Observando a história, podemos perceber que o seu decurso se faz em círculos. Momentos históricos são marcados por conquistas, que por sua vez instauram novos momentos. Assim, o ciclo da vida social vai sendo escrito ao longo dos tempos.
No início das relações trabalhistas prestar um serviço era visto como uma “oportunidade”, quase um favor que o empresário “benevolente” concedia a membros das classes menos favorecidas.
Novos ciclos vieram, trabalhadores começaram a conquistar alguns direitos, até que se cristalizou a concepção de que a relação de trabalho precisava ser tutelada pelo Estado, e mais, que o cidadão trabalhador era hipossuficiente diante do poderio econômico de seus patrões. Parecia claro que o Estado precisava proteger o cidadão nas relações trabalhistas.
Nesta concepção, fundamentaram-se várias conquistas. Vieram as Declarações de Direitos Trabalhistas, Leis Trabalhistas foram Consolidadas… Mas como tudo parece realmente ser cíclico na história da humanidade, eis que o Mercado, leia-se: empresários/capitalistas, ressurge com força, navegando nas ondas do desaquecimento econômico global, defendendo que “leis ultrapassadas não podem regular as relações de trabalho do século XXI”. Já nem falam mais em emprego. Intencionalmente, usam a palavra trabalho para se referir ao tema!
Este pensamento mercantilista tem tomado força no Brasil. O Presidente do Tribunal Superior do Trabalho (TST), Íves Gandra Filho, em entrevista publicada no jornal O Globo de 28 de fevereiro de 2016, afirmou que “as negociações entre patrões e empregados devem prevalecer sobre o garantido em lei”, para delírio dos representantes dos empresários e desespero dos dirigentes das centrais sindicais.
Seria a Justiça do Trabalho “muito paternalista”, como afirmou o nobre Ministro ?
Embora seja fato inconteste que países como a Alemanha atribuem às reformas trabalhistas implantadas em 2008 o fortalecimento de suas economias, é preocupante a ideia de transferir para “a autonomia das vontades” a liberdade de “ajustar as condições de trabalho, de acordo com a conjuntura nacional, para garantir a manutenção de empregos”.
Será possível pensar que em uma relação tão desproporcional como a trabalhista, todas as “vontades” conseguiriam manter-se autônomas, sem um eficaz sistema de “freios e contrapesos” ?
Somos um povo marcado por injustiças, todas elas bancadas pela desigualdade econômica. Os reis, arrendatários, donatários, barões, fazendeiros, comerciantes, empresários sempre impuseram regras desumanas para quem desejasse lhes servir de mão de obra. O que teria mudado agora para que o Brasil-Estado passasse a defender que a Justiça deva se ausentar de tais relações tão fundamentais para a composição social do nosso País?
A questão da flexibilização das leis trabalhistas é tão ampla quanto complicada. Este fenômeno iniciou-se na década de setenta com a crise do petróleo e só se fortaleceu de lá pra cá.
No tocante ao aspecto da possibilidade de terceirização da mão de obra que tramitou na Câmara dos Deputados esta semana e seguiu para a sanção presidencial, os direitos e garantias trabalhistas individuais não parecem ter sido mitigados diretamente. A controvérsia surge na seara do funcionalismo público, que percebe nesta lei a abertura de um mercado de trabalho, até agora muito bem sectarizado, no qual só adentravam via concurso público.
Pelo Projeto de Lei aprovado, funções consideradas essenciais também poderão ser preenchidas através da contratação terceirizada de profissionais. Isto causa grande temor por parte de servidores públicos, já que deverá substituir a realização de concursos e a diminuir o patamar de salários pagos até então.
Do ponto de vista da existência de algum impeditivo legal, é importante verificar que a Constituição Federal de 1988 não faz menção à expressão terceirização, não sendo possível identificar em seus dispositivos qualquer limite para as terceirizações envolvendo a natureza da atividade – meio ou fim.¹
Podemos concluir que tais critérios norteadores para as terceirizações foram estabelecidos pela Justiça do Trabalho. A Súmula 256 determinou que “ Salvo os casos de trabalho temporário e de serviço de vigilância… é ilegal a contratação de trabalhadores por empresa interposta, formando-se o vínculo empregatício diretamente com o tomador dos serviços”.
Percebendo que tal posicionamento não coadunava com a realidade das relações trabalhistas, o Tribunal Superior do Trabalho editou o Enunciado 331 afirmando: “I – A contratação de trabalhadores por empresa interposta é ilegal, formando-se o vínculo diretamente com o tomador dos serviços, salvo no caso de trabalho temporário. II – A contratação irregular de trabalhador, mediante empresa interposta, não gera vínculo de emprego com os órgãos da administração pública direta, indireta ou fundacional”
O tema é instigante e ainda produzirá muito!