RESPONSABILIDADE CIVIL DO MÉDICO E DO MÉDICO CIRURGIÃO ESTÉTICO
Inicialmente, deve-se destacar que a responsabilidade médica pode ser dividida em duas modalidades distintas, sendo uma subjetiva e outra que prescinda da comprovação da culpa. Explica-se: a responsabilidade do médico geral fica a obrigação de meio, pela qual o médico tem o dever de orientar seu paciente da melhor forma possível para que ele se cure.
Os deveres do médico daí decorrentes, situam-se em três momentos: antes do início do tratamento, durante e depois do tratamento. Ou seja, o profissional deve ouvir o paciente, interrogá-lo e averiguar a etiologia da moléstia; ao paciente incumbe fornecer ao médico todos os dados que interesse a esse fim, úteis para a formação do histórico clínico do enfermo[1]. Os médicos por sua vez, devem aos pacientes uma informação objetiva, veraz, completa e acessível.
Leciona Sergio Cavalieri Filho[2] (2009, p.370) que
Nenhum médico, por mais competente que seja, pode assumir a obrigação de curar o doente ou de salvá-lo, mormente quando em estado grave ou terminal. A ciência médica, apesar de todo o seu desenvolvimento, tem inúmeras limitações, que só os poderes divinos poderão suprir. A obrigação que o médico assume, a toda evidência, é a de proporcionar ao paciente todos os cuidados conscienciosos e atentos.
Cumpre referir que a dor, a doença, a morte e as alterações da saúde não constituem, em princípio, um risco que nasça da atividade médica, mas algo ínsito ao ser humano. Segundo Miguel Kfouri Neto[3] (2013 p.45), “o próprio doente traz consigo um risco, derivado de sua patologia – não é o médico quem a provoca. Adotar uma responsabilidade objetiva [...] equivale a lutar contra a própria natureza humana”.
Portanto, a responsabilidade civil do profissional da medicina, entre nós, continua a repousar no estatuto da culpa, incumbindo à vítima provar o dolo ou culpa stricto sensu do agente, para obter a reparação do dano, conforme artigos 186[4] e 951[5] do Código Civil. Contudo, nosso Codex permite, em hipóteses específicas, alguns casos de responsabilidade objetiva, ou responsabilidade sem culpa, as quais encontram-se elencadas no parágrafo único do artigo 927 do Código Civil[6], uma vez que a comprovação de culpa, às vezes, é uma prova difícil[7].
Assim, sendo a responsabilidade civil do médico geral subjetiva, com culpa que deve ser comprovada, o juiz poderá solicitar perícia para fins de comprovação de culpa.
Neste sentido:
RESPONSABILIDADE CIVIL. DANO MORAL E MATERIAL. ERRO MÉDICO. SIMPATECTOMIA TORÁCICA. HIPERIDROSE CRÂNIO-FACIAL. ERRO MÉDICO. HIPERIDROSE COMPENSATÓRIA. PROVA PERICIAL CONCLUSIVA. FALHA NO ATENDIMENTO MEDICO NÃO VERIFICADA. CONSENTIMENTO INFORMADO. INADEQUAÇÃO DO PROCEDIMENTO NÃO VERIFICADA. DEVER DE INDENIZAR AUSENTE. Caso dos autos em que o autor ingressou com pedido de indenização por danos morais e materiais, tendo em vista os danos experimentados em decorrência do procedimento cirúrgico de simpatectomia torácica realizado com o médico demandado, supostamente, de forma negligente, que acarretou resultado insatisfatório após ato cirúrgico, com hiperidrose compensatória. A doutrina distingue duas hipóteses de responsabilização médica: a responsabilidade decorrente da prestação do serviço direta e pessoalmente pelo médico como profissional liberal, e a responsabilidade médica decorrente da prestação de serviços médicos de forma empresarial, aí incluídos os hospitais. Na hipótese dos autos, trata-se de responsabilidade pessoal, uma vez que a demandante moveu a ação contra o médico responsável pela realização do procedimento cirúrgico de simpatectomia torácica. A obrigação assumida pelo médico é de meio, devendo este utilizar-se de toda a técnica disponível para o tratamento do paciente; no entanto, não pode garantir a cura do enfermo, o que depende de diversos fatores. Sua responsabilidade depende de comprovação de culpa, a teor do disposto no art. 14, § 4°, do CDC. Conforme o laudo pericial realizado, o atendimento médico prestado foi correto, com a utilização dos meios e conhecimentos disponíveis para o atendimento, inexistindo fatos que indiquem negligência, imprudência ou imperícia. Os testemunhos colhidos durante a instrução processual apenas corroboram o descrito pelo autor acerca da sudorese excessiva que o levou ao procedimento médico. Nada esclarecendo no que diz com o pós-operatório, questão de fundo da demanda. A prova colhida no processo não se revela suficiente para configurar o dever de indenizar. DIREITO DE INFORMAÇÃO. No tocante ao direito de informação, trata-se de um dos direitos básicos do consumidor (art. 6º, III, do CDC), e tem por finalidade dotar o paciente de elementos objetivos de realidade que lhe permitam dar, ou não, seu consentimento. A prova documental constante dos autos afasta eventual falha do dever de informar do médico. O documento de fl. 74 (Termo de Esclarecimento, Ciência e Consentimento) é claro quanto à possibilidade de complicações associadas ao procedimento realizado. Os elementos dos autos levam a crer que o demandante tinha conhecimento do procedimento realizado, bem como eventuais efeitos colaterais advindos da intervenção cirúrgica. Sentença de improcedência mantida. RECURSO DE APELAÇÃO DESPROVIDO. (Apelação Cível Nº 70062235981, Nona Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Túlio de Oliveira Martins, Julgado em 29/04/2015)
Aliás, a responsabilidade civil do médico geral é subjetiva, pois, segundo Miguel Kfouri Neto[8] (2013, p. 72), “a atividade curativa, em regra, não gera risco ao paciente. Antes, muito pelo contrário, visa a afastar risco de agravamento do seu estado de saúde do doente, propiciando-lhe cura ou melhora total”. Ou seja, a medicina é, por excelência, uma atividade profissional marcada pelo compromisso de meios[9].
O Eg. TJRS já decidiu:
RESPONSABILIDADE CIVIL. AÇÃO INDENIZATÓRIA. CIRURGIA PEDIÁTRICA CARDÍACA. NECESSIDADE. FALHA NO DIAGNÓSTICO. INOCORRÊNCIA. AUSÊNCIA DE PROVA DE CULPA DO MÉDICO. 1. A responsabilização do profissional liberal por defeito na prestação do serviço implica evidência de culpa. Art. 14, § 4º do CDC. 2. São pressupostos da responsabilidade subjetiva a comprovação da ocorrência do dano, a culpa ou dolo do agente e o nexo de causalidade entre o agir do réu e o prejuízo. 3. Caso em que a parte autora, menor impúbere, encontrava-se com quadro provável de problemas cardíacos e os resultados dos exames realizados indicavam a necessidade de procedimento cirúrgico, com urgência, sob pena do agravamento da situação. 4. Prova pericial que atesta a inexistência de elementos a demonstrar o liame subjetivo entre a conduta médica e os alegados danos morais. Expert que indica ter o profissional da saúde utilizado meios adequados/possíveis para o tratamento do paciente. Exames complementares que não se mostravam justificados na espécie, ante a urgência da situação. Sentença de improcedência mantida. NEGARAM PROVIMENTO À APELAÇÃO. UNÂNIME. (Apelação Cível Nº 70061446795, Décima Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Jorge Alberto Schreiner Pestana, Julgado em 30/04/2015)
Portanto, para que haja o dever de reparação por erro médico, sendo este um médico geral, mister se faz a comprovação do ato ilícito, do dano, do nexo causal e da culpa em sentido estrito, como negligência, imprudência e imperícia.
Esta responsabilidade civil encontra-se regida no Código de Ética Médica, aprovado pela Resolução 1.931 de 17 de dezembro de 2009, onde contem as normas que devem ser seguidas pelos médicos no exercício de sua profissão, utilizando-as nas relações advindas do estudo da Medicina.
Reza o artigo 1º, do Capítulo III da referida Resolução que capítulo III que é vedado ao médico causar dano ao paciente, por ação ou omissão, caracterizável como imperícia, imprudência ou negligência. E aí destaca, em seu parágrafo único que a responsabilidade médica é sempre pessoal e não pode ser presumida. Assim, mister se faz a comprovação do ato ilícito, do dano, do nexo causal e da culpa em sentido estrito, como negligência, imprudência e imperícia, a cargo do ofendido.
Como ressalta Pablo Stolze Gagliano e Rodolfo Pamplona Filho[10] (2009, p.210), a responsabilidade médica é como regra geral, a obrigação de meio, porém, de outra banda, a responsabilidade civil do médico cirurgião plástico estético é de resultado.
Maria Helena Diniz[11] (2003, p.271) ressalta que
A responsabilidade do médico é contratual, por haver entre o médico e seu cliente um contrato, que se apresenta como uma obrigação de meio, por não comportar o dever de curar o paciente, mas de prestar-lhe cuidado conscienciosos e atentos conforme os progressos da medicina. Todavia, há casos em que supõe a obrigação de resultado, com sentido de cláusula de incolumidade, nas cirurgias estéticas e nos contratos de acidentes. Excepcionalmente a responsabilidade do médico será delitual, se ele cometer um ilícito penal ou violar normas regulamentadoras da profissão.
Desta maneira, em que pese a responsabilidade civil do médico ser, de regra, subjetiva, tem-se casos em que esta será objetiva, com a dispensa da comprovação da culpa por parte do ofendido, pois culpa presumida.
Em síntese, aduz Miguel Kfouri Neto[12] (2013, p. 73) que “a responsabilidade objetiva é presumida e, nela, não se cogita de culpa, por isso transfere-se ao causador do dano o ônus de provar culpa exclusiva da vítima ou caso fortuito, circunstâncias que arredam o nexo de causalidade, visando eximir-se da obrigação de indenizar”.
É o caso do médico cirurgião plástico estético, eis que este responde independentemente de culpa, uma vez que a teoria objetiva da responsabilidade civil, neste caso, está assentada na teoria do risco.
O médico cirurgião plástico tem o dever de dar o resultado esperado ao seu paciente, ou seja, tem-se uma obrigação de resultado, com um fim específico, sem o que, não terá cumprido sua obrigação.
A jurisprudência neste caso é maciça, segundo entendimento do Eg. TJRS:
RESPONSABILIDADE CIVIL. CIRURGIA PLÁSTICA EMBELEZADORA. RESULTADO INDESEJADO. FALHA NO DEVER DE INFORMAÇÃO. DANOS MORAIS CONFIGURADOS. VALORES DESEMBOLSADOS PARA REALIZAÇÃO DE PROCEDIMENTO CIRÚRGICO. RESSARCIMENTO. A cirurgia plástica de natureza estética não caracteriza obrigação de meio, mas de resultado. O direito à informação é um dos direitos básicos do consumidor (art. 6º, III, do CDC), e tem por finalidade dotar o paciente de elementos objetivos de realidade que lhe permitam dar, ou não, o consentimento. Ausente nos autos elementos que demonstrem a ciência à parte autora acerca dos riscos do procedimento e possíveis resultados. DANOS ESTÉTICOS E MORAIS. No caso em exame, o dano estético, distinto do dano moral, corresponde à alteração morfológica da formação corporal da autora e à deformidade (cicatrizes); enquanto que o dano moral corresponde ao sofrimento mental - dor da alma, aflição e angústia a que a vítima foi submetida. Fixação do montante indenizatório considerando o caso concreto, o sofrimento da demandante, além do caráter punitivo-compensatório da reparação. Indenização mantida em R$ 25.000,00 (vinte cinco mil reais), consoante os parâmetros utilizados por esta Câmara Cível em situações análogas. DANO MATERIAL. São devidos os danos materiais consistentes no valor incontroverso despendido para a realização da cirurgia. Danos materiais mantidos nos termos da sentença. RECURSO DE APELAÇÃO DESPROVIDO. (Apelação Cível Nº 70059265595, Décima Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Túlio de Oliveira Martins, Julgado em 26/06/2014)
APELAÇÕES CÍVEIS. RESPONSABILIDADE CIVIL. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MATERIAIS, MORAIS E ESTÉTICOS. TRATAMENTO ORTODÔNTICO. RESULTADO ESTÉTICO ALMEJADO NÃO ATINGIDO. PROSSEGUIMENTO COM OUTRO PROFISSIONAL. AUSÊNCIA DE PRONTUÁRIO ODONTOLÓGICO. SERVIÇO DEFEITUOSO OU INSATISFATÓRIO. OBRIGAÇÃO DE RESULTADO. DEVER DE INDENIZAR CARACTERIZADO. A responsabilidade civil das clínicas no contrato de prestação de serviços odontológicos é objetiva, segundo o "caput" do art. 14 do CDC, enquanto a responsabilidade do profissional dentista é subjetiva, nos termos do § 4º do art. 14 do CDC. A obrigação do cirurgião-dentista, ao realizar implante de aparelho ortodôntico, é de resultado, porque o tratamento visa melhoria estética. DANOS MORAIS IN RE IPSA. Dano moral "in re ipsa", dispensando a prova do efetivo prejuízo em face do evento danoso. Presumível o desgosto do paciente ao deparar com a falta de resolutividade de tratamento dentário que se prolonga no tempo. ARBITRAMENTO DO "QUANTUM" INDENIZATÓRIO. DANOS MORAIS. VALOR MAJORADO. Montante da indenização majorado em atenção aos critérios de proporcionalidade e razoabilidade, bem assim às peculiaridades do caso concreto. DANOS MATERIAIS. DESPESAS COM O TRATAMENTO DEFICIENTE. REEMBOLSO. DANO ESTÉTICO. INOCORRÊNCIA. APELO DA RÉ DESPROVIDO. APELAÇÃO DA AUTORA PROVIDA EM PARTE. (Apelação Cível Nº 70058551573, Nona Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Miguel Ângelo da Silva, Julgado em 29/04/2015)
Nas lições de Caio Mário da Silva Pereira[13] (1993, p.168-169), além dos deveres genéricos (idênticos ao do médico geral) de aconselhamento, e assistência pré e pós-operatória,
A cirurgia estética gera obrigação de resultado e não de meios. Com a cirurgia estética, o cliente tem em vista corrigir uma imperfeição ou melhorar a aparência. Ele não é um doente que procura tratamento e o médico não se engaja na sua cura. O profissional está empenhado em proporcionar-lhe o resultado pretendido, e, se não tem condições de consegui-lo não deve efetuar a intervenção [...] cumprindo, mesmo, ao médico recusar seu serviço.
Segundo Mateus Kfouri Neto (2013, p. 213), as cirurgias estéticas dividem-se em duas modalidades.
A primeira modalidade é a cirurgia de caráter estritamente estético[14]. Nesta modalidade, destaca o doutrinador que, por expor o paciente a riscos de certa gravidade, o médico se obriga a um resultado determinado e se submete à presunção de culpa correspondente e ao ônus da prova para eximir-se da responsabilidade pelo dano eventualmente decorrente da intervenção. Ex: cirurgia de correção de nariz (cirurgia embelezadora)[15].
Assim já decidiu o Eg. TJRS:
APELAÇÃO CÍVEL. RESPONSABILIDADE CIVIL. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS E ESTÉTICOS. ERRO MÉDICO. CIRURGIA PLÁSTICA ESTÉTICA. OBRIGAÇÃO DE RESULTADO. ERRO MEDIDO CARACTERIZADO. DEVER DE INDENIZAR CONFIGURADO. DESCUMPRIMENTO DO DEVER DE INFORMAÇÃO. O profissional da medicina tem o dever de informar o paciente sobre os detalhes do procedimento, os riscos e implicações, bem como as suas garantias, além dos cuidados necessários para alcançar o resultado almejado. Manutenção da verba indenizatória fixada em sentença quanto ao dano moral. O valor da indenização pelo dano moral deve ser fixado, considerando a necessidade de punir o ofensor e evitar que repita seu comportamento, devendo se levar em conta o caráter punitivo da medida, a condição social e econômica do lesado e a repercussão do dano. Juros de mora. Alteração do termo inicial. Apelo do réu não provido e apelo da autora parcialmente provido. (Apelação Cível Nº 70058106741, Sexta Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Ney Wiedemann Neto, Julgado em 29/05/2014).
APELAÇÃO CÍVEL. RESPONSABILIDADE CIVIL. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO. MAMOPLASTIA E LIPOASPIRAÇÃO. CICATRIZES INDESEJADAS. AGRAVO RETIDO. CERCEAMENTO DE DEFESA. INOCORRÊNCIA. È cediço que compete ao juiz deliberar sobre a necessidade de produção de determinada prova para a formação do seu convencimento, não caracterizando cerceamento de defesa o indeferimento do pedido de produção de nova prova pericial, mormente por despicienda à solução da lide. Agravo retido improvido. RESPONSABILIDADE CIVIL DA CLÍNICA MÉDICA. É cediço que os hospitais e clínicas médicas, na qualidade de prestadores de serviços, respondem independente de culpa pelo serviço defeituoso prestado ou posto à disposição do consumidor, responsabilidade que é afastada sempre que comprovada a inexistência de defeito ou a culpa exclusiva do consumidor, ou de terceiro, ex vi do art. 14, § 3º do CDC. AUSÊNCIA DE ERRO MÉDICO. A obrigação assumida pelo cirurgião plástico na cirurgia estética embelezadora é de resultado e sua responsabilidade é subjetiva, com culpa presumida, sendo do profissional o ônus de comprovar que não agiu com culpa em qualquer das modalidades: negligência, imprudência ou imperícia. Aplicação do art. 14, § 4º, do CDC. DEVER DE INDENIZAR INEXISTENTE. Hipótese em que a prova pericial e testemunhal demonstra que o médico demandado se valeu da técnica correta ao efetuar a mamoplastia e lipoaspiração nos braços, cintura, coxas e barriga da autora, não havendo qualquer elemento nos autos no sentido de que a cicatriz hipertrófica da paciente tenha sido decorrente de qualquer conduta do demandado, não havendo falar em responsabilização civil do médico cirurgião e, por conseguinte, na obrigação de indenizar. Sentença de improcedência mantida. AGRAVO RETIDO E APELAÇÃO DESPROVIDOS (Apelação Cível Nº 70063648943, Décima Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Paulo Roberto Lessa Franz, Julgado em 26/03/2015)
A segunda modalidade é a cirurgia estética latu sensu, a qual não encerra risco relevante ao paciente e destina-se a corrigir leves imperfeições. Neste caso, o resultado será apreciado subjetivamente pelo paciente. Aqui, o médico deverá agir com o dever de prudência exigido, e não estará adstrito a uma obrigação de resultado.
Neste sentido:
APELAÇÃO CÍVEL. RESPONSABILIDADE CIVIL. AÇÃO DE REPARAÇÃO DE DANOS MATERIAIS E MORAIS. RELAÇÃO DE CONSUMO. CIRURGIA PLÁSTICA COM CARÁTER CORRETIVO. OBRIGAÇÃO DE MEIO. CICATRIZES POR QUEIMADURA RESULTANTES DE ACIDENTE COM MOTOCICLETA. RESPONSABILIDADE CIVIL DO PROFISSIONAL LIBERAL APURADA MEDIANTE VERIFICAÇÃO DE CULPA. ART. 14, § 4º, DO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR. ERRO MÉDICO NÃO EVIDENCIADO. A responsabilidade civil do médico, versando a hipótese obrigação de meio, como no caso em apreço, é de ordem subjetiva, nos termos do art. 14, § 4º, do CDC, exsurgindo o dever de indenizar somente quando houver prova convincente evidenciando conduta culposa em sentido amplo (culpa "lato sensu"). Situação concreta retratada no feito da qual se infere que o laudo pericial, cujas conclusões embasaram o veredicto de primeira instância, apresenta conclusão afastando a hipótese de erro médico, incorreção ou ineficiência do método empregado na cirurgia estética corretiva a que a autora se submeteu visando reparar ou minimizar cicatrizes de queimadura advinda de acidente com motocicleta. APELO DESPROVIDO (Apelação Cível Nº 70054721568, Nona Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Miguel Ângelo da Silva, Julgado em 24/06/2014)
Por outro lado, se a cirurgia tiver por finalidade reparar graves defeitos – causados por acidentes automobilísticos, queimaduras etc – é induvidosa a caracterização de obrigação de meios e não de resultado[16].
Neste sentido:
APELAÇÃO CÍVEL. RESPONSABILIDADE CIVIL. AÇÃO DE REPARAÇÃO DE DANOS MATERIAIS E MORAIS. RELAÇÃO DE CONSUMO. CIRURGIA PLÁSTICA COM CARÁTER CORRETIVO. OBRIGAÇÃO DE MEIO. CICATRIZES POR QUEIMADURA RESULTANTES DE ACIDENTE COM MOTOCICLETA. RESPONSABILIDADE CIVIL DO PROFISSIONAL LIBERAL APURADA MEDIANTE VERIFICAÇÃO DE CULPA. ART. 14, § 4º, DO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR. ERRO MÉDICO NÃO EVIDENCIADO. A responsabilidade civil do médico, versando a hipótese obrigação de meio, como no caso em apreço, é de ordem subjetiva, nos termos do art. 14, § 4º, do CDC, exsurgindo o dever de indenizar somente quando houver prova convincente evidenciando conduta culposa em sentido amplo (culpa "lato sensu"). Situação concreta retratada no feito da qual se infere que o laudo pericial, cujas conclusões embasaram o veredicto de primeira instância, apresenta conclusão afastando a hipótese de erro médico, incorreção ou ineficiência do método empregado na cirurgia estética corretiva a que a autora se submeteu visando reparar ou minimizar cicatrizes de queimadura advinda de acidente com motocicleta. APELO DESPROVIDO (Apelação Cível Nº 70054721568, Nona Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Miguel Ângelo da Silva, Julgado em 24/06/2014)
Ainda, há a cirurgia mista, de cunho estético e reparador[17]. Neste caso a responsabilidade do médico será fracionada, sendo de resultado em relação à sua parcela estética e de meio em sua parcela reparadora.
O Eg TJRS assim já decidiu:
APELAÇÃO CÍVEL. AGRAVOS RETIDOS. RESPONSABILIDADE CIVIL. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANO MORAL E MATERIAL. ALEGAÇÃO DE ERRO MÉDICO. CIRURGIA PLÁSTICA REPARADORA DE EMAGRECIMENTO DE PACIENTE COM OBESIDADE. RESPONSABILIDADE SUBJETIVA DO MÉDICO. AUSÊNCIA DE PROVA DA CULPA. DEVER DE INDENIZAR INCORRENTE. Trata-se de examinar agravos retidos interpostos pela parte autora e ré e recurso de apelação interposto pela parte autora contra a sentença que julgou improcedente a ação de indenização por dano moral e material e procedente a ação de cobrança em apenso. AGRAVO RETIDO DA PARTE RÉ - Inobservância da regra prevista no parágrafo primeiro do artigo 523, § 1º do Código de Processo Civil. Agravo retido não conhecido. AGRAVO RETIDO DA PARTE AUTORA - A perícia foi realizada por profissional nomeado pelo juízo respondendo, inclusive, aos quesitos suplementares formulados pela parte autora. Ademais, os autos possuem ampla produção de prova documental e oral capazes de amparar o correto deslinde do feito. Sendo o magistrado o destinatário da prova, autorizado está, consoante o disposto no artigo 130 do Código de Processo Civil, indeferir a realização de nova perícia, quando motivadamente o faz, por entendê-la desnecessária para apreciação da questão que lhe é posta. DEVER DE INDENIZAR - É aplicável o Código de Defesa do Consumidor, na medida em que a relação vertida nos autos se trata de relação de consumo, consoante traduz o artigo 3º, §2º do CDC. Consoante se pode extrair da análise em amiúde dos autos, a parte autora foi acometida obesidade decorrente de diabetes gestacional, situação em que se submeteu a tratamento de emagrecimento, reduzindo o peso corporal em aproximadamente 40 (quarenta) quilos. Em decorrência deste fato, a autora desenvolveu - conforme apurado na perícia médica - deformidade abdominal, em aspecto "avental", razão pela qual buscou a parte ré para realizar cirurgia reparadora, a qual ocorreu em 27 de novembro de 2003. In casu, necessário, tecer esclarecimentos entre cirurgia plástica estética propriamente dita e a cirurgia plástica reparadora. Na primeira modalidade o objetivo está restrito ao alcance do resultado meramente estético, situação em que o paciente não apresenta qualquer quadro de patologia quando procura submeter-se a uma intervenção cirúrgica. Já na cirurgia plástica reparadora, a obrigação assumida pelo médico é de meio, cabendo ao paciente a comprovação da culpa do profissional contratado no caso da falha na prestação do serviço. Nesta linha de raciocínio, tem-se o serviço prestado pelo médico, no caso dos autos, é obrigação de meio e não de resultado, devendo o profissional da área da saúde usar de toda técnica livre para realização do procedimento cirúrgico. Todavia, não é possível a garantia de êxito total de uma cirurgia, uma vez que depende, também, do desempenho do organismo de cada paciente, bem como dos avanços científicos. Dessa feita, o caso em t da responsabilidade subjetiva constante no Código de Defesa do Consumidor, sendo necessária a evidente comprovação de cometimento de negligência, imprudência ou imperícia, pela profissional médica, conforme disposição da legislação civil em seu artigo 951. Não restando demonstrado o agir ilícito da parte ré, afigura-se descabida qualquer reparação pecuniária, porque ao desabrigo da lei (art. 186 do CC). Ademais, ainda que tivesse razão a parte autora em apontar defeito na prestação do serviço de cirurgia plástica contratado, não seria possível mensurar-se o grau de participação do demandado para o evento, pois a parte autora foi atendida depois por outro profissional que acabou atuando, de alguma maneira, também para o resultado estético final, o que corresponde e equivale à alteração da coisa litigiosa. AGRAVO RETIDO DA PARTE RÉ NÃO CONHECIDO. AGRAVO RETIDO E APELAÇÃO DA PARTE AUTORA DESPROVIDOS. (Apelação Cível Nº 70032236457, Sexta Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Sylvio José Costa da Silva Tavares, Julgado em 30/10/2014)
(grifo meu)
In casu, necessário, tecer esclarecimentos entre cirurgia plástica estética propriamente dita e a cirurgia plástica reparadora. Na primeira modalidade o objetivo está restrito ao alcance do resultado meramente estético, situação em que o paciente não apresenta qualquer quadro de patologia quando procura submeter-se a uma intervenção cirúrgica. Já na cirurgia plástica reparadora, a obrigação assumida pelo médico é de meio, cabendo ao paciente a comprovação da culpa do profissional contratado no caso da falha na prestação do serviço.
Nesta linha de raciocínio, tem-se o serviço prestado pelo médico foi de cirurugia estética reparadora, devendo o profissional da área da saúde usar de toda técnica livre para realização do procedimento cirúrgico. Todavia, não é possível a garantia de êxito total de uma cirurgia, uma vez que depende, também, do desempenho do organismo de cada paciente, bem como dos avanços científicos. Dessa feita, aplica-se a responsabilidade subjetiva constante no Código de Defesa do Consumidor, sendo necessária a evidente comprovação de cometimento de negligência, imprudência ou imperícia, pela profissional médica, conforme disposição da legislação civil em seu artigo 951.
O Superior Tribunal de Justiça firmou precedente nesse sentido. Veja-se:
PROCESSO CIVIL E CIVIL. RESPONSABILIDADE CIVIL. MÉDICO. CIRURGIA DENATUREZA MISTA - ESTÉTICA E REPARADORA. LIMITES. PETIÇÃO INICIAL.PEDIDO. INTERPRETAÇÃO. LIMITES. 1. A relação médico-paciente encerra obrigação de meio, e não deresultado, salvo na hipótese de cirurgias estéticas. Precedentes. 2. Nas cirurgias de natureza mista - estética e reparadora -, aresponsabilidade do médico não pode ser generalizada, devendo seranalisada de forma fracionada, sendo de resultado em relação à suaparcela estética e de meio em relação à sua parcela reparadora. 3. O pedido deve ser extraído da interpretação lógico-sistemática dapetição inicial, a partir da análise de todo o seu conteúdo.Precedentes. 4. A decisão que interpreta de forma ampla o pedido formulado pelaspartes não viola os arts. 128 e 460 do CPC, pois o pedido é o que sepretende com a instauração da ação. Precedentes. 5. O valor fixado a título de danos morais somente comporta revisãonesta sede nas hipóteses em que se mostrar ínfimo ou exagerado.Precedentes. 6. Recurso especial não provido. (STJ , Relator: Ministra NANCY ANDRIGHI, Data de Julgamento: 27/09/2011, T3 - TERCEIRA TURMA)
Assim, tem-se que a responsabilidade civil do médico geral é subjetiva, quando adstrito à obrigação de meio, comportando-se a culpa presumida quando realizar procedimentos em que há obrigação de resultado, mormente médicos cirurgiões-estéticos, onde então, lhes incumbirá o ônus de provar quaisquer causas que afastem o nexo causal.
[1] ITURRASPE, Jorge Mosset. Responsabilidad civil del médico. Buenos Aires: Astrea, 1979, p. 125.
[2] FILHO, Sérgio Cavalieri. Programa de Responsabilidade Civil. 8 ed. Revista e Ampliada, São Paulo: Editora Atlas, 2009
[3] KFOURI NETO, Miguel. Responsabilidade civil do médico. 8 ed Revista e Ampliada. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2013.
[4] Artigo 186 do Código Civil: Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito.
[5] Artigo 951 do Código Civil: O disposto nos arts. 948, 949 e 950 aplica-se ainda no caso de indenização devida por aquele que, no exercício de atividade profissional, por negligência, imprudência ou imperícia, causar a morte do paciente, agravar-lhe o mal, causar-lhe lesão, ou inabilitá-lo para o trabalho.
[6]Estare Parágrafo único do artigo 927 do Código Civil: [...] Haverá obrigação de reparar o dano, independentemente de culpa, nos casos especificados em lei, ou quando a atividade normalmente desenvolvida pelo autor do dano implicar, por sua natureza, risco para os direitos de outrem.
[7] Apelação Cível Nº 70062235981, Nona Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Túlio de Oliveira Martins, Julgado em 29/04/2015
[8] Idem. Ibidem.
[9] Apelação Cível Nº 70061446795, Décima Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Jorge Alberto Schreiner Pestana, Julgado em 30/04/201
[10] GAGLIANO, Pablo Stolze; FILHO, Rodolfo. Novo curso de direito civil e responsabilidade civil. V. III. 7 ed. São Paulo: Editora Saraiva, 2009.
[11] DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro: responsabilidade civil. V. 7. 17 ed. São Paulo: Editora Saraiva, 2003.
[12] Idem. Ibidem.
[13] PEREIRA, Caio Mário da Silva. Responsabilidade civil. 3 ed. Rio de Janeiro: Forense, 1993.
[14] Apelação Cível Nº 70063648943, Décima Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Paulo Roberto Lessa Franz, Julgado em 26/03/2015.
[15] Apelação Cível Nº 70058106741, Sexta Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Ney Wiedemann Neto, Julgado em 29/05/2014
[16] Apelação Cível Nº 70054721568, Nona Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Miguel Ângelo da Silva, Julgado em 24/06/2014.
[17] STJ REsp 1097955/MG, 3ª T., j. 27.09.2011, v.u., rel. Min. Nancy Andrighi, DJe 03.10.2011, RT/V. 914/p.536