O presente artigo tem o intuito de falar dos institutos que dão nome ao artigo apenas referentes aos servidores militares do Estado da Bahia, não importando, assim, dizer que os servidores desta categoria nos demais Estados não tenham este direito.
Apesar dos dois institutos serem direitos líquidos e certos dos Policiais Militares do Estado da Bahia, a Administração Pública não realiza o seu pagamento a nenhum dos agentes. E nunca o fez. Durante a elaboração da peça para um cliente percebi o enorme número de policiais no Estado que enfrentam a mesma situação. Diante deste completo absurdo, elaborei este breve artigo para que os servidores militares do Estado tenham ciência dos direitos que lhe são tolhidos.
O ordenamento jurídico pátrio classifica os agentes públicos em várias espécies de acordo com a natureza da sua função. São elas: agentes políticos, agentes particulares em colaboração, servidores públicos e empregados públicos (esses regidos pela legislação trabalhista). Porém, outra importante subdivisão deve ser feita quanto aos servidores públicos, que são agrupados em servidores públicos civis e servidores militares.
Essa divisão é de grande importância, pois, apesar de ambos estarem submetidos ao regime estatutário, pela natureza do serviço que prestam, seus estatutos funcionais são distintos, não se podendo, assim, fazer comparações entre um e outro estatutos, pois se tratam de dois tipos de servidores totalmente diferentes e merecedores de normas funcionais próprias.
Superada essa primeira observação, iremos adentrar um pouco no regime estatutário. Uma característica marcante do regime estatutário que se faz importante destacar é a sua pluralidade normativa. No sistema Jurídico brasileiro, cada entidade da federação, desde que adote o regime estatutário para os seus agentes, precisa ter a sua Lei Estatutária para que possa estabelecer, dentre outras coisas, os direitos e deveres daquela categoria. Ou seja, existem, no Brasil, estatutos federais, estaduais, municipais e distritais, e o mais importante: cada um deles é autônomo em relação ao outro. Assim, o Estatuto da Policia Militar da Bahia, Lei 7.990 de 2001, independe do Estatuto dos Militares do âmbito federal ou de qualquer outro estatuto estadual. Isso se deve à autonomia das pessoas federativas de se organizar e organizar seus serviços e seus servidores.
Ou seja, os servidores públicos civis do Estado da Bahia estão sujeitos ao estatuto da Lei 6.677/94, enquanto os servidores militares estão sujeitos à Lei 7990/2001, estatutos estes, totalmente diferentes em relação ao outro.
AUXILIO TRANSPORTE
O Estatuto dos Policiais Militares do Estado da Bahia, no Capítulo referente aos direitos da classe, estabelece, entre outros direitos ali presentes o direito do militar de receber a indenização por auxilio transporte. Vejamos o que estabelece o art. 92, V, alínea "'h":
Art. 92 - São direitos dos Policiais Militares:
(...)
V - ...
(...)
h) auxílio transporte, devido ao policial militar nos deslocamentos da residência para o trabalho e vice-versa, na forma e condições estabelecidas em regulamento;
O direito ao auxílio transporte volta a ser citado, na própria Lei 7.990/01 em seu art. 102, §2º, alínea “c”:
Art. 102 - A remuneração dos policiais militares é devida em bases estabelecidas em legislação peculiar, compreendendo:
§ 2º - São indenizações devidas ao policial militar no serviço ativo:
c) transporte;
Apesar de haver a previsão expressa do direito do servidor militar ao auxilio-transporte, no próprio estatuto da classe, esse direito lhe é tolhido. Para tal, a Administração Pública se baseia na parte final do art. 92, V, alínea h, que estabelece condição de suspensiva de exequibilidade, qual seja, a posterior regulamentação por decreto (de competência do chefe do Poder Executivo – no caso em tela o Governador do Estado da Bahia).
Cumpre, aqui, destacarmos que o Estatuto do Policial Militar do Estado da Bahia já tem mais de 15 anos, não podendo, assim, aquele que se omite por grande lapso de tempo alegar a ausência de regulamentação do direito pleiteado, caso contrário estaria sendo concedido, a este, o poder de legislação negativa. Deve, então, ser utilizado de maneira analógica o que está estabelecido no Decreto Estadual nº 6.192/97 (que trata do auxilio transporte para o servidor público civil do Estado da Bahia), assegurando assim o direito líquido e certo da classe.
ADICIONAL DE PERICULOSIDADE
Caso ainda mais absurdo do que a negativa no pagamento do auxilio transporte é a negativa no pagamento do adicional de periculosidade. Veja bem, o policial militar, que enfrenta os bandidos, muitas vezes com armamentos inferiores ao daqueles, que não sabe se voltará ileso para sua residência, ou até mesmo vivo, não recebe o adicional de periculosidade. Além de ser um absurdo fático é, também, um absurdo jurídico. Vejamos:
O Estatuto da Policia Militar do Estado da Bahia, no Capítulo referente aos direitos da classe, em seu artigo 92, V, p, estabelece ainda:
Art. 92 - São direitos dos Policiais Militares:
V - ...
p) adicional de remuneração para as atividades penosas, insalubres ou perigosas, na mesma forma e condições dos funcionários públicos civis;
O próprio estatuto, na SEÇÃO V – DA REMUNERAÇÃO, deixando claro como a luz solar e extreme de dúvida, que é direito do policial militar do Estado da Bahia receber o adicional, repete o que já está estabelecido no artigo supracitado. Vejamos o que prescreve o artigo 102, §1º, alínea “d”:
Art. 102 - A remuneração dos policiais militares é devida em bases estabelecidas em legislação peculiar, compreendendo:
§ 1º - São gratificações a que faz jus o policial militar no serviço ativo:
d) adicional por exercício de atividades insalubres, perigosas ou penosas;
Quando o art. 92, V, alínea, “p” do estatuto dos militares faz referência aos funcionários públicos civis a interpretação que deve ser dada é de que o adicional a que se refere, deve ser concedido nas mesmas formas dos funcionários públicos civis do Estado membro, no caso em análise, da Bahia, em razão, também, da pluralidade de estatutos, como foi dito anteriormente.
O Estatuto do Servidor Público civil da Bahia é a Lei 6.677 de 1994, que estabelece quando será devido ao servidor o adicional de periculosidade em seu artigo 86. Vejamos:
Art. 86 - Os servidores que trabalham com habitualidade em locais insalubres ou em contato permanente com substâncias tóxicas ou com risco de vida, fazem jus a um adicional sobre o vencimento do cargo permanente.
Percebe-se que no referido Estatuto o legislador não fez referência do quantun deste adicional. Esta tarefa foi realizada pelo Decreto Nº 9.967 de 2006, que disciplinava a concessão dos adicionais de insalubridade e periculosidade para os servidores públicos dos órgãos da administração direta, autarquias e fundações do Poder Executivo Estadual, de que tratam os arts. 86 a 88 da Lei 6.677, de 26 de setembro de 1994, como dispõe sua ementa. O referido Decreto foi revogado pelo art. 10 do Decreto Nº 16.529 de 06 de janeiro de 2016 que manteve a redação da ementa do Decreto anterior. O novo decreto, vigente até o momento, estabelece em seu artigo 3º que:
Art. 3º - O trabalho em condições de periculosidade assegura ao servidor um adicional de 30% (trinta por cento).
Ocorre que o referido ato regulamentador elenca, dentre os requisitos necessários à concessão da vantagem, a existência de laudo técnico atestando o trabalho em condições perigosas:
“Art. 7º - Caberá à Junta Médica Oficial do Estado, com base na legislação vigente, emitir Laudo Médico Pericial de concessão dos adicionais de insalubridade e periculosidade, atestando o exercício em condições insalubres ou periculosas de trabalho e estabelecendo o percentual a ser concedido ao servidor, com base nos art. 2º e 3º deste Decreto.
§ 1º - O processo de apuração da insalubridade ou periculosidade deve ser instruído, com informações detalhadas das atividades desenvolvidas pelo servidor, em razão do cargo ou função para o qual foi nomeado, bem assim com informações do respectivo ambiente de trabalho, devendo ser firmadas pelo dirigente máximo do órgão ou da entidade de lotação do servidor, podendo tal atribuição ser delegada em ato específico.
§ 2º - A apuração das condições de insalubridade e periculosidade nas unidades poderá ocorrer mediante a emissão de Laudo Técnico de Identificação dos Riscos Ambientais, desde que homologado pela Junta Médica, compreendendo a identificação dos riscos, avaliação e proposição de medidas de controle dos mesmos, originados dos seus diversos setores.
Ora, pela própria natureza do serviço que prestam, é impossível, em alguns casos, haver a comprovação por junta médica, que não irá seguir os policiais nas ruas, se expondo, assim, a riscos que não cabem à sua profissão.
O ato que regulamenta o direito ao adicional (Decreto Nº 16.529 de 06 de janeiro de 2016), em verdade não regulamenta o Estatuto dos Policiais Militares do Estado da Bahia, Lei 7.990/2001, mas sim o Estatuto dos Servidores Civis do Estado da Bahia, Lei 6.677/94. Podemos perceber isso da simples leitura da ementa do referido decreto. Vejamos:
Disciplina a concessão dos adicionais de insalubridade e periculosidade para os servidores públicos dos órgãos da Administração direta, das autarquias e fundações do Poder Executivo Estadual, de que tratam os arts. 86 a 88 da Lei nº 6.677, de 26 de setembro de 1994.
A utilização deste ato para regulamentar os direitos do servidor público militar do Estado da Bahia se mostra totalmente errônea, já que, a própria ementa do regulamento não faz nenhuma referência ao estatuto dos militares. As exigências contidas no seu artigo 7º, são únicas e exclusivas da classe dos servidores civis. Ora, não é preciso de nenhum especialista para que se afirme que a profissão do policial militar é praticada sobre grande perigo.
Ademais, a negativa em se pagar o adicional de periculosidade fere também o que está contido no artigo 7º, inciso XXIII, da CF:
Art. 7º São direitos dos trabalhadores urbanos e rurais, além de outros que visem à melhoria de sua condição social:
(...)
XXIII - adicional de remuneração para as atividades penosas, insalubres ou perigosas, na forma da lei; (grifei)
Podemos perceber, ao longo do presente artigo a gravidade da negativa do pagamento dos referidos valores aos policiais militares do Estado da Bahia. Um dos meios para assegurar o direito do policial militar é o Mandado de Segurança, que tem um retorno mais rápido, por ser um remédio constitucional de urgência.
Você, Policial Militar do Estado da Bahia, fique atento a seu contracheque e perceba a inexistência da pagamento do adicional de periculosidade, que corresponde a 30% do seu soldo, e, também, ao não pagamento do auxilio transporte.