Meios Autônomos de Impugnação no Direito Processual Brasileiro


20/01/2016 às 10h07
Por Advocacia Pericles Rosa

RESUMO

O Processo Civil Brasileiro conta com diversos meios de controle das decisões jurisdicionais, dentre eles os recursos e as ações impugnativas autônomas. Os recursos se diferem das ações impugnativas autônomas por serem meios de impugnação que se desenvolvem no bojo do processo de origem, enquanto as ações impugnativas autônomas se desenvolvem em processo distinto daquele que as originaram. Ainda, as ações impugnativas autônomas constituem uma exceção ao princípio da coisa julgada, sendo, portanto, utilizadas em caráter excepcional e com muita parcimônia.

São meios autônomos de impugnação: Querela Nullitatis, Ação Rescisória, Reconsideração, Correição Parcial e Mandado de Segurança Contra Ato Judicial.

Palavras-Chave: Coisa Julgada, Meios autônomos de impugnação, recursos, Ações impugnativas autônomas, Ação Rescisória.

1. Introdução

A lide, na concepção clássica de Francesco Carnelutti[1], se origina em face de um conflito de interesses qualificado por uma pretensão resistida. O doutrinador, ainda, aduz que a justa composição da lide, mediante sentença de natureza declarativa, constitui a jurisdição. No que tange ao ato jurisdicional, Carnelutti entende que este se caracteriza pela virtude de produzir a coisa julgada.

A coisa julgada, por sua vez, se caracteriza pela impossibilidade de mutação na sentença, de forma que, em regra, não são mais admitidos recursos. A sentença encontra estabilidade e se torna incólume, seja porque esgotados os recursos, seja porque estes não foram utilizados nos prazos legais.

Sendo assim, enquanto a sentença não for transitada em julgado, estará sujeita a recurso e não se encontra apta a produzir seus regulares efeitos, pois pode sofrer alterações, em face do duplo grau de jurisdição, princípio consagrado pela Constituição Federal do Brasil.

A inconformidade com uma sentença que não seja compatível com o esperado pelo querelante ou querelado, faz parte da própria natureza humana, como lembrou o ex-ministro José Carlos Moreira Alves, em discurso proferido por ocasião de sua posse na Presidência do Supremo Tribunal Federal, em 25 de fevereiro de 1985: "É da natureza do homem não se conformar com um único julgamento. Dessa irresistível tendência psicológica e falibilidade das decisões humanas resultaram os recursos judiciais". (ALVES, 2002, p.215) Ainda, as decisões judiciais podem conter equívocos e defeitos, por serem atos humanos, o que justifica a necessidade de haver um meio para que estas possam ser reexaminadas.

A legislação brasileira nunca se eximiu de consagrar o princípio da recorribilidade em seus diplomas, mencionando, inclusive, os pressupostos de admissibilidade dos recursos e os prazos para sua interposição.

As impugnações são como remédios fornecidos pela lei para que as partes possam provocar o juízo ou instância superior a reexaminarem decisão anterior e reformá-la.

2. Discussões acerca da Coisa Julgada

O instituto da coisa julgada tem, como principal objetivo, proporcionar segurança jurídica acerca da questão discutida em juízo. Nas palavras de Humberto Theodoro Júnior,

Enquanto sujeita a recurso, a sentença não passa de “uma situação jurídica”. Os efeitos próprios da sentença só ocorrerão, de forma plena e definitiva, no momento em que não mais seja suscetível de reforma por meio de recursos. Ocorrerá, então, o trânsito em julgado, tornando o decisório imutável e indiscutível (art. 467).

A coisa julgada, segundo o exímio doutrinador, acarreta uma transformação qualitativa nos efeitos da sentença, que poderiam estar sendo produzidos independente do trânsito em julgado.

No entanto, ainda que o instituto em questão tenha o intuito de impor à sentença o caráter de imutabilidade e irrecorribilidade em face do interesse da coletividade pela estabilidade nas relações jurídicas, é necessário que haja algum instrumento que permita a rediscussão da matéria cujo mérito tenha sido objeto de coisa julgada, tornando-se irrecorrível: estes instrumentos são as ações impugnativas autônomas.

A doutrina, em geral, reconhece que a existência de mecanismos de controle das decisões jurisdicionais observam-se desde o princípio da história do direito. Sempre foi de interesse coletivo que as decisões tomadas pelo Estado-juiz pudessem ser objeto de impugnação e de reforma, quando necessário. O direito romano, por exemplo, trazia em seu bojo as figuras da “apellatio”, que muito se assemelham aos recursos, para impugnar os errores in judicando. No que tange às ações impugnativas, é possível distinguir certos traços de semelhança com as figuras do “restituto in integrum” e da “querela nullitatis”, sendo que o último ainda é observado na atualidade do sistema processual.

José Carlos Barbosa Moreira, com maestria, afirma que

"Naturalmente, conforme a diretriz de política legislativa predominante na época, tais remédios vêem-se prodigalizados ou, ao contrário, comprimidos em doses parcimoniosas. A oscilação entre uma e outra tendência marca a evolução histórica de todos os grandes sistemas jurídicos do chamado mundo ocidental."

O que Barbosa Moreira aduz no trecho transcrito acima é um fenômeno amplamente verificado no direito processual brasileiro: enquanto o sistema recursal é utilizado praticamente sem limites, as discussões acerca da coisa julgada são muito mais raras.

3. Diferenciação Entre Recurso, Ação Impugnativa Autônoma e Incidente Processual

De acordo com Barbosa Moreira, são duas as classes de impugnação fundamentais: a dos recursos, que são exercíveis dentro do processo que originou a decisão impugnada; e a das ações impugnativas autônomas, que, em regra, pressupõem a irrecorribilidade da decisão.

O doutrinador em questão critica o critério acima mencionado para diferenciar as classes de impugnação, pois a seu ver, este é insuficiente. Para ele, o critério diferencial reside na necessidade de instauração de um novo processo: o recurso é uma extensão do processo ainda fluente, tendo como efeito o deslocamento deste para outra instância, de modo que, ao ser interposto, não dá ensejo a instauração de novo processo. A ação autônoma de impugnação, por sua vez, instaura um processo distinto da decisão impugnada. Na mesma corrente, segue Alexandre Câmara:

Diferem-se entre si, basicamente, pelo fato de o recurso não provocar o aparecimento de um processo novo, sendo tão-somente um prolongamento do processo onde foi proferida a decisão atacada, enquanto a propositura de “ação autônoma de impugnação” faz nascer uma nova relação processual, diversa daquela onde a decisão impugnada foi proferida.

Ainda, não há que se confundir as figuras das ações autônomas de impugnação e dos recursos com os incidentes processuais, apesar destes de assemelharem aos recursos por não gerarem nova relação processual. Conforme observou Nelson Nery Júnior, nos incidentes processuais não se verificam “a voluntariedade, a tipicidade, o efeito devolutivo e, principalmente a finalidade recursal. Não é, portanto, recurso, nem faz as vezes dele.” No que tange às ações impugnativas autônomas, a distância é ainda mais visível, visto que os incidentes processuais não constituem meios idôneos de ataque aos atos jurisdicionais, sendo, obviamente, por sua natureza, tratados sempre no bojo do processo.

4. Ações Impugnativas Autônomas

De acordo com o exposto acima, recursos, ações autônomas e incidentes processuais não se confundem. No entanto, a despeito da evidência da distinção entre estes institutos, surgiu no meio jurídico a expressão “sucedâneos recursais” para diferenciar as ações impugnativas autônomas dos recursos. Os doutrinadores que seguem esta ideologia tem um posicionamento que se volta à praticidade, ao entenderem que as ações autônomas tem o mesmo papel dos recursos, assim como aduz Nelson Nery Junior ao afirmar que as ações autônomas de impugnação “fazem as vezes de recurso (por isso denominadas sucedâneos recursais), já que se dirigem contra decisões judiciais”.

Parte da doutrina, no entanto, diverge do entendimento exposto, por entender errada a ideia de que todo meio de ataque a uma decisão terá natureza de recurso ou o mesmo conteúdo. Para eles, a utilização da denominação “sucedâneos recursais” por determinados doutrinadores distingue as ações impugnativas autônomas e os recursos apenas pelo critério da taxatividade, o que é inadmissível, pois afirmaria que todo meio de impugnação não previsto em lei como espécie de recurso não pode ser considerado como recurso, mas terá o mesmo conteúdo. É o que afirma Nelson Nery Júnior, ao dizer:

"Como nem o CPC nem a CF dão a essas ações autônomas de impugnação a natureza jurídica de recurso, não as colocando no rol do art. 496, CPC, tem-se que não poderão ser considerados como recurso por direta aplicação do princípio da taxatividade ora examinado."

Os que divergem do posicionamento adotado por Nelson Nery Júnior ainda entendem que a expressão afronta os princípios inerentes aos recursos, princi palmente no que tange à questão da uni-recorribilidade e da taxatividade. A enumeração dos recursos tem o objetivo principal de proporcionar segurança nas relações jurídicas para alcançar maior justiça. A admissão de que outros remédios possam lhes fazer as vezes implicaria em aumentar o elenco dos recursos delimitado pelo legislador processual.

Os recursos são o meio mais comum para requerer o reexame de determinada sentença decisória. No entanto, a própria lei cria, em determinadas situações, meios para impugnar atos jurisdicionais que diferem dos recursos. Dentre estes remédios, estão os meios autônomos de impugnação.

4.1. Querela Nullitatis

A “querela nullitatis” (ação de nulidade) foi criada para atacar decisões inquinadas de “errores in procedendo”. Este meio de impugnação é considerado um dos pioneiros, porém seu desenvolvimento se deu mais tarde, por influência do direito germânico.

Haviam duas modalidades de “querela nullitatis”: a “querela nullitatis insanabillis”, a qual sua propositura se dá onde existem vícios graves, insanáveis; e a “querela nullitatis sanabillis”, que ao contrario da primeira é adequada a impugnação dos vícios sanáveis, esta se fundiu aos recursos em alguns ordenamentos europeus, posteriormente.

Esta ação pode ser impetrada a qualquer hora, mesmo que já tenha ocorrido o trânsito em julgado da decisão final, não podendo sofrer prescrição ou decadência. O objetivo da “querela nullitatis” é anular uma sentença que possui qualquer nulidade quanto ao ato citatório.

O processo apenas possui eficácia em relação ao réu, e só há validade quanto aos atos processuais se a citação for válida. A citação é quesito imprescindível no processo, de acordo com o artigo 214 do Código de Processo Civil, que aduz que o processo não é válido se não houver a citação inicial do réu. Logo a decisão, nesse caso, mesmo que transitada em julgado, não atinge o réu: o processo sem citação é nulo, e a nulidade pode ser requerida por meio de ação declaratória.

4.2. Ação Rescisória

É o mais comum meio autônomo de impugnação. De acordo com Cássio Scarpinella Bueno, “a ação rescisória tem como principal finalidade a desconstituição da coisa julgada (material) que recai sobre a decisão que tenha apreciado o mérito quando presentes pelo menos um dos pressupostos exigidos pelo art. 485.”

A ação rescisória pretende extinguir do ordenamento a coisa julgada que recai sobre as decisões que contenham nulidades absolutas ou que sejam proferidas em processos que tenham se desenvolvido sem qualquer pressuposto de validade. As nulidades relativas afastam a necessidade da ação rescisória, e serão aprovadas se não impugnadas a tempo e modo oportunos ao longo do processo.

A “querela nullitatis” difere da ação rescisória, pois como dito acima, esta cabe quando se trata da citação como quesito imprescindível.

Cassio Scarpinella, em seu livro, utiliza a expressão “ação desconstitutiva” para tratar sobre a ação rescisória, pois esta tem como objetivo o desfazimento de anterior coisa julgada material. A ação deve preencher os pressupostos processuais, e as condições da ação, por isto não tem natureza de recurso, é uma nova ação, que não se confunde com a anterior.

Há necessidade de ter transitado em julgado uma decisão anterior, e que a decisão a ser rescindida seja de mérito, ou sendo assim, ajustável, ao artigo 269 CPC, estes são os dois requisitos para ação rescisória.

Art. 269 - Haverá resolução de mérito:

I - quando o juiz acolher ou rejeitar o pedido do autor; II - quando o réu reconhecer a procedência do pedido; III - quando as partes transigirem;

IV - quando o juiz pronunciar a decadência ou a prescrição;

V - quando o autor renunciar ao direito sobre que se funda a ação.

De acordo com a Súmula 514 do STF “Admite-se ação rescisória contra sentença transitada em julgado, ainda que contra ela não se tenham esgotados todos os recursos.”, ou seja, se o autor da ação rescisória perdeu o prazo de interposição de apelação da sentença, que lhe foi desfavorável, pode ingressar com a ação rescisória no Tribunal competente, mas deve observar o prazo de dois anos do artigo 495 doCódigo de Processo Civil, e deve também, apresentar um dos requisitos do artigo 485do Código de Processo Civil. Isto porque, a ação em questão não pretende a revisão da decisão que foi dada, mas sim a desconstituição da coisa julgada material que recaiu sobre a sentença.

As hipóteses de cabimento para a Ação Rescisória são tratadas pelo art. 485 doCódigo de Processo Civil.

Art. 485. A sentença de mérito, transitada em julgado, pode ser rescindida quando:

I - se verificar que foi dada por prevaricação, concussão ou corrupção do juiz;

De acordo com Jose Carlos Barbosa Moreira, a interpretação deste inciso deve ser feita sob o conceito penal de prevaricação, concussão ou corrupção. Sendo assim, de acordo com os artigos 316, 317 e 319 do Código Penal, respectivamente, concussão é a exigência, "para si ou para outrem, direta ou indiretamente, ainda que fora da função ou antes de assumi-la, mas em razão dela", de vantagem indevida; já corrupção (passiva) é definida como "solicitar ou receber, para si ou para outrem, direta ou indiretamente, ainda que fora da função ou antes de assumi-la, mas em razão dela, vantagem indevida, ou aceitar promessa de tal vantagem" (art. 317 doCódigo Penal); por fim, prevaricação é “retardar ou deixar de praticar, indevidamente, ato de ofício, ou praticá-lo contra disposição expressa de lei para satisfazer interesse ou sentimento pessoal”.

O juiz não precisa ser julgado e condenado no juízo criminal para que a ação rescisória seja favoravelmente acolhida, a prova do vício pode ser feita no curso da ação, e se procedente o tribunal anulará todo o processo.

II - proferida por juiz impedido ou absolutamente incompetente;

O juiz que é impedido ou absolutamente incompetente tem seus atos invalidados, e está proibido de atuar.

III - resultar de dolo da parte vencedora em detrimento da parte vencida, ou de colusão entre as partes, a fim de fraudar a lei;

Ocorre neste artigo a violação do dever de lealdade e boa fé, por dolo da parte vencedora. Para poder interpor a ação rescisória neste caso deve haver a demonstração do nexo de causalidade entro o dolo e o resultado da sentença.

O vencedor não cometerá dolo se omitir a prova vantajosa a parte a parte contrária, e nem se fizer silencio sobre a circunstância desfavorável a ele. Para ser caracterizado dolo, o vencedor deve ter tido atitude que demonstre a intenção de obstar a produção de prova útil ao vencido.

IV - ofender a coisa julgada;

Ofender a coisa julgada também pode ser causa de ação rescisória, pois após o trânsito em julgado é impossível haver nova decisão sobre a questão que foi objeto da sentença.

Para José Carlos Barbosa Moreira,

"Haverá ofensa à coisa julgada quer na hipótese de o novo pronunciamento ser conforme ao primeiro, quer na de ser desconforme: o vínculo não significa que o juiz esteja obrigado a rejulgar a matéria em igual sentido, mas sim que ele está impedido de rejulgá-la."

Se duas coisas julgadas conflitarem, a que se formou por último é a que valerá, isto enquanto não se der a rescisão para restabelecer a primeira.

V - violar literal disposição de lei;

Se a sentença violar a disposição da lei caberá ação rescisória. Para Moacyr Amaral Santos a sentença que é dada nestas condições não é a que ofende só a lei escrita, mas é a que causa ofensa a lei, quando a decisão é repulsiva à lei, ou quando é proferida com menosprezo ao modo e forma estabelecidos pela lei para a sua prolação, sendo “error in judicando” e “error in procedendo”, respectivamente. Quanto ao “error in judicando”, o sentido e o propósito da norma devem ter sido totalmente violados; já quando falamos do “error in procedendo”, o vício alegado deve estar contido antes de ser proferida a sentença, no curso do processo, ou na própria sentença.

Para Flávio Luiz Yarshell, o que a lei exige para a desconsideração é que a decisão seja de mérito, e não que o dispositivo legal violado seja de direito material. Fundamentos de ordem processual também justificam a propositura de ação rescisória, desde que, pela cognição empreendida, a decisão seja apta a projetar efeitos para fora do processo, isto é, para o plano substancial.

Vl - se fundar em prova, cuja falsidade tenha sido apurada em processo criminal, ou seja provada na própria ação rescisória;

Nas palavras de José Carlos Barbosa Moreira,

"Contenta-se o dispositivo ora analisado com o fato de a sentença fundar-se na prova falsa. O que importa é averiguar se a conclusão a que chegou o órgão judicial, ao sentenciar, se sustentaria ou não sem a base que lhe ministrara a prova falsa. A sentença não será rescindível se havia outro fundamento bastante para a conclusão."

A ideia de Barbosa Moreira vai de encontro com a maior parte da doutrina.

A rescisão pode não ser total, podendo ser parcial quando a falsidade da prova atingir o fundamento da decisão de um dos pedidos, falsidade esta que pode ser material ou ideológica.

Vll - depois da sentença, o autor obtiver documento novo, cuja existência ignorava, ou de que não pôde fazer uso, capaz, por si só, de Ihe assegurar pronunciamento favorável;

O documento, que deverá ser de grande significância para a sentença, não pode ser criado após esta, já deve existir quando a sentença for proferida. A existência deste documento deve ter força para assegurar ao autor da ação rescisória um pronunciamento diverso do presente na sentença impugnada. Sobre isto preleciona Barbosa Moreira:

Em princípio, para admitir-se a rescisória, é preciso que o documento já existisse ao tempo do processo em que se proferiu a sentença. Documento ‘cuja existência’ a parte ignorava é, obviamente, documento que existia; documento de que ela ‘não pôde fazer uso’ é, também, documento que, noutras circunstâncias, poderia ter sido utilizado, e portanto existia.

VIII - houver fundamento para invalidar confissão, desistência ou transação, em que se baseou a sentença;

O ato viciado deve ser determinante para o julgamento do mérito, este é indispensável para a sentença.

Quanto à confissão, a lei abrange a hipótese de reconhecimento da procedência do pedido. Quanto à desistência, esta é causa de extinção do processo sem julgamento do mérito. A ação rescisória só é admissível contra sentenças de mérito, e a desistência só pode ser interpretada como renúncia ao direito em que se funda a ação. “A desconstituição da sentença nos casos de renúncia e de transação impõe a retomada do processo a partir do momento em que reconhecida a invalidade, não se passando a um novo julgamento”.

IX - fundada em erro de fato, resultante de atos ou de documentos da causa;

De acordo com Cassio Scarpinella este inciso é o conjunto dos dois parágrafos deste mesmo artigo:

§ 1o - Há erro, quando a sentença admitir um fato inexistente, ou quando considerar inexistente um fato efetivamente ocorrido.

§ 2o - É indispensável, num como noutro caso, que não tenha havido controvérsia, nem pronunciamento judicial sobre o fato..

O autor em questão diz que “o erro de fato não autoriza a rescisão da decisão de mérito e o proferimento de uma nova decisão por má avaliação da prova ou da matéria controvertida”. O erro de fato ocorre quando existe nos autos elemento que possa alterar a decisão que se quer rescindir.

Para Humberto Theodoro Júnior,

"São requisitos para que o erro de fato enseje ação rescisória: (i) o erro deve ter sido a causa da conclusão da sentença, (ii) o erro há de ser apurável mediante simples exame das peças do processo (...), e (iii) não pode ter havido controvérsia, nem pronunciamento judicial no processo anterior sobre o fato [...]"

Importa fazer menção ao fato de que a Jurisprudência vem admitindo que o erro de fato que configure erro de atividade (error in procedendo) possa vir a justificar a anulação do processo e sua retomada a partir do momento da invalidade, e não só o erro de fato que configure erro de juízo (error in iudicando). Recente julgado do Superior Tribunal de Justiça admitiu ser cabível a rescisória para desconstituir julgado que não apreciou o mérito da demanda, pois declarou intempestivo recurso de agravo de instrumento.

O prazo decadencial, por sua, vez, é tratado pelo art. 495 do Código de Processo Civil:

Art. 495. O direito de propor ação rescisória se extingue em 2 (dois) anos, contados do trânsito em julgado da decisão

Em regra, este prazo flui do trânsito em julgado da decisão que se pretende rescindir, excluindo o primeiro dia da contagem. A exceção diz respeito ao artigo 8º da lei nº6.739/79, lei esta que dispõe sobre a Matrícula e o Registro de Imóveis Rurais, e dá outras Providências.

Art. 8o É de oito anos, contados do trânsito em julgado da decisão, o prazo para ajuizamento de ação rescisória relativa a processos que digam respeito a transferência de terras públicas rurais.

Este artigo foi incluído pela Lei 10.267/0, artigo 4.

4.3.Reclamação

A reclamação é um meio que gera grande polêmica na doutrina, os autores divergem quando a sua natureza jurídica. A corrente majoritária entende que o instituto da reclamação é uma ação.

Para Moacyr Amaral Santos a reclamação tem como objetivo “atacar um ato processual, ou seja, decisão interlocutória que desnature a competência do STF ou desconheça, ou ofenda, a autoridade de sua decisão na relação processual".

A reclamação não é um recurso, pois com o seu ajuizamento o que se objetiva é assegurar a competência do Tribunal e a autoridade de seus julgados, e não resguardar apenas o interesse da parte que a interpôs, como seria o recurso. Também não é a reclamação um mero procedimento, pois aqui é provocada a atividade jurisdicional produzindo a decisão proferida na reclamação coisa julgada.

4.4. Habeas Corpus

O Habeas Corpus é medida que visa proteger o direito de ir e vir do cidadão, é dado sempre que o individuo vê sua liberdade de locomoção sendo restringida ou sendo ameaçada de ser por violência, coação, ilegalidade, ou abuso de poder.

O nosso Código de Processo Penal elenca o habeas corpus como um recurso, porém este não possui natureza jurídica do mesmo, já que pode ser impetrado para atacar uma decisão que já transitou em julgado; pode ser impetrado contra ato de autoridade; e por fim instaura nova relação jurídica, sendo esta última característica a principal dos meios autônomos de recurso.

Assim como o mandado de segurança, é ação que visa proteger o direito liquido e certo de locomoção contra os vícios de legalidade.

4.5. Correição Parcial

De acordo com o doutrinador Araken de Assis correição parcial é “remédio que, teoricamente sem interferir com os atos decisórios, beneficia os litigantes que se aleguem vítimas de erros ou de abusos que invertam ou tumultuem a ordem dos atos processuais”.

Este meio é um instrumento jurídico que visa a correção, possui caráter administrativo, que se destina a corrigir ato judicial, que por “error in procedendo”, venha causar inversão tumultuaria do processo.

A correição parcial não pode substituir qualquer recurso, as previsões normativas reservam o seu uso, em algumas ocasiões, para decisões “irrecorríveis” ou, como medidas para modificar decisões jurisdicionais.

4.6. Mandado de Segurança Contra Ato Judicial

Cássio Scarpinella Bueno afirma que o instituto do mandado de segurança contra ato judicial é um “procedimento jurisdicional constitucionalmente diferenciado” que tem o objetivo de evitar lesões a direitos praticados ou em vias de serem praticados por autoridades públicas. Trata-se de ato substancialmente administrativo e é um tema pacífico na jurisprudência.

O remédio em questão atualmente é tratado pela lei n.º 12.016/2009, no entanto, de acordo com a súmula 267 do STF, “não cabe mandado de segurança contra ato judicial passível de recurso ou correição”. O STF, porém, abrandou a interpretação do enunciado da referida súmula para admitir mandados contra atos judiciais desde que a decisão seja clara e inequivocadamente errada, capaz de causar dano irreparável ou de difícil reparação.

O mandado de segurança contra ato judicial, portanto, tem o objetivo de salvaguardar o direito do recorrente quando houver necessidade de suprir lacuna decorrente de ineficiência do sistema recursal. Sobre a questão, aduz Kazuo Watanabe que o mandado de segurança contra atos judiciais não pode se apresentar como “... Remédio alternativo à livre opção do interessado, e sim como um instrumento que completa o sistema de remédios organizados pelo legislador processual, cobrindo as falhas neste existente no que diz com a tutela de direitos líquidos e certos”.

Atualmente, a utilização do referido instrumento processual justifica-se pela irrecorribilidade das decisões proferidas em sede de agravo de instrumento pelo relator nas hipóteses dos incisos II e III do art. 527[2].

5. Conclusão

O Processo Civil Brasileiro tem diversas maneiras para controlar as decisões jurisdicionais e assim evitar injustiças. Os recursos são os meios mais utilizados para efetuar este controle, deslocando a discussão de determinada questão para uma instância superior. Quando não há mais a possibilidade de interposição de recurso, impõe-se à sentença o instituto da “coisa julgada”.

A coisa julgada tem o objetivo de auferir estabilidade e segurança jurídica para as questões discutidas em juízo, as quais já foi proferida sentença. No entanto, ainda existe a possibilidade de o magistrado, em sua decisão, ter cometido algum erro. Neste caso, para que haja a desconstituição da coisa julgada, existem as ações impugnativas autônomas.

Os meios impugnativos autônomos devem ser utilizados com parcimônia e em caráter excepcional, visto que a desconstituição da coisa julgada acarreta instabilidade e insegurança no sistema jurídico. Sendo assim, os meios existentes têm previsão expressa de utilização na legislação brasileira.

http://isabellarosa.jusbrasil.com.br/artigos/189321138/meios-autonomos-de-impugnacao

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Referências

AMARAL SANTOS, Moacyr," Primeiras Linhas de Direito Processual Civil ", 4a. Ed., vol. III, São Paulo: Saraiva, 1985.

ASSIS, Araken. Manual dos Recurso – 2ªed. São Paulo. Editora Revista dos Tribunais:

2008.

BARBOSA MOREIRA, José Carlos de,"Comentários ao Código de Processo Civil",

11a. Ed., vol. V, Rio de Janeiro: Forense, 2003.

BUENO, Cassio Scarpinella. Curso Sistematizado de Direito Processual Civil. Recursos. Processos e incidentes nos tribunais. Sucedâneos recursais: técnicas de controle das decisões judiciais. São Paulo: Saraiva, 2008

THEODORO JÚNIOR, Humberto," Curso de Direito Processual Civil ", vol. I, 36ª ed., Rio de Janeiro: Forense, 2001.

YARSHELL, Flávio Luiz," Ação Rescisória ", São Paulo:Malheiros, 2005.

[1]CARNELUTTI, Francesco, Sistema di diretto processual e civile. Pádua: Cedam, 1936.

[2]Art. 527. Recebido o agravo de instrumento no tribunal, e distribuído incontinenti, o relator: (...)

II - converterá o agravo de instrumento em agravo retido, salvo quando se tratar de decisão suscetível de causar à parte lesão grave e de difícil reparação, bem como nos casos de inadmissão da apelação e nos relativos aos efeitos em que a apelação é recebida, mandando remeter os autos ao juiz da causa;

III - poderá atribuir efeito suspensivo ao recurso (art. 558), ou deferir, em antecipação de tutela, total ou parcialmente, a pretensão recursal, comunicando ao juiz sua decisão (...)

Parágrafo único. A decisão liminar, proferida nos casos dos incisos II e III do caput deste artigo, somente é passível de reforma no momento do julgamento do agravo, salvo se o próprio relator a reconsiderar

* Artigo já publicado no site http://www.jusbrasil.com.br/ 


Advocacia Pericles Rosa

Bacharel em Direito - São Paulo, SP


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