SOBRE JANELAS E TORNEIRAS QUEBRADAS
Na seara da criminologia, uma das obras de maior destaque foi a ‘’ Fixing Broken Windows: Restoring Order and Reducing Crime in Our Communities , livro lançado em 1996 por por George L. Kelling e Catherine Coles, a partir de um artigo do jornal The Athlantic Monthly de 1982, de autoria do próprio Kelling.
Em apertada síntese, o cerne da obra mostrava que em determinado edifício, haviam algumas janelas quebradas.Se tais janelas não fossem reparadas , o abandono das mesmas serviria como um incentivo aos deliquentes em quebrar, vandalizar ou deteriorar mais janelas.
Como solução, a teoria propõe a resolução dos problemas, enquanto os mesmos ainda são considerados pequenos,ou seja, realizar o reparo das janelas o quanto antes seria uma tarefa rapidamente realizável, e de resultados positivos duradouros.
A partir de tal constatação, foi postulado que crimes ‘’em menor escala’’ eram solucionados com a postura reparadora imediata, enquanto crimes ‘’ de maior escala’’, em tese, seriam efetivamente prevenidos.
A maior crítica à Teoria das Janelas Quebradas foi o último ponto do parágrafo anterior, pois o ‘’reparar de janelas’’ não pôde ser utilizado como ferramenta efetiva na prevenção de ‘’grandes crimes’’ ou’’ ‘’crimes de larga escala’’.
Tomando como realidade o cenário criminal brasileiro, é de fácil constatação que tanto crimes de menor potencial ofensivo, quanto crimes de maior potencial ofensivo não são tratados de maneira preventiva, sendo que as medidas existentes são de eficácia mínima ou ausentes em certos casos.
Exemplificando: Pense na aplicação de advertência no caso de um crime de uso de drogas. A Lei prevê de fato, além da admoestação verbal, a frequência do réu em palestras sobre o malefício de uso de drogas e a prestação de serviços comunitários. Contudo, mesmo cumprindo as penas da Lei, o sujeito volta a delinquir seja em caráter reincidente, ou em condutas mais graves.
Pensemos agora, em uma situação cotidiana, o vazamento de uma torneira com defeito em seu registro. A água verterá daquele bocal, enquanto o registro não for devidamente fechado. Para evitar que um cômodo se molhe, ou que o vazamento chegue à lugares indesejados, adotamos medias paliativas como o uso de um balde grande, um objeto que atrapalhe ou impeça o fluxo da água, um ralo ou algum meio que possa desviar aquela corrente de agua. Levando em conta que o fluxo é a criminalidade, as medidas paliativas seriam as prisões e as Leis e que o registro da torneira é a Educação, é importante tecer algumas considerações.
Crimes continuarão ocorrendo, afinal fazem parte da vida em sociedade. Contudo, do que adianta a criação de novas leis e o emprego de verbas públicas em construção de centros prisionais, sendo que essas medidas são apenas um contorno sobre o obstáculo maior? A prevenção dos delitos em qualquer grau, não será resolvida de forma absoluta em nenhuma sociedade, mas deve prevalecer um mínimo tolerável no que concerne a sua segurança.
Por meio da Educação, devem os indivíduos aprender, do seu ensino básico até os níveis superiores, valores humanos, fundamentos morais e sociológicos que lhes permitam compreender o mundo em que vivem, despertando sua consciência política, fornecendo uma alternativa de vida à barbárie dos crimes e aos ideais do dinheiro fácil, da fama instantânea e da crença sobre ‘’levar vantagem’’ tão conhecida pelo brasileiro.
Estatisticamente, podemos observar o resultado de um estudo realizado pela USP, em que a cada investimento de 1% realizado na educação, 0,1% do índice de criminalidade é reduzido.
Em outro estudo , o Centro Internacional de Estudos Penitenciários mostra que nas Américas, excluído os Estados Unidos , no ano 2000 a população carcerária girava em torno de aproximadamente 753 mil detentos, sendo que até o dia 31 de outubro de 2015, esse número já era superior a 1 milhão e quinhentos mil gerando um aumento de quase 108% . O Brasil sozinho, é o país com o maior número de detentos da América Latina inteira, com 607.731 encarcerados até o mês de junho do ano de 2014, segundo mostra a pesquisa.
Na contramão, a mesma pesquisa do Centro Internacional de Estudos Penitenciários revela que os países do continente europeu foram os únicos a diminuírem seus números penitenciários num total global de 21,3% desde os anos 2000. Ao mesmo tempo, segundo os níveis do ranking internacional de investimento em alunos de 2014 e de 2015 em suas instituições de ensino públicas, a maioria dos países desenvolvidos investe em média US$ 10.000,00 dólares por aluno, encontrando-se o Brasil por dois anos consecutivos no penúltimo lugar, com investimento abaixo de US$ 5.000,00 dólares por aluno.
Diante desses dados é flagrante a conclusão: estamos combatendo os problemas com as armas erradas. Qual é a eficiência em aumentar a punição de certos crimes, sendo que a punição não cumpre seu próprio fim? Qual é o benefício em construir prisões incapazes de ressocializar um detento? Deve a maioridade penal ser reduzida?
Perguntas estas que se comparadas ao buscar uma educação digna para todos, continuarão fluindo como as águas de uma torneira quebrada: em um constante desperdício.