A decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) no Habeas Corpus nº 118.770, que autorizou a prisão imediata após condenação pelo Tribunal do Júri, revela uma preocupante flexibilização dos direitos e garantias fundamentais no ordenamento jurídico brasileiro. Sob o pretexto de preservar a soberania dos veredictos, o STF admitiu a execução provisória da pena, ignorando o princípio da presunção de inocência previsto no artigo 5º, inciso LVII, da Constituição Federal, que assegura que ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado da sentença condenatória.
Ao justificar a medida, o Tribunal sustentou que o caráter popular do Júri confere legitimidade à decisão, independentemente da pendência de recursos. No entanto, tal entendimento fragiliza a estrutura de garantias processuais e, na prática, subverte a presunção de inocência em favor de um punitivismo desproporcional. O resultado é uma criminalização antecipada que penaliza não apenas o réu, mas o próprio sistema de justiça, que se torna mais suscetível a erros e abusos.
Além disso, a decisão abre um precedente perigoso, permitindo que a execução provisória da pena, antes restrita a casos excepcionais, seja expandida para outras hipóteses, aumentando o número de encarceramentos sem condenação definitiva. Essa postura ignora a realidade de um sistema prisional já saturado, no qual a superlotação e as condições desumanas são a regra, e não a exceção.
Mais grave ainda é o impacto sobre a credibilidade do Tribunal do Júri, que, ao ser alçado a uma posição de absoluta infalibilidade, passa a ser visto como um instrumento de repressão em vez de um espaço de justiça. A soberania dos veredictos, longe de ser um dogma, deve ser equilibrada com o respeito aos direitos fundamentais, sob pena de legitimar arbitrariedades.
Em um cenário de tantas incertezas jurídicas, a decisão do STF soa como um retrocesso, reforçando um discurso de segurança pública às custas de garantias individuais. A preservação dos direitos fundamentais deve ser a prioridade, mesmo diante da pressão popular e da crescente demanda por respostas rápidas e enérgicas contra o crime. Ao flexibilizar a presunção de inocência, o STF não apenas desrespeita a Constituição, mas também coloca em risco o equilíbrio necessário entre punição e justiça.