira aparição à alma. Denomino idéias as pálidas imagens dessas impressões no pensamento e no raciocínio, como, por exemplo, todas as percepções despertadas pelo presente discurso, excetuando-se apenas as que derivam da visão e do tato, e excetuando-se igualmente o prazer ou o desprazer imediatos que esse discurso possa vir a ocasionar.[11]

Ou seja, o homem possui impressões (percepção imediata da realidade exterior) e idéias (lembrança de tal impressão). A impressão é a causa direta da idéia guardada na mente. Se você queima a mão no fogão, o que você experimenta é uma impressão imediata. Mais tarde pode ser que você se lembre de que se queimou, e esta lembrança Hume chama de idéia, noção. “A mente é um papel em branco em que são escritas as impressões proporcionadas pela experiência.” [12] [13]

Neste raciocínio, os princípios da moral não têm fundamento na razão, mas no sentimento. Pois, não é na razão que informa o que seja o certo e o errado, o justo ou o injusto, mas a própria experiência humana não existe uma faculdade especial como uma razão moral, nem tampouco um bem supremo ao qual deva se conformar o comportamento humano. Hume disciplina que:

Mesmo um homem de enorme insensibilidade será frequentemente tocado pelas imagens do certo e do errado e, ainda que seus preconceitos sejam os mais obstinados, irá certamente aperceber-se de que outras pessoas experimentam impressões análogas.[14]

A moralidade é, então, apenas um conjunto de qualidades aprovadas pela generalidade das pessoas. Essas qualidades seriam aprovadas conforme sua utilidade ou o prazer que proporcionam, posto que só a verdade é passível de discussão, não o gosto; o que existe na natureza das coisas é a norma de nosso julgamento, mas a norma do sentimento é o que cada pessoa sente dentro de si mesma.

O que é próprio da virtude, eles dizem, é ser estimável e do vício, odioso. A finalidade de toda a especulação moral é ensinar-nos nosso dever, e, pelas adequadas representações da deformidade do vício e da beleza da virtude, engendrar os hábitos correspondentes e fazer-nos evitar o primeiro e abraçar a segunda.[15]

Hume leciona que:

Os epítetos “sociável”, “de boa indole”, “humano”, “compassivo”, “grato”, “amistoso”, “generoso”, “benfazejo”, ou seus equivalentes, são conhecidos em todas as linguagens e expressam universalmente o mais alto mérito que a natureza humana é capaz de atingir. Quando essas estimáveis qualidades estão acompanhadas de linhagem, poder e capacidades eminentes, e se revelam no bom governo ou útil a humanidade, elas parecem até mesmo alçar seus possuidores acima da natureza humana e fazê-los aproximarem-se, em certa medida, da divina.[16]

Nesta perspectiva a utilidade é a aptidão ou a tendência natural para servir a um fim, desde que este seja visto como bom. David Hume entende que tudo o que produz incomodidade nas ações humanas se chama vício, e o que produz satisfação se chama virtude. Assim, a finalidade da especulação moral é fazer-nos evitar o vício e abraçar a virtude. Hume concede à Justiça o status de virtude social, juntamente com a benevolência, visto que em todas as decisões morais, essa circunstância de utilidade pública é o que sempre se tem principalmente em vista; e onde quer que surjam disputas, seja em filosofia ou na vida cotidiana, referentes aos limites do dever, não se pode de nenhum modo decidir melhor a questão do que averiguando, em cada um dos lados, os verdadeiros interesses da humanidade. Se alguma falsa opinião, à qual se aderiu em vista das aparências, chega a prevalecer, recuamos de nosso sentimento inicial tão logo a experiência adicional e um raciocínio mais preciso tiverem nos fornecido idéias mais corretas acerca dos assuntos humanos, e ajustamos novamente as fronteiras morais entre o bem e o mal.

Hume relata em seus Essays, “Que a política pode ser reduzida a uma ciência”, que:

Mas quando o príncipe patriota e heróico que o sucedeu se consolidou firmemente no trono, o governo, o povo, tudo pareceu mudar completamente; e somente em função da diferença de temperamento e conduta dos dois soberanos. Exemplos desse tipo podem se multiplicar interminavelmente, na história antiga e moderna, tanto no exterior quanto na esfera doméstica.[17]

Sob este prisma comum, o que deve ser considerado é o fato de que todas as questões são tratadas exclusivamente do ponto de vista da subjetividade humana. Sua epistemologia não se detém em reflexões sobre uma suposta ordem exterior e necessária ao mundo, à qual nosso conhecimento deveria adequar-se, mas diz respeito apenas à manipulação coerente e ordenada das impressões sensíveis que experimentamos em nosso cenário interior, e das idéias que delas resultam. Do mesmo modo, nossos juízos morais não pressupõem, para sua validade, qualquer padrão transcendente do que é bom ou mau em si mesmo, mas repousam integralmente em sentimentos de aprovação ou desaprovação que experimentamos ante certas ações, comportamentos e inclinações. O objeto do Tratado é o ser humano, e sua única tarefa é descrever e explicar o modo pelo qual chegamos a desenvolver tanto nossas convicções acerca da realidade do mundo exterior como nossos julgamentos morais diante das práticas de nossos semelhantes.[18]

Hume, novamente, no ensaio “Que a política pode ser reduzida a uma ciência” diz que:

As épocas de maior espírito público nem sempre são aquelas mais eminentes pela virtude privada. Boas leis podem proporcionar a ordem e a moderação no governo, mesmo que os usos e costumes tenham incutido pouca humanidade ou justiça no caráter dos homens.[19]

Porém de maneira perfunctória Hume[20] na investigação sobre os princípios da moral deixa claro que a justiça (respeito pelo direito de propriedade) deveria todo o seu mérito à utilidade pública, pois conduz ao bem-estar da sociedade. A justiça não teria qualquer necessidade lógica interna e seria desnecessária, se a bondade do homem fosse suficientemente grande para fazer com que todos se sentissem bem, sem necessidade de roubo.

Na obra “Uma Investigação sobre os princípios da moral”, Hume afirma que:

A utilidade pública é o objetivo geral de todas as correntes de justiça, e essa utilidade requer igualmente uma regra estável em todas as controvérsias, mas quando diversas regras quase iguais ou indistintas se apresentam, basta uma mínima inclinação do pensamento para estabelecer a decisão em favor deste ou daquele litigante. Parece evidente que, em vista de tamanha benevolência, o uso da justiça ficaria suspenso neste caso, e jamais se cogitariam, aqui, as divisões e barreiras da propriedade e obrigação.[21]

Nos Essays: “Dos primeiros princípios de governo”, Hume prioriza que:

Há opiniões de dois tipos; a saber, opinião de INTERESSE e opinião de DIREITO. Por opinião de interesse entendo principalmente a percepção da vantagem geral que advém do governo, aliada à convicção de que o governo instituído é igualmente preferível a qualquer outro que poderia se instituir. Quando essa opinião prevalece no Estado, ou entre os que detêm a força em suas mãos, ela traz ao governo uma grande segurança. A opinião de direito é de dois tipos, direito ao PODER e direito à PROPRIEDADE. A prevalência que a opinião de primeiro tipo exerce sobre os homens pode ser facilmente compreendida pelo apego que todas as nações têm por seu antigo governo, e até mesmo pelos nomes sancionados pela tradição. A tradição sempre engendra a opinião de direito; e, por mais que tenhamos sentimentos desfavoráveis a respeito dos homens, eles são sempre condescendentes em relação ao sangue e à riqueza no cuidado pela manutenção da justiça pública. Não há, na verdade, nenhum outro ponto como esse em que, à primeira vista, pareça haver maior contradição na ordenação da mente humana. Quando atuam em facções, os homens tendem a negligenciar, sem vergonha ou remorso, todos os elos de honra e moralidade para servir a seu partido; e, ainda assim, quando uma facção se forma em torno de uma questão de direito e princípio, não há melhor ocasião para que os homens descubram uma maior obstinação e um maior senso de justiça e equidade. A disposição social dos homens é a causa comum a essas aparências contraditórias.

É sabido que a opinião do direito à propriedade é relevante para todas as questões de governo. Um célebre autor fez da propriedade a fundação de todo governo; e a maior parte de nossos autores políticos parece concordar com ele. Mas isso é ir longe demais; mesmo assim, deve-se reconhecer que a opinião do direito à propriedade tem uma grande influência a esse respeito.

Portanto, todos os governos, e a autoridade de poucos sobre muitos, assentam nas três opiniões, a respeito do interesse público, do direito ao poder e do direito à propriedade. É verdade que há outros princípios que os reforçam e determinam, e limitam ou alteram sua operação, como o auto-interesse, o medo e a afeição; mas mesmo assim é possível afirmar que esses outros princípios não exercem influência por si mesmos, mas requerem a influência anterior das opiniões supracitadas. Eles devem ser considerados como secundários, e não como princípios originários do governo.

Pois, em primeiro lugar; quanto ao auto-interesse, pelo que entendo a expectativa de recompensas privadas, distinta da proteção geral que recebemos do governo, é evidente que a autoridade do magistrado deve ser de antemão instituída, ou pelo menos pressuposta, para que essa expectativa possa ser produzida. A perspectiva de benefício pode aumentar sua autoridade em relação a alguns indivíduos particulares, mas ela jamais poderá gerá-la em relação ao público. Os homens naturalmente esperam grandes favores de seus amigos e conhecidos; e, assim, a expectativa de um certo número de membros do Estado nunca recairia sobre um grupo qualquer de homens se estes não tivessem um título qualquer na magistratura e uma influência considerável sobre as opiniões dos homens. A mesma observação pode ser aplicada aos dois outros princípios, medo e afeição. Nenhum homem teria qualquer razão para temer a fúria de um tirano se a autoridade deste derivasse unicamente do medo; pois, enquanto indivíduo, sua força corporal é limitada, e todo outro poder de que dispõe deve se fundar ou em nossa própria opinião, ou na opinião atribuída a outrem. E, apesar do grande alcance da afeição pela sabedoria e virtude de um soberano, ele deve no entanto estar já revestido de um caráter público; não fosse assim, a estima pública não lhe serviria no exercício de nenhum cargo, e sua virtude não exerceria nenhuma influência para além de uma esfera limitada.[22]

Hume também propõe no ensaio “Da origem do governo” no livro Ensaios morais, políticos e literários que o homem é levado a instituir a sociedade política, a fim de tornar possível a administração da justiça, sem a qual não pode haver entre os homens nem paz, nem segurança, nem relações mútuas. Aqui, Hume entende que a Justiça é essencial a qualquer sociedade organizada, vejamos:

Nesse sentido, é forçoso reconhecer que a liberdade constitui a base da perfeição da sociedade civil; mas, ainda assim, deve-se reconhecer que a autoridade é essencial para a sua própria existência; e, nos conflitos que tão frequentemente acontecem entre uma e outra, a autoridade pode, por força dessas circunstâncias, merecer a preferência.[23]

[...]

Os homens devem, portanto, esforçar-se para amenizar o que não podem curar. Devem instituir algumas pessoas, com a denominação de magistrados, cuja função particular é indicar graus de eqüidade, punir transgressores, corrigir a fraude e a violência, e obrigar que cada um, por maior que seja sua relutância, considere seus interesses reais e permanentes. Em suma, a OBEDIÊNCIA É a nova obrigação que deve ser inventada para apoiar a obrigação à JUSTIÇA, que permite a corroboração dos laços de eqüidade pelos de lealdade. [24]

[...]

O governo que, no linguajar comum, recebe a designação de livre, é aquele que admite a partição do poder entre os seus diversos componentes, cuja autoridade combinada não é superior a de qualquer monarca, o qual, no curso usual da administração, deve agir com base nas leis gerais e iguais, de conhecimento prévio de todos os seus membros e subordinados. Neste sentido, deve-se admitir, a liberdade é a perfeição da sociedade.[25]

Afirma, também, que “Em última análise, a distribuição da justiça deve ser considerada como único objetivo e finalidade de todo o vasto mecanismo de nosso governo”[26]. Hume[27] defende, ainda, a existência da noção humana daquilo que seja justiça, in verbis: “Todo homem tem consciência da necessidade da justiça para conservar a paz e a ordem, assim como todo homem tem consciência da necessidade da paz e da ordem para a conservação da sociedade” [28]. Assim, a justiça nasce à medida que a fragilidade humana é incurável. Hume conclui que:

[...] a fim de estabelecer leis para a regulamentação da propriedade, devemos estar familiarizados com a natureza e a condição dos seres humanos, devemos rejeitar aparências que podem ser falsas embora plausíveis, e devemos procurar aquelas regras que sejam, no seu todo, as mais úteis e benéficas.[29]

William D. Grampp em seu artigo científico “Adam Smith and the Economic Man” manifesta que:

O apotegma: Aquele que controla a subsistência de um homem, controla sua vontade. Mas era Smith, que primeiro enfatizou que apenas através de um mercado livre, os homens poderiam emancipar-se da dependência. Não, até mesmo Hume, a quem Smith atribui fundamento de suas ideias, mostrou tão claramente e em riqueza de detalhes a relação entre economia e liberdade política.[30]

O pensamento de David Hume, assim se resume na idéia de que um governo só é legítimo se for útil. Assim, contraria a tese do direito divino dos reis, do contrato social e do uso do despotismo e da violência como recursos para a manutenção da ordem social. Segundo o filósofo, a legitimidade do governo por meio do princípio da utilidade é resolvida de maneira racional.

Rogério Athmar contribui para este raciocínio ao instruir que:

Nos estados livres sujeitos à autoridade estabelecida, explica Hume, prevalece o império da lei, o qual proporciona segurança e, desse modo, estimula a curiosidade e o conhecimento. Com o avanço das cidades, do comércio e da produção manufatureira, os agricultores encontram motivação para produzir além de suas necessidades, criando-se assim mais riquezas, estimulando-se as artes e as ciências e fortalecendo-se o Estado, que passa a dispor de recursos para sustentar os seus empreendimentos bélicos ou administrativos (Hume, Of the rise and progress of the arts and sciences, Of commerce, 1987, pp. 111-137, 253-267). Em poucas palavras, a segurança da propriedade proporcionada pelas leis e a estabilidade das instituições políticas, no juízo de Hume, forneceriam os fundamentos indispensáveis ao progresso da civilização: "Mas as manufaturas, o conhecimento e o humanismo não são vantajosos apenas na vida privada. Eles difundem a sua influência benéfica sobre o público, e fazem o governo grande e próspero como faz os indivíduos afortunados e felizes" (Hume, Of refinement in arts, 1987, p. 272, destaque no original).[31]

Desta feita, a segurança do povo é a lei suprema; todas as outras leis particulares são subordinadas a esta e dela dependem. E se no curso ordinário das coisas elas são seguidas e levadas em consideração, é apenas porque a segurança e o interesse públicos ordinariamente requerem um exercício assim equânime e imparcial.[32]

Pelo visto, o filósofo escocês entende que para que a justiça seja bem administrada deve haver a obediência. Caso contrário, a justiça não seria útil. A obediência é um novo dever, que precisa ser inventado para sustentar a justiça, e os laços da equidade devem ser reforçados pelos da sujeição. Assim, se formula a tese do binômio autoridade e liberdade.

Nesta linha, Arthmar explica que:

A constatação da impossibilidade de se apreender os princípios regentes da realidade exterior, embora fizesse de Hume um cético, não o impediu, todavia, de reconhecer que apesar dessa dificuldade, os homens vivem de fato em sociedade e, por instinto natural apoiado no costume, estabelecem inferências sobre as coisas (HUME, 1963, p. 40-55). Se o conhecimento efetivo lhe parecia inalcançável, seria plausível, não obstante, se obter certa compreensão do mundo a partir do exame da experiência histórica. Assim, entre as paixões humanas, a simpatia se afigurava a mais importante para Hume, pois se a proximidade das coisas instigaria as ideias, a convivência entre os indivíduos promoveria o compartilhamento dos valores constituintes da cultura comum das sociedades: “A este princípio devemos atribuir a grande uniformidade que podemos observar na disposição e no temperamento dos que pertencem a uma mesma nação” (HUME, 1896, p. 316). A simpatia facilitaria igualmente a difusão da linguagem, bem como das opiniões entre os agrupamentos sociais.

De outra parte, porém, o homem estaria guiado pelo interesse próprio, particularmente no tocante aos seus familiares e amigos. E essa inclinação, no juízo de Hume, poderia conduzir à desagregação social. Dentre os três tipos de bens à disposição do ser humano, os dois primeiros, a mente e o corpo saudáveis, não poderiam ser usurpados em favor de outrem. O mesmo, contudo, não poderia ser dito a respeito da satisfação proporcionada pela propriedade adquirida por esforço ou obra do destino. Pois sendo esta última categoria de bens limitada, estaria sujeita a ser apoderada por estranhos mediante violência ou pilhagem. “Como a ampliação desses bens, portanto, constitui a principal vantagem da sociedade, a instabilidade de sua posse, juntamente com a sua escassez, constitui-se no maior impedimento para tanto” (HUME, 1896, p. 488, destaque no original).[33]

Conforme Hume, nos diversos governos há uma luta entre dois ideais: o da autoridade e o da liberdade - que Marx futuramente daria o nome de luta de classes:

Em todos os governos existe uma permanente luta interna, aberta ou silenciosa, entre a autoridade e a liberdade, e neste conflito nem uma nem outra pode jamais prevalecer de maneira absoluta. Em todos os governos se tem necessariamente que fazer um grande sacrifício da liberdade, e, contudo também a autoridade, que limita a liberdade, jamais deve, em qualquer constituição, tornar-se completa e incontrolável.[34]

As regras da equidade ou da justiça dependem, portanto, inteiramente do estado e da situação particulares em que os homens se encontram e devem sua origem e existência à utilidade que proporcionam ao público pela sua observância estrita e regular. Assim, a autoridade se legitima à medida que proporciona o bem público e é útil à sociedade.

Grampp neste sentido enfatizou que:

Some of these principies (both "first" and "second") are rooted in human traits that Hume thought were dignified and others in traits that he thought were mean. One may infer that Hume in this essay was explaining the actual foundations of government and not the ideal. The most desirable government would base itself on the dignity in human nature, which is shown in the first two of the leading principies: the desire for peace and the desire for the protection of private property. These desires are in no way inconsistent with those established by Hooker, Locke, and Hobbes, nor are the conditions which, according to Hume, make the objectives realizable: the gregariousness of man and his ability to conceive of an ideal society. The explicit difference between Hume and his predecessors is over the social contract. But the difference is not decisive. Much more important is their agreement that government shotdd be based on the consent of the governed. This idea was at the heart of the political doctrine of the Enlightenment. Although it does not appear in this form in Hume essays, there does appear the idea of opinion, with the very strong suggestion that the ideal government draws its power from the opinion men hold of its ability to keep the peace and protect their property. And what is opinion, if it is not the idea of consent? The classic liberais said that government ought to maintain peace and protect wealth. But that is not ali it should do. When Locke wrote of the protection of property he clearly was interested in safeguarding more than the wealth of men. He meant "their lives, liberties and estates, which I call by the general name—property."

Property, so conceived, comprehended ali natural rights. The duty of government is to protect and advance them. Hume did not say much about natural rights and he did not emphasize, as Locke and Hobbes did, the governments responsibility to protect them. But he certainly was not indifferent to freedom and security, which were the principal rights. The term "natural rights" appears rarely in classical economics except in The Wealth of Nations where, however, it usually applies to economic liberty.[35]

Tanto não foi diferente, que Adam Smith[36] em sua principal obra, “A riqueza das nações”, pontifica em tom de poética a importância da utilidade sobre o estado justo. Observando que os governos estão permeados de um cinismo que, por comparação, faz com que os amigos céticos como Hume, irradiam brilho com doçura e calor. Em “A riqueza das nações”, o motivo do comportamento poético (e a maioria dos outros) é o interesse próprio, e o interesse próprio opera com sucesso indiferente. Suas declarações sobre o governo na pesquisa são fragmentárias e devem ser tomados com precauções, a fim de assegurar uma concepção segura de sua doutrina política. Pois, depois de um reconhecimento acerca do princípio da simpatia de Hume (a base, lembra-se, de Teoria dos Sentimentos Morais), Smith afirma nas suas palestras, que os governos são estabelecidos para providenciar justiça e os homens aprendem que a justiça requer coerção - uma ideia, que, penso, está subestimada no princípio de Hume de "vantagem genérica". Os governos são, portanto, fundados na utilidade, que é a prestação de justiça e salva-guarda dos direitos naturais, ou seja, liberdade econômica. Uma vez que o comportamento moral dos subordinados consiste na liberdade religiosa, na liberdade de expressão, no livre uso da propriedade, e representatividade no governo.

Já que, o governo que priva os homens dessas liberdades não pode ser tolerado, e se a resistência a ele evoca violência, isto é, pode ser considerado lamentável, mas dificilmente será uma razão para submissão. Smith observou uma vez que "rebeldes e hereges são pessoas azaradas, que, quando as coisas chegaram a um certo grau de violência, têm o infortúnio de sofrerem mais.[37]

Portanto, Smith não poderia ficar mais agitado pelo espectro da revolução. Pois, tanto ele como Hume concordam que enquanto um governo demonstrar “qualquer grau de moderação” (em tributação e em seus outros poderes) a sabedoria ditou que seria suposto. A saber, que os homens são pretensiosos, que são beligerantes, mas que sua faculdade racional e gregária, instinto próprio dos nacionais, torna estes fortes o suficiente para reuni-los sob um governo que irá proteger suas vidas, liberdades e estados.[38]

Para Smith:

[...] uma vez eliminados inteiramente todos os sistemas, sejam eles preferenciais ou de restrições, impõe-se por si mesmo o sistema óbvio e simples da liberdade natural. Deixa-se a cada qual, enquanto não violar as leis da justiça, perfeita liberdade de ir em busca de seu próprio interesse, a seu próprio modo, e faça com que tanto seu trabalho como seu capital concorram com os de qualquer outra pessoa ou categoria de pessoas.[39]

Assim, correto é o apontamento de Arthmar, que destaca que:

Face ao risco de práticas predatórias conducentes à desestruturação social na ausência de uma justiça atuante, o objetivo de resguardar a propriedade revelar-se-ia fundamental. "Lance uma quantidade considerável de bens entre os homens, eles imediatamente se põem em luta, cada qual querendo se apoderar do que lhe apetece, sem consideração às consequências." (HUME, 1896, p. 540). Diferentemente da teoria do contrato social então em voga, o estado de ordem e de respeito à propriedade, tal como concebido por Hume, seria alcançado apenas quando da presença de uma autoridade à qual os subordinados se sujeitassem pela força do hábito. A origem mais provável dos governos divisada por ele estaria localizada na obediência aos chefes militares que, em tempos de paz, teriam logrado estender sobre o restante da comunidade a ascendência conquistada nos campos de batalha (HUME, 1963; 1896; veja-se PHILLIPSON, 2011; MACFARLANE, 2001; BROWNSEY, 1978). Uma vez estabelecida tal situação, tudo o mais adviria, porquanto se tornaria viável a realização de trabalhos públicos com retorno distante no tempo, superando-se a propensão do homem a valorizar unicamente o que lhe parece próximo.[40]

Peter Jones amestra que:

Um ponto central nas reflexões históricas de Hume diz respeito à inevitável luta entre liberdade e autoridade. Em 1741 escreve: “em todos os governos, há uma luta perpetua interna, aberta ou secreta, entre AUTORIDADE e LIBERDADE” (E, 40). Ao traçar este tema através de seus escritos, é necessário aqui apenas observar que Hume oferece nenhuma definição ou análise formal dessas "noções", nem seriam suas as indagações. Como veremos, ele está principalmente preocupado com a liberdade sob a lei, e com as restrições sobre ela exercida por vários tipos de autoridade; Em menor grau, considera limites a liberdade pessoal imposta pelo hábito ou educação, mas ele não está preocupado. É na História, que ele se depara com os problemas filosóficos da “liberdade e determinismo”. Ele simplesmente assume, como uma questão de senso comum, que somos moralmente responsáveis ​​pelos pensamentos e paixões, intenções e inclinações, que funcionam como as causas de nossas ações; E que estamos geralmente imune de nossas responsabilidades pelas causas desses eventos mentais próprios, posto que somente eventos externos podem nos impedir.

[...]

A liberdade, então, é um direito que cada indivíduo deve estar pronto para vindicar para si mesmo, e que ele que pretende dar como um favor, tem por esse mesmo ato na realidade negado. Mesmo os estabelecimentos políticos parecem ser independentes da vontade e arbitragem dos homens, porém podem ser invocados para a preservação da liberdade; Eles podem nutrir, mas não devem substituir aquele espírito firme e resoluto, com o qual a mente liberal está sempre preparada para resistir às indignidades, e o recurso da segurança para si mesmo.[41]

Por este prisma, a lei das nações é discutida na seção XI do livro III do Tratado. A seção XII é dedicada à castidade e à modéstia. Se a sequência das duas seções parece inicialmente estranha, a surpresa logo se dissipa. A discussão da moral sexual obedece aos mesmos padrões seguidos na exposição sobre a justiça e sobre as condições indispensáveis à vida social, à cooperação internacional e até à guerra. "As três regras fundamentais da justiça – a estabilidade da posse, a sua transferência por consentimento e o cumprimento das promessas – constituem deveres dos príncipes tanto quanto dos súditos" e são derivadas igualmente da utilidade ou, simplesmente, do interesse dos homens e da sociedade.

Robert Lyon com espeque neste panorama apascenta que:

Na filosofia econômica, Hume concluiu que a única justificativa da propriedade privada era a utilidade. O que ele chamou de "esquemas de comunidade" uma vez que "essas idéias de perfeita igualdade... são, na verdade, de base, impraticáveis; E se não fossem assim, seria extremamente pernicioso para sociedade humana”. No caso de conflito entre interesses privados e públicos, o Estado tinha não apenas um direito, mas o dever de intervir para proteger o interesse público. Na verdade, como declarou categoricamente no Inquiry: “... utilidade pública é a única origem da justiça... ( no que diz a lei de proteção a propriedade).[42]

Alan Macfarlane apostola que:

Assim, Hume havia esboçado a expansão do poder do capitalismo nas vantagens do comércio, da manufatura e do dinheiro. Não é nenhuma maravilha que pensou que comerciantes são "uma das raças mais úteis de homens, que servem como agentes entre as partes do Estado, que são completamente desconhecidas, e são ignorantes em relação a outras necessidades". Na verdade, os comerciantes geram a indústria, servindo como alavanca e prosperidade para todos os cantos do estado: e, ao mesmo tempo, por sua frugalidade, eles adquirem grande poder sobre essa indústria, e coletam uma grande propriedade no trabalho e nas mercadorias, que são os principais instrumentos de produção. Aumento da riqueza, por sua vez, levaria ao círculo virtuoso, ou seja, ao crescimento de um sistema político equilibrado e a liberdade que, por sua vez, é a fundação para que haja uma riqueza futura.[43]

E Lionel Robbins ultima que:

O Sistema de Liberdade Econômica não foi apenas uma recomendação destacada de não interferir, era uma exigência urgente de que o que se pensava ser impedimentos e obstáculos anti-sociais deve sim, ser removidos e que o imenso potencial de iniciativa individual é o que movimenta o Estado.

[...]

É a contribuição específica dos economistas clássicos, que, para a realização deste objetivo, recomenda-se o que Marshall chamou de Sistema de Liberdade Econômica. Dado um certo enquadramento da lei e da ordem e dos serviços governamentais necessários (dos quais muito mais daqui em diante), eles conceberam que o objeto da atividade foi melhor alcançada por um sistema de cooperação. Como consumidores, os cidadãos devem ser livres para comprar o que melhor agradou a sua fantasia. Como produtores, trabalhadores ou como proprietários e organizadores da produção, eles devem ser livres para usar sua força ou a sua propriedade de forma que, na sua opinião, traga-lhes a máxima recompensa em dinheiro ou satisfação. É o mecanismo impessoal do mercado que, nesta perspectiva, leva a que os interesses dos diferentes indivíduos fiquem harmonizados. Adam Smith dizia que o indivíduo que procura dirigir a indústria tendo seus produtos o maior valor, pretende apenas o seu maior ganho, mas ele está nisso, como em muitos outros casos, liderados por uma mão invisível para o comércio presente nos governos. Nesta trajetória Benthamdiz que: “É modesto e razoável como o que Diógenes fez para Alexander: “Sair do meu raio de sol, nós não temos necessidade de favor - exigimos apenas um seguro e aberto caminho.”.[44]

Assim, não há uma discussão sistemática do coletivismo nas obras de Hume ou Adam Smith. Contudo, não é difícil inferir atitudes latentes indiretas. Como já vimos, a teoria da propriedade de Hume baseia-se essencialmente em considerações de utilidade. Você pode conceber circunstâncias em que a instituição da propriedade seria desnecessária ou em que teria que ser substituída: em um estado de abundância, em um estado de sítio, de quebra dos direitos naturais; um Estado da benevolência universal a tornaria supérflua.

Mas em circunstâncias normais, nos quais os meios de satisfação são escassos, mas não tão intensamente certo e onde o amor próprio e o afeto familiar são tão mais fortes do que o altruísmo geral, parece ser a propriedade a base viável para a ordem na vida social. Hume considera muito bem que existem circunstâncias em que a ação governamental é necessária para complementar as demandas que decorrem da propriedade dos bens.

Há uma passagem no Tratado que expõe também como poderia ser desejável a natureza das circunstâncias em que uma abdicação de certos direitos de ação individual pode ser do interesse de todos os indivíduos. Mas ele dá por certo que a propriedade privada é a base principal da cooperação social. E embora ele não discuta explicitamente a propriedade comum nesta conexão, é razoável inferir que a ênfase sobre a necessidade da propriedade privada implica uma rejeição da alternativa.

Esta conclusão é conjectural. Mas uma passagem do ensaio “Do Comércio”, no qual Hume descreve as dificuldades do socialismo militar considerado como uma instituição permanente, é prova muito forte de apoio.

Poderíamos converter uma cidade em uma espécie de acampamento fortificado, ele diz, e infundir em cada chefe tão marcial um gênio, e uma paixão pelo bem público, como fazer com que todos estejam dispostos a sofrer as maiores dificuldades para o bem do público, essas afeições poderiam agora, como em vezes, provar ser um estímulo suficiente a apoiar a comunidade. Seria então vantajoso, como nos campos, banir todas as artes e o luxo; e pôr restrições relativas ao equipamento e às tabelas, já que forragem duram mais do que se o exército fosse carregado com um número de retentores supérfluos. Mas como esses princípios são demasiadamente desinteressados ​​e difíceis de apoio, é necessário governar os homens por outras paixões e animá-los com um espírito de avareza e indústria, arte e luxo. O campo é, neste caso, carregado com um séquito supérfluo. Porém as provisões fluem proporcionalmente maiores. A harmonia do todo ainda é suportada. E a inclinação natural da mente, sendo mais pessoas físicas, bem como o público, encontram sua noção na observância dessas máximas.

No que diz respeito aos princípios de distribuição àqueles implicados pela instituição da propriedade e da herança, como já vimos, ele sai do seu caminho para reconhecer o forte, caso de prima face pela igual distribuição. Mas, como vimos também, ele é enfático em sua rejeição deste princípio. Não funcionará, e a tentativa de fazê-lo funcionar deve levar ao empobrecimento e a perda de liberdade. Deve-se notar, no entanto, que pensava Hume a este respeito, não num sistema de rendimentos iguais baseados na propriedade comum, mas na tentativa de conseguir uma igualdade persistente de distribuição de bens. Os Levellers aos quais ele refere-se a radicais distributivistas; não havia nada especificamente comunista sobre suas propostas.

Todavia há referências explícitas ao coletivismo, no moderno sentido do termo, são ainda mais difíceis de encontrar em Adam Smith, do que em Hume. Há, naturalmente, sua alusão à Utopia e Oceana como representando casos limitantes de improbabilidade de se desenvolver. Mas a referência aqui é para a improbabilidade de uma comunidade ideal de qualquer tipo, do que à indesejabilidade específica de qualquer coletivista tendencioso, como More ou Harrington. Smith estava muito preocupado em desenvolver sua própria análise e sistema de política que dela decorria, para ser em discussão de qualquer coisa que lhe parecesse tão inerentemente fantástico quanto o Coletivismo do século XIX.

O mesmo ponto é feito, talvez mais forte ainda, na famosa passagem da Teoria dos Sentimentos Morais sobre o homem de sistema: “O homem de sistema... capaz de ser muito sábio em sua própria presunção; E muitas vezes é tão enamorado com a suposta beleza de seu próprio ideal plano de governo, que ele não pode sofrer o menor desvio de qualquer parte dele.”[45]. Ele continua a estabelecer isso completamente e em todas as suas partes, sem qualquer consideração aos grandes interesses, ou aos fortes preconceitos que pode opor-se a ele. Ele parece imaginar que ele pode arranjar diferentes membros de uma grande sociedade com facilidade quando a mão organiza as peças diferentes do tabuleiro de xadrez. Ele não considera que as peças do tabuleiro de xadrez não tem outro princípio de movimento além do que a mão imprime sobre eles; mas isso, no grande tabuleiro de xadrez da sociedade humana, cada um tem um princípio de movimento próprio, completamente diferente daquela que o legislador poderia escolher para impressioná-lo. Se esses dois princípios coincidem e agem na mesma direção, o jogo da sociedade humana vai facilmente e harmoniosamente, e é muito provável para ser feliz e bem sucedida. Se eles são opostos ou diferentes, o jogo continuará miseravelmente, e a sociedade deve estar em todos os momentos no mais alto grau de desordem.

Till Grüne-Yanoff e Edward F. McClennen aludem que:

Assim concluímos que Hume não só fornece um quadro dinâmico de mudança de paixão, mas também prevê uma noção de auto-contenção racional dentro desta estrutura. Contra Hirschman, então, mostramos que Hume distingue dois tipos de empreendimentos comerciais: um, socialmente disruptivo, baseado na avareza; E outra, mais benéfica, que se baseia na racionalidade da auto-contenção.[46]

Neste pensar, Hume explicita essa regra de parcimônia no fim da seção III da Investigação sobre os Princípios da Moral:

Quando um princípio se demonstrou muito poderoso e eficaz em um caso, está inteiramente de acordo com as regras filosóficas, e mesmo da razão ordinária, atribuir-lhe eficácia comparável em todos os casos similares. Esta, de fato, é a regra principal da atividade filosófica, para Newton.[47]

Albert O. Hirschman refuta que:

Hume's statement can stand as the culmination of the movement of ideas that has been traced [in this work]: capitalism is here hailed by a leading philosopher of the age because it would activate some benign human proclivities at the expense of some malignant ones—because of the expectation that, in this way, it would repress and perhaps atrophy the more destructive and disastrous components of human nature.[48]

Nesta essência a referência ao livro III dos Principia. Em alguns momentos Hume parece rejeitar o critério da simplicidade. Alguns teóricos da moral foram longe demais "em sua paixão por um princípio geral único", observa Hume na seção inicial da Investigação sobre o Entendimento Humano[49]. Mas a expectativa de encontrar "alguns princípios gerais" para dar conta de todos os vícios e virtudes é desculpável, acrescenta logo depois. Esforços semelhantes deram algum resultado "nos campos das artes, da lógica e mesmo da política". Em outros textos, como no começo do livro II do Tratado, sua adesão à norma da parcimônia, ou simplicidade, é apresentada de forma inequívoca. No "curso da natureza", afirma Hume, efeitos variados comumente decorrem de poucos e simples princípios. Ele chega a atribuir o atraso da filosofia moral à rara observância dessa norma. A fidelidade a essa regra é um dos aspectos mais notáveis da filosofia moral de Hume e o principal fator de unidade de seus escritos: um número muito restrito de teses fundamentais aparece nos textos sobre economia, história, política e sociologia (ou psicologia social) e confere a toda a obra um caráter sistemático.

Se, por acaso, qualquer um dos subordinados apresentar um temperamento mais suscetível à devoção que o usual, de forma que lhe seja menos necessário ter que demonstrar hipocrisia no exercício de sua profissão, torna-se tão natural para ele superestimar essa vantagem, considerando-se imune a qualquer violação da moralidade, que freqüentemente ele não é mais virtuoso que o hipócrita. E, embora poucos ousem afirmar abertamente que tudo o que fazem é em lealdade aos santos e que todas as suas propriedades são assim legitimadas; ainda assim, podemos observar a presença oculta desses princípios em seus corações, e tal zelo pelo respeito às regras religiosas é tão grande que compensa muitos vícios e enormidades. Essa observação e tão comum que todos os homens prudentes ficam atentos quando se deparam com qualquer manifestação extraordinária de religiosidade; embora eles, ao mesmo tempo, confessem que existem muitas exceções a essas regras gerais, e que a probidade e a superstição, ou mesmo a probidade e o fanatismo, não são sempre e em todos os casos incompatíveis.[50]

No ensaio “Do Comércio” Hume abre a apreciação com uma vigorosa defesa do pensamento filosófico, mesmo quando o afastamento em relação ao senso comum parece imprudente. Hume declara de forma inequívoca sua preferência pelos "pensadores abstrusos". Podem errar o alvo, por excessos, mas oferecem novidades e abrem caminho a descobertas importantes. A "conversa dos cafés", própria dos "pensadores superficiais", jamais produzirá resultados semelhantes. Raciocínios gerais parecem intricados meramente por serem gerais e não é fácil para a maior parte da humanidade, distinguir, num grande número de particulares, a circunstância comum em que todos coincidem ou extraí-la, pura e sem mescla, de outras circunstâncias supérfluas. Mas, apesar de intricados, princípios gerais, se justos e sólidos, "devem prevalecer sempre no curso geral das coisas, embora possam falhar em casos particulares". É função principal dos filósofos e dos governantes levar em conta esse curso geral. Essa introdução serve como prefácio aos textos econômicos e como advertência ao leitor: ele deve preparar-se para encontrar raciocínios incomuns, talvez muito refinados, na aparência, para "objetos tão vulgares". Talvez sejam falsos, mas ninguém deveria, segundo Hume, rejeitá-los simplesmente por serem incomuns. Essa introdução contém, portanto, uma espécie de manifesto filosófico, uma advertência ao leitor e uma justificativa prática para a investigação científica: o conhecimento do "curso geral das coisas" é necessário à administração do Estado. Esse caráter prático da reflexão econômica permeia todos os ensaios. São todos polêmicos e dirigidos não apenas contra um determinado conjunto de teorias, mas também contra certas práticas políticas. Tanto essas teorias quanto essas práticas seriam mais tarde identificadas como mercantilistas. O rótulo comum pode ser impreciso, mas serve para marcar as principais diferenças do pensamento clássico em relação a ideias dominantes entre escritores e políticos até meados do século 18. Em suas versões mais populares, a história do pensamento econômico vincularia a mudança de paradigma principalmente a Adam Smith e David Ricardo. Mas, quando a Riqueza das Nações foi publicada, em 1776, alguns autores já haviam avançado muito na crítica do mercantilismo e na construção dos fundamentos da economia clássica. Hume, Quesnay e Turgot merecem boa parte do crédito – a maior, provavelmente – por esse trabalho.

David Hume no ensaio acima citado implementa que:

Embora se possa supor que, em certos aspectos, a grandeza de um Estado e a felicidade de seus súditos sejam independentes, eles são inseparáveis no que diz respeito ao comércio: assim como homens privados recebem do poder público uma maior garantia para a manutenção de seus negócios e de sua propriedade, assim também a comunidade se torna mais poderosa na mesma razão da opulência e da extensão do comércio de homens privados.[51]

No ensaio “Da desconfiança no comércio”, Hume vai além ao presumir que:

É evidente que a indústria de um povo não pode ser prejudicada pela maior prosperidade de seus vizinhos; e, como esse ramo do comércio é sem dúvida o mais fundamental em qualquer reino importante, estamos livres de qualquer razão para desconfiança. Mas vou mais longe, e observo que, quando se mantém uma comunicação aberta entre as nações, é inevitável que a indústria doméstica de cada um delas aumente com o aprimoramento das outras.[52]

E ensina o economista no ensaio “Da balança de poder”, que: “[...] a ambição trabalha cegamente pela destruição do conquistador, de sua família e de tudo o que lhe é próximo e caro.[53]

Portanto, Hume enquanto economista, escritor político e cidadão, defende as instituições inglesas de seu tempo e defende maior abertura para a atividade produtiva, para o comércio e, portanto, para o desenvolvimento das artes e das ciências e, portanto, para todos os benefícios consequentes. Há em seus escritos e em suas atitudes políticas uma mistura de conservadorismo e de reformismo. É preciso evitar o radicalismo político e preservar as liberdades e as formas de coexistência estabelecidas e consolidadas a partir da revolução de 1688.[54] Mas é preciso, também, avançar na liberação da atividade produtiva e comercial. A crítica à política dos monopólios, dos privilégios e das barreiras impostas ao comércio é uma tentativa de eliminar resíduos do absolutismo. Os fisiocratas desenvolvem na França uma campanha semelhante. Turgot, amigo e correspondente de Hume, batalha pela liberação do espaço econômico francês e pela difusão de novas práticas de produção e de circulação de mercadorias. O trabalho continuará com Adam Smith, Jean-Baptiste Say e David Ricardo.

Hume descreve, então, a história européia, desde o ponto de inflexão no século 11, como a construção progressiva de uma sociedade livre. As mudanças econômicas, culturais e políticas vividas entre a fase final do feudalismo e o começo da modernidade produzem em toda parte resultados semelhantes: “Assim, a liberdade pessoal tornou-se quase generalizada na Europa e essa vantagem pavimentou o caminho para o aumento da liberdade política ou civil”[55]. Mesmo quando esse efeito foi incompleto, acrescenta o historiador, a transformação proporcionou aos membros da comunidade alguns dos principais benefícios. A experiência inglesa, segundo ele, tem uma característica especial, porque a vontade do monarca, desde a invasão da ilha pelo saxões, jamais foi "inteiramente absoluta e incontrolada". Em outros aspectos, no entanto, o equilíbrio de poder mudou amplamente entre as várias ordens do Estado. Hume nunca se mostra bastante otimista para apostar na continuidade indefinida do progresso ou mesmo na preservação das liberdades e das luzes. Sua tese sobre a inflexão histórica depois dos períodos de exaltação ou de depressão nunca é abandonada. Além disso, ele nunca deixa de alertar para os perigos do radicalismo e do partidarismo. Mas a maior parte de seus escritos parece conter pelo menos a crença na possibilidade de um longo período de liberdade e de progresso, se houver suficiente investimento na polidez e no bom senso.

No escrito “Sobre a Balança Comercial” Hume desperta a atenção ao dizer que:

Em resumo, cada Governo tem muita razão em preservar com cuidado seu povo e suas manufaturas. Seu dinheiro pode com segurança confiá-lo ao curso dos assuntos humanos sem temor ou ciúme. Ou, se jamais der atenção a esta última circunstância, deverá ser apenas na medida em que afeta a primeira.[56]

Logo, é aparentemente impossível dar conta do prazer que os espectadores de uma tragédia bem escrita recebem da tristeza, do terror, da ansiedade e de outras paixões desagradáveis. Quanto mais são comovidos e afetados, mais se deliciam com o espetáculo e, assim que as paixões desagradáveis cessam sua influência, a peça chega ao fim.[57]

Outrossim, se a moralidade não tivesse naturalmente nenhuma influência sobre as paixões e ações humanas, seria inútil fazer tanto esforço para inculcá-la; e nada seria mais vão que aquela profusão de regras e preceitos tão abundantes em todos os moralistas.[58]

Para Mônica Loyola Stival acerca do pensamento experimental de Hume, ela condensa que:

A função das regras é assim permitir todo e qualquer raciocínio, constituindo o entendimento como conjunto das regras gerais para juízos de causação. Os raciocínios dependem então de que a mente possa distinguir as causas que propriamente operam em determinado evento.[59]

Nos desperta, então, a relação tênue entre o pensamento de David Hume, e o sistema de liberdade natural de Adam Smith, que resumidamente concedia ao Estado três funções: defender o país contra agressão estrangeira; administrar a justiça; e, criar e preservar certos serviços públicos e instituições públicas (ruas, portos, canais navegáveis, pontes, educação para juventude, instrução religiosa, sustento do soberano).

Neste aspecto os princípios morais de Hume, quanto a moralidade, a justiça, a utilidade pública, e sobre o desenvolvimento do comércio, ele deixa claro que a livre concorrência, partiu da noção de razão, “um maravilhoso e ininteligível instinto de nossas almas, que nos conduz por uma certa sequência de idéias, conferindo-lhes qualidades particulares em virtude de suas situações e relações particulares.[60]

Hume, é assim, um crítico ferrenho do mercantilismo e entusiasta defensor do livre comércio, cujo pensamento foi a principal influência no liberalismo econômico de Adam Smith. Ao longo dos Ensaios morais, políticos e literários (1741) alhures destacados, e de Uma investigação sobre os princípios da moral (1751) encontramos reflexões muito pertinentes e atuais. Nas análises econômicas utilizou um rigoroso aparato metodológico que o permitiu chegar a conclusões inovadoras e corretas. Percebeu que o cerne do problema econômico é a escassez, que nunca acabará porque, na maioria das vezes, os indivíduos desejam mais bens de consumo que a capacidade humana de produzi-los e distribuí-los. Defendeu o luxo e o consumo demonstrando sua relação com o progresso da sociedade. Demonstrou que para uma sociedade progredir e florescer são necessários o respeito ao direito de propriedade, a possibilidade de transferência da propriedade por consentimento e a garantia do cumprimento dos compromissos assumidos. Explicitou que o dinheiro não é um dos objetos do comércio, mas apenas o instrumento simbólico sobre o qual concordam os homens para facilitar a troca de uma mercadoria por outra, além de observar que o nível geral dos preços é determinado pela proporção entre a moeda circulante e produtos no mercado. O pensamento do filósofo e economista escocês foi o corolário do profundo debate sobre os fundamentos da moral, travado na Grã-Bretanha entre a última década do século XVII e o início da segunda metade do século XVIII. O cerne dessa querela filosófica foi à possibilidade de se conceber uma moral social autônoma em relação às outras esferas do saber, cujo estabelecimento se daria de forma não intencional via consenso social.

Todavia é válido ressaltar que o próprio Hume no ensaio “Dos impostos” chegou a ilustrar que:

Os historiadores nos informam que uma das causas principais da destruição do estado ROMAN O foi a mudança introduzida por CONSTANTINO nas finanças, ao substituir por um imposto individual universal quase todos os dízimos, taxas e impostos que anteriormente constituíam a renda do império: Em todas as províncias o povo foi tão oprimido e explorado pelos cobradores que se entregaram com prazer ao refúgio das armas dos conquistadores bárbaros, cujo domínio, pois que eles eram menos refinados e tinham menos necessidades, era julgado preferível à sofisticada tirania dos ROMANOS.[61]

E após muitas dificuldades[62] no panorama político e econômico da Inglaterra, o historiador escocês orna que:

A Revolução inaugura uma nova época da constituição, e provavelmente teve outras conseqüências vantajosas para o povo além de libertá-lo da administração censurável. Ao resolver em favor da liberdade muitas disputas pendentes, e estabelecer o importante precedente de deposição de um rei e instituição de novo regimento para a Coroa, concedeu aos princípios populares uma predominância tal que não pode haver mais controvérsia acerca da natureza da Constituição inglesa. É justo afirmar, sem receio de exagero, que desde então desfrutamos nesta ilha, senão do melhor sistema de governo, ao menos do mais completo sistema de liberdade que jamais existiu entre os homens.[63]

Finaliza-se esta digressão com a máxima citada por Hume no ensaio “Da obediência passiva”, que assim se expressa: “fiat Justitia ruat Caelum (“Que a justiça seja cumprida, mesmo que o universo seja destruído”)”.[64]

3. Considerações finais

Os economistas clássicos não estavam preparados para a política e sua conclusão implícita, a saber, a emancipação universal e o controle popular de todos os ramos do governo. Por outro lado, os economistas não expressamente colocariam limites à liberdade quando disseram que um mercado livre era o método ideal para organizar a economia. Em vez disso, implicavam ou afirmavam que a liberdade era um direito natural. Essa oposição da doutrina econômica e política - de acreditar na liberdade econômica completa, mas na liberdade política limitada - denotou uma contradição no seu liberalismo? Uma visão comum é que os economistas clássicos foram porta-vozes para o emergente capitalismo de seu tempo e se dedicaram apenas à libertação de sua carga especial, a classe média. Nesta visão, sua concepção de liberdade econômica era de fato tão limitada como sua concepção de liberdade política. Não aceitamos esta posição.

Acreditamos que realmente havia um paradoxo em suas ideias econômico-numéricas e política. Já que os classicistas acreditavam na liberdade econômica para todos e não apenas para a classe média. Argumentavam de forma muito expirada a liberdade destes últimos, mas não há dúvida de que era sua preocupação exclusiva. Sua simpatia para as classes mais baixas foi demonstrada de muitas maneiras.

Hume declarou que uma distribuição igual e mais consistente com a natureza humana, traria um melhor bem-estar nacional, e seria mais propício para a extensão da liberdade, embora em determinadas condições poderia o governo criar conflitos, tudo na salva-guarda da propriedade e suas liberdades, pelo implemento da Justiça como utilidade.

Já Smith deu ao operário a função mais importante na economia, os empregadores censurados por se combinarem para baixar os salários, sobre as maneiras e morais dos empresários, em tantos termos, que sua hostilidade para com a classe média, apesar de ele ter defendido esta, sua máxima era o direito de comércio livre, que dificilmente pode ser chamado de campeão.

A sociedade em geral persuade as classes mais baixas de que a previsão e a provisão são tão necessárias e "lucrativas", que impõe a estes a base desta liberdade.

Assim, tudo o que é certo, e a fazer como política em Hume seguiu a regra do laisser être, à medida que sua economicidade seguia o laisser faire. Essa impressão, entretanto, é porque Hume, em suas obras políticas, deu grande ênfase à necessidade de autoridade, paz e ordem, como as condições de bem, que o rei não governou por direito divino ou pela autoridade de sucessão, mas simplesmente para fornecer a estabilidade que o governo precisava.

Smith também se opôs a um governo no qual todos os Bispos eram eleitos. Em suas palestras, ele listou três formas de Governo: "monárquico", no qual o poder é investido em uma pessoa "que pode fazer o que quiser"; "aristocrático", em que o poder é mantido por um grupo pequeno que alcança o status por causa da família ou da riqueza; E "democrático", em que a "gestão dos assuntos pertence ao corpo do povo em conjunto". E por último o modelo "republicano", termo usado para denotar um governo sem um hereditário, único magistrado.

Nesta toada, Smith não aprovou totalmente nenhum dos três, mas favoreceu uma forma do terceiro combinado com um monarca, sustentando que um rei era necessário para preservar a ordem, entre interesses econômicos contendores e facções políticas.

Concluindo, denotamos que Hume se azafama das vicissitudes da constituição inglesa ao longo dos séculos, e em nenhum comenos ele disponibiliza uma descrição do que captava como tal. Essa postura singular, entretanto, encontrava-se em conformidade com o seu ceticismo filosófico, Tais períodos, marcados por diferentes estruturas de divisão do poder na Inglaterra, obedeciam às modificações no estado da opinião, o qual, por sua vez, se apoiava na tradição histórica, ou seja, no longo precedente.

Afinal, no procedimento inclinado ao acordo constitucional da Inglaterra ao tempo de Hume, considerado por ele o paradigma público perfeito, diferem-se dois víveres de hostes fortuitas. O primeiro conteria, de um lado, as instituições governamentais e, de outro, o sistema legal do país. Hume não era prosélito de um governo teso, porém sim de um ajuste bem regulado e estável, no qual os poderes estivessem distribuídos de forma equilibrada entre os pólos políticos da nação. Ademais, seria medular a aparição de um apresto jurídico emancipado apto de certificar não apenas o direito básico de propriedade, porém também as liberdades civis, em particular o direito ao devido processo legal, desprendido de abusos e parcialidade. O segundo agrupamento de fatores a atuar em préstimo da liberdade na Inglaterra teria essência econômica e moral, incluindo, primeiramente, a soberania da população das talingas feudais, tanto no campo quanto nas vilas e burgos, assim como a expectação de livre comercialização dos bens, especialmente da terra. Foi presumível, portanto, aos comerciantes e outros profissionais da nação amealhar riqueza suficiente para se levantarem como força política ativa em sua aguilhoada ao poder real.


    Referências

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    * Advogado do ILBES, Professor universitário, Mestre em Direito e Economia pela UGF/RJ, MBA em Direito Tributário – FGV/Rio, L.LM em Direito Corporativo pelo IBMEC/RJ, Pós-graduado em Direito Judiciário pela FDCI, aluno especial no Doutorado em História Pólica da UFES, matéria de HPE. E-mail: [email protected]. O Autor agradece ao Prof. Dr. Rogério Arthmar e ao PPGHIS da UFES pela promoção da publicação do presente artigo.

    [1] HUME, David. Da avareza. Ensaios morais, políticos & literários. Tradução: Luciano Trigo. Rio de Janeiro: Topbooks, 2004, p. 789.

    [2] PEREIRA, Oswaldo Porchat. Rumo ao ceticismo. São Paulo: Editora UNESP, 2007, p. 152.

    [3] HUME, David. Ensaios morais, políticos & literários. Tradução: Luciano Trigo. Rio de Janeiro: Topbooks, 2004, p. 781

    [4] SMITH, Adam. A riqueza das nações – investigação sobre sua natureza e suas causas. v. II. São Paulo: Abril Cultural, 1996, p. 170.

    [5] HUME, David. Ensaios morais, políticos & literários. Tradução: Luciano Trigo. Rio de Janeiro: Topbooks, 2004, p. 48.

    [6] HUME, David. Never say live!. Londres: Collins, 1951, p. 7.

    [7] HUME, David. Investigação sobre o entendimento humano. Tradução: André Campos Mesquita. São Paulo: Escala Educacional, 2006, p. 32: Pode ser, portanto, um tema digno de curiosidade pesquisar de que natureza é a evidência que nos assegura qualquer existência real e questão de fato, além do depoimento atual dos sentidos, ou dos registros de nossa memória. Esta parte da filosofia, como se pode observar, foi pouco cultivada pelos antigos e pelos modernos e, portanto, todas as nossas dúvidas e erros, ao realizar uma investigação tão importante, podem ser ainda mais perdoáveis, em vista de que caminhamos por caminhos tão difíceis sem guia nem direção alguma. Inclusive podem resultar úteis, por excitar a curiosidade ou destruir aquela segurança e fé implícitas que são a ruína de todo raciocínio e investigação livre. Da descoberta de defeitos, se os houvesse, na filosofia comum, não resultaria, suponho, desânimo, senão uma melhor incitação, como é habitual, a tentar algo mais completo e satisfatório que o que até agora se apresentou ao público.

    [8] HUME, David. Uma investigação sobre os princípios da moral. Tradução: José Oscar de Almeida Marques. Campinas: UNICAMP, 2013, p. 64.

    [9] KUNTZ, Rolf. Hume: a teoria social como sistema. Kriterion: Revista de Filosofia, v. 52., n. 124, Belo Horizonte, Dec., 2011. Disponível em: < http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0100-512X2011000200014>. Acesso em: 4 jan. 2017. “Alguns ordenamentos políticos são mais favoráveis que outros ao desenvolvimento do comércio, das artes, das ciências e – como síntese de todas as condições mais favoráveis à manifestação das capacidades humianas – da liberdade. A comparação entre regimes frequentemente assume a forma do confronto entre monarquia e república. Mas o contraste essencial, no pensamento humano, não é de fato entre os sistemas monárquico e republicano, mas entre governos despóticos e governos livres, ou, mais precisamente, entre regimes com diferentes graus de autoridade ou de liberdade e com diferentes níveis de segurança para a propriedade. Em algumas passagens a ênfase da linguagem humiana dificulta a percepção de certas distinções mais finas. A discussão sobre formas de organização política e liberdade fica mais clara quando se examinam mais de perto alguns detalhes da análise política. Até aqui, houve referências principalmente às funções básicas do governo – proporcionar segurança externa e interna e garantir a aplicação de normas de justiça. Mas o conjunto é bem mais complexo e um de seus aspectos mais interessantes é uma teoria sobre a autoridade.”.

    [10] FERREIRA, Eduardo Oliveira. David Hume e a utilidade da justiça. Revista Visão Jurídica. São Paulo, Dez., 2016. Disponível em: <http://revistavisaojuridica.uol.com.br/advogados-leis-jurisprudencia/32/artigo123730-2.asp>. Acesso em: 29 dez. 2016. “De 1763 a 1765 Hume atua como secretário da Embaixada da Escócia em Paris. Em 1766 ele hospeda Jean-Jacques Rousseau, na Inglaterra, indispondo-se com ele em seguida. Em 1768, foi nomeado secretário de Estado em Londres. Nesse meio tempo, publicou Investigação sobre os Princípios Morais (1751), História da Inglaterra (1754-1759) e História Natural da Religião (1757). Somente após sua morte (1776) é que foram publicados, em 1779, seus Diálogos sobre a Religião Natural. Com teses contrárias à ordem vigente, Hume foi acusado de "ateísmo" e "heresia", o que lhe valeu uma negativa quando se candidatou à cadeira de Ética na Universidade de Edimburgo. E, ainda, em 1761 todas as suas obras foram colocadas no Index dos livros proibidos. Em 1776, ano de sua morte, Hume redige A vida de David Hume escrita por ele mesmo.”.

    [11] HUME, David. Tratado da natureza humana: uma tentativa de introduzir o método experimental de raciocínio nos assuntos morais. Tradução: Déborah Danowski, São Paulo: Editora UNESP, 2001, p. 25.

    [12] Idem. Ibidem. p. 31.

    [13] Plínio J. Smith a respeito do tema, identificando um suposto “mentalismo” em Hume, sugere que: “Por mentalismo entendo a doutrina que afirma que nós só temos acesso à mente e às suas representações ou, dito de outro modo, que a mente só tem acesso às suas percepções. Essa doutrina difere, por exemplo, daquela outra, sustentada por Reid, que afirma ter a mente acesso diretamente a objetos. SMITH, Plínio J. O ceticismo de Hume. São Paulo, 1991. Faculdade de Filosofia Letras e Ciências Humanas. 497p. Tese de Doutorado. Universidade de São Paulo, p. 59, nota 5.

    [14] HUME, David. Uma investigação sobre os princípios da moral. Tradução: José Oscar de Almeida Marques. 2ª ed. Campinas: Editora Unicamp, 2013, p. 20.

    [15] Idem. Ibidem. p. 22.

    [16] Ibidem. p. 27.

    [17] HUME, David. Ensaios morais, políticos & literários. Tradução: Luciano Trigo. Rio de Janeiro: Topbooks, 2004, p. 108.

    [18] MARQUES, José Oscar de Almeida. HUME, David. Uma investigação sobre os princípios da moral. Tradução: José Oscar de Almeida Marques. 2ª ed. Campinas: Editora Unicamp, 2013, p. 11 (Prefácio).

    [19] HUME, David. Ensaios morais, políticos & literários. Tradução: Luciano Trigo. Rio de Janeiro: Topbooks, 2004, p. 120.

    [20] BUCKLE, Stephen. Natural law and the theory of property – Grotius to Hume. Oxford: Clarendon Press, 1991, p. 296-297: “Todavia serão os argumentos e explicações humianos suficientes para sustentar a qualificacão da justiça como virtude artificial? Sem se render às alegações do próprio Hume, Stephen Buckle o inclui na tradição jusnaturalista e lhe dedica o último capítulo de seu livro Natural Law and the Theory of Property. Buckle aponta, com razão, várias semelhanças entre a construção humiana e a as teorias da lei natural do século 17. Um bom exemplo é a apresentação do sistema da justiça como "adventício e necessário", nascido das circunstâncias e consolidado, ao longo do tempo, como única fundação segura para a vida social. Além disso, chama atenção, com ênfase especial, para o reconhecimento, pelo próprio Hume, de sua dívida em relação a Grotius. Esse reconhecimento aparece no terceiro apêndice à Investigação sobre os Princípios da Moral. "Esta teoria relativa à origem da propriedade, e consequentemente da justiça, é, na maior parte, a mesma sugerida e adotada por Grotius" escreve Hume. Em seguida vem uma citação do livro II, capítulo 2, do Direito da Guerra e da Paz: "Vemos, portanto, que a causa pela qual se renunciou à primitiva comunidade dos bens – em primeiro lugar, à dos bens mobiliários, e, em seguida, à dos bens imobiliários – foi certamente o fato de que os homens, não mais se contentando para seu sustento com aquilo que a terra por si mesma produzia, nem com o fato de morarem em cavernas, de andarem nus ou cobertos apenas de cascas de árvores ou peles de animais, quiseram viver de maneira mais confortável; e para isso foi preciso que um dedicasse sua perícia a uma coisa, outro a outra [...]" etc.”.

    [21] HUME, David. Uma investigação sobre os princípios da moral. Tradução: José Oscar de Almeida Marques. 2ª ed. Campinas: Editora Unicamp, 2013, p. 37.

    [22] HUME, David. Ensaios políticos. Tradução: Pedro Pimenta. São Paulo: Martins Fontes, 2003, p. 21-23.

    [23] HUME, David. Ensaios morais, políticos & literários. Tradução: Luciano Trigo. Rio de Janeiro: Topbooks, 2004, p. 140.

    [24] HUME, David. Ensaios políticos. Tradução: Pedro Pimenta. São Paulo: Martins Fontes, 2003, p. 27.

    [25] HUME, David. Ensaios políticos. Tradução: Pedro Pimenta. São Paulo: Martins Fontes, 2003, p. 28.

    [26] HUME, David. Ensaios morais, políticos & literários. Tradução: Luciano Trigo. Rio de Janeiro: Topbooks, 2004, p. 137.

    [27] FERREIRA, Eduardo Oliveira. David Hume e a utilidade da justiça. Revista Visão Jurídica. São Paulo, Dez., 2016. Disponível em: <http://revistavisaojuridica.uol.com.br/advogados-leis-jurisprudencia/32/artigo123730-2.asp>. Acesso em: 29 dez. 2016. “ O pensamento de Hume se resume na idéia de que um governo só é legítimo se for útil. Assim, contraria a tese do direito divino dos reis, do contrato social e do uso do despotismo e da violência como recursos para a manutenção da ordem social. Segundo o filósofo, a legitimidade do governo por meio do princípio da utilidade é resolvida de maneira racional.”.

    [28] HUME, David. Uma investigação sobre os princípios da moral. Tradução: José Oscar de Almeida Marques. 2ª ed. Campinas: Editora Unicamp, 2013, p. 47.

    [29] Idem. Ibidem. p. 47.

    [30] GRAMPP, William D. Adam Smith and the economic man. The Journal of Political Economy, v. 56, 4ª ed. Agost., 1948, 315-336, p. 323.

    [31] ARTHMAR, Rogério. David Hume e as finanças de James I. Revista de Economia Politíca. v. 35 n.3 São Paulo, Scielo Brasil, July/Set., 2015. Disponível em: <http://dx.doi.org/10.1590/0101-31572015v35n03a15.> Acesso em: 20 dez. 2016.

    [32] HUME, David. Uma investigação sobre os princípios da moral. Tradução: José Oscar de Almeida Marques. 2ª ed. Campinas: Editora Unicamp, 2013, p. 48.

    [33] ARTHMAR, Rogério. Hume e a origem da liberdade na Inglaterra. Niterói: ANPEC, 2013, p. 3. Disponível em: < http://www.anpec.org.br/sul/2013/submissao/files_I/i1-43ad651c4964d1b12caa40e1ee0909a2.pdf.> Acesso em: 20 dez. 2016.

    [34] HUME, David. Ensaios morais, políticos & literários. Tradução: Luciano Trigo. Rio de Janeiro: Topbooks, 2004, p. 139.

    [35] GRAMPP, William D. Economic liberalism: the classic view. New York: Random House, vs. I-II, 1965, p. 47. Pequena tradução do texto acima citado: A propriedade, tão concomitante, compreendia todos os direitos naturais. O dever do governo é protegê-los e promovê-los. Hume não disse sobre os direitos naturais e não enfatizou, como Locke e Hobbes fizeram, a responsabilidade dos governos era tão somente protegê-los. Mas certamente não era indiferente à liberdade e à segurança, que eram os principais direitos. O termo "direitos naturais" aparece raramente na economia clássica, exceto em A Riqueza das Nações, onde, no entanto, geralmente aplica-se à chamada “liberdade econômica”.

    [36] PANTONI, Roberta Alessandra. Livre iniciativa e livre concorrência na obra “A riqueza das nações” de Adam Smith. Rio Grande: Âmbito Jurídico, 2008. Disponível em: <http://www.ambito-juridico.com.br/site/index.php?n_link=revista_artigos_leitura&artigo_id=8807>. Acesso em: 22 dez. 2016.

    [37] HUNT, E. K. História do Pensamento Econômico: uma perspectiva crítica. Rio de Janeiro: Campus, 1982, p. 53.

    [38] GANEM, Ângela. Adam Smith e a explicação do mercado como ordem social: uma abordagem histórico-filosófica. Revista de Economia Contemporânea. Rio de Janeiro, 4 (2): 9-36, jul./Dez. 2000. Disponível em: < http://www.ie.ufrj.br/revista/pdfs/adam_smith_e_a_explicacao_do_mercado _como_ordem_social.pdf.> Acesso em: 3 jan. 2017.

    [39] SMITH, Adam. A riqueza das nações – investigação sobre sua natureza e suas causas. v. II. São Paulo: Abril Cultural, 1996, p. 169.

    [40] ARTHMAR, Rogério. Gênese e consolidação da liberdade na Inglaterra: a interpretação de Hume. Política & Sociedade. Florianópolis. v. 13. n. 26. Jan./Abr, 2014, p. 64. Disponível em: <http://dx.doi.org/10.5007/2175-7984.2014v13n26p61>. Acesso em: 15 dez. 2016.

    [41] JONES, Peter. On reading hume's history of liberty. Edição: N. Capaldi e D.W. Livingston. Liberty in Hume's History of England. Norwell: Kluwer Academic Publishers, 1990, p. 4 e 21.

    [42] LYON, Robert. Notes on Hume's philosophy of political economy. Journal of the History of Ideas, v. 31, n. 3, p. 457-461, University of Pennsylvania Press, Agost./Set., 1970, p. 459.

    [43] MACFARLANE, Alan. David Hume and the political economy of agrarian civilization. History of European Ideas. v. 27, p. 79-91, King's College, Cambridge, Reino Unido, 2001, p. 86.

    [44] ROBBINS, Lionel. The theory of economic policy in english classical political economy. Londres: MACMILLAN & CO LTD, 1965, p. 11-12 e 19.

    [45] HUME, David. A Teoria dos Sentimentos Morais, de Adam Smith. Tradução: Pedro Paulo Pimenta. Londres: Andrew Millar, 1759, p. 91. Disponível em: < http://rapsodia.fflch.usp.br/sites/rapsodia.fflch.usp.br /files/upload/paginas/rapsodia1_07.pdf>. Acesso em: 21 dez. 2016.

    [46] GRÜNE-YANOFF, Till; MCCLENNEN, Edward F. Hume's framework for a natural history of the passions. David Hume's Political Economy. Edição Carl Wennerlind e Margaret Schabas. Nova York: Routledge, 2008, p. 86-104, p. 87.

    [47] HUME, David. Uma investigação sobre os princípios da moral. Tradução: José Oscar de Almeida Marques. 2ª ed. Campinas: Editora Unicamp, 2013, p. 54-55.

    [48] HIRSCHMAN, Albert O. The passions and the interests: political arguments for capitalism before its triumph. Princeton: Princeton University Press, 1977, p. 66.

    [49] HUME, David, Investigação sobre o entendimento humano. Tradução: André Campos Mesquita. São Paulo: Escala Educacional, 2006, p. 31.

    [50] HUME, David. Ensaios morais, políticos & literários. Tradução: Luciano Trigo. Rio de Janeiro: Topbooks, 2004, p. 246.

    [51] HUME, David. A arte de escrever ensaio e outros ensaios (morais , políticos e literários). Tradução: Márcio Suzuki e Pedro Paulo Pimenta. São Paulo: Iluminuras, 2008, p. 196-197.

    [52] HUME, David. Ensaios políticos. Tradução: Pedro Pimenta. São Paulo: Martins Fontes, 2003, p. 186.

    [53] Idem. Ibidem. p. 197.

    [54] HUME, David. História da Inglaterra: da invasão de Júlio César à Revolução de 1688. Seleção, tradução e apresentação: Pedro Paula Pimenta. São Paulo: Editora UNESP, 2015, p. 420: “É justo afirmar, sem receio de exagero, que desde então desfrutamos nesta ilha, senão do melhor sistema de governo, ao menos do mais completo sistema de liberdade que jamais existiu entre os homens.”.

    [55] HUME, David. História da Inglaterra: da invasão de Júlio César à Revolução de 1688. Seleção, tradução e apresentação: Pedro Paula Pimenta. São Paulo: Editora UNESP, 2015, p. 415.

    [56] HUME, David. Escritos sobre economia. Tradução: Sara Albieri. 3 ed. São Paulo: Nova Cultural, 1988, p. 48.

    [57] HUME, David. Vida e Obra. Os pensadores. São Paulo: Nova Cultural, 1999, p. 345.

    [58] HUME, David. Tratado da natureza humana: uma tentativa de introduzir o método experimental de raciocínio nos assuntos morais. Tradução: Déborah Danowski, São Paulo: Editora UNESP, 2001, p. 497.

    [59] STIVAL. Monica Loyola. Subjetividade, espaço e tempo em David Hume. São Paulo: Humanitas, 2015, p. 146.

    [60] HUME, David. Tratado da natureza humana: uma tentativa de introduzir o método experimental de raciocínio nos assuntos morais. Tradução: Déborah Danowski, São Paulo: Editora UNESP, 2001, p. 207.

    [61] HUME, David. Ensaios morais, políticos & literários. Tradução: Luciano Trigo. Rio de Janeiro: Topbooks, 2004, p. 517-518.

    [62] “Os autores políticos estabeleceram como máxima que, na instituição de qualquer sistema de governo e na fixação dos diversos freios e controles constitucionais, todo homem deve ser considerado um velhaco, que tem como fim único de todas as suas ações o interesse pessoal. É por intermédio deste interesse que devemos governar os homens, e através dele obrigá-los, apesar de sua insaciável avareza e ambição, a contribuir para o bem comum. Sem isso, dizem eles, será inútil gabarmos as vantagens de qualquer Constituição; e acabaremos finalmente por descobrir que a segurança de nossas liberdades e posses depende apenas da boa vontade dos governantes; ou seja, que não temos segurança alguma.” (HUME, David. Da independência do parlamento. Ensaios morais, políticos & literários. Tradução: Luciano Trigo. Rio de Janeiro: Topbooks, 2004, p. 141.

    [63] HUME, David. História da Inglaterra: da invasão de Júlio César à Revolução de 1688. Tradução: Pedro Paulo Pimenta. São Paulo: Editora Unesp, 2015, p. 420.

    [64] HUME, David. Ensaios morais, políticos & literários. Tradução: Luciano Trigo. Rio de Janeiro: Topbooks, 2004, p. 692.


    Rogério Wanderley Guasti

    Advogado - Vitória, ES


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