EFETIVIDADE E EFICÁCIA DAS NORMAS QUE DISCIPLINAM O CONTRATO DE RISCO NO BRASIL E SUA INFLUÊNCIA NO MERCADO CONSUMIDOR*


27/06/2017 às 17h17
Por Roberta Ortiga

                                                                                                        *Autora: Roberta Oliveira Santos, Advogada, bacharel em Direito pela Universidade Estadual de Montes Claros, Pós-graduanda em Advocacia Empresarial pela PUC - MInas.

 

 

 

INTRODUÇÃO

O objetivo geral deste trabalho é analisar o instituto do contrato de seguro e sua aplicabilidade cotidiana, estudando as diversas modalidades existentes e as relações de consumo que envolvem a matéria para compreender os fatores que geram a necessidade de celebração, bem como a importância, os benefícios e a influência do seguro na vida e no futuro da sociedade brasileira.

O contrato de seguro é aquele pelo qual uma das partes, denominada segurador, se obriga, mediante o recebimento de um prêmio, a garantir interesse legítimo da outra, intitulada segurado, relativo a pessoa ou coisa, contra riscos predeterminados. O objeto principal do contrato de seguro é o risco. Participam da relação Jurídica o segurado e o segurador. O Contrato de Seguro é subordinado a boa-fé dos contratantes, seja subjetiva ou objetiva. Por sua natureza, é um contrato é vulnerável a fraudes e por isso exige ética e veracidade em suas relações, seja por parte do segurado ou do segurador.

O Código de Defesa do Consumidor considera a atividade seguradora como um serviço e sendo assim se esforça na proteção dos segurados, que se tornam consumidores. Tem-se que relação de consumo é a relação existente entre o consumidor e o fornecedor na compra e venda de um produto ou na prestação de um serviço. Ao contratar um seguro, as partes estão diante de um negócio jurídico. Na maioria das vezes, se caracteriza por um contrato de adesão no qual não há grandes possibilidades de estipulação, pois o segurado escolhe uma seguradora que dita quais condições são necessárias para que se firme o Seguro.

O consumidor brasileiro está cada vez mais informado a respeito dos seus direitos e deveres. O CDC faz-se presente nas relações cotidianas de consumo e prestação de serviço, sendo a informação acessível à grande maioria dos consumidores que, por sua vez são cada vez mais exigentes e conscientes ao consumir.

Porém, essa mudança ainda não abrange todos os consumidores, pois existem relações mais complicadas e incertas. Nesse contexto, pode-se inserir a comercialização dos seguros, que é uma prestação de serviços configurada na relação de consumo entre o fornecedor, que é a empresa seguradora, e o consumidor, destinatário final do serviço.

O presente estudo visa analisar como a efetividade e eficácia das normas que disciplinam o contrato de seguro influenciam na cultura de seguros e no mercado.

O desconhecimento da matéria, a falta de informação sobre os direitos do consumidor relativos ao assunto, bem como seus princípios e particularidades, dá ensejo para má-fé e falta de transparência nas relações entre segurados e seguradoras. Conseqüentemente, é gerado um grande desestímulo no mercado consumidor brasileiro adquirir um produto securitário, pois ocorrem inúmeros problemas na hora da contratação e prestação do serviço o que leva grande demanda de ações relacionadas à questão e desaquecimento do mercado segurador e um grande aumento de problemas que são levados até o judiciário.

A importância deste trabalho está no fato de que o desconhecimento dá lugar a inobservância dos princípios da boa-fé e da função social, pois muitas vezes as seguradoras colocam entraves para tornarem acessíveis os benefícios dos seguros aos consumidores e tornar clara a relação. Seguros embutidos em vendas, endividamento, prejuízos ao resgatar o valor do prêmio são alguns exemplos de situações causadas pela desinformação daqueles que firmam os contratos.

A escolha da discussão a respeito desse tema surgiu devido à necessidade de acesso a informação e esclarecimento sobre a matéria de seguros no Brasil para que o consumidor possa exercer plenamente os benefícios do contrato de seguro.

O primeiro capítulo tem por objetivo examinar o Instituto dos contratos: a evolução e os principais aspectos doutrinários da Teoria Geral dos Contratos com ênfase nos princípios da boa-fé e da função social dos contratos.

Em seguida, o segundo capítulo estuda o contrato de risco e sua inserção no ordenamento jurídico brasileiro, bem como as principais características dos contratos de seguro, suas particularidades e aplicação cotidiana, com enfoque nos direitos e obrigações das partes: anseios, dificuldades e expectativas em relação ao contrato.

E, por fim, o terceiro capítulo propõe-se a analisar a relação de consumo que envolve o seguro, o desenvolvimento do mercado brasileiro e o perfil dos contratantes, é possível discutir sobre as bases da cultura securitária no Brasil e apresentar propostas para o seu desenvolvimento e ampliação, apontando os principais responsáveis pela popularização do instituto no país e os fatores que contribuem para o despertar dessa relação.


 

I – CONTRATOS

1.1 Aspectos históricos e conceituais

 

Desde o seu surgimento, os contratos têm sido utilizados para gerir acordos de vontades entre as partes e a estipulação de termos para que as obrigações pactuadas fossem regidas. Transformou-se em um meio rápido e eficaz de circulação de riquezas e generalizou-se.

Qualquer indivíduo contrata. Essa faculdade independe de classe, padrão econômico ou grau de instrução. A globalização está fundada em relações contratuais, pois sem elas os relacionamentos viriam a regredir e a modernidade não poderia desenvolver suas atividades diárias.

Na antiguidade, quando vigorava a Lei das XII Tábuas. O contrato, ainda incipiente, podia ser descrito como severo e sacramental. Não era a figura que se conhece na atualidade, sendo apenas um acordo de duas ou mais vontades sobre um determinado objeto.

Não existia uma teoria geral sobre a matéria, mas apenas sobre determinados tipos de “contratos em espécie” com suas particularidades e formalidades. Nessa época, o acordo firmado não gerava necessariamente uma obrigação juridicamente exigível:

Entendia o romano não ser possível contrato sem a existência de elemento material, uma exteriorização de forma, fundamental na gênese da própria obligatio. Primitivamente, eram as categorias de contratos verbis, re ou litteris, conforme o elemento formal se ostentasse por palavras sacramentais, ou pela efetiva entrega do objeto, ou pela inscrição no codex. Somente mais tarde, com a atribuição de ação a quatro pactos de utilização freqüente (venda, locação, mandato e sociedade), surgiu a categoria dos contratos que se celebravam solo consensu, isto é, pelo acordo das vontades. Já ao seu tempo, Gaius podia noticiar: "Harum autem quattuor genera sunt: aut enim re contrahitur obligatio, aut verbis, aut litteris, aut consensu. Somente aqueles quatro contratos consensuais eram reconhecidos como tais. Nos demais, prevalecia sobre a vontade a materialidade de sua declaração, que haveria de obedecer rigidamente ao ritual consagrado: a inscrição material no livro do credor (contratos litteris), a traditio efetiva da coisa (contratos re), a troca de expressões estritamente obrigatórias (contratos verbis) de que a policitatio era o mais freqüente exemplo.Uma vez celebrado, com observância estrita ao ritual, o contrato gerava obrigações, vinculava as partes e provia o credor da actio, fator da mais lídima essencialidade, sem o qual não haveria direito, já que este era nada, se não fosse munido da faculdade de reclamação em juízo. (PEREIRA, 2003. p. 15)

No Direito Romano clássico havia três figuras para designar institutos semelhantes: convenção, contrato e pacto. A convenção era o gênero e as espécies eram o contrato e o pacto. Dessa maneira os contratos eram espécies de convenções regulamentadas, e por isso protegidas pela via da actio.

Havia, no entanto, outra modalidade de convenção, com objetivo semelhante, que era celebrar um o pacto. O pacto era um acordo não previsto em lei. Não exigia forma especial, nem era protegido pela actio.

O pactum não admitia o direito de pleitear uma ação no caso do descumprimento, ou seja, não possuía força cogente. O único fator que distinguia o pactum era a denominação individualizada dos contratos, a forma dos contratos consensuais de compra e venda locação, mandato e sociedade.

Modernamente, pacto e contrato estão definidos como institutos sinônimos. Todavia, o pacto passou a ser designação de alguns contratos acessórios, que por sua natureza, não deixam de ser, é óbvio, contratos.

Neste período o instituto desenvolveu a noção da força obrigatória dos contratos:

Essa noção, que vem do Direito Clássico, atinge a época de Justiniano. Para que se criasse uma obrigação, havia necessidade de certas formas que se exteriorizassem à vista dos interessados. A solenidade dava força às convenções. Cada uma dessas convenções, sob certas formalidades, constituía um contractus. Não reconhecia, portanto, o Direito Romano uma categoria geral de contrato, mas somente alguns contratos em particular.

O elemento subjetivo da vontade só vai conseguir sobrepujar o formalismo representado pela exteriorização de fórmulas na época de Justiniano, quando de certo modo se unifica o conceito de contrato com o de convenção. Não chegou, porém, a ser uma identificação completa. (VENOSA, 2004. p. 379)

Alguns desses contratos solenes e formais, que dependiam de um tipo de ritual para serem celebrados e dispensavam a vontade das partes, mais tarde foram se elaborando e se tornaram conhecidos como os contratos reais e consensuais de depósito, penhor, comodato, mútuo, venda, arrendamento, mandato e sociedade.

A parte prejudicada não bastava provar a existência do contrato; devia provar que cumpria uma prestação. Como vemos, a vontade era colocada em segundo plano. A proteção dependia mais do interesse do que da vontade.

A intervenção do pretor mostrou-se importante no preenchimento das lacunas do ordenamento.

De qualquer modo, qualquer convenção poderia tornar-se obrigatória, se revestida das formalidades legais da stipulatio. Isso criou a tendência de aumentar as convenções vinculativamente obrigatórias. Na fase final da codificação, já o que importa para a validade do contrato é a conventio, o acordo de vontades, ficando acima das formalidades. (VENOSA, 2004. p. 379)

Já na Idade Média, a forma escrita e a força obrigatória dos contratos e assim, o formalismo romano foi sendo aos poucos substituído até ter o seu ápice no período mercantil.

O Código de Napoleão regulou o instituto dos contratos pela primeira vez na era moderna, porém utilizou-se de muitos valores do direito romano, como por exemplo, a noção da diferença dos conceitos de contrato e convenção.

O Código Napoleão foi a primeira grande codificação moderna. A exemplo do direito romano, considerava a convenção o gênero, do qual o contrato era uma espécie (art. 1.101). Idealizado sob o calor da Revolução de 1789, o referido diploma disciplinou o contrato como mero instrumento para a aquisição de vontades representava, em realidade, uma garantia para os burgueses e para as classes proprietárias. A transferência de bens passava a ser dependente exclusivamente da vontade. (GONÇALVES, 2012. p. 23)

O contrato então passou a ser um meio de circulação de riquezas e uma forma para aquisição da propriedade. Era reflexo dos ideais revolucionários de que a liberdade e o direito de propriedade estavam intimamente ligados e a autonomia da vontade era expressão máxima da economia burguesa.

Tempos depois, ao ser promulgado, o Código Civil alemão trouxe a idéia de contrato como negócio jurídico, que por si só não transfere a propriedade, fundamento que também vigora no atual ordenamento brasileiro.

A partir de então, o Estado passou a criar normas para que os contratos fossem criados:

O espírito clássico do contrato dá lugar aos contratos de massa, que exigem ora a intervenção do poder do Estado em suas normas, ora a imposição de um contrato previamente regido, imposto a um número indeterminado e crescente de sujeitos. [...] o ideal de abstenção do Estado na relação negocial privada fica cada vez mais distante. Não podemos, porém, deixar que o intervencionismo do poder estatal ou econômico, elimine um mínimo de vontades no contrato, sob pena de extinguir-se uma das mais legítimas liberdades individuais. (VENOSA, 2004.p. 378)

Hoje, o instituto dos Contratos é a fonte de obrigação mais utilizada no ordenamento jurídico e a figura mais difundida de Negócio Jurídico, uma vez que constitui uma das bases do mundo econômico para regular os acordos revestidos de autonomia da vontade.

Portanto, quando o homem usa de sua manifestação de vontade com a intenção precípua de gerar efeitos jurídicos, a expressão dessa vontade constitui-se num negócio jurídico” (VENOSA, 2004. p. 375).

Segundo o Código Civil Brasileiro (CC), é um dos fatos que gera obrigação, porém para alguns doutrinadores o próprio contrato em si é uma obrigação, ou seja, um vínculo entre as pessoas do qual são exigíveis prestações que devem ser revestidas de responsabilidade para que haja respeito ao próprio ordenamento jurídico.

É consenso que deve haver um negócio jurídico, um acordo de vontades e limites para o respeito e efetividade do que está sendo contratado.

Contrato é o acordo de duas ou mais vontades, na conformidade da ordem jurídica, destinado a estabelecer uma regulamentação de interesses entre partes, com o escopo de adquirir, modificar ou extinguir relações jurídicas de natureza patrimonial. (DINIZ, 2012. p. 32)

O contrato deve ter forma de ato lícito e possuir objetivo adquirir, resguardar, transferir, modificar ou extinguir direitos. Assim, para sua celebração se aplicam as regras de capacidade, forma, objeto e vícios aplicáveis aos negócios jurídicos.

Para sua formação, é preciso pelo menos duas partes envolvidas em consenso mútuo para contratar. Deve haver acordo de vontades, sob pena de se tornar nulo. A autonomia da vontade e o interesse dos particulares são pressupostos para a celebração de um contrato.

Portanto, o contrato como negócio jurídico que é, é um fato gerador de direito, ou melhor, de norma jurídica individual, pois as partes contratantes acordam que se devem conduzir de determinada maneira, uma em face da outra. A norma jurídica negocialmente criada, que não estatui sansão, mas uma conduta cuja conduta oposta é pressuposto da sanção imposta pela norma jurídica geral, não é norma jurídica autônoma. Ela somente será jurídica em combinação com normas gerais estatuidoras de sansões. (DINIZ, 2012. p. 32)

O contrato nasce entre as partes, sendo regulado e criado por livre vontade. Por haver mínima intervenção do Estado no seu objeto e na sua forma, para ser lícito, válido e legítimo um contrato precisa necessariamente estar de acordo os pressupostos da lei e respeitar os princípios da ética jurídica, sendo revestido de lealdade e confiança.

É um negócio jurídico bilateral, e de conseguinte exige o consentimento; pressupõe, de outro lado, a conformidade com a ordem legal, sem o que não teria o condão de criar direitos para o agente; e, sendo ato negocial, tem por escopo aqueles objetivos específicos. Com a pacificidade da doutrina, dizemos então que o contrato é um acordo de vontades, na conformidade da lei, e com a finalidade de adquirir, resguardar, transferir, conservar, modificar ou extinguir direitos. Dizendo-o mais sucintamente, e reportando-nos à noção que demos de negócio jurídico, podemos definir contrato como o "acordo de vontades com a finalidade de produzir efeitos jurídicos". (PEREIRA, 2003. p. 14)

É preciso haver no ordenamento jurídico mecanismos que garantam a segurança e obrigue as partes a respeitarem o acordo pactuado, daí surgem cláusulas de indenizar, dentre outras sansões, assegurando a força obrigatória dos contratos.

Após ser celebrado, o contrato não pode ser modificado unilateralmente já que as partes firmam um acordo de livre e espontânea vontade, ou seja, o que foi estabelecido deve ser cumprido, uma vez que ninguém está obrigado a contratar algo. O contrato é um acordo de vontades para o fim de adquirir, resguardar, modificar ou extinguir direitos. Podendo compreender o seu conceito da seguintes maneira:

O contrato é um negócio jurídico por meio do qual as partes declarantes, limitadas pelos princípios da função social e da boa-fé objetiva, autodisciplinam os efeitos patrimoniais que pretendem atingir, segundo a autonomia das suas vontades. (GAGLIANO, 2012. p. 49)

Na condição de negócio jurídico, para que o contrato surta seus jurídicos efeitos, necessita de requisitos subjetivos, objetivos e formais.

Os requisitos subjetivos englobam a existência de duas ou mais pessoas que devem ter capacidade genérica para praticar atos da vida civil e especificamente a capacidade para contratar, sendo manifesto o consentimento entre as partes para que haja aplicação do princípio da autonomia da vontade.

Já para os requisitos objetivos, deve ser observada a licitude do objeto contratado, sua possibilidade física e jurídica, bem como sua economicidade. E para os formais, na codificação pátria a liberdade das formas é predominante, sendo necessária apenas como exceção exigida em lei, sobe pena de se tornar nulo o negócio.

Fácil é denotar que a noção de contrato contém dois elementos: a) o estrutural, isto é, a alteridade, pois o contrato, como negócio jurídico bilateral (ou plurilateral), requer a fusão de duas ou mais vontades contrapostas. Realmente, o contrato é um negócio jurídico bilateral ou plurilateral, e não a soma de dois ou mais negócios unilaterais. O efeito de direito almejado subordina-se, no espírito de cada uma das partes, ao consenso da outra, de tal maneira que nenhum dos contraentes pode alterar unilateralmente o que foi avençado. (DINIZ, 2012. p. 32-33)

A capacidade dos contratantes é indispensável para que o contrato seja válido, por isso é necessário que ela seja configurada no momento da celebração do ato. A capacidade superveniente à contratação não valida o ato, nem a incapacidade posterior o vicia.

Porém, certos contratos exigem legitimidade, ou seja, que o contratante tenha competência para praticá-lo, ou do contrário tal celebração se torna nula ou anulável. Como exemplo cita-se o marido que vende uma residência sem o consentimento de sua mulher, na constância do regime de comunhão de bens.

Também o objeto do contrato deve ser lícito, possível (materialmente e juridicamente), determinado ou determinável.

Ou seja, não pode atentar contra a moral e os bons costumes, uma vez que ninguém pode se valer de sua própria torpeza (nemo auditur proprium turpitudinem allegans).

Além disso, deve possuir algum valor para o mundo econômico para que haja possibilidade de ser contratado, como o exemplo clássico do grão de areia que não pode ser vendido ou do fio de cabelo, uma vez que não interessam ao mundo jurídico.

Para que um contrato seja celebrado, a manifestação de vontade, expressa ou tácita, é o principal requisito e como tem seu início no íntimo das partes contraentes, é um requisito subjetivo.

Quando tal vontade é externada através de uma declaração, esse requisito passa a ser objetivo, podendo produzir efeitos.

Não pode ser indireta e o silêncio só produz efeitos de aceitação quando acompanhado de outras circunstâncias claras que a autorizem, ou seja, quando encontrar previsão legal (se a lei lhe conferir efeito), quando ficar convencionado em contrato ou se os usos e costumes do local façam presumir aceitação.

Segundo o Código Civil, o silêncio importa anuência quando as circunstâncias ou os usos o autorizem, e não for necessária a declaração de vontade expressa (CC, art. 111).

Isso acontece quando, por exemplo, em virtude das situações ou condições de fato que envolvam o caso concreto, a falta de resposta, os atos ou fatos alheios, atitudes omissivas e voluntárias de quem as silenciam, fazem com que a outra parte creia que o silente mostrou sua vontade.

No contrato, a manifestação da vontade é livre, quando não for prescrita uma forma pela lei; ou quando assim não o fazem as próprias partes. Destarte, a vontade no contrato pode manifestar-se verbalmente e por escrito, seja por instrumento particular, seja por instrumento público. Também, a vontade de exteriorizar-se por sinais inequívocos, com força vinculante. É o que ocorre, por exemplo, em um leilão em que o costume é aceitar o lanço do arrematante por maneio de cabeça ou sinal de mão. Vale nessa hipótese, o que estipulam os usos e costumes do negócio e do lugar. (VENOSA, 2004. p.451)

Sendo um negócio bilateral, é possível notar um lado que fará uma oferta e o outro que fará a aceitação para que se configure a autonomia da vontade. A proposta se configura pelas negociações preliminares, conversas prévias, acordos, sondagens entre as partes quando uma manifesta a sua vontade de se vincular a outra pela obrigação contratual.

Por isso, a proposta deve ser séria, completa, precisa e clara, mostrando características do negócio, como preço, quantidade, tempo de entrega, modo de execução de uma tarefa, forma de pagamento, etc. Ela vincula o proponente, que fica obrigado a mantê-la e responder pela obrigação de realizá-la de acordo o estabelecido, além de responder por suas consequências.

Porém, caso seja estipulado, ela não obrigará o proponente ou em razão da natureza do negocio e das circunstâncias do caso.

A oferta traduz uma vontade definitiva de contratar nas bases oferecidas, não estando mais sujeita a estudos ou discussões, mas dirigindo-se à outra parte para que aceite ou não, sendo, portanto, um negócio jurídico unilateral, constituindo um elemento da formação contratual. Pode-se dizer, então que proposta, aceitação ou oblação é uma declaração de vontade, dirigida por uma pessoa a outra (com quem se pretende celebrar um contrato), por força da qual a primeira manifesta sua intenção de se considerar vinculada, se a outra parte aceitar. (GONÇALVES, 2012. p. 75)

A aceitação ou oblação consiste no ato pelo qual a parte concorda com os termos da proposta. Nesse momento a manifestação da vontade é indispensável para que o contrato seja celebrado, mas pode ser expressa ou tácita.

Ela deve ser feita dentro do prazo estipulado na proposta e quando aderida em todos os aspectos, torna o contrato concluído, desde se torne de conhecimento do proponente em tempo oportuno.

A aceitação não exige forma, mas deve ser oportuna, compreender a adesão integral à oferta, para que não se configure uma contraproposta, ser conclusiva e coerente.

Mesmo se o contrato estiver sendo celebrado entre partes presentes, a oferta poderá estabelecer um prazo para aceitação, do contrário ela deverá ser aceita imediatamente.

Para o contrato celebrado entre ausentes, caso exista um prazo, este deverá ser observado, mas se a aceitação for feita fora do prazo, sem culpa do oblato, o proponente deverá dar ciência do fato ao aceitante.

Sem prazo estipulado, a aceitação deverá ser feita dentro de um tempo apto a chegar ao conhecimento do proponente, podendo ser retratada antes ou no momento desse conhecimento. O contrato será celebrado no local em que foi proposto ou no local em que residir o proponente.

1.2 Função social e boa-fé na interpretação dos contratos

Como já exposto acima, os contratos tem sua base construída pela autonomia da vontade e esta consiste na faculdade de estipular livremente a forma e objeto contratual, nos limites acordados, possuindo interesses e efeitos jurídicos tutelados pela lei. As partes podem ou não contratar (ressalvadas as hipóteses em que as pessoas são obrigadas pela lei a contratar), fazer combinações e estipular suas próprias regras.

Através da autonomia da vontade podem ser celebrados contratos atípicos ou inominados: aqueles que não exigem disciplina ou regulamentação própria e, conseqüentemente, não estão previstos no Código Civil ou em lei especial, mas são admitidos em direito desde que não contrariem a lei e os bons costumes.

Quando são disciplinados de maneira específica, recebem a classificação de contratos nominados ou típicos, são regulados pelo Código Civil e em legislações próprias, como é o caso da compra e venda, aluguel, fiança, dentro outros.

O contrato é fonte criadora de direitos e deveres entre as partes. Os que contratam assumem a responsabilidade de se obrigarem a um determinado comportamento social que possui força jurídica. Porém, tal liberdade não é absoluta, para que não haja abuso de direito ou tumulto a ordem econômica e social.

Nesse ponto, os contratos são limitados pela Função Social, que é exercida através das normas que estabelecem a observância da ordem pública, os bons costumes e até mesmo a revisão judicial.

A Função Social “é antes de tudo, um princípio jurídico de conteúdo indeterminado, que se compreende na medida em que lhe recebemos o precípuo efeito de impor limites à liberdade de contratar, em prol do bem comum” (GAGLIANO, 2012. p.86). Por isso, ao ser positivada torna-se cláusula geral: regras que possuem caráter obrigatório apesar de seu conteúdo indeterminado, pois são inspiradas em princípios, e aplicadas segundo as particularidades do caso concreto.

Os efeitos da Função Social se manifestam no respeito e lealdade negocial, quando uma das partes não vida prejudicar a outra, buscando a igualdade material da relação jurídica.

Assim, o contrato não é visto apenas como um objeto criado para propiciar a circulação de riquezas, mas também como um instrumento de desenvolvimento social:

Mas não é só este o aspecto a considerar. Paralelamente à função econômica, aponta-se no contrato uma outra civilizadora em si, e educativa. Aproxima ele os homens e abate as diferenças. Enquanto o indivíduo admitiu a possibilidade de obter o necessário pela violência, não pôde apurar o senso ético, que somente veio a ganhar maior amplitude quando o contrato convenceu das excelências de observar normas de comportamento na consecução do desejado. Dois indivíduos que contratam, mesmo que se não estimem, respeitam-se. E enquanto as cláusulas são guardadas, vivem em harmonia satisfatória, ainda que pessoalmente se não conheçam. (PEREIRA, 2002. p. 17)

Através das cláusulas gerais da Boa-Fé e a Função Social, previstas na Constituição Federal e no Código Civil a autonomia da vontade é limitada para que prevaleçam os interesses coletivos e não os particulares, ou seja, visam abolir cláusulas leoninas de todo ordenamento jurídico brasileiro.

Os interesses das partes devem ser exercidos de acordo os interesses sociais, não podendo apresentar conflitos, pois nessa hipótese prevalecem os interesses da coletividade.

A liberdade contratual está vinculada aos interesses da ordem pública, que proíbem a convenção entre as partes que não respeite as normas de ordem pública, a moral, os bons costumes, o interesse da coletividade em geral e a ordem socioeconômica.

Deve estar fundada na solidariedade, justiça social, progresso social, livre circulação de bens e serviços, à produção de riquezas, ao equilíbrio das prestações, para que não haja abuso de poder econômico, desigualdade ou desproporcionalidade entre as partes e sejam desrespeitados os princípios que regem o ordenamento jurídico.

Caso o contrato não respeite a Função Social, o Estado, uma vez provocado pode intervir, através do juiz, nessas relações e assumir o papel de garantir a ordem pública, abolindo cláusulas abusivas que interfiram nos direitos coletivos.

Considerando o Código que o regime da livre iniciativa, dominante na economia do País, assenta em termos do direito do contrato, na liberdade de contratar, enuncia regra contida no art. 420, de subordinação dela à sua função social, com prevalência dos princípios condizentes com a ordem pública, e atentando a que o contrato não deve atentar contra o conceito da justiça comutativa. Partindo de que o direito de propriedade deve ser exercido tendo como limite o desempenho de deveres compatíveis com a sua função social, assegurada na Constituição da República, o Código estabelece que a liberdade de contratar não pode divorciar-se daquela função. Dentro nesta concepção, o Código consagra a rescisão do contrato lesivo, anula o celebrado em estado de perigo, combate o enriquecimento sem causa, admite a resolução por onerosidade excessiva, disciplina a redução de cláusula penal excessiva. (PEREIRA, 2003. p. 18)

A função social do contrato é garantia para que os contratos não interfiram na livre concorrência, nas leis de mercado e principalmente as leis que regem relações de consumo. Possui o objetivo de limitar a autonomia da vontade para que esta não se sobreponha ao interesse social e isto inclui até mesmo impor medidas na própria liberdade de contratar ou deixar de contratar, como é o caso dos contratos obrigatórios.

O atual ordenamento jurídico brasileiro abandona a antiga idéia de que os contratantes podem fazer tudo segundo o exercício de sua vontade. Possibilita o controle da atividade das partes, influenciando diretamente nas decisões e direção das relações pactuadas, como por exemplo, a limitação de cláusulas que venha a prejudicar os direitos de terceiros ou o interesse da coletividade, afirmando a prevalência do interesse social, que é maior que o privado.

No que tange à interpretação dos contratos, desde o desenrolar da proposta e formação, a boa-fé deve estar presente nos interesses das partes. As partes possuem o múnus de agir corretamente em todas as fases da relação contratual, até mesmo após o cumprimento.

A cláusula geral da boa-fé vem positivar um conjunto de comportamentos ligados ao respeito à verdade, ética, lealdade e a transparência que vem do íntimo daquele que, mesmo errado, acredita estar certo e não possui vontade de enganar o outro.

Em outras palavras, boa-fé se resume em não lesar o outro por convicção íntima. Quando esses comportamentos passam a ser regulados pelo Direito para que as relações jurídicas tenham segurança e justiça, para que as partes não sejam prejudicadas, a boa-fé se torna objetiva. Divide-se em boa-fé subjetiva e objetiva:

Na boa-fé subjetiva, o manifestante de vontade crê que sua conduta é correta, tendo em vista o grau que possui de conhecimento do negócio. Para ele há um estado de consciência ou aspecto psicológico que deve ser considerado.

A boa-fé objetiva, por outro lado, tem compreensão diversa. O intérprete parte de um padrão de conduta comum, do homem médio. Naquele caso concreto, levando em consideração os aspectos sociais envolvidos. Desse modo, a boa-fé objetiva se traduz de forma mais perceptível como uma regra de conduta, um dever de agir de acordo com determinados padrões sociais estabelecidos e reconhecidos. (VENOSA, 2004. p 393)

Também auxilia na interpretação dos contratos, atuando no limite do exercício do direito e na integração dos negócios jurídicos, uma vez que deve ser observada por ambas as partes para que os contratos sejam corretamente celebrados, interpretados e cumpridos.

A boa-fé é norteadora de todas as relações jurídicas existentes, motivo pelo qual não poderia ser dispensado seu estudo na teoria geral dos contratos.

Se mostra então como objetiva e é característica das relações obrigacionais, por isso não pode ser um estado de consciência mental do agente e sim um comportamento positivado que determina um padrão de conduta moral a ser seguido de acordo o que é pactuado.

A boa-fé objetiva não cria apenas deveres negativos, como o faz a boa-fé subjetiva. Ela cria também deveres positivos, já que exige que as partes tudo façam para que o contrato seja cumprido conforme previsto e para que ambas obtenham o proveito objetivado. Assim, o dever de simples abstenção de prejudicar, característico da boa-fé subjetiva, se transforma na boa-fé objetiva em dever de cooperar. O agente deve fazer o que estiver ao seu alcance para colaborar para que a outra parte obtenha o resultado previsto no contrato, ainda que as partes assim não tenham convencionado, desde que evidentemente para isso não tenha que sacrificar interesses legítimos próprios. (PEREIRA, 2003. p. 23)

Tal elemento interpretativo cria deveres como correção, cuidado, segurança, informação, sigilo, cooperação, prestar contas e muitos outros que visam a transparência das relações contratuais.

Também proíbe comportamentos ofensivos a dignidade humana, assim como tudo que é considerado ilícito ou imoral pelo direito.

O contrato, que reflete por um lado a autonomia da vontade, e por outro submete-se à ordem pública, há de ser conseguintemente a resultante deste paralelogramo de forças, em que atuam ambas estas freqüências. Como os conceitos de ordem pública e bons costumes variam, e os conteúdos das respectivas normas por via de conseqüência, certo será então enunciar que em todo tempo o contrato é momento de equilíbrio destas duas forças, reduzindo-se o campo da liberdade de contratar na medida em que o legislador entenda conveniente alargar a extensão das normas de ordem pública, e vice-versa. (PEREIRA, 2003. p. 27)

Portanto, o legislador teve a preocupação de inserir no ordenamento uma cláusula que cuide da honestidade nas relações contratuais e a maneira de cumprir todos os deveres pactuados. Presta-se mais à intenção do contrato do que ao sentido do texto para que prevaleça o interesse social e a segurança das relações jurídicas.

1.3 Classificação e Natureza Jurídica

Devido à existência de inúmeras espécies de contratos, dos nominados aos inominados, há necessidade de classificá-los para que haja como regulamentá-los de acordo suas características comuns.

Contudo, como é próprio de qualquer tipo de instituto jurídico, existem várias classificações, motivo pelo qual se faz necessária a adoção de um parâmetro de estudo, ressaltando que um determinado tipo de contrato pode ser classificado de várias maneiras ao mesmo tempo.

Quanto às partes envolvidas na relação contratual, podem ser unilaterais, quando envolva a atividade de apenas uma para ser criado; bilateral quando gere obrigações para ambos os contratantes ou plurilateral quando existam várias pessoas envolvidas no pacto.

Tais obrigações são sinalagmáticas, pois se mostram recíprocas, ou seja, a obrigação de um depende do cumprimento da obrigação do outro, como ocorre na compra e venda.

Quando são vantajosos para apenas uma das partes, tem-se um contrato gratuito ou benéfico, existe sacrifício para apenas um dos contraentes enquanto o outro obtém o proveito da relação. São chamados de onerosos, os contratos nos quais ambas as partes auferem proveito e sacrifício para que se firme a relação pactuada.

Os contratos onerosos possuem subclassificação. Assim, são comutativos se as prestações envolvidas forem certas e determinadas, podendo as partes ter limite exato de suas obrigações, pois não envolve risco na relação.

Todavia, quando há incerteza nas prestações, o contrato torna-se aleatório, dependem de um evento futuro, ou seja, uma alea. Como exemplo clássico, cita-se o contrato de seguro, objeto do presente estudo, no qual o segurado faz a celebração para acobertar-se de qualquer risco, sendo sempre aleatório para a seguradora, uma vez que o pagamento da indenização depende de um fato eventual.

Há, porém, contratos tipicamente comutativos, como a compra e venda, que, em razão de certas circunstâncias, tornam-se aleatórios. Denominam-se contratos acidentalmente aleatórios e são de duas espécies: a) venda de coisas futuras; e b) venda de coisas existentes, mas expostas a risco. Nos que têm por objeto coisas futuras, o risco pode referir-se: a) à própria existência da coisa; e b) à sua quantidade. Do risco respeitante à própria existência da coisa trata o art. 458 do Código Civil, nestes termos: “Se o contrato for aleatório, por dizer respeito a coisas ou fatos futuros, cujo risco de não virem a existir um dos contratantes assuma, terá o outro direito de receber integralmente o que lhe foi prometido, desde que de sua parte não tenha havido dolo ou culpa, ainda que nada do avençado venha a existir”. Tem-se, na hipótese, a emptio spei ou venda da esperança, isto é, da probabilidade de as coisas ou fatos existirem. Caracteriza-se, por exemplo, quando alguém vende a colheita futura declarando que “a venda ficará perfeita e acabada haja ou não safra, não cabendo ao comprador o direito de reaver o preço pago se, em razão de geada ou outro imprevisto, a safra inexistir”. O art. 459 cuida do risco respeitante à quantidade maior ou menor da coisa esperada (emptio rei speratae, ou venda da coisa esperada): “Se for aleatório, por serem objeto dele coisas futuras, tomando o adquirente a si o risco de virem a existir em qualquer quantidade, terá também direito o alienante a todo o preço, desde que de sua parte não tiver concorrido culpa, ainda que a coisa venha a existir em quantidade inferior à esperada”. Aduz o parágrafo único: “Mas, se da coisa nada vier a existir, alienação não haverá, e o alienante restituirá o preço recebido”. Assim, se o risco da aquisição da safra futura limitar-se à sua quantidade, pois deve ela existir, o contrato fica nulo se nada puder ser colhido. Porém, se vem a existir alguma quantidade, por menor que seja, o contrato deve ser cumprido, tendo o vendedor direito a todo o preço ajustado. A venda de coisas já existentes mas sujeitas a perecimento ou depreciação é disciplinada no art. 460, como segue: “Se for aleatório o contrato, por se referir a coisas existentes, mas expostas a risco, assumido pelo adquirente, terá igualmente direito o alienante a todo o preço, posto que a coisa já não existisse, em parte, ou de todo, no dia do contrato”. Cita-se, como exemplo, a venda de mercadoria que está sendo transportada em alto-mar por pequeno navio, cujo risco de naufrágio o adquirente assumiu. É válida, mesmo que a embarcação já tenha sucumbido na data do contrato. Se, contudo, o alienante sabia do naufrágio, a alienação pode ser anulada, como dolosa, pelo lesado (art. 461). (GONÇALVES, 2011. p.41)

Se as partes puderem dispor e tratar livremente sobre as cláusulas e condições a serem contratas em condição de igualdade, o contrato é paritário. Ao contrário deste, é classificado como de adesão aquele que não admite liberdade para que as partes manifestem sua vontade quanto a elaboração das cláusulas e termos: uma parte adere ao que foi proposto por outra previamente e não pode modificar o que foi escrito, apenas aceitar.

O Código Civil delineia o contrato de adesão, resguardando a posição do aderente não só em vista de “cláusulas ambíguas ou contraditórias”, como ao proibir “a renúncia antecipada do aderente a direito resultante da natureza do negócio” (arts. 423 e 424). O Código de Defesa do Consumidor (Lei n. 8.078/90) dedicou-lhe um capítulo, conceituando-o da seguinte forma, no art. 54: “Contrato de adesão é aquele cujas cláusulas tenham sido aprovadas pela autoridade competente ou estabelecidas unilateralmente pelo fornecedor de produtos ou serviços, sem que o consumidor possa discutir ou modificar substancialmente seu conteúdo”. O § 1º permite a inserção de cláusula no formulário, sem que isso desfigure a natureza da adesão do contrato, ou seja, sem que afaste a posição privilegiada do proponente. O § 3º exige que os contratos de adesão sejam redigidos em termos claros e legíveis, de modo a facilitar a sua compreensão pelo consumidor. As cláusulas que eventualmente limitem o seu direito deverão ser redigidas com destaque, permitindo sua fácil e imediata compreensão (§ 4º). Esta espécie de cláusula limitativa não pode, porém, ser abusiva, sob pena de incidir na cominação de nulidade do art. 51. O art. 47 do Código do Consumidor estatui que as cláusulas contratuais serão interpretadas de maneira mais favorável ao consumidor. Já de há muito a jurisprudência vem proclamando que, nos contratos de adesão em geral, na dúvida, a interpretação deve favorecer o aderente, porque quem estabelece as condições é o outro contratante, que tem a obrigação de ser claro e de evitar dúvidas. (GONÇALVES, 2011.p. 43)

Importante diferenciar a modalidade acima do contrato-tipo que é aquele apresentado por uma das partes por uma fórmula prévia já escrita, mas que admite novas estipulações sobre seu conteúdo, não há imposição e vão sendo preenchidos e explicados no decorrer das tratativas.

O momento em que os contratos devem ser cumpridos também é classificado. Pode ser de execução instantânea (ou imediata) se são cumpridos num só ato e logo após sua celebração ou de execução diferida quando em um só ato são cumpridos em um momento posterior.

Caso sejam cumpridos em várias prestações, os contratos serão de trato sucessivo ou de execução continuada e nesse ponto se enquadra a Teoria da Imprevisão, inserida pela cláusula rebus sic stantibus: instituto que permite a esse tipo de contrato, caso haja ocorrência de fato extraordinário e imprevisível que leve a mudança da situação em que foi pactuado, a revisão de suas cláusulas devido a onerosidade excessiva para uma das partes.

A teoria tornou-se conhecida como cláusula rebus sic stantibus, e consiste, resumidamente, em presumir, nos contratos comutativos, uma cláusula, que não se lê expressa, mas figura implícita, segundo a qual os contratantes estão adstritos ao seu cumprimento rigoroso, no pressuposto de que as circunstâncias ambientes se conservem inalteradas no momento da execução, idênticas às que vigoravam no da celebração. (PEREIRA, 2003. p.106)

Intuita personae são os contratos celebrados em virtude das qualidades pessoais de uma das partes. Por isso, não podem ser cumpridos por outra pessoa como nos contratos impessoais que podem ser realizados por terceiros, uma vez que a contratação não gira em torno das características da pessoa.

Em suma, o instituto dos contratos é um negócio jurídico bilateral que gera obrigações para as partes envolvidas.

Essa relação é formada pelo consentimento de dar, fazer ou não fazer algo que se não cumprido na forma estabelecida gera sanções e constatando dessa maneira, a constituição, modificação ou extinção de um vínculo patrimonial.

II - O CONTRATO DE RISCO NO DIREITO BRASILEIRO

2.1 O Seguro como contrato de risco

O Código Civil Brasileiro, em seu art. 757, dispõe que pelo contrato de seguro, o segurador se obriga, mediante o pagamento do prêmio, a garantir interesse legítimo do segurado, relativo a pessoa ou a coisa, contra riscos predeterminados. Nesse sentido, FERREIRA afirma que o contrato de seguro:

É aquele pelo qual uma das partes, o segurado, mediante uma remuneração, a que se dá o nome de prêmio ou quota, se faz prometer para si próprio ou para terceiro, no caso de ocorrência de um evento futuro e determinado, a que se dá o nome de risco, uma prestação normalmente pecuniária, e de outra parte, o segurador que, assumindo um conjunto de risco, os compensa de acordo com as leis da estatística e o princípio do mutualismo. (FERREIRA, 1985. p. 310)

É preciso compreender o contrato de seguro segundo a noção de que, os danos causados pelos fatos alheios a vontade das pessoas, e que acontecem comumente nas situações diversas da vida, causam prejuízos difíceis de serem suportados individualmente por aquele que é atingido pelos mesmos. Sendo assim, suportar coletivamente tais prejuízos, importa sua principal função.

Como existe um universo de indivíduos sujeitos a um determinado tipo de risco (por exemplo, os donos de automóveis sujeitos a sofrerem danos causados por acidentes), há uma grande demanda para que estes procurem certo tipo de amparo para que, juntos possam suportar as conseqüências dos danos.

Esta noção gera a base do contrato de Seguro: a solidariedade. É mais fácil unir-se para suportar os temidos riscos do que suportá-los individualmente.

A reunião de um grande número de indivíduos expostos a um risco forma uma coletividade de fundos que, reunidos e administrados pelas seguradoras são utilizados para o pagamento da indenização, tornando equilibrada a situação para todos envolvidos na relação securitária.

Os segurados depositam quantias para serem administradas pelas seguradoras. Estas se encarregam de beneficiar com ente fundo aqueles que vierem a sofrer o temido dano, que é sempre pactuado. Assim, tal contrato é aleatório:Em razão das vantagens esperadas, tanto para o segurado como para o segurador, dependerem exclusivamente de um evento futuro e incerto, seja quanto à sua ocorrência, seja quanto ao momento em que se deverá produzir. (MATOS E MOLINA, 2006. p. 33)

A Seguradora se obriga a pagar a indenização pactuada somente se o risco de fato se concretizar, ou seja, se o sinistro acontecer. Alguns seguros exigem que o dano seja capaz de gerar prejuízos ao segurado, ou seja, que sejam sinistros. Outros, todavia, podem ser felizes, como por exemplo, um seguro de sobrevivência ou para financiar estudos.

O mecanismo do contrato de seguro assenta-se no princípio da mutualidade dos seguros. A empresa seguradora privada nada mais é do que uma intermediária que recolhe os prêmios pagos pelos segurados e os utiliza para pagar as indenizações pelos sinistros ocorridos. Dessa forma, são os próprios milhares de segurados que pagam as indenizações pelos sinistros ocorridos. O prêmio é fixado de antemão com base em cálculos atuariais, que se apoiam na análise das probabilidades. Os dados estatísticos mostram a incidência dos sinistros num determinado risco e possibilitam ao analista estabelecer, com precisão, qual será a referida incidência em futuro próximo. Com base nesses dados fixa o segurador a taxa de seguro, suficiente para pagar todas as indenizações e ainda proporcionar-lhe um lucro razoável. (GONÇALVES, 2012. p 510)

O risco é um evento futuro e incerto que pode ou não acontecer dentro de um lapso temporal compreendido entre o termo inicial e final, que são estabelecidos no contrato. É um acontecimento ou um evento que pode vir a acontecer por fato da natureza ou do próprio homem, por exemplo, uma inundação ou uma batida de carro.

O risco também é fundamental para o contrato de seguro, pois, com base nas estatísticas e cálculos de probabilidade, constatam-se quais as chances de determinado evento danoso vir a, de fato, ocorrer. Em outras palavras, do risco (probabilidade de ocorrência do fato) virar sinistro (fato ocorrido). Quanto maior a probabilidade de ocorrência do sinistro, maiores as possibilidades da seguradora vir a pagar a indenização, logo, maiores terão de ser seus fundos e maiores os prêmios. Atualmente, os eventos mais improváveis já são objeto de técnicas capazes de torná-las previsíveis, não só naquilo que diz respeito às suas possibilidades de ocorrer, como também a seus efeitos e às somas necessárias a se suportar economicamente os danos. (MATOS E MOLINA, 2006 p. 47)

Por esta razão, os riscos protegidos pelo seguro e assumidos pelo segurador devem estar claramente expressos e inscritos na apólice (instrumento pelo qual se prova o contrato de Seguro), não se admitindo interpretação extensiva a respeito destes. Os riscos compreendem também todos os prejuízos que são resultantes ou conseqüentes dos estragos ocasionados até mesmo para evitar o sinistro, minorar o dano ou salvar a coisa (Art. 779 do CC).

No direito securitário, prêmio é expressão utilizada para referir-se à quantia que o segurado paga à seguradora para que esta venha a cobrir o risco assumido caso ocorra um sinistro. Como mencionado anteriormente, o prêmio é pago independente da ocorrência do sinistro.

O prêmio consiste na contraprestação devida pelo segurado à seguradora, em troca da garantia que esta lhe oferece, surgindo como uma obrigação fundamental do tomador do seguro.

Desta forma, verifica-se que o prêmio é um elemento essencial do contrato de seguros, uma vez que representa o valor do risco garantido. Assim, sem o pagamento do prêmio é impossível à seguradora formar o fundo comum, necessário ao pagamento de todos os sinistros ocorridos. Por tal razão, a falta do pagamento do prêmio é razão suficiente para liberar o segurado do pagamento da indenização. (MATOS E MOLINA, 2006. p 50)

O pagamento do prêmio é elemento fundamental do contrato de seguro, sendo que, a indenização ou quantia acordada será a mesma estipulada pela apólice ou bilhete de seguro.

Evidenciando a presença essencial da boa-fé, o objeto que virá a ser indenizado, dever ser, como em todo negócio jurídico, lícito e possível, não podendo contrariar normas de ordem pública, sob pena de nulidade absoluta.

Sendo nulo também, o Seguro celebrado para garantir risco proveniente de algum ato doloso do segurado, beneficiário ou seu representante (art. 762 do CC).

A participação do segurado ou beneficiário na realização do risco exclui a incerteza, que é um dos seus elementos essenciais e anula o contrato. Por exemplo, a mutilação voluntária, a simulação de um acidente de trânsito, a provocação de um curto-circuito para incendiar o imóvel são fatos que anulam o direito à indenização do seguro. A própria ordem pública possui interesse na proibição da prática de atos danosos à saúde ou ao patrimônio material da nação e daqueles que possam estipular as ações dolosas. (ALVIM, 2007. p. 31)

Quando algo que agrave o risco possa ser previsto, é dever do segurado comunicar à seguradora, sob pena de perder o direito ao seguro, pois a companhia de seguros possui a prerrogativa de rescindir o contrato, caso este se torne extremamente desvantajoso.

De nada valeria exigir do segurado estrita boa-fé nas declarações que presta sobre o risco que pretende segurar, se lhe fosse permitido alterar posteriormente essas condições agravando a possibilidade de ocorrência do sinistro. É o que se verifica, por exemplo, se o dono de uma casa comercial fizer o seguro do estoque de mercadorias e depois resolver trabalhar com inflamáveis no local ou um armazém segurado para depósito de algodão enfardado passar a receber algodão em rama. Quando ocorrem fatos como estes, o segurado voluntariamente altera as condições do contrato. Rompe o equilíbrio entre a prestação representada pelo prêmio e a contraprestação do segurador que teria direito a uma recompensa maior, já que se agravou o risco a seu cargo. (ALVIM, 2007.p. 55)

O prêmio não poderá ser aumentado nas hipóteses em que, durante a vigência do contrato, por fato alheio a vontade das partes, o risco venha a aumentar.

Porém, tal situação não autoriza que o segurado venha deliberadamente a praticar atos que possam agravar o risco do contrato, uma vez que a cláusula geral da boa-fé impõe às partes o dever de agir com lealdade.

Da mesma forma, o segurado deve proceder com honestidade ao responder os questionários que informem os riscos, para que a seguradora possa realizar os cálculos da maneira correta para que não incorra em prejuízo.

Se inexatidão ou omissão de dados resultarem da má-fé do segurado, o segurador poderá anular o contrato por dolo, e o segurado não terá direito a receber reembolso das quantias já pagas.

Já houve oportunidade de afirmar-se que um dos princípios fundamentais do seguro é o mutualismo. Só se prospera onde o espírito comunitário desperte o esforço conjunto na defesa contra os riscos que ameaçam a coletividade.O segurador se propõe a organizar esse trabalho com a cooperação de todos. Amealha de cada uma pequena contribuição que irá formar o fundo comum para o pagamento das indenizações aos que são atingidos pelo infortúnio. Segurador e segurados, irmanados pelo mesmo objetivo, constroem as grandes empresas seguradoras que suportam bem o pagamento de voluptuosas indenizações.A contribuição de cada segurado é proporcional ao risco que está correndo sua pessoa ou seu patrimônio. O prêmio que paga varia de acordo com a sua periculosidade de risco. Eis que deverá assinalar na proposta do seguro, todas as circunstâncias que possam caracterizar a natureza do risco, sob pena de perder o direito à indenização (ALVIM, 2007. p.55)

Todavia, o Código Civil prevê na hipótese em que o erro não resulte de má-fé, o direito do segurador de resolver o contrato ou cobrar, mesmo depois do sinistro, a diferença do prêmio estipulado na apólice ou bilhete se este for pago a menos.

O que se justifica pelo fato de que a presunção no seguro é de que o segurado saiba a verdade sobre a situação do risco no ato da assinatura do contrato.

A diminuição do risco no curso do contrato, todavia, não acarreta a redução do prêmio estipulado, mas caso esta seja considerável, o segurado, logicamente poderá requerer a revisão do prêmio ou a resolução do contrato, uma vez que este se tornará excessivamente oneroso para a parte segurada.

Também é inerente ao dever da lealdade entre as partes a comunicação do segurado à seguradora no caso de haver um sinistro, bem como todos os fatos que o envolvam, além de tomar as devidas providências que lhe caiba para minorá-lo e abster-se de transacionar com o responsável pelos danos sem o prévio consentimento da seguradora, pois será nula qualquer transação para pagamento reduzido do capital segurado.

Assim, entende-se que no seguro, o risco é transferido para a seguradora que fica responsável por pagar uma indenização ao segurado caso o evento temido aconteça, tudo de acordo com os termos estipulados previamente e constantes na apólice.

Porém, caso o evento nunca venha acontecer, o segurado não receberá pagamento de reembolso. Sobre essa hipótese, o Código Civil foi claro ao dispor que, a não ocorrência do evento previsto no seguro, não exclui a obrigação do segurado de pagar o prêmio (CC, art. 764).

2.2 Características particulares e elementos do contrato de seguro

O seguro envolve as figuras do segurador e do segurado que pode ser ou não aquele que contrata, sendo que o primeiro é responsável por garantir o interesse legítimo do segundo, possuindo natureza bilateral, ou seja, obrigações para ambas as partes.

Possui características próprias, conforme será exposto a seguir. “São considerados elementos essenciais para formação do contrato de seguro: (I) o segurado; (II) o segurador; (III) o risco; (IV) o objeto do seguro; (V) o prêmio; e, (VI) a prestação do segurador ou indenização” (MATOS E MOLINA, 2006. p. 33).

Assim, o segurador é sempre uma pessoa jurídica autorizada a exercer a atividade e o segurado, pessoa física ou jurídica que necessite dos serviços prestados por esta. O interesse pode envolver assuntos referentes à pessoa ou coisa, sendo o objeto do contrato a garantia do interesse legítimo.

Em se tratando de seguros de vida ou de pessoa, existe outra figura envolvida na relação, a do beneficiário: aquele a quem a indenização é paga caso ocorra um sinistro com o titular do seguro.

A relação securitária traz benefício e ônus patrimonial para ambas as partes, manifestando sua onerosidade. O segurado paga ao segurador um prêmio e recebe deste a garantia pactuada caso ocorra o sinistro.

Mostra-se um contrato de execução continuada na medida em que é realizado dentro de um lapso temporal no qual a seguradora será responsável por indenizar ao segurado caso haja um sinistro que abale o interesse legítimo protegido.

A incerteza é característica peculiar do seguro o que o torna um contrato aleatório. As vantagens esperadas por ambas as partes não dependem de sua vontade, mas de um evento futuro e incerto. O segurador pode ser obrigado a pagar uma indenização ao segurado, porém, mesmo com a ausência do sinistro, o segurado continuará obrigado a pagar o prêmio.

É um contrato aleatório por não haver equivalência entre as prestações; o segurado não poderá antever, de imediato, o que receberá em toca da sua prestação, pois o segurador assume um risco, elemento essencial deste contrato, devendo ressarcir o dano sofrido pelo segurado, se o evento incerto e previsto no contrato ocorrer. Daí a aleatoriedade desse contrato, pois tal acontecimento pode verifica-se ou não. Desse modo, a vantagem do segurador dependerá de não ocorrer o sinistro, hipótese em que receberá o prêmio sem nada reembolsar. Se advier o sinistro, deverá pagar uma indenização, que poderá ser muito maior do que o prêmio recebido o. O ganho ou a perda dos contraentes dependerá de fatos futuros e incertos, previstos no contrato, que constituem o risco. (DINIZ, 2012.p. 549)

Por estar expressamente previsto e regulamentado no Código Civil e em legislações especiais, o seguro é um contrato nominado, sendo estritamente formal e escrito ao pré-estabelecer cláusulas e condições. Como geralmente não há modificação nem transigência, é classificado por boa parte da doutrina também como um contrato de adesão.

O seguro é, ainda, típico contrato de adesão, uma vez que se aperfeiçoa com a aceitação, pelo segurado, das cláusulas previamente elaboradas pelo segurador e impressas na apólice, impostas sem discussão entre as partes. O segurado adere em bloco ao modelo contratual, não podendo modificar qualquer de suas cláusulas: aceita-se ou rejeita-as, de forma pura e simples, afastada qualquer alternativa de discussão. O novo Código Civil resguarda a posição do aderente não só em vista de “cláusulas ambíguas ou contraditórias”, como ao proibir a “renúncia antecipada do aderente a direito resultante da natureza do negócio” (arts. 423 e 424) (GONÇALVES, 2012. p. 504)

O Código Civil preocupou-se também em dispor que, para que se firme um contrato de seguro, as tratativas devem ser claras e acessíveis (CC, art. 759). Antes da emissão da apólice, é necessária a apresentação escrita de uma proposta em que contenham os riscos assumidos, bem como todos os elementos do contrato e especificamente qual é a garantia do interesse legítimo a ser segurado, como uma espécie de contrato preliminar.

Após ser contratado, o seguro se prova através da apólice, que é um instrumento utilizado para descrever os limites e as definições do acordo pactuado no contrato, além de mostrar formalmente a existência, validade e eficácia da relação securitária.

É o documento principal do contrato e fica em poder do segurado, nele estão contidas as responsabilidades e obrigações assumidas pelas partes, além do início e fim de sua validade, limite da garantia, prêmio devido e se for o caso, os nomes do segurado e do beneficiário.

Por meio da apólice, portanto, descreve-se o risco e delimita-se o período de vigência do seguro, em dias e horas, visando, com isso, a tornar clara e precisa a assunção do risco pelo segurador, permitindo em contrapartida, ao segurado, ter a exata noção da abrangência do seu direito. (GAGLIANO, 2012. p.520)

O seguro pode envolver também a figura do bilhete de seguro, que é um documento mais simples que a apólice, mas que possui a mesma função: provar a existência da relação securitária e sua abrangência. Na falta destes documentos, o seguro se prova através de qualquer documento que demonstre o pagamento do prêmio.

Quando a apólice ou o bilhete mostram apenas um risco assumido, eles são denominados como específicos e quando abrangem vários tipos de riscos são plúrimos.

Outras classificações de tipos de apólices e bilhetes existem para se ocupar de especificar e delimitar a responsabilidade do segurador:

Aberta, se o risco se desenvolver ao longo de sua atividade, determinando a individualização e a especificação dos objetos segurados por meio de averbações realizadas dentro do período de sua vigência, como sucede no seguro de transporte. Na apólice aberta, o contrato aperfeiçoar-se-á com a emissão da apólice geral, que consiga as condições do seguro, havendo o depósito de um prêmio inicial para depois dar surgimento aos riscos sucessivos, que integram a apólice em cada averbação, o que acarreta, por sua vez, a obrigação de pagar complemento do respectivo prêmio.Poderá ser ainda: simples, se o objeto do seguro é determinado precisamente, sem que haja possibilidades de substituí-lo, e flutuante, se estiver prevista a substituição da coisa segurada, fazendo-se o seguro por uma soma global, como se verifica em relação a mercadorias armazenadas. (DINIZ, p. 557-558)

Também podem ser classificados quanto a sua titularidade, sendo nominativos quando puderem ser transferidas através de cessão civil ou alienação, à ordem se forem transferidas por endosso ou ao portador se a simples tradição for suficiente para outorgar a detenção dos mesmos.

Outro instituto particular dos seguros é o co-seguro. Este consiste na participação de mais de um segurador em um mesmo risco, na medida de sua quota ou parte, com objetivo de ampará-lo integralmente até que o valor total do montante fixado na apólice seja coberto.

O co-seguro pode ser feito em uma mesma apólice em que todos os seguradores assumam conjuntamente sua responsabilidade ou também na forma de vários contratos, sobre o mesmo risco, mas em apólices separadas.

Para todos os efeitos legais, porém, a apólice deve indicar o segurador incumbido de administrar o contrato e representar as demais seguradoras. Essa representação possui natureza administrativa e cada co-segurador responderá apenas por sua parte.

Instituto diverso, mas que se assemelha ao do co-seguro, o resseguro visa a garantia da cobertura integral do risco na perspectiva das seguradoras:

O resseguro consiste na transferência de parte, ou de toda a responsabilidade do segurador para o ressegurador, com a finalidade de distribuir a responsabilidade pelo adimplemento da indenização. Nessa modalidade contratual, não há relação entre o ressegurador e o segurado, mas sim entre aquele e o segurador. Em verdade, o resseguro consiste em um seguro mediato, uma vez que é um seguro assumido entre o segurador e a resseguradora. Verifica-se, portanto, que o ressegurador consiste no segurador que se obriga a segurar uma seguradora, de maneira a garantir uma maior possibilidade de que esta cumpra sua obrigação frente aos seus empregados.A atividade seguradora enfrenta forte intervenção estatal a fim de permitir o pleno funcionamento do sistema securitário nacional. Para tanto, foi criado o Instituto de Resseguros do Brasil (IRB), com a finalidade de dar cobertura automática de resseguro aos seguradores aqui sediados. Dessa forma, o IRB é considerado litisconsorte necessário em liquidações judiciais em que tiver responsabilidade nos valores reclamados. (MATOS E MOLINA, 2006. p. 43)

Quando for celebrado com seguradores diversos, vários seguros sobre o mesmo interesse e contra o mesmo risco, o segurado deve previamente comunicar sua intenção por escrito ao primeiro segurado e indicar a soma que pretende fazer o seguro, pois a compensação jamais poderá ultrapassar o valor da coisa segurada.

A liquidação dos sinistros, ou seja, o processo para apuração do dano havido em virtude da ocorrência do sinistro, suscetível de ser indenizado, deverá ser feito num prazo não superior a 30 dias, contados a partir da entrega de todos os documentos básicos apresentados pelo segurado ou beneficiário.

Para qualquer tipo de seguro, a contagem do prazo poderá ser suspensa quando, no caso de dúvida fundada e justificável, forem solicitados novos documentos, voltando a correr a partir do dia útil subseqüente àquele em que forem completamente atendidas as exigências pelo segurado ou beneficiário.

É essencial que o segurado ou beneficiário solicite à sociedade seguradora o devido protocolo que identifique a data do recebimento do aviso de sinistro e seus respectivos documentos.

Assim, se o segurado, seu representante, ou seu corretor de seguros fizer declarações inexatas ou omitir circunstâncias que possam influir na aceitação da proposta ou no valor do prêmio, ficará prejudicado o direito à indenização, além de estar o segurado obrigado ao pagamento do prêmio vencido.

Todavia, a seguradora pode abster-se da responsabilidade do pagamento de parte do prejuízo, essa quantia deve ser fixada na apólice, dependendo das disposições do contrato e representará a franquia, quantia que representa parte do prejuízo apurado e não coberto pela seguradora.

A franquia é o valor previsto na apólice pelo qual o segurado fica responsável em cada sinistro, tornando-se até esse valor segurador de si próprio. Existem dois tipos de franquia: simples, em que o segurador responde pela totalidade dos prejuízos sempre que estes ultrapassarem a franquia estabelecida; ou dedutível, onde o segurador só paga os prejuízos que ultrapassarem a franquia. As franquias podem ser fixadas em valor absoluto ou como percentual do limite máximo de garantia. Se for estabelecida como percentual dos prejuízos indenizáveis, comumente recebe o nome de Participação Obrigatória do Segurado (POS). E sua contratação resulta, naturalmente, em redução de prêmio, já que os sinistros a cargo do segurador diminuem. (SUSEP, disponível em http://www.susep.gov.br/menu/informacoes-ao-publico/planos-e-produtos/seguros/seguro-de-danos, acesso em 22/03/2014)

Caso o segurado se encontre em mora no pagamento do prêmio e ocorra um sinistro antes de purgá-la, nos termos do artigo 763 do Código Civil, não terá direito a indenização.

Todavia, caso haja insolvência ou liquidação da companhia de seguro, o segurado possui o direito de reter os prêmios atrasados e fazer outro seguro pelo valor integral caso ainda não tenha recebido a indenização pelo sinistro ou apenas os prêmios se este já tiver sido pago.

Assim, nas situações em que o sinistro ocorrer por culpa grave ou dolo do segurado ou beneficiário do seguro, a reclamação de indenização por sinistro for fraudulenta ou de má-fé, o segurado, corretor, beneficiários ou ainda seus representantes e prepostos fizerem declarações falsas ou, por qualquer meio, tentarem obter benefícios ilícitos do seguro ou o segurado agrava intencionalmente o risco, a seguradora exime-me da responsabilidade no contrato.

O segurado, nesses casos, perde do direito ao prêmio mesmo que o sinistro seja oriundo de um risco coberto e a seguradora fica isenta de qualquer obrigação decorrente do contrato.

2.3 Principais espécies de seguro na legislação brasileira

Amplamente difundido e contratado desde o início, os seguros foram se aprimorando, surgiram muitos doutrinadores e os conhecimentos se incorporaram a atual legislação, o que facilitou o desenvolvimento do mercado de seguros brasileiro.

O contrato de Seguro em sua natureza é dotado de elementos muito complexos e por isso, aqueles que se dedicam a atividade securatória devem entender muito bem o aspecto técnico sob pena de prejuízo do negócio. Para ser segurador, no Brasil, a lei exige que se constitua entidade legalmente autorizada para tal fim (Art. 757, Parágrafo Único do CC).

Tal atividade envolve, além dos princípios legais, aspectos econômicos e matemáticos, fazendo com que tal matéria seja de extrema relevância e a seara doutrinária que a envolve seja vasta.

Segundo pesquisa história feita pela SUSEP e disponível no site da autarquia, a atividade seguradora no Brasil teve início com a abertura dos portos ao comércio internacional, em 1808, com o objetivo de realizar seguro marítimo. Neste período, a atividade seguradora era regulada pelas leis portuguesas.

Foi regulada por lei brasileira no Código Comercial de 1850, prestando aos negócios portuários e de exportação a proteção econômica necessária em virtude do seu grande risco, uma vez que envolvia perigo para as grandes fortunas que eram enviadas para o oceano.

Os conceitos dessa época foram se incorporando as novas realidades e até hoje são largamente utilizados pelos juristas e aplicados nos tribunais, além de disciplinarem as relações técnicas, que sofreram grandes influências também das empresas européias de Seguro.

A partir dessa legislação o mercado se seguros no Brasil, bem como as normas que o regem começou a se desenvolver. Várias seguradoras começaram a operar e aos poucos, seguros terrestres, que não eram regulados pelo Código Comercial, também começaram a surgir. Assim, tal atividade começou a se desenvolver cuidando dos transportes, incêndios, danos, etc.

Ressaltando que, o seguro de “vida de uma pessoa livre” era vedado, mas foi autorizada em 1855, sob o fundamento de que o Código Comercial só proibia o seguro de vida quando feito juntamente com o seguro marítimo. Todavia, só foi introduzido na legislação mais tarde com o advento do Código Civil de 1916, momento em que a matéria já se encontrava bem mais consolidada no país com características do Direito das Obrigações e, sendo o Seguro, um dos tipos de contratos nominados desde o início das codificações.

Neste cenário, com a expansão do setor de seguros, várias empresas estrangeiras começaram a operar no mercado brasileiro e em virtude disso, os recursos financeiros obtidos pelos prêmios cobrados eram remitidos para o exterior, provocando uma significativa evasão de divisas. Assim, visando proteger os interesses econômicos do País, foi promulgada, em 5 de setembro de 1895, a Lei n° 294, dispondo exclusivamente sobre as companhias estrangeiras de seguros de vida, determinando que suas reservas técnicas fossem constituídas e tivessem seus recursos aplicados no Brasil, para fazer frente aos riscos aqui assumidos. Algumas empresas estrangeiras mostraram-se discordantes das disposições contidas no referido diploma legal e fecharam suas sucursais. O mercado segurador brasileiro já havia alcançado desenvolvimento satisfatório no final do século XIX. Concorreram para isso, em primeiro lugar, o Código Comercial, estabelecendo as regras necessárias sobre seguros marítimos, aplicadas também para os seguros terrestres e, em segundo lugar, a instalação no Brasil de seguradoras estrangeiras, com vasta experiência em seguros terrestres. (SUSEP- disponível em http:// www.susep.gov.br/menu/a-susep/historia-do-seguro, acesso em 26/03/2014)

A codificação aprimorou-se até que surgiram várias leis especiais, sendo o Decreto-Lei nº 73 de 21/11/1966 a mais importante: criou o Sistema Nacional de Seguros Privados, que é composto pelo Conselho Nacional de Seguros Privados, Superintendência de Seguros Privados, Instituto de Resseguros do Brasil, sociedades autorizadas a operar em seguros privados e pelos corretores habilitados.

Compete ao Conselho Nacional de Seguros Privados, entre outras funções, a de fixar as diretrizes e normas da política de seguros privados, entre outras funções, a de fixar as diretrizes e normas da política de seguros privados, regular a constituição, organização, funcionamento, fiscalização dos que exercem atividades subordinadas ao decreto-lei, bem como aplicação de penalidades.A Superintendência de Seguros Privados – SUSEP é uma entidade autárquica federal, tendo como principal função executar a política traçada pelo Conselho Nacional de Seguros Privados e fiscalizar a constituição, organização, funcionamento das Sociedades Seguradoras.O Instituto de Resseguros do Brasil, atualmente denominado IRB-Brasil Resseguros S/A, é uma entidade de economia mista, cujo capital participam as sociedades seguradoras. O IRB-Brasil mantém sob sua responsabilidade as funções de regulamentação do mercado ressegurador. (ALVIM, 2007. p. 3)

Atualmente, o Código Civil e o Código de Defesa do Consumidor assumem juntamente com atos normativos da SUSEP o papel de regular as relações securitárias.

O Código Civil trata de duas espécies de seguro e estas serão objetos do presente estudo: o seguro de dano e o seguro de pessoa. O primeiro engloba os seguros em relação à coisas, que podem ser móveis ou imóveis e também em relação à responsabilidade civil, que está ligada a cobertura de danos causados por terceiros. O segundo grupo, todavia, trata da cobertura dos seguros de vida e de acidentes pessoais.

O seguro de dano, assim como o de responsabilidade civil, visa atestar ao segurado, até o limite máximo da garantia estipulada e de acordo com as condições do contrato, o pagamento de indenização por prejuízos, devidamente comprovados, que decorram de perdas ou danos causados aos bens segurados e que tenham ocorrido nas condições descritas na apólice.

Os riscos descritos na apólice podem ser amplos, tais como os cobertos por um seguro de saúde, que geralmente engloba uma lista muito grande de doenças, ou seguros restritos como o automotor que protege de furto contra um bem específico.

Cabendo ressaltar que, na hipótese de seguro de vida ou de pessoas, não se admite a transmissibilidade da apólice ou do bilhete, não podendo ser ao portador (Art. 760 do CC).

A garantia do contrato de seguro de dano não pode ultrapassar o valor do interesse do segurado no momento da celebração do contrato, no memento do sinistro nem além do que foi estipulado na apólice, sob pena de enriquecimento ilícito. Isto porque, o objetivo do seguro não é gerar lucro ou renda e sim cobrir eventuais prejuízos que possam ser causados por um sinistro, porém, caso haja mora por parte do segurador em pagar a indenização, esse valor poderá ultrapassar o que foi estipulado (CC, art. 781).

O contrato de seguro não pode ser objeto de lucro para o segurado, já que sua finalidade é garantir um interesse legítimo. O limite fixado por este artigo para a indenização do sinistro, no seguro de dano é, o valor do interesse segurado no momento do sinistro, não podendo ultrapassar o limite máximo da garantia fixado na apólice. No contrato de seguro de dano, a indenização deve corresponder ao real prejuízo do interesse segurado, já que esta indenização não poderá ser maior que a própria coisa segurada; caso contrário, descaracterizaria a finalidade do contrato de seguro. Ocorrendo perda total da coisa, o segurado deve indenizar o segurado pelo valor total estabelecido na apólice. Caso ocorram prejuízos parciais, menores do que o limite fixado na apólice, o segurador ficará responsável somente até o valor apurado. A única hipótese extraordinária de indenização superar o valor da coisa assegurada será no caso de mora do segurador no momento do sinistro. (MACHADO, 2010. p.571-572)

Assim, o Código Civil confere ao segurador o direito de ingressar, até mesmo na esfera penal, contra o segurado quando houver lucro indevido por má-fé. Sendo o dano um prejuízo ou lesão a interesse jurídico, que pode ser patrimonial ou não e deve ser causado por uma ação ou omissão, deve ter um valor compreendido dentro do que foi estabelecido entre as partes.

Da mesma maneira, é abusiva a prática de incluir na apólice um valor, sobre o qual o segurado paga o prêmio, mas recebe por indenização de valor menor, que corresponde ao preço de mercado estipulado pela seguradora, pois caso o prêmio tenha sido calculado sobre um valor maior do que a indenização recebida no momento do sinistro, o segurado possui a prerrogativa de pleitear a devolução da diferença.

Geralmente, o sinistro causa diminuição do patrimônio, podendo acontecer até mesmo por caso fortuito ou força maior, porém para que o dano possa ser indenizado, ou seja, reparado no todo ou em parte, é necessário que ele seja mensurado, certo e real.

No seguro de dano sofrido pelo bem, a garantia prometida não pode ultrapassar o valor do interesse segurado no instante da conclusão do contrato (p. ex., no seguro de veículo, o valor do prêmio e o da indenização basear-se-ão no ano de sua fabricação, no seu estado de conservação e na sua quilometragem, no risco a que está exposto etc.), sob pena de perda do direito à garantia, além de ficar o segurado obrigado ao prêmio vencido. Se a inexatidão na declaração daquele quantum não resultou de má-fé do segurado, o segurador poderá rescindir o contrato ou cobrar, mesmo depois do sinistro, a diferença do prêmio (CC, arts. 778 c/c 766 e parágrafo único). A indenização não poderá ser superior ao valor do interesse segurado no momento do sinistro, e, em caso algum, ao limite máximo da garantia estipulada na apólice (RT, 730:222), exceto se o segurador estiver em mora (ex porsona) (CC, art. 781). (DINIZ, 2012. p. 562-563)

No que tange a boa-fé na celebração do seguro de dano, é preciso que o segurado informe com exatidão as características e condições do bem, e nunca omita dado relevante.

Além disso, o defeito intrínseco da coisa que causar um sinistro, se não for declarado pelo segurado, não será incluído na garantia, ou seja, se o segurado não possuía conhecimento ou não informou sabendo do defeito, este não terá direito a indenização do seguro.

A modalidade de dano preocupa-se em garantir a integridade material, física ou obrigacional do segurado, ou seja, resguardar um bem das eventualidades a que está sujeito.

O risco do seguro de dano engloba até mesmo os prejuízos que são resultados ou conseqüências de estragos ocasionados para evitar o sinistro, minorar o dano ou salvar a coisa, ou seja, o risco compreende todos os prejuízos e estragos que envolvam a situação do sinistro e que estão previstos na apólice.

As partes podem acordar a reposição do bem danificado ou uma indenização que pode corresponder ao valor integral do objeto ou da diminuição do seu valor, assim, na maioria das vezes, o pagamento é feito em pecúnia, mas as partes podem estabelecer a possibilidade de restituição da coisa segurada.

O segurado é responsável por aquilo que deixou de incluir no seguro, ou seja, será considerado segurador de si mesmo dos bens que não transferiu ao segurador no contrato. Isso porque o segurador só pode receber por aquilo que segurou independente do valor se seus prejuízos.

Assim, se celebrar um seguro sobre metade de seu estoque e vier a perder em um incêndio toda mercadoria estocada, a seguradora só será responsável pela metade e, caso tenha segurado integralmente o estoque e, em um incêndio perca apenas a metade, a seguradora não pagará o valor integral do prêmio e sim o valor do dano. Esta cláusula de rateio é prevista no artigo 783 do Código Civil e deve ser proporcional e expressa, mas admite estipulação em contrário.

Outra modalidade securitária regulada pelo Código Civil e que possui grande expressão no mercado brasileiro é a do seguro de responsabilidade civil: por este seguro, o segurado garante o pagamento de perdas e danos devidos pelo segurado a terceiro e “compreende a cobertura ao segurado pelas indenizações que eventualmente seja obrigado a pagar por danos causados a terceiros, resultantes de atos ilícitos, independentemente de ter ou não agidos culposamente.” (GONÇALVES, 2012. p.517)

Também nessa modalidade, tão logo o segurado for informado do sinistro, possui a obrigação de comunicar o mais rápido possível sobre o evento ao segurador para que este possa minimizar as conseqüências. Sendo assim, a omissão injustificada do segurado é causa para eximir a seguradora da responsabilidade por ser violação da boa-fé.

Como o objetivo de tal modalidade é indenizar prejuízos causados por terceiro na responsabilidade do segurador, por exemplo, responsabilidade inerente a uma relação de emprego, o segurado não pode reconhecer ou confessar a ação, tão pouco transigir com o terceiro prejudicado ou indenizá-lo diretamente sem a anuência da seguradora, pois descaracterizaria a finalidade do contrato.

Portanto, caso a vítima do dano ingresse com ação de responsabilidade civil por ato ilícito contra o segurado, este deverá chamar a seguradora a integrar a lide, pois pelo contrato, as conseqüências do sinistro recaem sobre o segurador e a responsabilidade de pagar pelo dano prevalecerá para o segurado perante o terceiro caso o segurador for insolvente.

Não prevalece, portanto, o preceito do art. 70, Inciso III do Código de Processo Civil vigente, acima mencionado. Trata-se de uma norma jurídica genérica aplicável aos contratos. Embora não se conformasse bem com o seguro de responsabilidade civil, vinha sendo adotada nas ações oriundas desse contrato. Com o advento do código atual, os preceitos sobre esse seguro demandaram outra disciplina processual. Antes tinha como certo que o segurador era garantido e o terceiro um estranho ao contrato. Submetia-se, então, à norma comum do aludido art. 70. Agora, o código vigente vincula o lesado pelo ato ilícito como beneficiário da garantia e justifica a ação direta contra o segurador, valendo-se do disposto no art. 46 do Código de Processo Civil, a saber, duas ou mais pessoas podem litigar no mesmo processo em conjunto, ativa ou passivamente, quando:

“Inciso I – entre elas houver comunhão de direitos ou de obrigações relativamente à lide; Inciso II – os direitos ou as obrigações derivarem do mesmo fundamento de fato ou de direito.” Estabelecer-se-á litisconsórcio passivo entre o segurado e o segurador, vinculados pelo contrato. Estão relacionados com o autor da ação: o primeiro, como agente ilícito e o segundo como garantidor da indenização. (ALVIM, 2007. p. 144)

O segurador só poderá ser responsabilizado na medida da cobertura do que for estabelecido em contrato e o segurado apenas se houver parte não coberta. Da mesma maneira, se incorrer em algumas das causas de exclusão de responsabilidade da seguradora, o segurado terá que arcar integralmente com a indenização.

O que o código assegura é o direito de indenização ao terceiro prejudicado, nos termos da apólice. Não é razoável assim que o causador do dano tenha a responsabilidade afastada por força do contrato de seguro, pois a finalidade do seguro é ressarcir o sinistro.

O seguro de responsabilidade civil pode ser obrigatório, ou seja, deve possuir tarifamento do valor e a responsabilidade objetiva: para o pagamento basta a prova do dano.

Por fim, estabelece o art. 788 do Código Civil que, “nos seguros de responsabilidade legalmente obrigatórios, a indenização por sinistro será paga pelo segurador diretamente ao terceiro prejudicado”. O seguro obrigatório constitui medida de reconhecimento e elevado alcance social e, por essa razão, a simples ocorrência do dano, independentemente ao terceiro prejudicado, sem a participação ou indenização diretamente ao terceiro prejudicado, sem a participação ou intermediação de pessoas que possam, eventualmente, dele obter vantagens indevidas. (GONÇALVES, 2012. p. 518)

Assim, a maior característica do seguro de responsabilidade civil obrigatório é que a indenização é paga diretamente ao terceiro prejudicado. Tal medida visa garantir segurança ao terceiro e proíbe qualquer interferência de outras pessoas para que seja garantido o direito ao recebimento da indenização.

São várias as espécies de seguro obrigatório em nossa legislação. Destaca-se o artigo 20 do decreto-lei nº 73/66, regulamentado pelo Decreto n. 61867/76, em que está previsto um rol de espécies de seguro obrigatório, também merecendo destaque o seguro de responsabilidade civil dos proprietários de veículos automotores de vias terrestres, o DPVAT, incluindo nesse rol pela lei n. 6.194, de 19 de dezembro de 1974. O objeto do DPVAT é indenizara vítima de acidentes provocado por veículo em qualquer parte do território nacional, e não o proprietário do veículo que se envolva nesse acidente. O pagamento da indenização será efetuado mediante a prova do acidente e do dano decorrente, independentemente da existência de culpa. Conforme visto anteriormente, o objetivo do DPVAT é indenizar a vítima de acidente (só danos pessoais e não danos materiais causados por colisão, roubo ou furto de veículos) provocado por veículos automotores (não se enquadram nessa categoria de veículos trens, barcos, bicicletas e aeronaves) em qualquer parte do território nacional, independentemente de apuração de culpa, de identificação do veículo ou de outras apurações, desde que haja vítimas, transportadas ou não. As situações cobertas pelo DPVAT, válidas para motoristas, passageiros e pedestres são: indenização por morte, indenização por invalidez permanente e reembolso de despesas médico-hospitalares. (MACHADO, 2010. p. 577-578)

Outra espécie prevista no Código Civil é a do seguro de pessoa, no qual o capital da indenização é estipulado livremente por aquele que propõe e podem ser contratados vários seguros sobre o mesmo interesse, com o mesmo ou diversos seguradores.

Divide-se em seguro de vida, acidentes e saúde, e conseqüentemente, o interesse legítimo pode ser a vida, a integridade física ou a saúde do segurado. O objetivo não a proteção do patrimônio, mas a tranqüilidade financeira do beneficiário nos casos de doença, acidentes ou morte.

No seguro de vida e de saúde, o que se avalia para o pagamento da indenização não é o valor do objeto, ou seja, da vida humana e da saúde, pois é certo que não há como se mensurar o valor da saúde muito menos da vida. Todavia, ao estipular-se uma indenização esta possui caráter compensatório e não reparatório.

O seguro de vida te por objeto garantir, mediante o prêmio que se ajustar, o pagamento de certa soma a determinada ou determinadas pessoas, por morte do segurado, sendo considerado neste caso, seguro de vida propriamente dito. Pode estipular-se, igualmente, o pagamento dessa soma ao próprio segurado, ou terceiro, se aquele sobreviver ao prazo de seu contrato. É o denominado seguro de sobrevivência ou dotal, que também se configura quando o segurado só tiver direito a ele se chegar a certa idade, ou for vivo a certo tempo. Pode-se dizer que o seguro é dotal quando os contraentes ajustam o pagamento do capital ao próprio segurado, após determinado prazo estipulado no contrato; e é ordinário de vida ou seguro de vida propriamente dito quando convencionado que o pagamento será aos herdeiros ou a pessoa designada, por morte do segurado. (GONÇALVES, 2012. p. 520)

Especificamente na modalidade de vida, a mais importante categoria do seguro de pessoas, a duração da vida é referência para cálculo do prêmio devido ao segurador, que se obriga a pagar ao beneficiário um determinado valor, em virtude da morte do segurado ou para o caso de sobreviver por um prazo determinado.

No seguro de vida, o interesse do segurado não é somente egoístico, qual seja, o de permanecer vivo, como também altruístico, no intuito de proteger a família e os entes que lhe estão próximos. No seguro de vida em favor de terceiro, o interesse do contraente é de que ele viva durante a existência do terceiro. Para a determinação do risco a ser coberto pelo segurador na garantia de vida, é necessário que este conheça o estado de saúde do segurado ou do terceiro. Para tal avulta de importância a boa-fé do declarante ao contrair o seguro. Nem sempre a empresa seguradora exigirá exame de saúde, mormente nos seguros de grupo, cuja contratação em massa o torna impraticável. Nesse caso, assume risco mais amplo. (VENOSA, 2004. p. 387-388)

Geralmente, por meio de um prêmio anual, o segurador fica obrigado a pagar certa soma as pessoas indicadas como beneficiárias na apólice. É uma espécie de previdência, e o prêmio pode ser pago durante a vida do segurado, podendo ser parcelado ou por um prazo determinado.

O seguro de vida (individual ou em grupo) que visa garantir riscos relativos à duração da vida da pessoa, podendo ser estipulado pelas partes por duas modalidades: por prazo determinado, sendo o prêmio contratado por prazo ilimitado, e por prazo indeterminado, ou seja, por toda a vida do segurado, sendo o prêmio também estabelecido dessa forma. Por essa razão, se o segurador não receber o prêmio no prazo previsto no contrato de seguro de vida, ele não poderá ser forçado a fazer o pagamento do capital segurado no caso de sinistro. (MACHADO, 2010. p. 583-584)

A falta de pagamento do prêmio nos prazos estipulados é causa de resolução do contrato de seguro de vida, inclusive com a restituição da reserva já formada. Também pode levar a redução do capital garantido proporcionalmente ao prêmio, sendo expressa a limitação no direito de ação do segurador.

Também é lícito, nos termos do artigo 797 do Código Civil, que no seguro de vida seja estipulado um prazo de carência durante o qual o segurador não responderá pela ocorrência do sinistro, porém o artigo não estipula um prazo, podendo este ser fixado de acordo a vontade das partes, mas obriga o segurador a devolver ao beneficiário o montante da reserva técnica.

Reserva técnica é um fundo financeiro que o segurador é obrigado a constituir, mensalmente, independentemente da existência de lucros, com o objetivo de garantir sua estabilidade financeira. Essa reserva é regulamentada por normas específicas, editadas pelos órgãos fiscalizadores da atividade de seguro no país, que exercem fiscalização rigorosa quanto à existência de tal reserva. O valor da reserva técnica, que o segurador é obrigado a devolver ao beneficiário (em se tratando de seguro de vida), é determinado por percentual calculado sobre o prêmio pago pelo segurado. Esse prazo será ajustado pelas partes no contrato de seguro. O STJ já decidiu que este artigo impõe à seguradora, na hipótese de morte do segurado dentro do prazo de carência, a obrigação de restituir a reserva técnica ao beneficiário, sem apontar, contudo, qualquer ressalva quanto à espécie de seguro, em grupo ou individual, não se conferindo ao intérprete proceder a uma intenção restritiva. (MACHADO, 2010, p.585)

A maior característica do seguro de vida é a estipulação em favor de terceiro, o segurado é sempre o estipulante, o segurador o promitente devedor e o beneficiário o terceiro em favor do quem se faz a estipulação.

Importante ressaltar que é lícito que o segurado constitua como beneficiário o companheiro mesmo que ao tempo da celebração estejam separados de fato ou judicialmente (Art. 793 do CC), sendo este ponto importante inovação do Código Civil, pois comunga com as jurisprudências no campo do Direito de Família no que tange aos assuntos ligados à união estável.

Quando o seguro é sobre e a vida dos outros, o proponente é obrigado a declarar, sob pena de incorrer em falsidade, o interesse pela preservação da vida do segurado, sendo presumido o interesse quando o segurado é cônjuge, ascendente ou descendente do proponente e na falta de um desses, o valor do seguro deve ser revertido em prol daquele que provar que a morte do segurado o privou de meios necessários a sobrevivência.

Não há caráter de herança no seguro de vida. O beneficiário não precisa ser herdeiro e a quantia recebida não pode ser utilizada para o pagamento de dívidas, é impenhorável e não sofre incidência de Imposto de Transmissão por Causa Mortis, todavia, as despesas referentes ao próprio prêmio são asseguradas.

A soma estipulada como benefício no seguro de vida ou de acidentes pessoais para o caso de morte não se sujeitará às dívidas do seguro, nem se considerará herança (CC, art. 794), visto que reverterá em favor do beneficiário, não se integrará, portanto ao espólio, nem mesmo poderá ser penhorada. Será considerada nula qualquer transação para o pagamento reduzido do capital segurado (CC, art. 795), em se tratando de seguro de pessoa, evitando-se que a indenização a que faz jus o beneficiário sofra alteração. Aplicando-se os princípios da boa-fé objetiva e da probidade, procura-se tutelar o segurado. Impossível será, além disso, substituir a vontade do falecido segurado. (DINIZ, 2012. P.571)

Qualquer transação que vise diminuição no valor do capital segurado no seguro de vida e acidentes por lesão total ou parcial em decorrência de acidentes é nula. A pessoa beneficiária deve receber o valor exato expresso na apólice.

Caso o segurado venha cometer suicídio nos dois primeiros anos de vigência inicial do contrato ou na sua recondução depois de suspenso, o beneficiário não possuirá direito de receber o capital estipulado, sem prejuízo de receber a reserva técnica. Todavia, é nula qualquer cláusula que venha estipular exclusão da responsabilidade do segurador no caso de suicídio, pois o contrato deve cobrir o suicídio que não é premeditado.

Cabe ao beneficiário provar essa ausência de premeditação, questão que pode ganhar complexidade na prática, razão pela qual muitos defendem caber à seguradora provar em contrário, por ser o suicídio um ato de inconsciência. De qualquer modo, será ineficaz, tida como abusiva, a cláusula que excluir o suicídio da indenização. O novo Código procurou solucionar de forma mais prática e objetiva a questão, estatuindo que o suicídio não gerará indenização, se ocorrido nos dois primeiros anos de vigência inicial do contrato, ou de sua recondução depois de suspenso, permitida esta pelo ordenamento (art. 798). Sob tal prisma, afasta-se a possibilidade de eventual fraude de quem fez o seguro de vida com a intenção precípua de suicidar-se. Esse mesmo art. 798 é expresso no parágrafo único, estatuindo que “ressalvada a hipótese prevista neste artigo, é nula a cláusula contratual que exclui o pagamento do capital por suicídio do segurado” (VENOSA, 2004. p. 399)

Pode ser estipulado por pessoa natural ou jurídica em proveito de grupo que a ele esteja vinculada de alguma maneira, é o chamado seguro pessoal em grupo. O grupo deve existir antes da celebração do contrato e as partes dessa relação são o segurador estipulante, o segurado que é o grupo vinculado ao estipulante e o beneficiário. No Brasil, o seguro pessoal em grupo mais comum é o de vida em grupo.

O novo Código Civil no art. 801, §§ 1º e 2º, contempla o seguro de pessoas, estipulado por pessoa natural ou jurídica em proveito do grupo que a ele, de qualquer modo, se vincula, p. ex. por laços de parentesco ou liames empregatícios. O estipulante (pessoa natural ou jurídica) não é representante do segurador perante o grupo segurado, mas é o único responsável, para com o segurador perante o grupo segurado, mas é o único responsável, para com o segurador, pelo cumprimento das obrigações contratuais assumidas por aquele grupo, inclusive pela arrecadação do prêmio a ser entregue ao segurador. Qualquer modificação feita, nesse grupo, na apólice em vigor dependerá do consenso expresso de três quartos do grupo segurado. (DINIZ, 2012. p. 572)

O seguro de pessoa não garante o reembolso das despesas hospitalares, médicas nem do funeral, pois estas são objeto de seguro de dano.

Como característica do seguro de pessoa, o segurador não pode sub-rogar-se nos direitos e ações do segurado, ou do beneficiário, contra o causador do sinistro em virtude da finalidade do contrato que é garantir a integridade física do segurado. Assim, não pode haver pagamento de dívida do segurado nem indenização por danos patrimoniais.

III – EFICÁCIA E EFETIVIDADE DAS NORMAS DISCIPLINADORAS DO CONTRATO DE SEGURO COMO RELAÇÃO DE CONSUMO NO MERCADO BRASILEIRO

3.1 Os direitos do segurado e o Código de Defesa do Consumidor

O advento do Código de Defesa do Consumidor foi uma previsão da Constituição Federal. A partir de então, a atividade securitária passou a ser considerada um serviço específico e, assim, o seguro se tornou uma relação de consumo quando trata individualmente a relação existente entre o segurado e a seguradora.

 

Portando através da edição do Código de Defesa do Consumidor, o Estado o garante o respeito ao princípio da tutela do contratante débil, como forma de promover a realização da igualdade material. O CDC teve, então, como fundamento para a sua elaboração, este princípio constitucional, reequilibrando as relações contratuais feitas sob égide. [...] Reconhecendo, o legislador, a debilidade de um dos partícipes na relação de consumo, nada mais justo do que, a partir daí, criar para tais relações uma categoria diferenciada, com normas próprias, já que a disciplina prevista para as relações privadas em geral, fundada precipuamente no dogma da autonomia da vontade e no princípio da igualdade formal, em vez de corrigir qualquer desigualdade e equilibrar um contrato, coloca um dos contraentes ainda mais a mercê do poderio econômico do outro.Para criar esta nova categoria de normas de tutela às relações de consumo, que culminou com a elaboração do Código de Defesa do Consumidor, o Estado, já com postura totalmente nova perante à sociedade e às relações intersubjetivas, iniciou mais um capitulo do dirigismo contratual, intervindo nas relações contratuais para garantir que as mesmas fossem feitas com justiça e equilíbrio. (NOVAIS, 2001. p. 88-89)

O objetivo do Código de Defesa do Consumidor (CDC) é minimizar as fraquezas e deficiências existentes nas relações de consumo, para que haja equivalência de direitos entre consumidores e fornecedores, assegurando segurança jurídica nessas relações contratuais.

Isso ocorre porque, mesmo sendo vedado pelo ordenamento jurídico, nos contratos em geral, existem comumente desigualdades entre as partes. Na maioria das vezes, uma parte é vulnerável em relação à outra e assim, não possui forças para discutir o conteúdo do contrato ou não possui meios para fazer com que ele seja cumprido conforme o que foi estipulado.

O contrato de seguro, por tratar-se de uma prestação de serviços específicos, que configura uma relação de consumo formada, de um lado, por um fornecedor de serviços que é a empresa seguradora, nos exatos termos do artigo 3º, § 2º, do Código de Defesa do Consumidor, Lei 8.078/90, e, de outro lado, por um consumidor destinatário final de tais serviços, o segurado, de acordo com o artigo 2º, é regido, indubitavelmente, pelas normas do Código de Defesa do Consumidor, que são de ordem pública e interesse social, conforme prescreve seu artigo 1º, e não podem ser derrogadas mesmo pela vontade das partes. (GOMES, 2003. p.125)

Uma relação de consumo se forma quando o fornecedor e o consumidor celebram um contrato para aquisição de um produto ou utilização de um serviço, como é o caso do seguro. As seguradoras, sob essa visão, são as fornecedoras dos produtos e serviços securitários, uma vez que exercem atividade econômica com habitualidade e de maneira profissional e os segurados, consumidores, pois utilizam dos seguros como destinatários finais.

Assim, por imposição do CDC, além do Código Civil, o segurado possui a prerrogativa de ser considerado hipossuficiente em relação a seguradora, tendo o direito de ver a autonomia da vontade para celebração limitada e o princípio do pacta sunt servanda sempre respeitado, pois as práticas abusivas violam as cláusulas gerais da boa-fé e da função social.

Essas limitações pedem ser observadas quanto à pratica e as cláusulas abusivas que fazem com que os segurados tenham direitos garantidos.

Todavia, por se tratar de uma legislação complexa, sobretudo porque por natureza os contratos de seguro possuem termos técnicos e conceitos próprios, o que permite observar um grande desconhecimento do instituto pela maioria dos consumidores, que assim, fica a mercê das seguradoras que detém grande conhecimento sobre a matéria, deixando os segurados sem nenhuma condição de discutir sobre as cláusulas que regem os contratos de seguro, necessitando da proteção do CDC para isso.

Nota-se, nesse sentido, que as companhias seguradoras, muitas vezes, se valem da posição de inferioridade econômica e técnica do comprador do serviço para obter vantagens pecuniárias ou impor determinadas cláusulas de maneira abusiva. Estas práticas denotam, em geral, abuso da boa-fé do consumidor e são consideradas ilícitas per se, mesmo que não redundem em danos para o consumidor. A supremencionada conduta consiste em procedimentos vexatórios de cobrança, arbitramentos de juros exorbitantes do parcelamento do prêmio, mudança de condições na renovação do contrato com o mesmo interesse segurado para o mesmo risco, arbitramento de indenizações injustificadamente inferiores para danos materiais e morais, falta de prazo para o pagamento de indenizações, etc. É em razão de tais fatos que a atividade securitária está inserida no Código de Defesa do Consumidor, uma vez que reconhecida como prestação de serviços. (MATOS E MOLINA, 2006. p. 57)

O CDC estipula a necessidade do prévio conhecimento do conteúdo do contrato antes da celebração, além disso, veda instrumentos que dificultem a compreensão do mesmo, caso tais hipóteses aconteçam, o consumidor não se obrigará a cumprir o contrato.

São nulas de pleno direito as cláusulas consideradas abusivas pelo CDC, ou seja, aquelas extremamente desvantajosas para o consumidor ou que violem os princípios contratuais da lealdade.

O CDC serve de base para as atitudes que regem a contratação de Seguro, exigindo que se torne indispensável a ciência prévia do seu conteúdo com clareza e destaque em sua redação.

A ciência prévia do conteúdo do contrato tornou-se uma das regras básicas nas relações de consumo, principalmente as que envolvem matéria de seguro, cujo contrato é visto como de adesão, o que impõe ao segurador a cautela de obter do segurado ou de seu corretor legalmente habilitado a declaração expressa do prévio conhecimento das condições da apólice na ocasião da proposta, pois segundo o artigo 46 do Código, os contratos que regulam as relações de consumo não obrigarão os consumidores, se não lhes for dada a oportunidade de tomar conhecimento prévio de seu conteúdo, ou se os respectivos instrumentos forem redigidos de modo a dificultar a compreensão de seu sentido e alcance. Em virtude disso, o segurador, antes de decidir se aceita ou não a proposta do segurado, deve atentar para esta imposição legal de tomar, por escrito, a sua prévia ciência de todo o conteúdo das condições gerais que irão reger a apólice, sob pena de, como consignamos no capítulo anterior, a interpretação desfavorecer quem redigiu o contrato. (KRIGER FILHO, 2000, p. 137-137)

Neste ponto, adentrando no que se refere à interpretação dos contratos, deve-se considerar que o CDC preceitua que as cláusulas contratuais serão interpretadas de maneira mais favorável ao consumidor (Art. 47 do CDC), ou seja, devem favorecer ao aderente caso haja dúvidas.

Esta regra de interpretação se justifica pelo fato de que ao estabelecer as condições do contrato, o proponente se obriga a ser claro e evitar dúvidas.

No caso de eventuais dúvidas a respeito da interpretação dessas cláusulas, prevalecerá sempre o interesse do segurado ou do beneficiário, uma vez que, na maioria das vezes tal contrato é celebrado por adesão e, além disso, é uma prestação de serviços, estando sujeita as normas do CDC.

Também são vedadas as cláusulas que limitem o direito do consumidor que não estejam redigidas de forma clara, sob pena de nulidade da mesma.

As cláusulas abusivas mais comuns nos contratos de seguro são aquelas que determinam ao segurador a faculdade de rescindir o contrato unilateralmente, faculdade de suspender a execução do contrato, ônus da decadência, limitação ao contraente aderente, a exercer sessões, restrição de liberdade com relação à terceiros, prorrogação tácita do contrato, limitação de responsabilidade e competência de foro inadequada.

Como exemplo, cita-se a jurisprudência mineira que tem sido pacífica ao reconhecer os direitos do segurado nas relações de consumo securitário:

EMENTA: APELAÇÃO CÍVEL - CONTRATO DE SEGURO - INDENIZAÇÃO - DÉBITO EM CONTA CORRENTE - CLAÚSULA QUE PREVÊ A SUSPENSÃO AUTOMÁTICA DO CONTRATO EM RAZÃO DO INADIMPLEMENTO DA PARCELA - CLÁUSULA ABUSIVA - NECESSIDADE DE PRÉVIA NOTIFICAÇÃO DO SEGURADO.

A seguradora deveria notificar a segurada acerca da ausência de pagamentos, concedendo-lhe a oportunidade de quitar o débito, ou, ao menos, deveria ter lhe informado acerca da rescisão do contrato. A cláusula de suspensão automática do contrato não pode subsistir, por vulnerar o disposto no art. 51, XI, e § 1º, I e II, do CDC. O princípio da boa-fé objetiva deve prevalecer nos contratos de seguro, pois ficou incontroverso o pagamento regular de várias prestações. (Relator: Des. Marco Aurelio Ferenzini. Data de Julgamento: 27/03/2014. Data da publicação da súmula: 04/04/2014)

No mesmo sentido, sobre a modificação das cláusulas pactuadas, a jurisprudência tem decidido por manter a proporcionalidade entre o prêmio e o capital segurado:

EMENTA: AÇÃO DE REVISÃO DE CONTRATO DE SEGURO CDC - APLICAÇÃO -- MODIFICAÇÃO CLÁUSULAS PACTUADAS - ABUSIVIDADE - VIOLAÇÃO DA BOA FÉ-OBJETIVA - REAJUSTES EXCESSIVOS - PROPORCIONALIDADE ENTRE O PRÊMIO E O CAPITAL SEGURADO - NECESSIDADE - RECURSO NÃO PROVIDO- SENTENÇA MANTIDA.

- Aplica-se o Código de Defesa do Consumidor aos contratos de seguro.

- À luz do CDC, a modificação das condições originalmente pactuadas no contrato de seguro é abusiva, pois coloca o consumidor, que firmou contrato visando segurar-se de riscos indesejados, com a legítima expectativa de manter ao menos a proporção entre o valor pago e o valor a ser recebido, em desvantagem exagerada, em flagrante violação da boa-fé objetiva.

- Caso realmente a seguradora avaliasse estar o contrato desprovido de equilíbrio atuarial, deveria ela reajustar os valores gradativa e suavemente, com a colaboração do consumidor. Assim, com a cooperação mútua, poderia ser atingido o equilíbrio das contas relativas ao seguro, e jamais com reajustes excessivos, unilaterais e, portanto, abusivos.

- Constatada a abusividade da renovação contratual e concluindo-se ser necessária a proporcionalidade entre o prêmio e o capital segurado, urge manter-se a sentença que determinou ao réu que aplicasse os mesmos índices de reajustes nos prêmios para as importâncias seguradas.

- A sentença que entendeu dessa forma deve ser mantida e o recurso não provido. (Relator: Des. Mariângela Meyer. Data de Julgamento: 25/02/2014. Data da publicação da súmula: 14/03/2014)

Para que haja clareza nas tratativas e celebração do seguro, o princípio da informação rege que o serviço oferecido ao consumidor do seguro deve ser especificado corretamente sobre qualidade, quantidade, características, composição, preço, garantia, bem como sobre os riscos que apresenta.

As informações prévias são direitos do segurado, elas interferem diretamente na validade e eficácia do contrato de seguro que vier a ser celebrado.

Assim, o corretor de seguros tem o dever de informar ao consumidor também as desvantagens do futuro contrato a ser celebrado.

Os dados contidos na proposta devem mencionar a natureza dos riscos garantidos assim como todos os dados que possibilitem a avaliação do interesse e os riscos sobre eles incidentes, uma vez que através dessas informações, os segurado e o segurador podem avaliar as vantagens e desvantagens da contratação.

O artigo 30, do CDC, dispõe que toda informação ou publicidade, suficientemente precisa veiculada por qualquer forma ou meio de comunicação com relação a produtos e serviços oferecidos ou apresentados, obriga o fornecedor que a fizer veicular ou dela se utilizar e integra o contrato que vier a ser celebrado.

Há tese jurídica que se direciona para outro rumo, entendendo que as relações jurídicas entre segurador, estipulante e segurado não seriam de consumo, porque as relações securitárias só poderiam ser reguladas por lei complementar e não por lei ordinária, tal qual o Código de Defesa do Consumidor. A questão, inclusive, foi posta sob julgamento perante o Supremo Tribunal Federal, na ADIn nº 2.591 levada a debate pela Confederação Nacional do Sistema Financeiro (CONSIF), que pretendeu ver declarado inconstitucional o parágrafo 2º, do artigo 3º, do CDC, porém, sem êxito. (BELLUCI, 2010. p. 80)

O direito tem como uma de suas principais características a interpretação das normas legais apresentadas pelo legislador, qualquer lei está suscetível a interpretações, argumentações e críticas, e esse é o caso do CDC no que diz respeito a sua abrangência, pois a maioria das matérias reguladas por ele, já estava positivada em outras legislações, como é o caso do seguro no Código Civil.

Considerando o previsto no artigo 6º, podemos vislumbrar que, atualmente, nas relações de seguro restam garantidos aos segurados, além dos normais à própria natureza do contrato, os seguintes direitos básicos: a) educação sobre a correta utilização do seguro contratado, asseguradas a sua liberdade de escolha e igualdade na contratação; b) informação adequada e clara sobre o seu conteúdo; c) proteção contra publicidade enganosa e métodos comerciais coercitivos e desleais; d) proteção contra práticas e cláusulas abusivas ou impostas; e) efetiva prevenção e reparação de danos morais e patrimoniais e d) facilitação da defesa de seus direitos, inclusive com inversão do ônus da prova a seu favor, quando a critério do juiz, for verossímil a sua alegação ou for ele hipossufi–ciente, segundo as regras ordinárias da experiência. (KRIGER FILHO, 2000. p. 141)

Assim, desde que o CDC passou a regular a matéria securitária no que tange as relações de consumo, pode-se inferir que a ciência prévia do conteúdo do contrato e a clareza na sua redação envolvem duas regras básicas para a celebração de acordo as normas de proteção ao consumidor para que sejam também respeitadas as cláusulas gerais da boa-fé e da função social dos contratos.

As cláusulas limitativas nos contratos de seguro, ou seja, aquelas que limitam os direitos do consumidor, mas não são abusivas, estas por não serem proibidas, também devem estar expressas de maneira clara ao consumidor, pois essas cláusulas são comuns nos seguros devido à sua natureza de risco para que as contratações possam ser viabilizadas.

3.2 O Mercado Segurador face o desconhecimento do consumidor brasileiro – validade e eficácia das normas disciplinadoras do seguro

No Brasil, a necessidade de proteção em relação a eventos que geram prejuízos, nunca foi tão evidente quanto nos últimos anos: os desafios e o estilo da vida moderna trazem riscos cada vez maiores para as atividades desenvolvidas pelo homem.

Para evitar que os danos causados por eventos incertos gerem perdas materiais, o seguro oferece ressarcimento e por isso protege aquele que o contrata de prejuízos que poderiam levá-lo ao desamparo econômico e até mesmo a ruína.

O Brasil possui um sistema financeiro bem organizado. Como já mencionado, o SUSEP é o órgão de controle e fiscalização do mercado de seguros, que aqui pode ser conceituado como o conjunto de instituições e práticas que no dia-a-dia fazem com que a atividade securitária se desenvolva, ou seja, é o campo de atuação dos negócios de seguro.

Justamente pela solidez do sistema financeiro brasileiro, no qual se inserem as atividades securitárias, nas últimas décadas, as seguradoras têm visto o país como um dos mais atraentes mercados do mundo, aliado também a inovação tecnológica e a melhoria da qualidade de vida da população.

A estabilidade econômica do país faz com que os consumidores tenham como se planejar financeiramente, assim como as empresas que podem investir a longo prazo em ações que possibilitem o seu desenvolvimento.

Por isso, cada vez mais investem em ofertas e diversidade de serviços, ampliando cada vez mais sua área de atuação, inclusive nas camadas de menos poder aquisitivo da sociedade brasileira, uma vez que o pai se encontra em um momento promissor da economia.

Assim, as empresas oferecem seguros de contratação rápida e valores módicos para eventos como perda e roubo de produtos de pequeno valor, indenizações no caso de desemprego, pequenas reformas do lar e até mesmo pequenos seguros de vida.

Porém, apesar do mercado de seguros brasileiro mostrar-se em crescimento, acompanhando a modernização dessas relações (pois a assunção do risco tornou-se um negócio de muito êxito), ainda há grande resistência da parte dos consumidores em firmar um contrato de seguro, este sucesso e desenvolvimento não vem acompanhado de instrução e o consumidor muitas vezes é lesado em virtude do seu desconhecimento ou até mesmo não se interessa em contratar o seguro e se o faz, não o faz da melhor maneira possível.

A SUSEP divulga todos os anos dados que traduzem o andamento do mercado brasileiro de seguros. A última divulgação sobre o período de janeiro a novembro de 2013, disponível no site da autarquia, mostrou que o faturamento do mercado legal regulado pela autarquia, tece acrescimento de 13,3% em relação ao mesmo período do ano de 2012, todavia, esse crescimento não foi tão expressivo como em 2012, que avançou 21,7% em relação ao mesmo período do ano de 2011.

O faturamento dos seguros de pessoas mostrou nesse período de 2013, acréscimo de 8,4% em relação a 2012, novamente abaixo dos 27,7% de 2012 em relação ao ano de 2011.

Esse decréscimo está ligado às regulamentações financeiras modificadas, as altas nos preços das apólices e altas nos juros. O que demonstra que para se contratar um seguro, os preços dos mesmos e as condições financeiras do segurado em relação ao momento econômico do país também são fatores decisivos.

Apesar disso, os seguros de vida individual, vida coletivo tiveram acréscimo de 24,4% e 13,6%. As contribuições a planos tradicionais tiveram alta de 6,5% no período e a arrecadação de prêmios de seguros gerais cresceu 18,5% no período mencionado de 2013 sobre o de 2012, expansão maior que expansão que a de 2012 sobre 2011, que foi de 13,1%.

Os dados mais relevantes foram do setor de seguros de automóveis, no qual, o faturamento cresceu 18,7% sobre 2012, percentual que se compara favoravelmente aos 16,2% de 2012 sobre 2011.

Dado notório tendo em vista a melhoria do poder aquisitivo do brasileiro, aliado as facilidades de financiamento e redução de impostos para compra de automóveis, o que também demonstra que o consumidor está preocupado em proteger o patrimônio adquirido e por isso contrata o seguro.

Porém, as vendas de automóveis em 2013 não superaram marcas histórias e o faturamento das seguradoras provavelmente se deu em virtude do aumento nos preços dos seguros, dado preocupante, pois o consumidor não tem adquirido quantidade expressiva de seguros e pago um preço mais alto quando contrata.

Mesmo sendo claro que o consumidor brasileiro está cada vez mais informado a respeito dos seus direitos e deveres, a complexidade das normas que regem os seguros, aliado ao desconhecimento técnico da população tem gerado muitos problemas que podem ser detectados no universo jurisprudencial de soluções de conflitos no que diz respeito à matéria securitária.

O CDC cuida dessas relações, apesar de não regular os elementos do contrato de seguro, mas serve de subsídio para o amparo do consumidor ao dirimir conflitos advindos da matéria. O contrato de seguro possui peculiaridades e muitos termos de natureza técnica desconhecidos por grande parte da população brasileira que, na maioria das vezes, não o celebra por desconhecimento dos seus benefícios e da sua sistemática.

Além disso, o desconhecimento dá lugar a inobservância da boa-fé e da função social, pois muitas vezes as seguradoras colocam entraves para tornarem acessíveis os benefícios dos seguros aos consumidores e tornar clara a relação. Seguros embutidos em vendas, endividamento, prejuízos ao resgatar o valor do prêmio são alguns exemplos de situações causadas pela desinformação daqueles que firmam os contratos.

A noção de mutualidade deve estar presente na consciência do consumidor ao contratar um seguro. Apesar disso, na maioria das vezes, quando preenchem suas propostas e respondem aos questionários de adesão, os segurados não conseguem compreender o aspecto solidário do seguro e não se atentam para o fato de que os valores pagos nos prêmios são inferiores aos valores dos bens segurados no momento da contratação.

Ao compreender a mutualidade, é possível perceber quando o seguro esta sendo desfavorável para o consumidor, mas também quando as atitudes do segurado prejudicaram o segurador. É comum que os segurados de automóveis façam reparos em oficinas não autorizadas pelas seguradoras, pois entendem que tais estipulações da seguradora ao escolher o local de reparo são apenas formas de tolher a sua liberdade de escolha, sem ponderar os reais motivos das restrições.

Tais práticas são reflexos de uma consciência individual dos consumidores, na qual o dever de abster-se de praticar atitudes que prejudiquem a seguradora não está presente.

Quando isso acontece, há impacto no contrato, pois não há controle para minimizar os riscos e a seguradora fica em posição de desvantagem e se vê no direito de até mesmo rescindir o contrato.

Muitos aspectos do contrato de seguro não são compreendidos adequadamente pelos segurados e são confundidos com busca por lucro e má-fé da seguradora que na maioria das vezes está apenas exercendo o caráter técnico do contrato de seguro, como análise das possibilidades de ocorrência do risco e fixação do premio de acordo a sua ocorrência.

Outra questão corriqueira é falta de conhecimento da natureza aleatória do contrato. Muitas vezes o segurado não entende que o preço que paga pela proteção é independe da ocorrência do risco.

 

É por isso que não faz sentido quando um segurado diz que pagou o seguro durante anos e nunca usou e, com essa frase, deixa trair uma ponta de insatisfação por pagar por algo que não usou. Em verdade, seguro não é para ser utilizado! Seguro é planejamento contra riscos que podem afetar o patrimônio e a estabilidade de vida das pessoas. Quanto menos utilizado, mais sadia e feliz a vida em sociedade. Além disso, é preciso lembrar que o segurado utiliza o seguro diariamente, embora não na forma de pagamento de indenizações. Pagar indenização é apenas uma das tarefas legais de uma sociedade seguradora. Mas existem muitas outras que, apesar de pouco comentadas e estudadas, são as que efetivamente garantem o pagamento das indenizações quando isso é necessário.Como toda empresa privada, as seguradoras têm por primeira obrigação organizar bens e pessoas para obter a empresariabilidade de sua atividade-fim. No caso das empresas dessa área, é preciso contratar pessoal técnico capaz de efetuar cálculos atuariais a partir do estudo de estatísticas e probabilidades; é preciso contratar pessoas que saibam estudar riscos para definir corretamente as modalidades de contratação; é preciso, enfim, dar conta de todas as necessidades técnicas, comerciais e administrativas para que a companhia se coloque em condições de atuar no mercado de forma eficiente. Além disso, a sociedade seguradora deve atender a todas as regras determinadas pelo setor de regulamentação e fiscalização, em especial as regras de solvência, o que a obriga a contratar corpo técnico especializado em aplicações que cumpram a tarefa de garantir rentabilidade aos fundos administrados, com riscos mínimos de perda.Organizar a atividade empresarial e manter essa atividade em funcionamento com eficiência e bons resultados é o trabalho primordial das empresas de seguro. Pagar indenizações para segurados cujos riscos se materializaram durante a vigência do contrato é apenas uma de suas atividades.Assim, durante os anos em que um segurado paga seguro e não sofre nenhum dano passível de indenização ele não está deixando de utilizar o seguro. Ao contrário, está pagando valores que permitem à sociedade seguradora organizar e administrar sua atividade-fim, indenizando milhares de outros segurados, aplicando corretamente os fundos arrecadados a partir dos valores de prêmio recolhidos e analisando estatísticas e probabilidades que permitam aprimorar os contratos de seguro. Enfim, o segurado está pagando para que a atividade securitária seja eficiente, atualizada e confiável. É por isso que quando se trata de educar para o consumo de seguro, a primeira lição deve ser o pertencimento à mutualidade, a contratação de seguro como ingresso em um universo fechado, composto por outros segurados que têm os mesmos objetivos e, que esperam uns dos outros um comportamento de mais estrita boa fé, para que não seja necessário sangrar o fundo comum com pagamentos indevidos. (CALINI, 2010. Disponível em http://cadernosdeseguro.funenseg.org.br/secao.php?materia=384, acesso em 01/04/2014)

As informações claras e precisas a respeito do conteúdo do contrato de seguro possibilitam que o segurado tenha amplo conhecimento a respeito da natureza e condições do mesmo para que não incorra em vício de consentimento ou venha a desrespeitar o que foi pactuado, gerando quebra no contrato causando diminuição ou perda dos seus direitos.

Quando há um correto esclarecimento sobre a utilização do seguro, o segurado se eleva da simples condição de consumidor contratante para o patamar de parceiro colaborador, com objetivo de aprimorar o negócio e conseqüentemente o mercado securitário, sendo claro que a confiança e lealdade são uma das bases do sucesso da atividade securitária.

É o princípio básico da confiança, instituído pelo CDC para garantir ao consumidor a adequação do produto e do serviço, para evitar risco e prejuízos oriundos dos produtos e serviços, para assegurar o ressarcimento do consumidor, em caso de insolvência, de abuso, desvio da pessoa jurídica-fornecedora, para regular também alguns aspectos da inexecução contratual do próprio consumidor (MARQUES, 2005. p. 1145)

Como já mencionado, no mercado securitário deve imperar os princípios da honestidade, lealdade, boa-fé para que os direitos dos que nele estão inseridos não sejam prejudicados por prática de condutas nocivas em virtude do desconhecimento das normas que disciplinam o seguro.

Assim, o conflito surge quando os interesses do segurador, que necessita limitar os riscos para viabilizar as indenizações vão de encontro com os do segurado, que muitas vezes não tem conhecimento das cláusulas limitativas, ou de sua correta extensão, ou a má redação ou a obscuridade das cláusulas contratuais que causam este desconhecimento ou incorreto conhecimento ao segurado.

Para solucionar tal questão, o segurador é obrigado a esclarecer para o segurado todas as condições do contrato e fazer constar na apólice, com clareza e destaque, todas as informações referentes à vigência, valor, parcelas do prêmio, vencimentos, os riscos cobertos, e até mesmo os excluídos, sob pena de, como já mencionado, das omissões e dúvidas serem interpretadas contra quem instituiu a cláusula irregular.

Quando há uma omissão de informações que cause prejuízo ao segurado, a intervenção do judiciário é a solução perfeitamente aplicável para proceder a interpretação das cláusulas confusas do seguro.

Assim, a eficácia e a efetividade das normas que disciplinam a matéria de seguros, sejam elas dispostas na Constituição Federal, no Código Civil ou em legislações especiais como o CDC ou nos regulamentos da SUSEP, traduzem em sancionar os abusos, proibir a prática de entraves para o cumprimento do contrato, e respeito da boa-fé e função social do mesmo.

Neste aspecto, o direito consumerista agrega a teoria geral dos contratos valores formas que possibilitem que as normas sejam aplicadas de maneira efetiva, priorizando a defesa do consumidor sem invalidar o que está disposto no Código Civil.

3.3 O perfil do segurado brasileiro e a importância do contrato de seguro para a sociedade

Com o aumento do poder de consumo de parte significativa da população, especialmente da nova classe média, nota-se que há por parte dos consumidores uma grande preocupação em preservar os bens adquiridos e garantir segurança financeira para o futuro de suas famílias.

A expansão das contratações, todavia, não está sendo acompanhada da educação para o consumo. Como reflexo de tal situação, os consumidores cada vez mais lotam o judiciário de questões relativas a problemas nos contratos causados por dúvidas de interpretações e desconhecimento das cláusulas e da legislação securitária.

A importância sócio-econômica dos contratos de seguro é refletida na imensa quantidade de contratações de diversas modalidades, pois estes garantem aos seus consumidores tranqüilidade e segurança, caso ocorra o sinistro coberto, o prejuízo que teria o segurado deve ser suportado pela seguradora, pois com o recebimento dos prêmios de seus segurados, este forma um fundo que propicia o pagamento das indenizações.

Como o sinistro, temido e protegido pelo seguro, geralmente causa decréscimo do patrimônio ou quando causa morte, pode levar alguém a situação de desamparo financeiro, o seguro nada mais é que uma forma de gerenciar o risco quando este não pode ser evitado e assim pode garantir a quem o contrata uma forma de proteção financeira.

Os contratos de seguro, ao lado de outros tantos, tornaram-se os principais responsáveis pela evolução jurisprudencial e legal voltada à conscientização sobre a necessidade de se conceber um direito mais social aplicado aos contratos, um direito mais comprometido com a eqüidade e menos influenciado pelo dogma da autonomia da vontade, realidade que trata iguais os desiguais. As linhas gerais, asseguradas pela jurisprudência pátria ao consumidor, na interpretação, em matéria de seguros, demonstram a implementação de uma tutela especial àquele contratante que se encontra subjetivamente em posição mais vulnerável na relação contratual securitária, agora instrumentalizada nas normas do Código de Defesa do Consumidor. (GOMES, 2003. p. 126)

O mercado segurador brasileiro passa por um momento histórico de expansão que é fruto do bom momento econômico e da abertura do consumidor ao entendimento da importância de se prevenir de eventuais danos causados por riscos indesejáveis.

Não se pense, porém, que o seguro envolve apenas um segurador, um segurado e a emissão de uma apólice.Ao contrário do que pode parecer, o seguro jamais se apresenta em face do segurador como um contrato isolado, mas possui em seu mecanismo de funcionamento elementos que bem demonstram o alto interesse social e humano com que se reveste este negócio. Antes de mais nada, necessário se faz entender que não é a empresa seguradora quem, por si só, assume o risco de pagar indenização pelo sinistro, mas é ela apenas uma intermediária que, recolhendo os prêmios pagos por um grupo de segurados, todos sujeitos a riscos comuns, usa deste montante para pagar as eventuais indenizações relativas aos sinistros ocorridos, havendo, pois, numa relação de seguro, uma verdadeira mutualidade de segurados, de tal modo que, quando paga uma indenização, não é o dinheiro do segurado per se stante que é utilizado, mas o do grupo de segurados por ela abraçados. (KRIGER, 2000. p. 17)

O seguro oferece garantia. Em virtude disso, se torna um instrumento essencial para o desenvolvimento social e econômico na medida em que se torna um instrumento de amparo e possui capacidade de realiza um negócio retributivo e benéfico para ambas as partes.

Atualmente a função social do seguro toma ares de verdadeira utilidade pública, uma vez que movimenta a economia e forma fundos comuns que geram segurança, tranqüilidade e bem-estar para os consumidores envolvidos nas relações securitárias.

Assim, é cada vez mais comum a intervenção do Estado nas relações securitárias, seja através de legislações sobre a matéria ou através da intervenção do judiciário para que o seguro possa ser uma forma de desenvolvimento social.

É capaz de proporcionar a redução dos prejuízos econômicos a eles associados, permite a utilização do contrato como ferramenta para a redução de capital necessário para realização de atividades econômicas. Permite a diminuição dos prejuízos baseado na mutualidade, possui aspectos social por influencia diretamente na economia do país e na vida financeira dos envolvidos.

O contrato de seguro é certamente um dos contratos mais importantes para a economia de um país, possui a função de prevenir danos e efeitos negativos causados pelos riscos que acometem freqüentemente as pessoas e as empresas.

Devido sua importância social, um simples erro de interpretação no contrato de seguro pode gerar um grande desequilíbrio na relação de mutualidade que envolve o mesmo e gerar alterações nos valores estipulados e causar para o consumidor grandes dificuldades para contratar um seguro. Por isso, a tarefa do CDC é renovar as relações securitárias e garantir ao consumidor o respeito a boa-fé, e efetivando a proteção da parte vulnerável da relação.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

No decorrer do presente artigo, verificou-se que o contrato de seguro ocupa lugar de destaque na sociedade brasileira tendo em vista a proteção que o mesmo oferece às pessoas que sofrem danos pessoais ou patrimoniais.

Apesar disso, o contrato de seguro ainda não é muito apreciado pelos consumidores que desacreditam na possibilidade de um dano, não possuem condições financeiras ou não entenderam a mutualidade da relação, na qual se verifica que é mais vantajoso pagar o valor do prêmio que suportar individualmente o dano causado pelo sinistro.

Todavia, quando o consumidor entende a importância do seguro e se dispõe a contratá-lo, acaba se deparando com a dificuldade técnica que envolve a matéria e este desconhecimento abre espaço para que ele acabe sendo prejudicado na relação.

Muitas vezes, essas complicações e detalhes fazem com que surjam no contrato cláusulas abusivas impostas pela seguradora que não respeita as disposições legais para celebrar o contrato, muito menos para executá-lo.

Com este tipo de procedimento, ou seja, a falta de interesse e condições para conhecer as condições estipuladas, o consumidor passa somente a ter conhecimento do que foi contratado, das garantias cobertas e como deve proceder quando ocorre um sinistro, o que gera desconforto e reclamações, que são ditadas exclusivamente pelas seguradoras.

Assim, para gerar o próprio estímulo na contratação e despertar a cultura de seguros é necessário que o consumidor se informe de seus direitos e busque o judiciário para mediação de conflitos e desrespeito as normas, além de cumprir sua parte no que diz respeito à boa-fé durante todas as fases da relação securitária.

Em contrapartida, a própria seguradora deve obrigar-se a proceder mediante a boa-fé e lealdade para que ao mostrar ao consumidor de forma clara os aspectos contratuais da relação, uma vez que detém o conhecimento técnico, este possa ingressar com confiança na relação e despertar para o consumo consciente dos seguros.

Conclui-se que existem atualmente normas jurídicas suficientes para garantir seguranças as relações securitárias. A Constituição Federal, o CDC e Código Civil, sem dúvida, são aptos a regular o consumo de seguros e promover justiça, porém a boa-fé e a função social são pressupostos para que a efetividade e eficácia das normas sejam respeitadas.

 

 

 


 

  • SEGUROS
  • BOA-FÉ
  • CONTATOS
  • CDC
  • FUNÇÃO SOCIAL

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Roberta Ortiga

Advogado - Montes Claros, MG


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