Aspectos da redução da maioridade penal sob o prisma da inimputabilidade como cláusula pétrea, argumentos favoráveis e contras e políticas públicas


20/08/2015 às 09h56
Por Advogado Rafael Valetim Milanez

Aspectos da redução da maioridade penal sob o prisma da inimputabilidade como cláusula pétrea, argumentos favoráveis e contras e políticas públicas

Rafael Valentim Milanez

Curso de Mestrado – Universidade Metodista de Piracicaba

Introdução

Em nossa legislação o marco definidor da capacidade do indivíduo para exercício de forma plena dos direitos e garantias legais, para contrair obrigações e deveres, é no exato momento em que completa 18 anos de idade, isto é, atinge a maioridade.

Referida idade é determinada em razão de entender-se que a pessoa já possui o condão de perceber, raciocinar e se comportar de maneira plausível na sociedade, em outras palavras, reúne condições de autodeterminar e impulsionar sua própria vida de maneira independente, sabendo dos riscos de seus atos.

Na esfera criminal o marco definidor da maioridade penal é o mesmo da imputabilidade penal, ou seja, aos 18 anos de idade, conforme disposição do artigo 228 da Constituição Federal. Os menores de dezoito anos respondem por ato infracional nos termos do Estatuto da Criança e do Adolescente, pois é este regulamento que prevê sanções aos inimputáveis menores de 18 anos.

A imputabilidade penal, por seu turno, não está vinculada à maioridade civil, nem com qualquer outra legislação, sendo facultado ao legislador, se o caso, aumenta-la ou diminui-la, pois a Constituição apenas proíbe a redução abaixo de 18 anos.

Assim, com o advento da Carta Magna de 1988, a inimputabilidade penal é elevada à condição de garantia constitucional por força do artigo 228 da Constituição Federal, portanto, vedada qualquer alteração na esfera infraconstitucional.

Alguns sustentam ser direito e garantia individual, amparados, ainda, pelo parágrafo 4º do artigo 60, da Constituição Federal, portanto, não podendo ser alterado por emenda à Constituição.

Contudo, atualmente, está em pauta legislativa algumas propostas de emendas constitucionais visando a redução da maioridade penal para a idade de 16 anos, gerando debates e opiniões totalmente diversas desde as casas legislativas até nos ambientes sociais. Os que são a favor apresentam uma gama relevante de argumentos, enquanto os que são contra, da mesma forma, oferecem justificativas proeminentes, portanto, trata-se de assunto que envolve políticas públicas e muito estudo e debate antes de qualquer decisão, tendo em vista que o resultado dependerá de prestações efetivas da administração e esta pode não ter condições de suportar.

Artigo 228 da Constituição Federal é cláusula pétrea? Argumento contrário à redução da maioridade penal

Indaga-se, primeiramente, se deve ponderar o artigo 228 como um direito e garantia individual fundamental. Pois, se partirmos do ponto de considera-lo como tal, sob a interpretação literal do texto constitucional, torna-se evidente a impossibilidade de alteração, com base no parágrafo 4º do artigo 60 da Constituição Federal2 , em virtude de seu caráter de cláusula pétrea.

Em razão de não estar previsto no Título II “Dos Direitos e Garantias Fundamentais” em seu Capítulo I “Dos Direitos e Deveres Individuais e Coletivos”, haveria a possibilidade de não se enquadrar como fundamental. No entanto, é pacífico o entendimento de que os direitos fundamentais sejam eles individuais ou coletivos, são classificados em dois critérios. No critério formal seriam os direitos com previsão expressa no título II acima mencionado. Pelo critério material, os direitos fundamentais estariam previstos no conteúdo dos demais artigos da Constituição. E mais, com fulcro no parágrafo 2º do artigo 5 da Carta Magna" Os direitos e garantias expressos nesta Constituição não excluem outros decorrentes do regime e dos princípios por ela adotados, ou dos tratados internacionais em que a República Federativa do Brasil seja parte". Destarte, o teor deste parágrafo traduz certezas de que a própria Constituição Federal admite e garante direitos fundamentais que se encerram em seu corpo fora do artigo 5º, ratificando que este o rol não é exaustivo, além dos direitos previstos nos tratados internacionais firmados pelo Brasil.

É majoritário esse entendimento pelo fato de os direitos fundamentais, em tese, serem sempre benéficos aos indivíduos, recebendo proteção legal, uma vez que,

"Refere-se a princípios que resumem a concepção do mundo e informam a ideologia política de cada ordenamento jurídico, é reservada para designar, no nível do direito positivo, aquelas prorrogativas e instituições que ele concretiza em garantias de uma convivência digna, livre e igual de todas as pessoas. No qualitativo fundamentais acha-se a indicação de que se trata de situações jurídicas sem as quais a pessoa humana não se realiza, não convive e, às vezes, nem mesmo sobrevive; fundamentais do homem no sentido de que a todos, por igual, devem ser, não apenas formalmente reconhecidos, mas concreta e materialmente efetivados. Do homem, não como o macho da espécie, mas no sentido de pessoa humana. Direitos fundamentais do homem significa direitos fundamentais da pessoa humana ou direitos fundamentais." (José Afonso da Silva, 2013).

Em poucas palavras, referidos direitos fundamentais são garantias aos cidadãos que limitam e determinam a atuação Estatal e dos próprios indivíduos com a finalidade de promover o bem social resguardando a dignidade da pessoa humana. 2 § 4º Não será objeto de deliberação a proposta de emenda tendente a abolir: IV - os direitos e garantias individuais.

Evidentemente, o argumento de alguns que defendem a redução da maioridade penal, afirmam que o artigo 228 não é cláusula pétrea, uma vez que seu conteúdo não é equivalente a direito fundamental.

Entretanto, a disposição legal em questão estra inserida Título VIII “Da Ordem Social”, em seu Capítulo VII: “Da família, da criança, do adolescente, do jovem e do idoso”. Por conseguinte, trata-se de direitos extremamente importantes, o sistema de proteção aí instaurado, se inserem no “mínimo existencial” a ser observado pelo Estado, pois trata de questões de saúde, cultura, educação, meio ambiente, família.

E mais, argumenta-se, ainda, que mesmo sendo o artigo 228 cláusula pétrea da Carta Magna, não haveria violação artigo 60, §4º, pois a intenção da emenda à constituição é no sentido de modificação do teor, e não de exclusão ou eliminação do citado artigo, com a consequente, abolição da inimputabilidade.

No entanto, tal afirmação carece de credibilidade jurídica, pois é indubitável que os direitos fundamentais possuem caráter de cláusulas pétreas, e jamais podem ser reduzidos, ou seja, somente haverá possibilidade de ampliação e constituição de novos direitos, pois são conquistas sociais durante o caminhar da sociedade, sob pena de ir à contramão do princípio da vedação ao retrocesso social.

"Concebe-se a inimputabilidade como uma das garantias fundamentais da pessoa humana, embora topograficamente não esteja incluída no respectivo Título (II) da Constituição que regula a matéria. Trata-se de um dos direitos individuais inerentes à relação do artigo 5º, caracterizando, assim, uma cláusula pétrea. Consequentemente, a garantia não pode ser objeto de emenda constitucional visando à sua abolição para reduzir a capacidade penal em limite inferior de idade – 16 anos, por exemplo, como se tem cogitado. A isso se opõe a regra do parágrafo 4º, IV, do artigo 60 da CF."(Dotti, René Ariel. Curso de Direito Penal – Parte Geral, pp. 412-413. Citado por José Afonso da Silva. Comentário contextual à Constituição. 2ª edição. Ed. Malheiros: São Paulo, 2006.)

Aduzem os partidários contra a redução que foi a intenção do legislador originário prescrever com clareza a determinação da idade penal, situado no plano constitucional. Justificam, também, de modo comparativo, o fato da proibição da aplicação da pena de morte ou de prisão perpétua, como garantias dos cidadãos. Sendo assim um leque de proteção aos indivíduos da atuação penal, a qual sempre deve ser a ultima ratio do sistema.

Neste diapasão, pode-se dizer que artigo 228 é uma garantia aos menores de 18 anos de não serem responsabilizados criminalmente nos termos do Código Penal, evitando maiores problemas, justamente em razão da sua condição pessoal de estar em desenvolvimento físico, mental, espiritual, emocional e social. Devendo ser constituído um regulamento especial para tratar das infrações cometidas por menores, conforme se afere da parte final do artigo 228, a qual é feita pelo Estatuto da Criança e do Adolescente.

Portanto, os menores estariam diante de uma responsabilização de ordem especial, como tutela de seus direitos subjetivos e indiretamente de liberdade e desenvolvimento pessoal e social, consubstanciado em cláusula pétrea, sendo que qualquer emenda tendente a abolir do texto constitucional a fixação da idade penal ou a que pretenda reduzir a idade de responsabilização penal, será flagrantemente inconstitucional e vedada expressamente pelo artigo 60, § 4º, IV, da Constituição Federal.

Argumentos contra a redução da maioridade penal

O debate da redução é de grande escala, diversos grupos, ongs e demais organizações se manifestam, especialmente pela internet, expondo seus argumentos e até comparecem nas votações no Congresso Nacional.

Merece destaque o Movimento do Ministério Público Democrático, associação civil sem fins econômicos nem corporativos, de âmbito nacional, que congrega membros do Ministério Público da ativa e aposentados, isto é, instituição que trabalha com menores infratores, vindo a público externar sua total contrariedade à redução da maioridade penal, especialmente aos termos da PEC 171, que propõe a redução da idade mínima para a responsabilização penal e que foi rejeitada na Câmara Federal.

Apresentam 7 argumentos que, pode-se dizer, abrangem, até mesmo, em outras palavras, os apontamentos expostos pelos que se posicionam de forma contrária à redução da idade penal, os quais seguem abaixo:

1. A idade penal mínima prevista no art. 228 da Constituição da República é considerada cláusula pétrea, integrando o núcleo irreformável da Carta Magna, sendo, portanto, imutável via proposta de emenda constitucional.

2. O patamar etário de 18 anos é estabelecido fundamentalmente por força de decisão de política criminal, não obstante o amadurecimento crescente de alguns segmentos da população e sua progressiva conscientização em relação ao caráter criminoso de certas condutas.

3. A criminologia tem demonstrado que a pura e simples expansão do direito penal não é eficaz para a redução da criminalidade, especialmente quando visa satisfazer o clamor público e o desejo de vingança social, o que afeta a arquitetura normativa e pode caracterizar demagogia penal e agudizar ainda mais o quadro de desigualdade social, aprisionando e punindo criminalmente um número ainda maior de pessoas pobres, com grandes dificuldades de acesso à justiça.

4. A justificativa da criminalidade crescente atribuída aos adolescentes, responsáveis por menos de 1% dos homicídios cometidos no país, é descabida e visa indevidamente responsabilizar o jovem pelo fracasso do Estado nas ações preventivas, que sequer cumpre o comando da prioridade absoluta, inclusive orçamentária, no tocante à efetivação de políticas públicas realizadoras de direitos fundamentais

5. Chama a atenção que, neste momento de crise de imagem do Congresso Nacional e Presidência da República, mesmo em meio a tantas carências sociais e políticas públicas não concretizadas, priorize-se o debate legislativo sobre a redução da idade penal como se isto resolvesse todos os males da sociedade brasileira.

6. O sistema penitenciário brasileiro sofre forte influência do crime organizado, sendo certo que crianças e adolescentes, por serem seres humanos em formação, necessitam de educação e principalmente de exemplos de dignidade, valores éticos e morais de seus responsáveis (família, sociedade e Estado), sendo óbvio que a mistura pura e simples de adolescentes a criminosos profissionais não cumprirá as funções essenciais do Direito Penal.

7. O Estatuto da Criança e do Adolescente é moderno paradigma legal internacional, representando instrumento jurídico que promove a responsabilização penal juvenil desde os 12 anos, o qual poderia ser ajustado no sentido de ampliar o período de internação nas hipóteses de cometimento de crimes hediondos ou excessivamente violentos.

“Aduzem também, que o sistema prisional brasileiro não suporta mais pessoas. O Brasil tem a 4° maior população carcerária do mundo e um sistema prisional superlotado com 500 mil presos. Só fica atrás em número de presos para os Estados Unidos (2,2 milhões), China (1,6 milhões) e Rússia (740 mil). O sistema penitenciário brasileiro NÃO tem cumprido sua função social de controle, reinserção e reeducação dos agentes da violência. Ao contrário, tem demonstrado ser uma escola do crime. Portanto, nenhum tipo de experiência na cadeia pode contribuir com o processo de reeducação e reintegração dos jovens na sociedade.”(https://18razoes.wordpress.com/quem-somos/.)

Assim sendo, em suma, os menores de dezoito anos não têm formação biológica física e psicologicamente suficiente para assumir a responsabilidade pela prática de crimes de menor ou maior potencial ofensivo. A mercê disso, tal idade se aproxima de um padrão mundial, conforme tabela anexa ao final.

Uma solução seria a prestação positiva do Estado em investimento efetivo e amplo na educação, e, se o caso, alteração ou aplicação adequada do Estatuto da Criança e do Adolescente, punindo com maior rigidez os crimes considerados mais graves ou os hediondos.

Argumentos a favor da redução da maioridade penal

O primeiro argumento a se mencionar, sob a ótica jurídica, é referente ao artigo 228 da Constituição de 1988, uma vez que o mesmo não é cláusula pétrea, portanto, não seria inconstitucional sua alteração. Defensores da redução afirmam que ela não elimina direitos, apenas impõe novas regras, discussão esta já exposta anteriormente.

Por outra ótica, e fundamento da maioria dos argumentos são os relativos às questões sociais, opiniões individuais com base da experiência do cotidiano e políticas públicas.

Frase batida de se ouvir: A impunidade gera mais violência. Pelo fato de saberem e terem consciência de que não serão presos em razão da idade, e, diante disso, continuam na delinquência. E mais, por este mesmo fator, o crime organizado vem recrutando esses menores para suas atividades, razão pela qual, poder-se-ia considerar até mesmo em uma forma de protegê-los, se considera-los, a partir de então, como imputáveis penalmente.

Comparativamente, indagam, se os adolescentes com idade de 16 e 17 anos já têm discernimento o suficiente para responder por seus atos, uma vez que podem exercer seu direito ao voto, qual seria o problema em também o ser pelos seus com efeitos criminais.

Não raras às vezes é noticiado casos onde revelam menores de idade cometendo atos infracionais momentos antes de completarem dezoito anos de idade. Indubitavelmente, não há argumento razoável para estabelecer objetivamente o momento ou a fase da vida em que pessoa adquire a capacidade de entendimento, bem como para ser classificada como adulta.

Assim sendo, não se trataria, simplesmente, de analisar a redução da maioridade penal como instrumento para a redução da violência. Mas sim, como um meio de se buscar justiça, analisando se determinado indivíduo tem condições de responder penalmente pelo seu ato criminoso.

Argumenta-se, também, que o tratamento especial dispensado aos menores não tem sido suficiente para a ressocialização. Até mesmo pelo fato da gravidade de atos infracionais que se tornam recorrentes. Assim, a legislação especial aplicável aos menores infratores é insuficiente ao prever medidas incompatíveis com a gravidade de determinados crimes. Pois nesses casos de excepcional gravidade, é preciso uma sanção mais adequada, proporcional e mais eficaz ao menor infrator do que aquelas preconizadas pelo Estatuto da Criança e do Adolescente.

Defensores da redução da maioridade penal refutam a afirmação de colocar os menores para o cumprimento de pena em companhia de adultos. Da mesma forma, é perfeitamente possível, assim como acontece na separação entre homens e mulheres e presos definitivos e provisórios, dispor a respeito da separação de acordo com a idade.

Aduzem não haver relação direta entre a delinquência e a exclusão social, tanto que, dos considerados excluídos, ínfima parcela decide se dedicar ao crime. Além disso, a delinquência não estaria restrita à baixa classe social.

Por fim, esses são alguns argumentos mais trazidos à discussão, mas o que realmente movimenta essa redução é o inconformismo da população, diante de uma violência que só tende a aumentar e não se vislumbra nem em longo prazo uma solução para este acentuado problema.

A maioria da população brasileira é a favor da redução da maioridade penal. Em 2013, pesquisa realizada pelo instituto CNT/MDA indicou que 92,7% dos brasileiros são a favor da medida. No mesmo ano, pesquisa do instituto Datafolha indicou que 93% dos paulistanos são a favor da redução.(http://noticias.uol.com.br/cotidiano/ultimas-noticias/2015/03/31/veja-cinco-motivos-a-favor-e-cincocontra-a-reducao-da-maioridade-penal.htm)

Políticas públicas como a principal solução do problema

Entende-se como Políticas Públicas o conjunto de programas, planos, decisões, metas e ações e atividades governamentais desenvolvidas pelo Estado (nacional, estadual ou municipal), com a finalidade de assegurar direitos voltados para a resolução de problemas de interesse público. As políticas públicas correspondem a direitos assegurados constitucionalmente de ordem individual ou coletiva, bens materiais ou imateriais para determinado seguimento social, cultural, étnico ou econômico, entre outros.

"As políticas públicas possuem como principais linhas de definição os seguintes elementos constitutivos: diagnóstico, diretrizes, ações, princípios, metas, trabalho em conjunto entre sociedade civil e governo (ou só pelo Estado ou seu delegado), ficando o financiamento a cargo do poder público ou em regime de parceria e, por fim, a avaliação." (Cidadania, Direitos sociais e Políticas Públicas. Organizadores: Maria Baroni Cecatto; Mirta Lerena; Mônia Clarissa Hannig Leal; Orides Mezzaroba – São Paulo: Conceito Editorial, 2011. Pág. 536.)

A sociedade é e deve ser participante ativa, seja individualmente ou através de grupos organizados para fazerem seu apelo e pleito aos seus representantes políticos para que estes mobilizem de forma a atender as solicitações dos cidadãos. Geralmente, são as ONGs e associações que fazem esse trabalho de pressionar o governo a dar uma resposta favorável, como ocorrido no presente caso.

Independentemente da posição favorável ou contra à redução da maioridade penal, a questão de políticas públicas vem à tona inevitavelmente. Pois, aqueles que são contra a redução apresentam este argumento como sendo um problema da administração pública. Da mesma forma, aqueles que são favoráveis à redução, não abrem mão, também, de afirmarem ser do ente estatal referido problema.

Os direitos e garantias da sociedade, especialmente da criança e adolescente está eleita no corpo da Carta Magna, como por exemplo no artigo 227. Dessa forma, o Estado como garantidor deve se estruturar e agir distinguindo entre o que o governo pretende fazer em paradigma com a atual situação. A política pública é uma ação positiva do Estado com objetivos a serem alcançados em prol do interesse comum, independentemente de seus impactos serem em curto prazo, ou com projeções em longo prazo.

Apesar de toda essa responsabilidade do Estado, temos no Brasil um método tradicional e falho de solucionar todos os problemas sociais, através da Lei. Surgindo um problema num determinado espaço territorial, o remédio encontrado é a confecção de lei, ou até mesmo com o agravamento da punição. Sabemos que a mídia influencia bastante o legislador nesse aspecto. Muitas vezes manipulados ou influenciados por sensacionalismo nos meios de comunicação.

Em outras palavras, somos uma sociedade carecedora da atuação estatal na esfera referente às políticas públicas. Nunca enfrentamos o problema em suas raízes, somente elaboramos uma lei para punir ou regular a questão na esfera final como um “dever ser” negativo, sob pena de alguma sanção.

Transportando ao tema em estudo, é mais que evidente que nossa sociedade sofre com enormes problemas sociais, sendo um deles a violência, e não vislumbramos qualquer solução a curto, médio e longo prazo. Quiçá disso, não bastasse a omissão do Estado.

Assim sendo, em razão desse aumento na criminalidade, consequentemente, esse fator atingiu os menores de 18 anos, ou seja, menores cometendo vários crimes das mais variadas formas e gravidade, vem à tona, o debate de como resolver esse problema de longa data.

Uma solução imediata seria a redução da maioridade penal, conforme a opinião pública, motivando vários projetos de emendas à constituição. Contudo, estaríamos novamente se aventurando no método legal como o melhor remédio para os problemas sociais.

Independente da redução da idade penal, não é de se olvidar que esse problema social se refere às políticas públicas, de um lado da moeda estão os direitos dos cidadãos de terem uma vida digna com qualidade - segurança - e de outro lado estão as atuações estatais para fornecer estes direitos.

Nesse sentido, conclui-se que a punição não é o único e melhor remédio para a violência cometida pelos jovens, criar lei não vai reduzir a criminalidade. Ainda que se considerasse adequada essa medida, os problemas sociais de segurança persistiriam e os alcances e medidas que o Estado poderia tomar para resolver, novamente, ficarão inertes.

Partindo disso, é evidente que o Estado está quedando omisso e mascarando uma solução do problema, em outras palavras, deixa de aplicar e atuar no caminho a ser percorrido pelas prestações positivas das políticas públicas, isto é, não observa o estágio em que nos encontramos, não trilha projetos e planejamentos e muito menos executa atividades para resolução efetiva.

Em suma, é irrefragável que a redução da imputabilidade penal não servirá de solução para nossos problemas sociais.

A própria falta de políticas públicas coloca o Estado numa posição insustentável para garantir até mesmo esse pleito de redução, pois atualmente, nossa população carcerária é uma das maiores do mundo e não temos presídios suficientes para os atuais delinquentes encarcerados. Vale registrar, que está em discussão no Supremo Tribunal Federal a possibilidade de recebimento de indenizações por danos morais os presos que se sujeitam às celas lotadas em condições precárias. Estamos num patamar deplorável de administração pública. Aonde teremos que bancar os custos de mais presidiários e como se não bastasse, teremos que, eventualmente, pagar a referida indenização.

Evidentemente, políticas públicas sociais, educacional, preventiva, assistência social, são medidas que, se aplicadas no ambiente da sociedade, terão o condão, efetivamente, de reduzir não só a violência, mas resolverá inúmeros problemas enfrentados hoje.

Sem entrar no mérito do sistema de aplicação da pena e sua benesses, é evidente que em determinados casos, é preciso uma punição mais eficaz do que aquelas preconizadas pelo Estatuto da Criança e do Adolescente, mas isso vai além desse regramento, pois nos próprios crimes cometidos “por maiores de 18 anos de idade” carece de sanção adequada e proporcional.

A OAB também se manifestou acerca do assunto nas palavras do seu presidente, “A redução da maioridade, que já possuía inconstitucionalidade material, porque fere uma garantia pétrea fundamental, passa a contar com uma inconstitucionalidade formal, diante deste ferimento ao devido processo legislativo (…). Tanto pelo seu conteúdo, quanto pela forma de sua aprovação, a PEC não resiste a um exame de constitucionalidade.” Finalizando, “reitera sua história posição sobre o tema, considerando um equívoco colocar mais alunos das universidades do crime, que são os presídios do país”. Para a Ordem, é mais adequado “aumentar o rigor de sanção do Estatuto da Criança e do Adolescente, aumentar o prazo de internação, ampliar o período diário de serviços comunitários, obrigar frequência escolar, além de investir na inclusão de todos”.

Ao abrirmos o leque de possibilidades para a solução do problema da segurança social, a meu ver, a mais importante e fundamental é na educação com qualidade. Mas me refiro, não só às disciplinas escolares, e sim, uma educação social, comportamental, aonde se deve privilegiar o respeito, o tratamento isonômico, resgatar a importância do professor, o envolvimento da sociedade, buscar a paz social, sobretudo a valorização da escola como instrumento capaz de humanizar e de produzir mudança social.

É de se pensar profundamente na seguinte frase de Paulo Freire: “Seria uma atitude ingênua esperar que as classes dominantes desenvolvessem uma forma de educação que proporcionasse às classes dominadas perceber as injustiças sociais de maneira crítica.”

Enfim, somente com investimentos massivos e estruturados neste campo das políticas públicas, se valendo do remédio “educação” é que se poderá propiciar uma mudança significativa em paradigma ao atual modo de funcionamento do sistema educacional.

Conclusão

A problemática referente à redução da idade penal é antiga e está forte debate atualmente. Assim, pretendeu-se, neste trabalho, analisar alguns aspectos e pontos favoráveis e contras tal medida. Tecendo maiores comentários à respeito da inimputabilidade penal como cláusula pétrea e num contexto das políticas públicas.

Diante de tais explanações é evidente que a nossa maior dificuldade e que está longe de ser resolvida é a segurança pública, sendo que apresento como a melhor saída, ainda que brevemente, uma educação diferenciada, baseada nos valores morais e sociais, ressaltando o respeito alheio e ao professor.

Portanto, a única maneira de manutenção e equilíbrio é através de uma regulação social do sistema, uma prestação mais positiva do Estado através de órgãos reguladores que devem localizar, identificar as perturbações, analisar sob a hermenêutica social e tratar dos problemas que causam desequilíbrio, com um projeto final capaz de executar ordens coerentes que surtam efeitos.

Bibliografia

Cidadania, Direitos sociais e Políticas Públicas. Organizadores: Maria Baroni Cecatto; Mirta Lerena; Mônia Clarissa Hannig Leal; Orides Mezzaroba – São Paulo: Conceito Editorial, 2011.

Silva, José Afonso da. Curso de Direito Constitucional Positivo. 37ª ed. Editora Malheiros, São Paulo, 2013.

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Advogado Rafael Valetim Milanez

Advogado - Tietê, SP


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