Caso Paradigma: Azul S.A. (“Azul”), Processo CVM nº RJ-2013/5993
Não há na seara jurídica qualquer impedimento para a implantação das chamadas “ações superpreferenciais”, ações preferenciais com direito aos dividendos exorbitantes, na sistemática jurídica de uma Companhia.
O caso paradigma de 2013, Azul, reforça e corrobora a tese de serem tais ações instrumentos lícitos para ampliar a liberdade dos acionistas na organização da sua estrutura de capitalização. Antes de analisar tal arranjo societário, a certeza é de que estamos diante de uma situação atípica, e, como tal, deve ser analisada.
A atração nas compras de ações sempre se pauta em dois campos distintos, o político e o econômico, ou nos dois. Ora, sendo a ação ordinária atrativa pela em sua originalidade em possuir o direito de voto e a ação preferencial por sua possibilidade em receber dividendos fixos, preferenciais e/ou diferenciados, mas não tendo, necessariamente, direito ao voto é atrativa pelo fator econômico.
O caso Azul foi uma utilização perspicaz das possibilidades societárias, permitidas, para uma organização satisfatória de capitalização em um ramo tão restrito que é o da aviação. Na época, o Código Brasileiro de Aeronáutica previa a obrigatoriedade de 4/5 do capital serem pertencentes a brasileiros, na exploração de serviços aéreos (atualmente a Medida Provisória 714, de 1º de março de 2016, incluiu o art. 181 e seus incisos, onde, a concessão para a exploração dos serviços aéreos será dada para PJ, estabelecida em solo nacional, com pelo menos 51% -cinquenta e um por cento- do capital com direito a voto pertencentes a brasileiros).
Sem a capacidade legal em atrair investimento externo com a atração política, visto 1/5 do capital não ser uma posse significativa de votos, mesmo na possibilidade destas ações serem compradas integralmente por um mesmo investidor. Tendo descartado a possibilidade deste 1/5 restante de ações serem ordinárias a possibilidade volta-se para as ações preferenciais, mas resta um novo porém. As possibilidades de um mesmo investidor comprar todas estas ações são baixas, então ter um dividendo obrigatório de 25% (vinte e cinco por cento) – porcentagem usada normalmente em solo nacional, seguindo o modelo do § 2º do artigo 202 da Lei nº 6.404/76, de que quando não há dividendos obrigatórios fixados pelo estatuto seriam estes no montante de 25%- não é tão atrativo, visto que o investidor teria poucas ações não é vantajoso receber esta pouca diferença, a atração não é alta. Se, entretanto, estas poucas ações preferenciais estipularem um alto valor no seu dividendo diferencial (no caso Azul foram estipulados 75%), a atratividade em comprar estas poucas ações sobe drasticamente.
Claro que o caso Azul foi alvo de discussões sobre sua legalidade e utilização, por isto que se tornou paradigma, a CVM pronunciou-se diversas vezes e o caso foi considerado válido e permitido. O medo nesse caso, visto não desrespeitar as leis então vigentes, seriam dois distintos.
O primeiro medo, era de quebrar com os princípios de proporcionalidade e de razoabilidade imperantes no Direito Brasileiro. Como dito anteriormente, os campos de atração, político e econômico, imperantes nas ações das Companhias são responsáveis pelo equilíbrio societário da mesma e na fruição de seu estatuto. Se há uma grande atração no campo político isto acaba por desigualar o outro lado e vive versa. Ocorre que no caso estudado, a utilização de uma ação preferencial com um valor extravagante em seu dividendo diferencial poderia desfavorecer o outro lado, as ações ordinárias. O fato é que estas ações preferenciais diferenciadas ainda eram apenas 1/5 do capital, em números quantitativos não superariam o dividendo recebido pelas ações ordinárias, e se superassem, seria uma diferença razoável.
O segundo medo, pautando- se no art. 111, § 1º da Lei nº 6.404/76, existe na possibilidade de as ações preferenciais adquirirem direito ao voto, quando no término de 03 (três) exercícios seguidos a Companhia não distribuir dividendo. A grande habilidade foi em diferenciar as três possibilidades de recebimento dos dividendos das ações preferenciais, o dividendo obrigatório e o dividendo fixo seriam os únicos elegíveis para a obtenção do voto findo os 03 (três) exercícios seguidos da Companhia, sem a distribuição dos dividendos. O caso em questão apenas utiliza os dividendos diferenciados ou preferenciais, introduzidos pela Lei nº 9.457/97, não são prioritários. Basicamente, estas ações sem direito ao voto e contando apenas com os dividendos preferenciais terão a supressão permanente do direito de voto, mesmo que findo 03 (três) exercícios seguidos sem a distribuição dos dividendos.
Concluindo, não há qualquer impedimento legal ou conceitual com as ações superpreferenciais. Elas pautam-se na qualidade de se extirparem por completo seu direito ao voto e com isso consegue-se equilíbrio com o campo político.