O DIREITO DA MULHER AOS ALIMENTOS GRAVÍDICOS DENTRO DA LEI Nº 11.804/2008 EM FAVOR DO NASCITURNO
1 BREVE HISTÓRICO
A disciplina de alimentos é tema de extremo enredamento, que foge do senso comum. Trata-se, em realidade, de instituto cujos princípios são remarcados por uma acentuada complexidade, com reclamo de permanente atualização dos seus estudos.
Os alimentos ao nascituro nunca foram devidamente discutidos, visto a imprecisão do Código Civil ao tratar da personalidade civil, adotando a teoria natalista, mas colocando a salvo os direitos do nascituro, conforme Art. 2º desse Codex:
A personalidade civil da pessoa começa do nascimento com vida; mas a Lei põe a salvo, desde a concepção, os direitos do nascituro.
Ainda nessa acepção o Estatuto da Criança e do Adolescente em nada colaborou sobre o tema, dispondo no Artigo 8º, § 3º, que “incumbe ao Poder Público propiciar apoio alimentar à gestante e à nutriz que dele necessitem”.
Porém, a doutrina de alguma forma, reconheceu o direito de alimentos do nascituro, como forma de proteção à vida e a dignidade do feto em desenvolvimento.
De maneira bem curiosa, o Direito Francês garante o direito de alimentos do filho sem pai declarado ou reconhecido, com base na responsabilidade do risco que o suposto pai correu de gerar uma pessoa, mediante “ação para fins de subsídios” que deve ser intentada contra quem teve relação sexual com a mãe do nascituro, mesmo sem ter havido o reconhecimento de paternidade.
Por outro lado, as exigências feitas pela Lei de Alimentos, como a comprovação da paternidade, do vínculo de parentesco ou da obrigação alimentar, sempre foram um obstáculo para a concessão de alimentos em favor do nascituro. Ainda que inegável a responsabilidade parental desde a concepção, o silêncio do legislador gerava dificuldade à concessão de alimentos ao nascituro.
Apesar do óbice apresentado pela Lei nº 5.478/1968, a Justiça em casos raríssimos teve a oportunidade de analisar e reconhecer o dever alimentar desde a concepção, “garantindo-se assim os direitos do nascituro e da gestante, em atenção à teoria concepcionalista do Código Civil e ao princípio da dignidade da pessoa humana.
Decisões no Tribunal do Rio Grande do Sul abriram precedentes e deram margem para a elaboração da nova Lei de Alimentos nº 11.804/2008, a qual prevê com louvor a concessão de alimentos gravídicos, que podem ser compreendidos como; “aqueles devidos ao nascituro, mas percebidos pela gestante ao longo da gravidez”.
Assim, discorreu Clovis Brasil Pereira, que a nova Lei de alimentos, “garante a assistência da mulher gestante, com o enfoque e preocupação com a proteção do ser em formação, desde sua concepção, e da própria parturiente, para que tenha uma formação e desenvolvimento sadio, antes mesmo do nascimento”.
Portanto, muito festejada tal Lei, pois possibilitou a abertura de portas para o nascituro no sentido de dar pleno amparo ao seu direito de se desenvolver, nascer e viver.
2. CONCEITO
Sempre houve discussão em relação ao direito do nascituro pleitear alimentos, alguns entendem ser inviável uma ação em que o titular do direito seja o nascituro, entretanto, outros entendem haver responsabilidade alimentar antes mesmo do nascimento, desde que já concebido no ventre materno.
A Lei, a doutrina e a jurisprudência eram incertas sob a disciplina legislativa anterior, relativamente aos alimentos ao nascituro, porque a pretensão vinha ligada ao tema acerca do início da personalidade civil.
Um dos doutrinadores que concorda com o deferimento de alimentos para o nascituro é Arnaldo Rizzardo, que cita exemplificativamente as hipóteses em que isso pode ocorrer:
Durante a gravidez, inúmeras as situações que comportam a assistência econômica do pai. Assim, o tratamento ou acompanhamento médico; a conduta de repouso absoluto imposto à mãe em muitos casos de gravidez de risco; os constantes exames médicos e medicamento; o tipo de alimentação que deve seguir a gestante; a sua própria subsistência se for obrigada a se afastar do trabalho remunerado que exercia.
Porém com a chegada da Lei nº 11.804/2008, esse conceito foi aprimorado e colocado um ponto final na indecisão que pairava a cerca dos alimentos ao nascituro.
Surgiu, então, o que é chamado de Alimentos Gravídicos, que nada mais é do que o direito da mãe gestante receber ajuda econômica do indigitado pai durante o período gestacional, para garantir a vida e o desenvolvimento intrauterino do nascituro, com dignidade e tendo como base da obrigação alimentar simplesmente indícios de paternidade.
Buscando o significado da palavra gravídico e da palavra nascituro, tem-se que “Gravídico é adjetivo, é aquilo que diz respeito à gravidez; ou que é dependente da gravidez, sendo esta o estado da mulher durante a gestação ou prenhez”; e que “Nascituro é o ser que esta sendo gerado pela gestante, o que ira nascer, o feto durante a gestação; o ente concebido que está no claustro materno”.
Assim sendo, conforme Art. 1º da Lei nº 11.804/2008, “alimentos gravídicos compreendem-se aqueles devidos ao nascituro, mas percebidos pela gestante ao longo da gravidez”.
Deste modo, alimentos gravídicos são aqueles a que o nascituro tem direito de receber durante o período em que ainda está dentro do ventre materno, para garantir o seu bom desenvolvimento pré-natal e peri-natal, mas que serão pagos à mãe, como sua representante legal.
3. NATUREZA JURÍDICA
A natureza jurídica dos alimentos gravídicos é um misto entre pensão alimentícia e responsabilidade civil, pois adita elementos dessas obrigações, de forma que emprega a prioridade de tutela da obrigação alimentar em relação às demais obrigações e utiliza-se das regras de reparação absoluta do patrimônio que são escopo da responsabilidade civil.
Neste aspecto e tendo em vista que a Lei objetiva a máxima proteção da mãe e da futura prole, pode-se dizer que é permitido a aplicação do Código Civil de 2002 principalmente seu artigo 1698, que estipula a concorrência dos demais parentes para fazer frente ao crédito alimentício:
Se o parente, que deve alimentos em primeiro lugar, não estiver em condições de suportar totalmente o encargo, serão chamados a concorrer os de grau imediato; sendo várias as pessoas obrigadas a prestar alimentos, todas devem concorrer na proporção dos respectivos recursos, e, intentada ação contra uma delas, poderão as demais ser chamadas a integrar a lide.
Neste sentido o Superior Tribunal de Justiça, consolidou entendimento de que os avós também são responsáveis na prestação de alimentos de forma sucessiva e complementar a obrigação dos pais, desde que demonstrado que os genitores não possuem meios de suprir por completo e satisfatoriamente as necessidades do menor.
Portanto, cabe ressaltar a importância desta obrigação, que encontra fundamentos tanto no Direito de Família quanto no Direito Civil quando trata da responsabilidade civil, mais especificamente da responsabilidade parental, pois conforme já dito, a responsabilidade pela subsistência daqueles que necessitam é primeiramente dos pais, no caso de menores ou do próprio nascituro, depois dos familiares, da sociedade e por último do Estado.
4. TERMO INICIAL DOS ALIMENTOS
Em relação ao termo inicial dos alimentos paira a dúvida sobre quando deveria começar a obrigação alimentar, entendendo alguns doutrinadores como sendo devidos desde a citação, e outros que entendem serem devidos desde a concepção do feto. Em se tratando de alimentos gravídicos e o período da gravidez que não perdura in aeternum como a relação parental, descabido seria falar em citação como termo inicial para o pagamento da obrigação alimentar.
A Lei nº 11.804/2008 previa o termo inicial dos alimentos Gravídicos como sendo a data da citação do suposto pai, porém, tal decisão seria prejudicial ao nascituro e a gestante, conforme justificativa do Presidente da República ao vetar o Art. 9º da Lei de Alimentos Gravídicos.
Destarte, resta concluir que os alimentos gravídicos serão devidos desde a concepção do nascituro como forma de prevenir e garantir a sua formação ainda no claustro materno.
5. DO QUANTUM DOS ALIMENTOS GRAVÍDICOS
Da mesma forma que nos alimentos comuns, o quantum a ser fixado para os alimentos gravídicos também devem respeitar o binômio necessidade-possibilidade, de acordo com o princípio da razoabilidade e proporcionalidade para se manter o equilíbrio econômico-social das partes e para não lesar qualquer outro.
Neste sentido é que prevê o Art. 6º da Lei de Alimentos Gravídicos:
Convencido da existência de indícios da paternidade, o juiz fixará alimentos gravídicos que perdurarão até o nascimento da criança, sopesando as necessidades da parte autora e as possibilidades da parte ré.
Entretanto, esta Lei traz a destinação específica para os alimentos gravídicos, devendo esses, serem utilizados para as despesas especiais do período gestacional, da concepção ao parto, conforme disposição do Art. 2º da Lei nº 11.804/2008:
Os alimentos de que trata esta Lei compreenderão os valores suficientes para cobrir as despesas adicionais do período de gravidez e que sejam dela decorrentes, da concepção ao parto, inclusive as referentes a alimentação especial, assistência medica e psicológica, exames complementares, internações, parto, medicamentos e demais prescrições preventivas e terapêuticas indispensáveis, a juízo do médico, além de outras que o juiz considere pertinentes.
Resta evidenciado, portanto, o interesse do legislador em proteger a gestante e principalmente o nascituro, que é a parte hipossuficiente desse relação jurídica, e os necessita de maneira inconteste, pois deles, é que advêm o resguardo de seu desenvolvimento saudável.
Portanto, mostra-se de extrema complexidade o tema abordado, pois deve ser analisado com cautela pelo magistrado para que não haja exageros ou irrizoriedade na fixação dos alimentos gravídicos, e para que ninguém sai lesado em detrimento do favorecimento do outro.
6. DO ÔNUS PROBATÓRIO
Como em qualquer tipo de ação, na Ação de Alimentos Gravídicos o ônus da prova compete ao autor da ação, no caso dos alimentos gravídicos, o ônus probatório incumbe à mãe, como representante do nascituro. “Salvo a presunção de paternidade dos casos de Lei, como imposto nos Arts. 1597 e seguintes, o ônus probatório é da mãe”.
Cabe à genitora apresentar os “indícios de paternidade”, informada na Lei por meio de fotos, testemunhas, cartas, e-mails, entre tantas outras provas licitas que puder trazer aos autos, lembrando que, ao contrario do que pugnam alguns, o simples pedido da genitora, por maior necessidade que há nesta delicada condição, não goza de presunção de veracidade ou há uma inversão do ônus probatório ao pai, pois este teria que fazer (já que não possui exame pericial como meio probatório) prova negativa, o que é impossível e refutada pela jurisprudência.
Porém, conforme a previsão do Art. 6º da Lei nº 11.804/2008, na Ação de Alimentos Gravídicos basta a comprovação de indícios de paternidade para a fixação dos alimentos, desde que esses indícios sejam fundamentados.
Para o deferimento de alimentos gravídicos, provisórios ou definitivos, portanto, não bastara a mera e gratuita imputação de paternidade a alguém, devendo ser amparada na narrativa de fatos conhecidos, ou aptos a serem conhecidos mesmo em sede de justificação judicial.
Embora, “os elementos probatórios passíveis de produção no trâmite da demanda não gozam, por certo, do grau de certeza decorrente daqueles que poderiam ser amealhados em sede de Ação Investigatória de Paternidade”, como por exemplo o Exame de DNA, como devem ser colocadas as provas para a comprovação dos indícios de paternidade, sendo que é necessário o convencimento do juiz além da fundada indicação de paternidade: “Deve o autor da ação fundar-se em qualquer meio de prova que indique a convivência com o indigitado pai, o que sustentara o fumus boni iuris”.
Por outro lado, a avaliação das provas por parte do magistrado também merecem dedicação e análise profunda. Como também, é necessário a prudência do juiz e a ponderação dos fatos alegados, pois a decisão deve ser motivada e se baseará no livre convencimento do juiz.
Quanto à documentação probatória, “podem ser fotografias, testemunhas, cartas, e-mails e demais provas lícitas admitidas, que puderem corroborar positivamente para a presunção da paternidade.
Aplica-se, portanto, a regra do artigo 333, inciso I, do CC, que informa que o ônus da prova incumbe ao autor, quanto ao fato constitutivo do seu direito.
Entretanto, há alguns casos em que é possível a inversão do ônus da prova ou a produção de prova a critério do suposto pai, como por exemplo, o exame de vasectomia ou de esterilidade.
Diferentemente da Ação de Alimentos da Lei 5478, de 25 de julho de 1968, a ação de alimentos gravídicos não exige a prova pré-constituida da paternidade.
Portanto, na ação de alimentos gravídicos basta a indicação de indícios de paternidade que devem ser fundamentados e na medida do possível provados, para a estipulação de alimentos em favor do nascituro.
7. LEGITIMIDADE ATIVA E PASSIVA
O enunciado da Lei de Alimentos Gravídicos, diz que a Lei tratará do direito de alimentos da gestante e a forma como ele será exercido, pressupondo desta forma, que o legislador quis beneficiar a mulher grávida. Entretanto pode-se dizer também, que a Lei nº 11.804/2008 regula o direito de alimentos do nascituro, que será percebido pela mãe durante o período pré-natal.
Antes de discutirmos a legitimidade ativa da ação de alimentos gravídicos, é importante frisar a personalidade civil da pessoa, que segundo o Art. 2º do Código Civil, começa do nascimento com vida, mas a Lei põe a salvo, desde a concepção, os direitos do nascituro (art. 2º, CC/2002).
Assim sendo, “garantir que o nascituro tenha direito aos alimentos nada mais é do que valorizar a vida humana intrauterina, respeitando-a como tal”. Por isso, pode-se dizer que o nascituro é o titular do direito de alimentos, da mesma forma que a gestante, pois é necessário que a mulher tenha uma gestação saudável para o melhor desenvolvimento do feto e assim resguardado estará o direito à vida do nascituro, conforme preceito Constitucional.
A ação de alimentos gravídicos será ajuizada pela gestante, representando o nascituro, em face do apontado pai. A gestante pleiteia alimentos em nome do embrião que se desenvolve.
“É pacífico que o nascituro é parte no plano processual, estando apto para funcionar como autor ou demandado, representado ou assistido pela mãe, que é sua tutora e curadora nata, segundo antigo julgado local (RJTJRS, 104/418)”.
Entretanto, Maíra Syltro de Souza, considera que a legitimidade ativa seria inicialmente da gestante, mas que somente com o nascimento com vida da criança, que a legitimidade passaria a ser do filho.
Denis Donoso resolve o impasse sobre a titularidade dos alimentos gravídicos, considerando que a mãe pode pleitear ajuda financeira de maneira autônoma aos alimentos gravídicos, através dos alimentos convencionais, ou seja, seriam duas ações autônomas, uma em nome do nascituro como alimentos gravídicos, para assegurar a gestação e outra em nome da própria gestante como alimentos tradicionais, sendo, portanto, duas espécies de alimentos, com fixação em uma parcela única, que poderá ser desmembrada com o nascimento da criança com vida, usando-se do fundamento de que após o nascimento da criança a mãe não poderia ficar desamparada caso necessitasse de alimentos.
A discussão acerca da legitimidade ativa para a propositura da ação de alimentos gravídicos tem repercussão importante sobre a definição de quem pode ser parte do pólo passivo da demanda, pois há possibilidade de se cobrarem alimentos gravídicos não só do suposto pai, mas também dos avós paternos, desde que o titular do direito seja o nascituro, pois a base da obrigação será a solidariedade familiar, com base nos princípios da solidariedade familiar e da dignidade da pessoa humana.
Para alguns doutrinadores, o réu da ação de alimentos gravídicos será sempre o indigitado pai, não podendo ser movida em face dos avós ou do espólio. Isso porque, não firmada a paternidade do nascituro, não há ligação de parentesco que justifique os alimentos avoengos ou pretensão de transmissibilidade alimentar em sede de direito das sucessões.
Por conseguinte, pode-se considerar tanto a gestante quanto o nascituro como titulares da ação de alimentos gravídicos, entretanto, ao considerarmos o nascituro, estende-se a obrigação aos avós paternos e demais parentes, dentre ascendentes, descendentes e até irmãos, conforme Art. 1696 do Código Civil.
8. ASPECTOS PROCESSUAIS
GENERALIDADES
Os alimentos gravídicos de que trata a Lei nº 11.804/2008, como já dito, são aqueles necessários para cobrir as despesas do período gestacional, portanto, a sua fixação deve ocorrer em caráter de emergência, sob pena de se perder a eficácia da norma.
A intenção do legislador é a de que o processo de alimentos gravídicos tenha celeridade e eficácia, sob pena de prejuízos na qualidade gestacional do nascituro ou de ser deferido após o nascimento.
Os litígios que dizem respeito aos alimentos gravídicos versam sobre os direitos personalíssimos indisponíveis, nos quais, cessa a preponderância do interesse das partes, para predominarem os imperativos legais e os interesses de ordem publica. Assim, necessária e obrigatória a intervenção ministerial nesses processos, sendo que a pesquisa da verdade por meio da prova independerá da vontade das partes.
Portanto, o processo de Alimentos Gravídicos deve ser acompanhado pelo agente ministerial, tendo em vista o interesse da ordem pública de que está submetido, e com análise célere e eficiente para não causar nenhum dano a gestante e sua prole.
9. PROCEDIMENTO
Como toda ação, a ação de alimentos gravídicos inicia-se com uma petição inicial, contendo a narrativa dos fatos, e os fundados indícios de paternidade.
Era conjeturado ainda, pela Lei nº 11.804, a realização de uma audiência de justificação, mas devido à morosidade do Judiciário isso ocasionaria o atraso na fixação dos alimentos.
Então, recebida a citação, dispõe o art. 7º da Lei de Alimentos Gravídicos que o réu terá o prazo de cinco dias para apresentar resposta e deverá alegar toda a matéria de defesa, sob pena de preclusão observando-se que nestas ações não se aplicam os efeitos da revelia, obrigando-se o juiz a instruir celeremente o processo.
Fixados os alimentos provisórios em sintonia com a equação alimentar, o réu apresentará sua defesa em cinco dias, seguindo-se os procedimentos específicos da Lei de Alimentos e do Código de Processo.
São os alimentos gravídicos um misto de cautelar de caráter definitivo, pois necessitam serem postulados de imediato e possuem definitividade, pois, permanecem inalterados até mesmo após o nascimento da criança até que alguém peça sua modificação.
Os alimentos gravídicos, embora tragam a sua roupagem definitiva no curso da gravidez, com a nova Lei, assumirão um caráter misto, de cautelaridade e definitividade. Serão cautelares, devendo ser postulados de imediato, durante o estado gravídico, deferidos preferencialmente in limine, sob pena de se tornarem prejudicados por eventual demora da instrução; podem ser definitivos, porquanto fixados, assim ficarão depois do nascimento com vida, em não havendo pedido judicial para sua revisão.
Desta forma, fixados os alimentos gravídicos em sentença, terá o nascituro um titulo executivo judicial com a fixação dos alimentos gravídicos, passível de execução, mesmo sem ainda ter nascido com vida. Pretendendo ver atendidas todas as necessidades do menor enquanto feto e após o seu nascimento, há quem sustente que o juiz poderá fixar duplamente os alimentos, ou seja, um para vigorar durante o estado gravídico e outro percentual para vigorar após o nascimento.
Além disso, afora o reduzido prazo de contestação, como nas cautelares, a ação seguirá o rito da ação de alimentos (Lei nº 5.478/1968) e do Código de Processo Civil, de acordo com o já dito.
Desse modo, como bem advertiu o Desembargador Enio Zuliani, “o juiz deve ter a sensibilidade de atuar de acordo com as circunstâncias e com a urgência, pois as decisões não devem demorar mais tempo do que o período gestacional”.
Assim sendo, a ação de alimentos gravídicos trata-se de procedimento especialíssimo de cognição sumária, que embora, siga o procedimento da Ação de alimentos tradicional, é revestida de pequenas particularidades que fazem dela, Ação independente, com requisitos diferentes das demais.
10. PRESUNÇÃO DE PATERNIDADE E O PRINCIPIO DA PATERNIDADE RESPONSAVEL
A Lei nº 11.804/2008 verifica as possibilidades de atribuição de paternidade sem a manifestação do suposto pai, através da presunção de paternidade que pode ocorrer em alguns casos específicos.
Os arts. 1597 a 1602 do CC elencam possibilidades de presunção ou não de paternidade de acordo com casos de traição, vasectomia, impotência sexual, novas núpcias, entre outras. Embora as regras acima trazidas nos casos de casamento, não há óbice para serem interpretadas extensivamente para os casos de união estável.
Com o advento da Lei de Alimentos Gravídicos a presunção de paternidade ganhou força ao considerar indícios de paternidade para a atribuição do vínculo parental, principalmente porque pode ocorrer antes mesmo do nascimento da criança e ainda obriga o indigitado a pagar alimentos mesmo sem a comprovação da filiação como é exigido pela Lei de Alimentos de 1968.
Acertadamente a nova Lei trouxe a tona o princípio da paternidade responsável que vem sendo fortemente discuto nos dias atuais para a determinação de alimentos aos filhos, ainda que não nascidos.
A Lei informa que a fixação dos alimentos gravídicos se dará de acordo com o convencimento do juiz da “existência de indícios de paternidade” conforme dito no Artigo 6º da referida norma.
Art. 6º Convencido da existência de indícios da paternidade, o juiz fixará alimentos gravídicos que perdurarão até o nascimento da criança, sopesando as necessidades da parte autora e as possibilidades da parte ré.
Portanto, entende-se por melhor sacrificar o sujeito responsável pelo pagamento de alimentos que poderá provar no futuro que não os deve, do que prejudicar o nascituro e lançá-lo ao infortúnio de não ter suas necessidades vastamente amparadas por ausência de instrução probatória.
Não resta duvida de que, diante dos alimentos gravídicos procedentes, poderá haver um ‘esvaziamento’ ou uma diminuição das ações de investigação de paternidade.
O mesmo ocorrerá com a ação de alimentos, uma vez que fixados os alimentos gravídicos, não será mais necessário a prova de paternidade nem todos os exames periciais exigidos pela Lei de Alimentos, restando apenas proceder ao registro civil da criança de imediato, sob de sobrevir nova ação de averiguação de paternidade e até o pagamento de novos honorários advocatícios.
Destarte, resta completar que o princípio da paternidade responsável foi um grande avanço na legislação brasileira, pois permitiu alcançar as modalidades de pagamento de alimentos por completo e garantiu a satisfação de todas as necessidades dos filhos gerados pelo determinado pai, nascidos ou não.
11. PRINCÍPIO DA IRREPETIBILIDADE DOS ALIMENTOS E O EFEITO RETROATIVO
Pode-se dizer que os alimentos gravídicos também são irreptíveis, uma vez que se destinam a garantia da sobrevivência de quem os recebem, mãe e filho neonato. Como os alimentos servem para garantir a vida e se destinam à aquisição de bens de consumo para assegurar a sobrevivência é inimaginável pretender que sejam devolvidos.
Entretanto, a doutrina admite algumas hipóteses em que é possível cobrar de volta o que indevidamente foi pago pelo pai, como no caso de comprovada má-fé da mãe.
Desta forma, conforme ensinamento de Carlos Roberto Gonçalves, “o princípio da irrepetibilidade não é, todavia, absoluto e encontra limites no dolo em sua obtenção, bem como na hipóteses de erro no pagamento dos alimentos”, como por exemplo, a mãe que mesmo sabendo não ser o réu, pai da criança, intenta ação de alimentos gravídicos contra o mesmo, objetivando receber verba alimentar que não tem direito e assim obter lucro indevido as custas do sujeito.
Ao tratarmos de alimentos gravídicos, portanto, deve ser redobrada a atenção quanto a essa questão, vez que para a fixação de tais alimentos, basta a indicação do suposto pai com os fundados indícios de paternidade, o que pode acarretar a estipulação de uma obrigação a quem não deva pagar, já que a prova da paternidade como o exame de DNA só poderá ser realizado após o nascimento da criança. E até então, o indigitado pai estaria obrigado a ajudar nas despesas da gestação.
Os novos valores definidos a partir de novas provas impõem que o quantum fixado passe a valer desde a sua definição. Esta regra vale até quando a redefinição do valor dos alimentos é levada a efeito na sentença. O que tem efeito imediato, mesmo sujeito a recurso.
Ainda, em face da natureza da obrigação, a Lei empresta eficácia retroativa à sentença para aquém de seu trânsito em julgado: ‘em qualquer caso’ efeito retroativo à data da citação (La 13 § 2º). Portanto, não tem como o réu se furtar ao pagamento desses alimentos.
Portanto, a regra considera os alimentos gravídicos, instituo jurídico que não pode repetido, porém se houver dolo na obtenção ou erro no pagamento, é possível que haja o ressarcimento dos valores já pagos, com fundamentos no enriquecimento sem ca
12. CONVERSÃO DOS ALIMENTOS GRAVÍDICOS EM PENSÃO ALIMENTÍCIA
Um aspecto da nova Lei que deve ser ressaltado é que o pagamento de alimentos gravídicos se restringe ao período da gravidez, convertendo-se em pensão alimentícia com a vinda do nascituro à luz.
Isso conforme dispõe o parágrafo único do Art. 6º da Lei de Alimentos Gravídicos:
Após o nascimento com vida, os alimentos gravídicos ficam convertidos em pensão alimentícia em favor do menor até que uma das partes solicite a sua revisão.
Desta forma, a conversão dos alimentos gravídicos em pensão alimentícia ocorre de maneira espontânea, sem a manifestação de vontade de qualquer das partes, isso porque, o valor já foi decidido na Ação de Alimentos Gravídicos, porém, para que haja modificação ou extinção do valor fixado na ação de alimentos gravídicos, é necessário que a mãe ou o indigitado pai ingressem com outra ação, de revisão de alimentos, mostrando que houve mudança no binômio necessidade/possibilidade, ou ação de exoneração, comprovando neste caso, o alimentante, que não é pai biológico da criança nascida e, portanto, irregular seria sua manutenção como devedor de alimentos.
Assim sendo, a conversão dos alimentos gravídicos ocorrem de maneira automática e espontânea, entretanto, nada impede que seja deferido dois tipos de alimentos, um para durante a gestação e outro para depois do nascimento com vida da criança, visto que as necessidades se modificam após o nascimento, desde que se tenha consciência de que os valores fixados devem respeitar o binômio alimentar atualizado, “não se sabendo e não se podendo prever a necessidade da criança após o nascimento e nem a possibilidade do obrigado.
Portanto, a fixação dos alimentos gravídicos deve ocorrer de maneira compatível com a realidade em que se encontra a criança, de acordo com suas necessidades durante a prenhe e de acordo com suas necessidades após o nascimento com vida.
13. REVISÃO E EXTINÇÃO DOS ALIMENTOS GRAVÍDICOS
A Lei nº 11.804/2008 ainda no dispositivo do Art. 6º, parágrafo único, também prevê a possibilidade de revisão dos alimentos gravídicos, que pode ser pedido tanto pela gestante quanto pelo indigitado pai, desde que seja fundamentado o pedido, pois é necessário que haja modificação na situação financeira das partes, conforme legislação do Art. 1699 do Código Civil:
Se, fixados os alimentos, sobrevier mudança na situação financeira de quem os supre, ou na de quem os recebe, poderá o interessado reclamar ao juiz, conforme as circunstâncias, exoneração, redução ou majoração do encargo.
Desta forma, temos que as parte é quem devem manifestar-se pela modificação ou manutenção daqueles alimentos gravídicos, de acordo com o binômio alimentar que deve ser verificado no momento da exigência.
Esta revisão poderá ser realizada, também, durante a gestação, embora, pela morosidade processual, dificilmente se verá o fecho antes do nascimento do menor.
Entretanto, uma vez concedida a revisão dos alimentos, esta passará a valer a partir da citação em caso de majoração dos alimentos e à partir da sentença mesmo que passível de recurso, em caso de minoração da obrigação alimentícia, isto porque, os alimentos são irrepetíveis, não se podendo devolver o que provisoriamente pagou a mais.
Quanto a extinção, esta se dará automaticamente em casos de aborto e, também, após o nascimento, comprovando-se que a paternidade não é daquele obrigado pelos alimentos gravídicos.
Por fim, tem-se que nas ações de redução e exoneração de alimentos, não aplica o efeito retroativo tendo em vista que tal aplicação afrontaria o Principio da irrepetibilidade dos alimentos, independente de qual seja a natureza jurídica da obrigação alimentar.
Desta feita, a extinção da obrigação alimentar pertinente à gestante ou ao nascituro, poderá acontecer, pela ação negatória de paternidade em que é constatado não ser o réu, o pai biológico da criança titular do direito, ou ainda em casos em que a vida desta é ceifada por qualquer motivo, como o aborto espontâneo ou provocado, sendo que nesses casos há o entendimento que os alimentos permaneceriam pela necessidade da gestante.
Ainda repise-se que em qualquer hipótese, a exoneração dos alimentos gravídicos poderá dar ao réu o direito de receber de volta os valores já pagos durante a gravidez, exceto os casos ressaltados.
13. CONCLUSÃO
Em tempos de destaque da dignidade da pessoa humana e de especial proteção ao direito à vida, a Lei de Alimentos Gravídicos, nº 11.804 de 05 de novembro de 2008, veio amparar de maneira completa os direitos do nascituro, atribuindo-lhe o direito de receber alimentos durante seu desenvolvimento no ventre materno, e assegurando que esse direito permaneça mesmo após o seu nascimento.
Como vimos, já existia a obrigatoriedade dos pais prestarem alimentos aos filhos, porém inexistia disposição quanto ao momento em que se iniciava essa prestação. Com a Lei dos Alimentos Gravídicos a questão foi resolvida, com a determinação de que os alimentos são devidos desde a concepção do embrião, até a maioridade.
Essa solução trazida pela nova Lei advém da essência da obrigação alimentar e é amparada por princípios e normas constitucionais que protegem acima de tudo o direito à vida.
Assim, conclui-se que a referida Lei veio no sentido de proteger o nascituro e a gestante para que seja enaltecida a especial atenção que a Constituição Federal dispensa para a Dignidade da Pessoa Humana resguardando o direito da gestante em ter o mínimo necessário para uma perfeita gestação, protegendo também o nascituro proporcionando a ele um perfeito desenvolvimento.
Marinete Luiza Oro
Advogada
Mestrado em Direito Internacional - UK
Engenheira de Negócios
Bacharel em Artes Visuais
Bacharel em Letras/Francês