Conveniências e Inconveniências de Um Sistema Jurídico Demasiadamente Codificador


01/12/2016 às 14h02
Por Abm Advogados

UNIVERSIDADE DO ESTADO DE MINAS GERAIS – UEMG

UNIDADE DIAMANTINA

KELVIM WENDEL ROCHA

CONVENIÊNCIAS E INCONVENIÊNCIAS DE UM SISTEMA JURÍDICO DEMASIADAMENTE CODIFICADOR

DIAMANTINA

2016

KELVIM WENDEL ROCHA

CONVENIÊNCIAS E INCONVENIÊNCIAS DE UM SISTEMA JURÍDICO DEMASIADAMENTE CODIFICADOR

Monografia apresentada ao Curso de Direito da Universidade do Estado de Minas Gerais, como requisito parcial à obtenção do título de Bacharel em Direito.

Orientador: Prof. Ms. André Luis Vieira Eloi

DIAMANTINA

2016

RESUMO

A criação demasiada de leis específicas carrega consigo a conveniência de facilitar a subsunção dos normas aos fatos e antagonicamente carrega consigo a inconveniência de abandonar o discurso e a eloquência, bem como tornar o sistema mais violável pelos legisladores, facilitando que esses criem leis com o escopo de beneficiar a sua classe. Diante desse empasse o presente trabalho propõe elucidar os reflexos da codificação excessiva frente à atuação do intérprete no sistema jurídico pátrio, expor os aspectos gerais da codificação através de um viés hermenêutico, evidenciar a atuação do jurista, em face de um sistema codificador excessivo, assim como apontar as “conveniências” e “inconveniências” atinentes à forma de aplicar a lei, decorrentes desse sistema. Para fundamentar a reflexão Chaím Perelman (1997), Norberto Bobbio (1995), Hans-Georg Gadamer (2002), Giambattista Vico (2009) sustentarão o corpo teórico juntamente com obras adjacentes. Em suma, o campo de atuação do jurista deve ser ampliado, valorizando a retórica e a hermenêutica.

Palavras-chave: leis específicas, codificação excessiva, atuação do intérprete.

ABSTRACT

The convenience of facilitating subsumption of the facts and norms by the extensive creations of too much of specifics laws, but at the same time, it carries a burden of inconveniences to abandoned the eloquence and the speech which allows the legal system to become too fragile and violable by the legislators with the only concern to create laws on behave of benefiting their own interests. On behalf of these impasses, this present undergraduate thesis has the sole propose to elucidate the consequences of excessive codifications ahead of the performance of the interpreter of the Brazilian legal system by exposing the general aspects of codification through hermeneutic analyses. Therefore, highlighting the role of the jurists in faces of the excessive legal coding system, and under this system to appoint the “conveniences” and “inconveniences” ways to apply the law. The theoretical body of this article is composed by the works of Chaim Perelman (1997), Norberto Bobbio (1995), Hans-Georg Gadamer (2002), Giambattista Vico (2009) and along with other researches. In general, the jurists’ fields shall be expanded and valuing the rhetoric and hermeneutics.

Keywords: performance, specific laws, excessive codification, the interpreter roles.

SUMÁRIO

INTRODUÇÃO..........................................................................................................................1

CAPÍTULO I – ASPECTOS DA CODIFICAÇÃO. 3

1.1 Escola da Exegese 3

1.2 A Coerência do Ordenamento Jurídico 5

1.3 Dogma da Completude 9

1.4 A Jurisprudência 13

1.5 Lógica Jurídica 17

1.6 História da Codificação a Partir do Império Romano 19

CAPÍTULO II – ESPAÇO PARA RETÓRICA E HERMENÊUTICA.. 29

2.1 Retórica 29

2.2 Hermenêutica 36

CONCLUSÃO ................................................ 40

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS .................................................................................43

INTRODUÇÃO

A temática proposta tem como foco a atuação do intérprete frente a um sistema jurídico excessivamente codificador. A criação demasiada de leis facilita a subsunção das leis ao fato, entretanto, cria um sistema de direito mecanizado, com o cerne de sua atuação voltada para a validade das disposições legais e sua intenção de prever todos os casos particulares, reduzindo exponencialmente o espaço para a retórica e a hermenêutica.

A partir da análise dos aspectos gerais da codificação, dentre eles, têm-se os preceitos advindos da escola da exegese, presente na revolução francesa e sua total confiança no texto da lei, também o dogma da completude e a coerência do ordenamento jurídico, que por mais que já se restou comprovado a existência de antinomias e de lacunas, será relevante frisar esses aspectos devido ao fato deles estarem entranhados na mentalidade dos legisladores, sobretudo os brasileiros, a inexistente “lógica jurídica”; e por derradeiro as conveniências e inconveniências advindas da codificação demasiada, in fatu, expressada através do estudo da jurisprudência realizada por Vico, traduzida por Vladimir Santos. No primeiro momento buscar-se-á expor como se dá o processo de codificação, elucidando superficialmente as conveniências e inconveniências dos sistemas codificadores em excesso.

Após perpassado os aspectos gerais da codificação, apresentar-se-á as ferramentas capazes de combater os inconvenientes gerados pela criação demasiada de leis, fazendo uma interface com os aspectos apresentados. O trabalho do intérprete da lei será analisado e apontado as suas limitações. Nesse sentido, aduz-se que o intérprete se vê engessado ao texto da lei, ao passo que essa se preocupa com as minúcias do caso particular, surgindo cada vez mais leis específicas, ou seja, aquelas que se atentam às peculiaridades de determinados grupos ou até mesmo casos isolados, tolhendo assim a confiabilidade do ordenamento jurídico e aumentando a violabilidade das leis, facultando ao legislador a criação de leis que possa lhe beneficiar.

Existe uma diferença crucial entre um sistema com muitas leis que cuidam de assuntos específicos que não dizem respeito à coletividade e o outro que cria poucas leis versando sobre temas mais abrangentes, e, por conseguinte, com maior relevância.

Através da retórica e da hermenêutica, demonstrar-se-á que num ordenamento jurídico em que as leis são de caráter geral e abstratas, ou seja, que versem sobre temas amplos sem se ater a casos específicos, aumenta-se a confiabilidade e obriga o intérprete a usar de argumentos mais elaborados e, por conseguinte, capazes de convencer os demais da sua tese, bem como pensar em métodos de prestação jurisdicional que valorizem mais a retórica ao texto escrito. A subsunção dos fatos à norma é o que se almeja e não o inverso, como se demonstra nos sistemas jurídicos codificadores ao extremo.

CAPÍTULO I – ASPECTOS DA CODIFICAÇÃO

A temática apresentada tem o intuito de elencar alguns aspectos da codificação ao longo da história.

Nesse primeiro capítulo, propositalmente, os subcapítulos não guardam uma fiel evolução histórica acerca dos aspectos da codificação, ou seja, não foram apresentados seguindo uma lógica estrutural, de forma concatenada, guardando relação com a data que ocorreu.

Esse capítulo tem como escopo apresentar as nuances da codificação. Tal como apresentar uma breve evolução histórica a partir do império romano e outros acontecimentos que guardam relação com o tema proposto. Essa exposição a partir das civilizações antigas, novamente de forma intencional, foi colocada se valendo de recortes, apresentando apenas alguns aspectos da codificação relacionados com o presente trabalho.

Com efeito, expor-se-á também outros aspectos, mais contemporâneos, que influenciaram também para que a codificação assumisse a forma atual. Têm-se a escola da exegese com o nascimento do fetichismo da lei, bem como as proposições de Bobbio acerca do positivismo jurídico, que por mais que seja criticado e talvez até superado pelo pós-positivismo, ainda se verifica algumas dessas características elencadas por Bobbio. Por derradeiro, apresentar-se-á as obra de Perelman, versando sobre a inexistente “lógica jurídica”, e Vico elencando conveniências e inconveniências atinentes à codificação.

Destarte, o presente capítulo tem o intuito de iniciar a discussão para que no segundo capítulo seja apresentado as contraposições e, por conseguinte, a conclusão.

1.1 Escola da Exegese

A discussão partindo inicialmente da escola da exegese remete à sua exponencial contribuição à codificação. Nessa escola cultuou-se a positivação de normas e o culto por elas.

Na vigência do código napoleônico se deu ênfase à escola da exegese, responsável por dispor acerca das técnicas de raciocínio jurídico. Tal escola vigorou, segundo Perelman (2000), entre o período de 1830-1880, influenciada substancialmente por Rudolf Von Ihering.

Fundada exclusivamente na razão, a escola de exegese preconizava, numa visão muito cristalina da divisão dos poderes, a redução da atuação jurisdicional aos limites impostos pela lei e exclusivamente por ela, ficando aquém da aplicação qualquer subjetividade do juiz.

O poder legislativo estabelece as normas vetoriais para a sociedade, ao passo que o juiz apenas é o reprodutor dessa vontade pré-estabelecida. Tal modo de interpretar o direito, fundado exclusivamente nas instituições estatais, tem o intuito de aproximar o direito a uma ciência exata tal como a matemática.

A intenção de criar um método de aplicar a lei com perfeição e capaz de solucionar todos os ensejos da sociedade era a maior cobiça da escola exegética francesa. Para cada caso concreto o juiz deveria ter ao seu alcance uma lei específica capaz de elucidar o litígio em epígrafe. Tal exposição se torna cristalina conforme o artigo 4º do código napoleônico, pois esse aduz que o direito é completo e sem antinomias. Nesse sentido, o filósofo do direito belga dispõe:

Ora, o artigo 4º do Código de Napoleão, ao proclamar que o juiz não pode recusar-se a julgar sob o pretexto do silêncio, da obscuridade ou da insuficiência da lei, obriga-o a tratar o sistema de direito como completo, sem lacunas, como coerente, sem antinomias e como claro, sem ambiguidades que dêm razão a interpretações diversas. (PERELMAN, 2000, p. 34-35).

Fundados nessa ideia de um sistema de direito similar a uma ciência exata os juristas da escola da exegese enraizaram sua atuação em limitar o papel do juiz exclusivamente no de aplicar a lei, em suma, fazendo a subsunção das normas aos fatos.

A escola da exegese fundava sua forma de estudo a partir da concepção sistêmica de um direito extremamente formal. Imbuídos pelo ideal iluminista do século XVIII, onde a razão permeava todas as ações do homem. Nessa busca exacerbada pela racionalidade o sistema do direito passou a ser extremamente codificador, ao passo que o jurista se via completamente engessado ao texto da lei, sem espaço para dialética.

Destarte, com esse ideal racionalista acerca da positivação do direito e sua pretensão formalista, tal escola serviu de escopo e influenciou sistemas jurídicos que se formariam posteriormente. Tal como o positivismo jurídico, sistema jurídico extremamente codificador, tal qual duas de suas principais nuances serão explanadas a seguir. A coerência e a completude.

1.2 A Coerência do Ordenamento Jurídico

Atualmente o debate já extrapolou os limites do positivismo jurídico, o debate já incorporou os preceitos do pós positivismo, em que a estrutura principiológica dos ordenamentos é posta em evidência, tendo o próprio Norberto Bobbio como representante, mesmo que de forma discreta. Contudo, necessário se faz a alusão a esses preceitos positivistas devido ao fato de estarem presentes na concepção que se tem do direito atualmente em alguns países, tal como o Brasil como se verificará ao longo do texto.

Acerca da completude do ordenamento jurídico, Bobbio assevera de forma concatenada suas nuances, ou seja, trata sobre antinomias, lacunas, coerência e problemas que envolvem os ordenamentos jurídicos positivados e as possíveis soluções.

Numa análise inicial acerca de ordenamento jurídico sistêmico, Bobbio analisa o termo “sistema de direito” à luz do pensamento de Hans Kelsen.[1]

A análise do conceito de sistema do direito se subdivide em duas correntes: sistema estático e sistema dinâmico. Aquele sistema cujas normas obedecem a um axioma norteador, ou seja, todas as normas derivam de um preceito inicial é denominado de sistema estático. Já no sistema dinâmico as normas derivam umas das outras, partindo do pressuposto de validade das autoridades que as colocaram.

Contudo, Bobbio (1995) passa a tecer fortes críticas ao termo “sistema”, colocando tal termo como uma “totalidade ordenada”. Suas críticas incidem na situação paradoxal criada por tal conceito, pois, como uma totalidade ordenada em que o pressuposto de validade da norma deriva da autoridade que as colocou e não do seu conteúdo, como se resolveria uma antinomia assim? Ou seja, se duas normas postas por uma autoridade competente fossem contraditórias as duas teriam validade?

Tal paradoxo é fortemente criticado pelo jurista. Quando se trata de um “sistema jurídico” onde o termo “sistema” leva à ideia de que todo o emaranhado de normas carrega entre si relação harmônica, e, havendo normas incompatíveis, o princípio basilar desse sistema exclui automaticamente um ou ambos desses preceitos antinômicos.

Fazendo uma interface com o sistema dinâmico posto por Kelsen, Bobbio afirma que o sistema jurídico, fundado na compatibilidade das normas, não apenas necessita de uma autoridade capaz de atribuir validade à norma, mas também que essa tenha compatibilidade com as demais.

Contudo, notório é o fato dos ordenamentos jurídicos conterem normas que não se relacionam harmonicamente. Bobbio (1995) discorre sobre a questão enumerando relações de incompatibilidades das normas (subentendendo-se incompatibilidade como normas incompatíveis que não podem ser ambas verdadeiras), de três formas, a saber:

1) entre uma norma que ordena fazer algo e uma norma que proíbe fazê-lo (contrariedade);

2) entre uma norma que ordena fazer e uma que permite não fazer (contraditoriedade);

3) entre uma norma que proíbe fazer e uma que permite fazer (contraditoriedade) (BOBBIO, 1995, pag. 85).

O conceito de antinomia é dissecado. Os elementos: tempo, espaço, pessoa e matéria são incorporados, ocasionando uma nova definição de antinomia versada pelo jurista, “podemos definir novamente a antinomia jurídica com aquela situação que se verifica entre duas normas incompatíveis, pertencentes ao mesmo ordenamento e tendo o mesmo âmbito de validade” (BOBBIO, 1995, p. 88).

Após expor no que consiste a antinomia, pela ordem, o autor passa a descrever como solucionar tal incompatibilidade de normas. Alertando para determinados casos onde as antinomias são insanáveis, e para os casos solúveis há três critérios solucionadores: cronológico, hierárquico e de especialidade.

Em suma, o critério cronológico consiste na máxima; “lei posterior derroga a anterior”, plausível que assim proceda para se dar uma ideia de evolução do ordenamento jurídico. O critério hierárquico se vale de um esquema pré-determinado, como determinados conjuntos normativos que possuem maior força em decorrência dos outros, como, por exemplo, a Constituição estaria no topo e as demais leis teriam força inferior. E por derradeiro, o critério da especialidade, dispondo sobre a prevalência de leis específicas; aquelas que almejam prever todos os atos possíveis a ser praticados pelo ser humano, sobre as de caráter geral, que consistem nas leis que versam sobre determinado tema em sentido amplo, em que vários casos particulares podem ser julgados através delas.

Contudo, existem normas dotadas da mesma força hierárquica, mesmo lapso temporal e o mesmo caráter (geral ou específico) que podem enfrentar contradições. O método mais corriqueiro usado para sanar tal antinomia, segundo Bobbio (1995), consiste em conservar as duas normas incompatíveis, eliminando a incompatibilidade, nesse sentido afirma o autor:

Aquilo a que tende o intérprete comumente não é mais a eliminação das normas incompatíveis, mas, preferentemente, à eliminação da incompatibilidade. Às vezes, para chegar ao objetivo, introduz alguma leve ou parcial modificação no texto; e nesse caso tem-se aquela forma de interpretação chamada corretiva. Geralmente, a interpretação corretiva é aquela forma de interpretação que pretende conciliar duas normas aparentemente incompatíveis para conservá-las ambas ao sistema. (Bobbio, 1995, p. 103)

Desta forma a chamada interpretação corretiva acarreta na criação de mais dispositivos legais com intuito de sanar duas normas incompatíveis, ou seja, cria-se normas contendo comandos de exclusão. Como por exemplo, uma norma que permite praticar ato libidinoso em praças públicas em dissonância com outra que proíbe a prática de ato libidinoso em qualquer local público, através de interpretação corretiva com intuito de preservar as duas normas, cria-se um dispositivo permissivo na segunda norma, seria disposto da seguinte forma a segunda norma: é proibido a prática de ato libidinoso em qualquer local público, com exceção das praças públicas.

Toda essa ideia de antinomias e suas formas de saná-las remetem ao fato de atribuir a condição de coerência ao ordenamento jurídico. Para afirmar que um ordenamento jurídico é coerente não consiste numa condição de validade, mas consiste num dever moral; por parte do legislador a ter moralmente o dever de não elaborar leis antinômicas e ao aplicador, conforme seu convencimento, aplicar ao caso exposto a norma que melhor atenda o disposto na lei. Ou seja, quando se tratar de duas normas incompatíveis no mesmo nível e contemporâneas não cabe ao aplicador excluir uma delas, pois ambas são válidas. Discute-se nesses casos a eficácia de uma delas aplicada ao caso concreto.

Bobbio (1995) destaca que essa faculdade atribuída ao aplicador, de fazer a escolha de umas das normas antinômicas no caso específico, viola dois axiomas norteadores dos ordenamentos jurídicos:

É evidente que quando duas normas contraditórias são ambas válidas, e pode haver indiferentemente a aplicação de uma ou de outra, conforme o livre arbítrio daqueles que são chamados a aplicá-las, são violadas duas exigências fundamentais em que se inspiram ou tendem a inspirar-se os ordenamentos jurídicos: a exigência da certeza (que corresponde ao valor da paz ou da ordem), e a exigência da justiça (que corresponde ao valor da igualdade) (BOBBIO, 1995, p.113).

A questão das antinomias e a necessidade de excluir qualquer espécie dos ordenamentos jurídicos remetem à ideia de coerência. Essa última de suma importância em garantir a segurança dos sistemas jurídicos, pois o cidadão anseia que as consequências das suas condutas sejam tipificadas previamente, bem como o ideal de justiça, que prevê aos semelhantes tratamento igual advindo das normas. A incidência de antinomias coloca em xeque tal segurança. Destarte, cabe ao legislador; o dever de criar, e ao aplicador da lei, o dever de manter, um sistema jurídico coerente.

Destarte, esse ideal positivista, nota-se a sua presença em nosso ordenamento jurídico, tendo em vista a criação demasiada de leis com intuito de prever todas as condutas do cidadão e, por conseguinte, trazer a esperada segurança jurídica aos legislados não ocorre, a segurança que se busca criando todas essas leis propulsiona o efeito contrário, surgindo cada vez mais antinomias e ficando sujeitas à subjetividade do juiz a aplicação da norma ao caso concreto. Fato esse que se apoia na incomum extensão da carta magna brasileira, ademais, o número excessivo de emendas constitucionais, bem como nas leis infraconstitucionais inúmeras.

Com efeito o paralelo entre o positivismo e o ordenamento jurídico pátrio é apenas um adendo á ideia maior que cobiça o presente trabalho elucidar, ou seja, analisar a codificação como um todo e a atuação do jurista em face dela. Vale ressaltar que, expondo de uma forma conotativa, a codificação se trata do gênero, ao passo que o positivismo e pós-positivismo são espécies.

1.3 Dogma da Completude

Comumente é atribuída ao ordenamento jurídico a característica de ser completo, porquanto ao juiz sempre haverá uma norma solucionadora da lide que lhe é apresentada. Um ordenamento completo é aquele que sempre haverá uma norma permissiva ou proibitiva a todas as condutas possíveis do homem, ele tem o escopo de nunca deixar com que a arbitrariedade do juiz seja a única forma de solucionar o conflito.

Um sistema jurídico capaz de obrigar o intérprete a julgar cada caso com fulcro numa lei pré-estabelecida remete a ideia dum ordenamento completo. Nesse sentido Bobbio afirma:

A norma que estabelece o dever do juiz de julgar cada caso com base numa norma pertencente ao sistema não poderia ser executada se o sistema não fosse pressupostamente completo, quer dizer, com uma regra pra cada caso. A completude é, portanto, uma condição sem a qual o sistema em seu conjunto não poderia funcionar (BOBBIO, 1995, p. 118).

Neste mote, ao contrário da coerência que não consiste num pressuposto de validade ao sistema jurídico, a completude é exigência se tornar válido e não ruir um ordenamento jurídico.

Fazendo uma alusão ao direito romano, Bobbio (1995) afirma que a herança deste é forte em diversos ordenamentos jurídicos da Europa, tal como o francês e o italiano. O ideal romano de um sistema de direito perfeito e capaz de emanar toda sabedoria necessária ao juiz para dirimir o conflito é o cerne do dogma da completude.

Imbuídos desse sentimento de total confiança no ordenamento jurídico, acima de qualquer outra fonte, seja o costume ou equidade, enraizou-se o monopólio do soberano que dita a norma, seja esse soberano o Estado ou um monarca. Apoiados nessa ideia, de um ordenamento jurídico munido de soluções ilimitadas, as grandes codificações (como a francesa e a alemã) prestavam continência incondicionada ao texto legal, e, por conseguinte, ao soberano que as promulgava ou outorgava. Nesse sentido assevera Bobbio:

Para manter o próprio monopólio, o Direito do Estado deve servir para todo uso. Uma expressão macroscópica dessa vontade de completude foram as grandes codificações; e é justamente no interior de uma dessas grandes codificações, note-se bem, que foi pronunciado o veredicto de que o juiz deve julgar permanecendo sempre dentro do sistema já dado. A miragem da codificação é a completude: uma regra para cada caso. O código é para o juiz um prontuário que lhe deve servir infalivelmente e do qual não pode afastar-se. (Bobbio, 1995, p.121.) (grifo meu)

A escola da exegese, acima mencionada, confunde-se com a própria ideia de codificação, segundo Bobbio (1995). Para o jurista, a escola da exegese não existiu apenas na França, seus ideais permeiam ordenamentos diversos, dentre eles o alemão e o italiano. A essa confiança irrestrita e pautada na soberania dos ordenamentos positivados se deu o nome de “fetichismo da lei”, no qual o horizonte alcance do ordenamento jurídico é ilimitado.

Contudo, com a mudança brusca advinda com a revolução industrial atrelada ao “envelhecer” das codificações, fundadas na escola da exegese, críticas foram tecidas ao fetichismo da lei. A realidade da época não condizia com os preceitos estipulados nos códigos ultrapassados, fundados numa cultura predominantemente agrícola e aquém da industrialização.

Com o advento da Sociologia, o movimento contra o fetichismo da lei ganhou força, os ideais de que a sociedade era peça fundamental para a sustentação do Estado, bem como de que os ordenamentos jurídicos deviam se ater a realidade e não a um sistema de direito constituído sob a égide de outra forma societária, ganharam notoriedade.

Nessa esteira, a criação da sociologia jurídica endossou a necessidade de pensar o direito sob o viés sociológico e não fundado em leis estáticas e obsoletas. Nesse sentido, assevera o jurista italiano:

No âmbito mais vasto da sociologia, formou-se uma corrente de sociologia jurídica, da qual Erhlich é um dos representantes mais destacados: o programa da sociologia jurídica foi o de mostrar, principalmente no início, que o Direito era um fenômeno social, e que portanto a pretensão dos juristas ortodoxos de fazer do Direito um produto do Estado era infundada e conduzia a vários absurdos, como o de acreditar na completude do Direito codificado (BOBBIO, 1995, p. 125).

A partir dessa forma de ver o Direito, nova ordem jurídica foi se instaurando. O Direito livre, que se confundia com os ideais da sociologia jurídica, se levantava em contraposição ao Direito constituído. Cada vez mais o Direito livre se fortificava e, por conseguinte, ruía com o dogma da completude, porquanto, emergia uma forte necessidade de estudar não um Direito constituído, fundado na soberania estatal, mas sim uma ciência do Direito, que se aplicava à sociedade in fatu e que era capaz de solucionar os problemas atuais, um Direito livre que solucionava as lacunas a partir do estudo pormenorizado de cada caso.

Tem-se aqui uma tentativa de olhar o direito sob a ótica de uma ciência social, fundada na expectativa que a norma traz de atender aos anseios da sociedade. Ao versar sobre uma ciência do direito, almejava-se dar ênfase á metodologia e não tão somente à forma, como de faz no positivismo jurídico, fato esse que poderia influenciar de forma positiva o trabalho do intérprete, ao passo que esse teria posição de destaque, pois teria que se valer de argumentos que comprovassem sua tese e não somente argumentos de validade.

Contudo, os juristas tradicionais não aceitaram de bom grado o “Direto livre”, rebateram fortemente tal ideal. A principal crítica encontrava sua raiz ainda em aversão à completude do ordenamento, ou seja, o sistema jurídico em que a completude não fosse vista como uma exigência de validade caminhava para a anarquia e o caos.

A primeira teoria alavancada contra o Direito livre sustentava que não havia lacunas no ordenamento jurídico, pois, onde há lacuna não há direito, leia-se: aquilo que não é previsto pelo ordenamento não é juridicamente discutido e sim em outros campos do saber; falava-se em “limites” do ordenamento jurídico e não em “lacunas”.

Já a segunda teoria defendida pelos positivistas tradicionalistas asseverava que não existem lacunas porque o direito nunca falta. A norma era dividida em duas nuances: a norma inclusiva escrita e particular e a norma geral que tinha o caráter de excluir outras condutas. Uma norma que proibia fumar (norma particular) permitia automaticamente todas as outras condutas que não fossem a de fumar (norma geral exclusiva), desse mote, não existia espaço jurídico vazio, toda conduta humana era regulada por uma norma, seja ela particular ou geral exclusiva.

Contudo, a falha dessa segunda teoria, que é melhor enraizada e aceita que a primeira, está contida nos preceitos acerca da “norma geral inclusiva”. Tal norma versava sobre a possibilidade do intérprete aplicar a um caso não regulamentado uma norma semelhante. Bobbio (1995) cita como exemplo o artigo 12 das disposições preliminares do ordenamento italiano que aduzia exatamente que ao juiz era atribuído o dever de julgar conforme casos parecidos ou matérias análogas àqueles casos não regulados.

Diante disso, a existência das lacunas se voltou para qual das normas gerais deveriam ser utilizadas, a inclusiva ou a exclusiva, pois nos casos não regulamentados por lei as duas normas eram aplicáveis. Comprovando mais uma vez a incompletude dos ordenamentos jurídicos. Conforme elucida Bobbio:

Frente a uma lacuna, se aplicarmos a norma geral exclusiva, o caso não regulamentado será resolvido de maneira oposta ao que está regulamentado; se aplicarmos a norma geral inclusiva o caso não regulamentado será resolvido de maneira idêntica àquele que está regulamentado. (BOBBIO, 1995, p. 136)

Cediço é que as lacunas existem, porquanto os ordenamentos jurídicos positivistas são incompletos. Duas formas são apresentadas por Bobbio (1995) para completar os ordenamentos, segundo a terminologia de Carnelutti: Heterointegração e Auto-integração.

A heterointegração dispunha que na presença de uma lacuna o intérprete deveria recorrer a normas diversas daquelas presentes no próprio ordenamento. Seja no Direito Natural, seja nos costumes, o ordenamento era “completado” com uma fonte alheia. Em sentido contrário, a auto-integração pregava que o interprete deveria buscar no âmago do ordenamento a solução para a lacuna apresentada. Nesse segundo método, o fundamento relevante se apoiava na ideia de princípios gerais do Direito positivo bem como na analogia, em que no próprio ordenamento haveria normas de caráter geral que munia o juiz para dirimir o problema da lacuna, ou em comparação com uma norma semelhante.

Destarte, esse sentimento de total confiança nos dizeres de uma norma positivada, herança do direito romano, se demonstrava sempre paradoxal os argumentos tradicionalistas, ao passo que tentavam solucionar o problema que a codificação trazia, seja por falta (lacuna) ou por conflito de normas (antinomias), se atendo em novas normas positivadas, e jamais eram levantadas questões como a retórica e a hermenêutica como ferramentas para auxiliar o jurista.

A pretensão da completude gerou um inconveniente crucial no que tange à atuação do intérprete, ao passo que o intuito da codificação é alcançar a completude. Nesse sentido com o estudo da jurisprudência, entendida na temática proposta como a própria codificação, apresentado no próximo capítulo, somadas a esses preceitos já apresentados constituem os aspectos da codificação que mais influem na atuação do intérprete.

1.4 A Jurisprudência

Com efeito, perpassado alguns aspectos ligados ao positivismo jurídico, influenciados pela escola exegética, passar-se a expor os aspectos atinentes à jurisprudência, relevante instrumento para materializar a codificação. Sendo assim, apresentar-se á nesse capítulo conveniências e inconveniências advindas dessa ferramenta da codificação.

Vico utiliza o termo jurisprudência para elencar as conveniências e inconveniências, para o presente trabalho se deve abranger esse conceito, portanto os empasses apresentados comungam com a ideia da codificação excessiva, sendo assim ao utilizar o termo jurisprudência versaremos também sobre a codificação.

Insta salientar que uma breve diferenciação entre o modo de “enxergar” o direito entre os gregos e os romanos serviu para iniciar a discussão acerca do tema.

Desta forma, a cultura do romano em louvar a lei se diferenciava dos gregos essencialmente na forma de “dizer o direito”. Os gregos exaltavam livros de filosofia, e quem “dizia”, quem expunha as leis eram os oradores, já os romanos exaltavam a prática dogmática do Direito, quem reproduzia a lei eram os juízes, sem espaço para retórica, apenas se atinham ao texto da lei positivado. Nesse sentido Vico se posiciona da seguinte maneira:

Por que, espantosamente, há entre nós uma imensa massa de livros sobre direito, e houve sobretudo entre os romanos depois do Édito perpétuo, mas antes disso houve muito poucos, e entre os gregos nenhum absolutamente? Porque entre os gregos os filósofos ensinavam a filosofia do direito, a saber, a doutrina do estado, da justiça e das leis; aqueles que eram chamados “pragmáticos” forneciam leis aos oradores; e os oradores, nas causas, encontravam a partir do fato mesmo argumento de equidade.” (SANTOS, apud. VICO, 2009, p. 261).

Vico (2009) exaltou a importância que os gregos davam ao discurso e aos filósofos, bem como reafirmou que os romanos eram obcecados por leis positivadas, e acreditavam encontrar a solução para todos os problemas na codificação.

O Direito se dividia, nos domínios romanos, em três esferas: sacro, público e privado, daí que se tinha ideia de que a jurisprudência consiste no conhecimento das coisas divinas e humanas. O Direito civil, sempre rígido, era o signo do absolutismo das leis, cabendo aos pretores apenas expor o que os códigos, dotados de saber ilimitado, previam.

Imbuídos desse conhecimento das coisas divinas e humanas os senadores, agraciados pelo poder de dispor acerca também do Direito privado, reproduziam nada mais que a vontade do imperador endossado pelo “consentimento” daqueles que detém o conhecimento jurídico. Numa estreita conexão com o que depois será dito a respeito da vontade estatal dos sistemas codificadores modernos.

A transição de republica para império e o abandono da eloquência no tribunal, essa massacrada pelos juízos de equidade e reprodução da lei, o Direito romano se desenhou a abandonar a forma filosófica de ver o direito e adotar a criação exacerbada de leis. Nesse sentido, Vico (2009) afirma que as leis são determinadas e os fatos infinitos, fato esse que explica a multiplicação exponencial de livros versando sobre direito no império romano.

Ao traçar uma linha entre os gregos e o império romano é possível obter uma terceira linha de estudo acerca da jurisprudência, que unifica a figura do jurisconsulto e do orador em uma só. Vico (2009) destaca as conveniências e inconveniências dessa razão de estudo acerca da jurisprudência conforme se verifica adiante.

Dentre as conveniências o filósofo do direito italiano assevera que a nossa razão de estudo atual acerca da jurisprudência supera a dos gregos e dos antigos romanos, pois:

(...) entre os gregos era dividida na ciência dos filósofos, na história das leis dos pragmáticos e na faculdade dos oradores, e entre os romanos, antes do Édito perpétuo, entre os jurisconsultos e os oradores, hoje poderia reunir-se em uma única doutrina. (SANTOS, apud. VICO, 2009, p. 279)

Com efeito, Vico conclui que devido ao fato de estarem reunidas em uma única doutrina, a razão de estudo da jurisprudência, possibilita àqueles que são “exercitados na tópica legal” (Santos, apud. Vico, 2009, p. 279) a terem maior discernimento para escolher a lei mais favorável ao caso concreto, ao passo que os detentores apenas do conhecimento histórico não possuíam a mesma capacidade; bem como o fato de que os conhecedores da jurisprudência detém uma percepção mais apurada em face daqueles que são meros oradores.

Atrelada à conveniência da razão de estudo unificada desprende-se a inconveniência dos jurisconsultos não serem capazes de vencer as leis como os oradores faziam, pois se valem de um discurso fraco, além do fato da ciência que deveria ordenar o estado com leis, não ensina a doutrina, que, segundo Vico (2009), deveria ser ensinada a priori.

Nesse mote, outra conveniência advém da facilidade com que se adequa as leis aos fatos, ao passo que não precisa de muita eloquência para alcançar a equidade nas causas. Nesse sentido, afirma o autor:

(...) há a conveniência de não ser necessária muita eloquência para se obter a equidade nas questões legais; pois, basta encontrar de modo simples os argumentos de equidade a partir do fato, de modo que as leis se adequem aos fatos, não pela letra, mas pelo espírito. (SANTOS, apud. VICO, 2009, p. 279-280)

Tal conveniência só o é para o magistrado. Nesse sentido, facilitar a subsunção das normas ao fato minimiza o seu trabalho, pois esse não terá que se valer da retórica e da hermenêutica para convencer os demais da sua decisão, apontando apenas argumentos simples de equidade.

Porém, essa facilidade acarreta no inconveniente de diminuir a inviolabilidade das leis, “pois, quem se esforça para excetuar algo à lei, censura a lei como defeituosa, acusa o legislador de inadvertência, e, finalmente, derruba a autoridade das leis” (Santos, apud. Vico, 2009, p. 281). Ou seja, derruba o tom de autoridade que a lei deve emanar.

Da união entre orador e jurisconsulto, em uma só pessoa, extrai-se a conveniência de pesar mais eloquência nos casos de direito e tratamento mais rigoroso nas questões de fato. Com embargo, a essa benesse se contrapõe o inconveniente da divisão pormenorizada da prudência; que consiste em três ramos: pública, privada e sacro, passam a ser estudadas completamente separadas. Nesse sentido, assevera Vico que, ao passo que a equidade é obtida conforme os fatos, e, dada a infinidade desses, leis infinitas serão criadas, gerando uma reação em cadeia, tolhendo a inviolabilidade das leis que versam sobre assuntos de maior relevância, conforme aduz o filósofo:

Uma vez que a equidade se julga conforme os fatos, e os fatos são infinitos, e no mais das vezes de pouquíssima importância, temos também inúmeras leis concebidas a propósito de coisas em grande parte de pouquíssima importância. Entretanto, sendo inúmeras, não podem ser todas observadas, e aquelas sancionadas a respeito de coisas de pouca importância facilmente, como acontece, são desprezadas, e, tendo sido desprezadas, também tolhem a inviolabilidade das mais sérias. (SANTOS, apud. VICO, 2009, p. 283)

Categoricamente, Vico expressou nessa passagem o principal inconveniente advindo de um ordenamento jurídico com raízes no direito romano, tal inconveniente que diz respeito a criação de leis específicas, que cobiçam abranger todos os casos concretos, atenuam a confiabilidade que emana do sistema jurídico. Cria-se um sentimento de vulgaridade provinda dos legisladores que se atém a coisas banais, e, por derradeiro, todo ordenamento é subjugado.

Insta frisar que esse inconveniente é um retrato do atual sistema jurídico pátrio. Neste mote, têm-se a carta magna com mais de 200 artigos e mais de 80 emendas à constituição, sem falar na imensidade de leis infra constitucionais. Este inconveniente leva a discussão jurídica a um patamar subordinado ao texto da lei, ou seja, não se discutem argumentos e sim quais leis seriam ideais ao caso.

É, também, mister salientar que o intérprete da lei é o maior prejudicado com essa criação desenfreada de leis. Quanto mais específica elas se mostram, menor será a área de atuação do jurista, em especial o advogado, caberá a esse apenas a indicação de qual lei se aplica ao caso, tolhendo a eloquência e o discurso atinente à subsunção dos fatos às normas. Leia-se, o ideal para o jurista seria um ordenamento jurídico em que as leis se mostrassem imperiosas, convincentes e de caráter geral, obrigando ao jurista que demonstrasse profundo conhecimento hermenêutico, que lhe trouxesse o escopo necessário para, através do discurso e da eloquência, moldurar os fatos à norma.

Essas inconveniências demonstram a intenção dos ordenamentos demasiadamente codificador em almejar a completude, e, por conseguinte ceifar a atuação do intérprete frente a esses ordenamentos. Nessa esteira, esses ordenamentos se pautam numa inexistente lógica jurídica, ao passo que fazem alusão às ciências exatas e não vêm o direito como uma ciência social.

1.5 Lógica Jurídica

A ideia que se tem de atividade da mente, bem como os resultados dessa atividade, constitui, segundo Perelman (1997), o raciocínio. Podendo ser estudado por certas áreas do saber, dentre elas a psicologia e a fisiologia. Dessa atividade da mente se desprende o raciocínio analítico e o raciocínio dialético. O raciocínio analítico é aquele que “partindo de premissas necessárias, ou pelo menos indiscutivelmente verdadeiras, redundam, graças a inferências válidas, em conclusões igualmente necessárias ou válidas” (Perelman, 1997, p. 1). Os raciocínios analíticos, numa visão teleológica, funda sua atuação na necessidade e na verdade das premissas, ao passo que partindo de premissas corretas e raciocinando corretamente é impossível que a conclusão seja falsa, afirma Perelman (1997).

A disciplina conhecida como “lógica” cuida de examinar o raciocínio independentemente das condições de sua elaboração, porquanto serão analisados “o modo como foi formulado, o estatuto das premissas e da conclusão, a validade do vínculo que as une, a estrutura do raciocínio, sua conformidade a certas regras ou a certos esquemas conhecidos de antemão.” (Perelman, 1997, p.1). No que se refere ao raciocínio analítico a lógica que estuda quais inferências serão válidas trata-se da lógica formal. O objetivo dessa lógica formal é criar uma certeza partindo de um silogismo em que as premissas, sendo verdadeiras, os seus elementos sempre que se apresentarem da mesma forma possam ser substituídos. Ou seja, a partir do esquema “se todos os B são C e se todos os A são B, todos os A são C”, dessa forma a única condição que a lógica formal exige para garantir a verdade das conclusões diz respeito à possibilidade de substituir “A”, “B” e “C” sempre que se apresentem pelos mesmos termos, conforme conclui Perelman (1997).

Já o raciocínio dialético, segundo o autor, não se refere às demonstrações científicas, mas às deliberações e às controvérsias. Esse raciocínio tem o cerne da sua atuação em convencer e persuadir pelo discurso, a partir de uma afirmação, fazer com que os outros se convençam dela. Nesse sentido afirma o autor, “dizem respeito aos meios de persuadir e de convencer pelo discurso, de criticar as teses do adversário, de defender e justificar as suas próprias, valendo-se de argumentos mais ou menos fortes.” (Perelman, 1997, p. 2)

É a partir do discurso que se alcança o resultado, não obrigatoriamente deve se atentar às premissas, pois o raciocínio dialético não está atrelado ao modo de concluir e sim a convencer os demais pelo discurso, Perelman (1997) afirma que partindo desse raciocínio poderá se decidir de um modo diferente cada caso, bem como não chegar a conclusão nenhuma.

Complementa o autor que o raciocínio dialético não pode cair no reducionismo criado pelo raciocínio analítico, em que tudo se baseia em premissas válidas, sendo assim, uma argumentação, mesmo que não atente à formalidade exigida, pode ser também válida. Partindo desse reducionismo; ou seja, de afirmar que toda argumentação deve partir de premissas formalmente válidas, corre-se o risco de afirmar que a lógica jurídica, além de existir, seria “a parte da lógica que examina, do ponto de vista formal, as operações intelectuais do jurista” (Kalinowski, Introdução à Lógica Jurídica, 1965, p.7, apud. Perelman, 1997, p.4).

Ainda versando sobre lógica jurídica, ou melhor dizendo a não existência de uma lógica jurídica, Perelman faz uma análise e um adendo ao pensamento de Kalinowski, esse autor expõe a seguinte proposição:

Não há, em nosso entender, senão uma lógica: a lógica pura e simples (pura e simples tomadas no sentido teórico ou normativo). Por outro lado, entre as diversas aplicações das leis ou regras lógicas universais, há algumas que são feitas por juristas na área de um saber jurídico qualquer. É muito interessante e útil analisar as diferentes aplicações das leis e das regras lógicas universais nos diversos campos dos saberes jurídicos. É curioso e enriquecedor examinar os habitus jurídicos aos quais elas se devem. Mas é vão tentar estudar uma lógica jurídica no sentido do termo, pois ela não existe. (Kalinowski, Ya-t-il une logique juridique- Logique et analyse, 1959, p.53, apud, Perelman, Lógica Jurídica, 1997, p.5)

O adendo que Perelman faz ao pensamento acima exposto constitui o acréscimo do qualitativo “formal” à palavra “lógica”. Segundo o autor apenas a lógica formal existe que é aquela estudada nas faculdades. A semelhança entre a lógica jurídica e a formal se funda apenas no nome, afirma o jurista, devido à peculiaridade da ciência do direito, pois, ao contrário de outras ciências que comportam lógicas pura e simples, pois as conclusões podem ser uniformes, contudo o Direito não comporta essa espécie de “lógica jurídica”, ao passo que, se não houver um terceiro decidindo o conflito, cada parte permanecerá imbuída do sentimento de que está certo.

Nesse sentido Perelman conclui que “por ser quase sempre controvertido, o raciocínio jurídico, ao contrário do raciocínio dedutivo puramente formal, só muito raramente poderá ser considerado correto ou incorreto, de um modo, por assim dizer, impessoal.” (Perelman, 1997, p. 8). Corroborando com a ideia de que o direito difere das ciências que alcançam uma conclusão não controvertida com certa facilidade acerca dos conflitos, ciências como a matemática e a biologia, e.g.

Destarte, ao Direito não se deve atribuir a alcunha de lógica jurídica ao estudar os seus métodos. Tal exposição comunga com a ideia de que o Direito não se deve pautar pela codificação excessiva e sim visar atender aos anseios da sociedade como um todo.

1.6 História da Codificação a Partir do Império Romano

Após passado os aspectos atinentes à codificação mostrar os acontecimentos históricos que motivaram esse ideal se vê necessário para que se possa entender de forma otimizada o estudo da codificação. Ademais, o direito romano foi o grande ensejador dessa fiel alusão às normas e seu culto.

A partir dessa evolução histórica, Caenegem (1999) demonstra que a evolução do direito romano ganhou espaço a partir do desaparecimento do Estado romano e da influência dos povos germânicos.

Afirma Caenegem que a velha ordem jurídica romana não havia desaparecido completamente, entretanto com o declínio das instituições da antiguidade ela perdeu sua posição de supremacia. Para o autor, as principais mudanças, sob o império, consistiram no fato de toda a população se sujeitar ao direito romano. Contudo, as tribos germânicas conservaram seu próprio direito consuetudinário, período em que o direito romano tornou-se mais distante do seu modelo clássico, em virtude do desaparecimento dos principais componentes da antiga cultura jurídica.

Caenegem classificava cultura jurídica, e, versava acerca do empobrecimento intelectual do ocidente da seguinte forma:

A tradição as grandes escolas de direito, o saber dos juristas, a legislação imperial e a jurisprudência. Além disso, o Ocidente não permanecia mais em contato com o Oriente grego, que em sua época contribuíra muito para o desenvolvimento do direito clássico romano. A essas circunstâncias, devemos acrescentar o empobrecimento intelectual do mundo ocidental. O direito romano estava reduzido a um direito consuetudinário provinciano, o direito romano vulgar, que prevalecia na Itália e no Sul da França. O direito vulgar era usado em certa medida nas compilações rudimentares feitas, sob as ordens dos reis germânicos, em benefício de seus súditos romanos. As compilações de Justiniano (565) foram o legado mais importante do direito romano. Mas a obra legislativa de Justiniano não entrara em vigor no Ocidente. E permaneceu desconhecida durante os primeiros séculos da Idade Média, devido ao isolamento do Ocidente e ao fracasso de Justiniano em reconquistar os territórios invadidos pelos germânicos. (Caenegem: Uma Introdução histórica ao Direito Privado, 1999, p.24-25)

É possível verificar uma importante mudança na nova formatação do direito romano, a partir dos povos germânicos, haja vista a crescente transformação da cultura e respectivas maneiras com que ele era influenciado, principalmente sob os aspectos em que se posicionava o Ocidente com o Oriente grego, em virtude da mudança de contato, que demonstrou uma evolução intelectual maior para a parte oriental.

Nota-se que Justiniano exerceu considerável importância para o mundo jurídico ao apresentar o Corpus Iuris Civilis, considerado um dos mais célebres projetos legislativos da História, afirma Caenegem (1999).

Perpassado superficialmente alguns aspectos atinentes aos romanos, caenegem (1999) passa a descrever o direito feudal e seus aspectos legislativos.

Os imperadores romanos demonstraram formação ativa e conhecimento jurídico ao promulgarem as suas constituições, visto que através da legislação eles elucidaram, especificaram e interpretaram normas de direito, além de dar uma nova direção à ordem jurídica.

No entanto, aduz Caenegem (1999) a atividade legislativa entrou em colapso junto com o Estado romano no Ocidente. Os reis germânicos ao participarem do processo legislativo tentaram inovar ao redigir e promulgar o direito tradicional, mas o objetivo principal era fixar o velho direito da tribo.

Nessa época, houve o declínio da legislação, concomitante com o desaparecimento do império, porém, pode-se atribuir tal declínio também às concepções dos povos germânicos acerca da realeza e do direito. Por sua vez, o direito tinha caraterística própria e não poderia ser manipulado e adaptado conforme a vontade das autoridades, visto que o direito era uma realidade eterna, um princípio fixo e intemporal de orientação que devia ser elucidado e interpretado e jamais alterado.

Trata-se o direito de uma realidade eterna, um princípio fixo e intemporal de orientação, que deveria ser elucidado e interpretado, mas jamais alterado fundamentalmente. O rei tinha o poder de elucidar o significado do direito e desenvolver princípios jurídicos, desde que respeitasse os fundamentos existentes e incontestáveis, mas não poderia alterar a antiga lei. (Caenegem, 1999, p. 29)

Começa-se a verificar uma cultura que venerava o texto legal em decorrência de outros preceitos, sejam eles divinos ou advindos de um soberano que dizia o direito.

Durante a alta idade média, raramente são encontrados estatutos genuínos e os soberanos que vieram depois foram lentos e indecisos em retomar a atividade legislativa, o que se deve ao fato ligado à incontestável existência do direito como realidade eterna, afirma o autor.

Outro elemento de destaque se trata das legislações capitulares, essas eram vários tipos de dispositivos legais, promulgadas pelo rei, que, hoje, assemelham-se estatutos, ordens, diretivas e regulamentos. As capitulares foram implantadas no Império Romano no século VIII e IX.

Compunham-se as capitulares de dispositivos de direito civil, em menor escala, direito penal, direito processual e direito feudal, instruções administrativas, ordens e regulamentos sobre a organização militar. As capitulares refletem as tentativas dos soberanos de melhor direcionar a administração e sob a influência cristã, proteger seus súditos mais pobres contra os mais poderosos.

Ao mesmo tempo que protegiam a Igreja, os reis também intervinham nos negócios eclesiásticos. Isso os levou a promulgar numerosas capitularias eclesiásticas (em contraposição às capitularias mundanas). Embora essas capitulares versassem sobre questões eclesiásticas, emanavam dos reis francos e não de autoridades eclesiásticas, que mantinham seus próprios conselhos e promulgavam seus próprios decretos. (Caenegem, 1999, p. 30)

Complementa Caenegem (1999), na vigência do comando de Carlos Magno, os interesses da igreja e do Estado eram essenciais para a formação da sociedade medieval, fator que se assemelhava aos imperadores cristãos que já haviam interferido nos negócios da Igreja.

Destacavam-se alguns tipos de capitularia; a Capitularia legibus addenda (capitulares complementares às leis nacionais dotada de unidade jurídica dentro do estado, capitularia per se scribenda – capitulares autojustificadas, dispositivos independentes que não eram auxiliares das leis nacionais), compunham-se de 10 a 20 artigos com diferenças significativas quanto às suas formas; capitularia missorum (instruções verbais do soberano aos missi dominici), os mensageiros reais enviados a todo o país para supervisionar a aplicação da lei ou para introduzir novas normas.

Algumas delas estão devidamente datadas e apresentam um preâmbulo solene e outras só podem ser datadas de maneira aproximada e não contêm qualquer protocolo inicial ou final. Tem, muitas vezes, textos títulos e não frases completas. Esses títulos permitem apenas presumir o significado. Por exemplo, sobre fugitivos, aos quais se insista em dar hospitalidade.

As ideias da época davam ênfase à palavra do rei vista como força de lei a um documento. Isso aplica-se também no contrato e na prova.

O sentido de superioridade da palavra escrita parte de uma revolução que não remonta a antes do fim da Idade Média.

Caenegem (1999) afirma que com a criação desse tipo de legislação as capitulares não derivavam unicamente da autoridade do rei. Para ele legislar contava com o apoio de um consenso, concordância dos homens do reino, como representantes do povo franco. Embora, nas decisões de soberanos, como Carlos Magno, já havia um pré-consentimento da vontade do rei. Contudo, na vigência do governo de seu neto Carlos, o Calvo, cuja posição política era, às vezes, insegura, a vontade da aristocracia não podia ser ignorada.

As capitulares desempenhavam um papel modesto na época dos merovíngios. Destaca-se o grande período das capitulares com a dinastia carolíngia que chegou ao poder aos 751 d.C., fato esse que ocorre no século IX, no reinado de Carlos Magno. No entanto, no fim do século IX as capitulares tinham desaparecido, primeiro nos reinos ocidentais e depois no oriental. As capitulares eram superiores às leis tribais e formavam uma unidade jurídica, afirma o autor. No continente europeu, desapareceu a legislação que abrangia a escala de um reino depois das capitulares, no entanto, no século XII, novas tentativas foram encontradas, como na Inglaterra, do século X e XI ainda se promulgavam importantes dooms. A unidade política inglesa era inversa à da Europa, haja vista estar acontecendo nessa época a divisão política dos reinos.

Assim, foi reconhecida a importância das capitulares, tendo sido compiladas coleções destinadas à prática dos tribunais e a outros objetivos jurídicos.

Duas coleções tornaram-se muito conhecidas, Ansegisus, abade de St. Wandrile (827 d.C) e a de Benedito, o Levita (847-52 d.C.).

Ansegius, na qual um artigo de uma capitular é às vezes transposto para um contexto diferente quando o autor julga que isto é mais logico. A de Benedito, um pseudônimo sob o qual o autor reuniu varias fontes legais (sobretudo os textos eclesiásticos) numa coleção que se propunha complementar e continuar o trabalho de Ansegisus. (CAENEGEM, 1999, p. 33)

Dispõe Caenegem (1999) que vários documentos da coleção do Levita são falsos ou falsas capitulares, ou fontes autênticas que sofreram falsificações, alusivas a hierarquia eclesiásticas, e constituíam provavelmente uma das principais preocupações do autor.

No que tange à ciência jurídica, no início da Idade Média não existia a Ciência Jurídica como tal. Não há tratados de direito ou de ensino profissional, a respeito. De acordo com Caenegem (1999) as coleções de capitulares eram escritas para uso de praticantes e não se destinavam à exposição doutrinaria através de comentários ou manuais. Conheciam-se determinados princípios dos pensamentos romanos por meio de textos como a “Lex Romana Visigothorum ou as Etymologiae de Isidoro de Sevilha, uma pequena enciclopédia que destilava o conhecimento da antiguidade” (Caenegem, 1999, p. 34).

Aflora-se certa ignorância sobre o direito romano e do direito das capitulares. No entanto, Agobardo de Lyon (840) um dos raros que expressavam a opinião crítica, ousou atacar os ordálios e o princípio de personalidade na aplicação do direito.

Segue na idêntica linha o direito canônico, ou seja, sem inspirar qualquer estudo ou comentário teórico. Raramente, os autores das coleções limitavam-se a reunir as normas existentes e a promulgação de novas normas pelo papa ou pelos conselhos, afirma Caenegem (1999).

Nesse sentido, o direito permaneceu na forma original de forma oral e a sua fonte principal era o costume. Não houve unificação do direito do reino, pois ele variava de tribo para tribo e de região para região.

Já as capitulares, direito supranacional, era o direito Da Igreja Romana, vigente no Ocidente e a sua importância limitava-se aos assuntos da igreja, em sua maior parte de natureza administrativa.

Em relação à alta idade média, destaca Caenegem (1999) têm-se que os tribunais diferenciavam-se com os tribunais do Império Romano. Desapareceu a hierarquia dos tribunais, com a possibilidade de apelar para Roma, tendo sido substituído por um sistema de jurisdições locais, ao passo que inexistia centralização e apelação.

Segundo o autor, no tocante à administração da justiça ocorreu a troca dos juízes profissionais por juízes ocasionais sem qualificação específica. No reinado de Carlos Magno criou-se o cargo de juízes permanentes, porém não eram magistrados profissionais, mas davam estabilidade à administração da justiça.

O processo adotado pelas cortes e tribunais do início da Idade Média era naturalmente muito diferente do processo extra ordinem do fim do império. Os casos agora eram expostos publicamente, ao ar livre, perto de um local sagrado, talvez uma montanha, árvore ou fonte. O povo participava ativamente da administração da justiça e expressava sua concordância ou discordância com o veredito proposto; o processo era oral, com um uso muito limitado de documentos escritos; não havia atas nem petições escritas, não se guardavam registros; a causa consistia essencialmente numa disputa entre as partes, na qual o papel desempenhado pelas autoridades estava limitado ao controle formal e à simples ratificação da parte vitoriosa. (CAENEGEM, 1999, p. 36)

Seguia-se o processo com características próprias daquela época, levando à decisão a melhor argumentação e maneira de convencimento ao julgador, visto que as técnicas primordiais para elucidação dos fatos, como provas, testemunhas não tinha um seguimento que levavam tecnicamente, à elucidar os fatos e nem tanta relevância ao serem analisadas. Até mesmo os julgadores se viam diante dos fatos com as provas que, em tese, não expressavam um desenvolvimento completo obrigando-os a apelar para o duelo como uma saída possível.

Caenegem (1999), afirma que no período de c. 1100-c 1750, na Europa e no direito romano germânico, percebe-se que a estrutura feudal e agraria já foram se perdendo em virtude da presente evolução e transformação do ocidente. O estado nacional soberano passou a dominar a organização política através do monarca. O estado passou a corresponder com a população já de forma mais desenvolvida, em virtude dessa transformação, tendo, inclusive diminuído o poder dos senhores feudais.

A igreja, de forma semelhante, apresentava-se como centralizadora, com o poder concentrado num nível supranacional e permitiu que uma Igreja burocrática e hierarquizada tomasse forma sob a direção do papado.

Sobressaia a economia de mercado, em substituição a economia agrícola fechada, em virtude do desenvolvimento do comercio e da indústria internacional pela intensa circulação do capital e pelo desenvolvimento de um sistema bancário.

Ou seja, no início da era moderna o desenvolvimento mais generalizado aflorou deixando para trás os métodos e costumes da época, pelo crescimento das cidades, aumento considerável da população e isso requeria, também uma sociedade com uma cultura e conhecimentos específicos para o crescimento que se propunha.

Houve também um profundo desenvolvimento intelectual. O nível cultural geral elevou-se de maneira considerável, o que se refletiu particularmente na alfabetização e no uso crescente da língua vernácula; o pensamento racional também continuou a ganhar terreno. Foi também nesse período que as universidades surgiram e espalharam-se por toda a Europa. Traziam consigo uma disciplina intelectual baseada nas grandes obras filosóficas e jurídicas da antiguidade greco-romana. (CAENEGEM, 1999, p. 44).

As transformações ocorridas nas diversas áreas mudaram a sociedade, complementa o autor. Influência da Revolução Industrial com a produção em massa, avanços científicos, culminou com a era iluminista, trazendo uma nova concepção do homem e do universo e vislumbrou uma base voltada para a razão humana e não mais na religião, abrindo vertente para a melhor interferência de uma sociedade mais aberta, visto que as ideias de outrora ligavam-se mais aos aspectos da religião.

No que tange ao desenvolvimento do direito, afirma Caenegem:

No desenvolvimento do direito privado, não há uma ruptura dramática entre os séculos XV e XVI. Admite-se que foi por volta de 1500 que a recepção do direito romano surgiu na Alemanha; algumas décadas mais tarde, a homologação dos costumes começou nos países baixos; o século XVI viu a jurisprudência ser dominada pela Escola Humanista. Todos esses acontecimentos são apenas um estágio dentro de uma longa evolução que remonta à Idade Média. A recepção era uma consequência do renascimento do direito romano no século XII e foi apenas uma das muitas formas de interação entre o direito consuetudinário germânico e o direito erudito romano, um processo desenvolvido ao longo de vários séculos em toda a Europa. O humanismo jurídico constituiu apenas um novo episodio na longa história de assimilação do direito antigo pelo homem europeu. (CAENEGEM, 1999, p. 47).

Nota-se que o direito consuetudinário começa perder espaço, pois havia necessidade de modernização da sociedade, para acompanhar as mudanças, corresponder às expectativas da época e acompanhar também a evolução em todas as áreas, complementa o autor.

Sobressaiu um direito pautado em um sistema romano-germânico, no entanto, a influência de um sobre o outro variava de país para país. A Alemanha, por exemplo recepcionou o direito erudito. Ao passo que a Inglaterra, e seu sistema de direito, rejeitou o direito romano.

A partir do século XVI, o direito erudito foi instituído em vários países e regiões da Europa continental. No entanto, ainda vigora os costumes em determinadas áreas.

A erudição jurídica encontrava-se inteiramente sob a influência do direito erudito; os tribunais de justiça estavam cheios de juristas cuja educação universitária fora baseada no direito romano; e os próprios costumes reconheciam frequentemente que que o direito romano exercia um papel suplementar de vínculo. (CAENEGEM, 1999, 49).

Afirma Caenegem (1999) que nos séculos XVI e XVII, época clássica do direito romano, prevalecia um sistema jurídico acadêmico, um direito de professores, pouco inteligível e acessível a um público desprovido de formação acadêmica. O processo burocrático evitava contato direto com o povo, ao qual o direito se aplicava, tratava-se de um direito com significação obscura, no entanto, quando os costumes foram fixados por escrito, houve um avanço. Esse direito constituía-se por muitas obras e, ás vezes desordenada, intermináveis e escritas por inumeráveis juristas, com tendências a contradições mútuas. Quanto à legislação não se realizou qualquer codificação geral até meados do século XVIII. As tentativas limitavam-se à ordenação de áreas específicas do direito ou simplesmente a juntar estatutos promulgados ao longo dos séculos da Idade Média e do antigo regime.

O fim da velha ordem jurídica europeia ocorreu no fim do século XVIII.

Vários fatores contribuíram para esse desaparecimento: a recusa em submeter-se às autoridades da Antiguidade, em particular ao direito romano; a procura de uma nova ordem jurídica fundada na razão ou na natureza do homem e da sociedade, tal como era concebida e definida pela razão; o triunfo da ideia de codificação; e o desejo de tornar acessível e democrático o fechado e esotérico mundo do direito e da justiça. (CAENEGEM, 1999, p.49)

No que tange ao direito consuetudinário, afirma Caenegem (1999) que no norte da França e ao Sul dos países baixos houve uma grande incidência do direito consuetudinário. No decorrer do antigo regime, esse direito sofreu várias modificações, dentre elas: tendência para uma maior unidade: no período pós-carolíngio, existiam muitos costumes locais e regionais em virtude da fragmentação feudal e à independência das cidades. Na Inglaterra (1154-89), reinado de Henrique II, os tribunais reais centrais já haviam criado um direito nacional consuetudinário único, o Common Law, o qual contrastava com os costumes locais de menor importância. Em outros países, a concentração foi menos radical e a diversidade de costumes foi reduzida, no entanto, não eliminada. No sul da França o direito romano tornou-se base comum da prática jurídica. No norte, já os costumes eram menos resistentes. Ao Sul dos países baixos, a homologação dos costumes levou à extinção de muitos deles e a uma relativa unificação do direito consuetudinário. Houve certa tendência em registrar por escrito os costumes, com relevância para a adaptabilidade, a flexibilidade e a fluidez com que surgiam e desapareciam.

O costume tornou-se objeto de estudos jurídicos eruditos, que certamente afetaram sua espontaneidade original. Os costumes homologados eram o tema mais frequente de tais estudos: embora as obras dos juristas fossem inesperadas principalmente pelo direito romano, no qual tinham sido formados, não estava fora de seu alcance comentar esse novo direito escrito que adquirira a força do estatuto. (CAENEGEM, 1999, p.54)

Destarte, com a apresentação superficial de aspectos históricos atinentes ao império romano bem como a idade média, vale frisar que a maior contribuição desse subcapitulo guarda com o restante do trabalha se funda na confiança que os povos romanos depositaram no texto da lei, principalmente após o iures civili escrito por Justiniano. Essa contribuição perpetrou durante a história da codificação, retomando grande força com a escola da exegese francesa.

Esse primeiro capítulo, como fora mencionado na introdução, tem o escopo de levantar alguns aspectos atinentes à codificação. A parte histórica foi posta de forma recortada apontando apenas os pontos que dizem respeito à temática proposta. Deste mote, com essa ideia inicial dos aspectos da codificação, no segundo capítulo serão apresentadas ferramentas capazes de sanar os inconvenientes que a codificação excessiva trás para atuação do jurista, em especial o advogado.

CAPÍTULO II – ESPAÇO PARA RETÓRICA E HERMENÊUTICA

Esse derradeiro capítulo trará as ferramentas necessárias para sanar esses inconvenientes no primeiro capítulo mencionados, sejam eles o falso ideal de um ordenamento jurídico coerente e completo, ou o fetichismo da lei, fatores que culminam no aumento da violabilidade das leis, e tolhem o trabalho do intérprete, como fora acima mencionado.

O uso da retórica na área jurídica detém papel de destaque, contudo um jurista que tenha o dom da retórica, mas que não saiba interpretar, compreender e aplicar o texto da lei, trazendo-o para o contexto atual, não terá sucesso em sua empreitada. A retórica atrelada aos preceitos da hermenêutica jurídica enaltece o trabalho do jurista.

2.1 Retórica

O estudo da retórica, afirma Perelman (1997), não faz parte de uma disciplina existente, com seus métodos e problemas bem definidos. Para o autor o tema estaria situado entre as fronteiras da lógica e da psicologia. E o objeto de estudo seria, “o estudo dos meios de argumentação, não pertencentes à lógica formal, que permitem obter ou aumentar a adesão de outrem às teses que se lhe propõem ao seu assentimento”. (PERELMAN, 1997, p. 57)

Nesse sentido, complementa Perelman não poder ser considerada argumentação o apelo à experiência, ou seja, quando quer aumentar a adesão de outrem a alguma tese com os seguintes argumentos: “olha e verás” ou “observa-te e sentirás”. Para o autor o que servirá como objeto de estudo será a experiência bruta, aquela que consiste em se opor a opinião de outrem e fazer com que esse concorde com a sua. A título exemplificativo, Perelman (1997) apresenta o caso do comerciante que pretende vender um brilhante e defenderá a brancura da pedra mesmo o comprador observando reflexos amarelados.

No que tange à argumentação, há uma distinção entre persuasão e convicção. Para os racionalistas a convicção está ligada ao campo da objetividade e da ciência ao passo que a persuasão está relacionada à subjetividade e sugestão. Decerto, para esses racionalistas a convicção seria superior à persuasão, afirma Perelman (1997).

Neste mote, trazendo à discussão as disciplinas ligadas ao senso comum e não à lógica, como a tradição filosófica, o autor afirma que esse senso impõe uma distinção entre convencer e persuadir, equivalente à distinção entre raciocínio e sugestão. Afirmando que a persuasão não pode ser baseada na experiência ou no raciocínio formal, a persuasão diz respeito à deliberações em assembleia, qualquer discurso político ou religioso, bem como a maioria das exposições filosóficas.

Essa distinção entre persuasão e convicção não será suficiente para o estudo do tema “retórica”, afirma o autor, pois se partir apenas de um racionalismo estrito em que se examinam diversos meios de obter a adesão das mentes não será suficiente. Para o autor o método ideal de obter a adesão seria por uma diversidade de procedimentos que consigam provar como se chegou àquele resultado, “Constata-se então que esta é obtida por uma diversidade de procedimentos de prova que não podem reduzir-se nem aos meios utilizados em lógica formal nem à simples sugestão”. (Perelman, 1997, p. 63)

Essas distinções se mostram necessárias ao estudo da retórica, pois após a pesquisa realizada com intuito de aferir o valor dos argumentos, não de um ponto de vista matemático pautado na lógica, mas com o fim de sistematizar as observações feitas em relação ao grau de convencimento de um argumento, colocando em pauta a possibilidade de diferenciar um bom discurso de um mal feito, bem como um tratado de filosofia de primeira ordem uma de uma dissertação de iniciante; é que o autor chegou à conclusão que os procedimentos utilizados, coincidentemente, eram as da Retórica de Aristóteles.

O estudo da retórica, segundo Perelman (1997), se viu muito tempo ligado à lógica e submisso a ela, vindo a desvincular dessa a partir do momento em que é introduzido ao estudo da retórica o juízo de valor. O objetivo da retórica consiste em “possibilitar-nos sustentar nossas opiniões e fazer que sejam admitidas pelos outros. A retórica não tem, pois, como objeto o verdadeiro, mas o opinável” (Perelman, 1997, p. 66). Nesse mote, ao versar sobre retórica, o autor retoma aos antigos.

Na visão de Perelman, os antigos dividiam o estudo dos gêneros oratórios em três, a saber:

O deliberativo, o judiciário e o epidíctico. O deliberativo se refere ao útil e diz respeito aos meios de obter a adesão das assembleias políticas; o judiciário se refere ao justo e diz respeito à argumentação perante os juízes; o epidíctico, tal como é representado pelo panegírico dos gregos e pela laudatio funebris dos latinos, se refere ao elogio ou à censura, ao belo e ao feio; mas ao que virará? É aqui que os antigos se viram em grande embaraço. (PERELMAN, 1997, p. 68).

Tal embaraço se demonstrou ao passo que enquanto conseguiam definir com clareza que o gênero deliberativo e judiciário suponham um adversário, e, o uso da retórica era explicado pela incerteza e pela ignorância, e ainda que visavam obter uma decisão acerca de uma questão não definida e controvertida. Contudo, para o discurso epidíctico, não viam claramente um objetivo, passando a considera-lo apenas um espetáculo, tendo como intenção ao discursar o prazer dos espectadores. Entretanto o autor afirma que ao criticar o discurso epidícitco, criou-se daí um objetivo, vez que tanto o gênero deliberativo quanto o judiciário deveriam se valer de juízos de valor, ou seja, formas de encantar os espectadores para fazer com suas premissas fossem aceitas.

A partir desse empasse e da necessidade de se valer do discurso epidíctico, com intuito de incorporar a argumentação e aumentar a adesão do ouvinte à sua tese, é que Perelman (1997) passou a utilizar o termo “retórica” em sua obra, num contexto atual, ou seja, aquele em que o orador deve estar ligado de certa forma ao espectador, esse liame deve indicar o que levará o ouvinte a se interessar e, por conseguinte, aderir à argumentação de quem vos fala. Nesse sentido afirma Perelman:

Para que a argumentação retórica possa desenvolver-se, é preciso que o orador dê valor à adesão e que aquele que fala tenha a atenção daqueles a quem se dirige: é preciso que aquele que desenvolve sua tese e aquele a quem quer conquistar já formem uma comunidade, e isso pelo próprio fato do compromisso das mentes em interessar-se pelo mesmo problema. (PERELMAN, 1997, p. 70).

Perelman (1997) elucida a dificuldade que é atribuída ao orador em obter a atenção da sua plateia. O autor afirma que argumentos diversos poderiam ser dispensados apenas a essa discussão inicial de “valerá a pena ou não sermos ouvidos”, e daí surgiria argumentos inúmeros discussões extensas apenas nessa preliminar. Nesse sentido, o autor afirma que toda sociedade bem organizada é dotada de procedimentos que permitem iniciar essa discussão, ou seja uma ligação subjetiva entre orador e plateia pré-definida, citando como exemplo as instituições políticas, judiciárias e de ensino.

Essa ligação subjetiva se relaciona com um auditório, nesse sentido Perelman (1997) desfere atenção especial a dois tipos de auditórios: o composto por uma pessoa e outro composto por toda humanidade. Ao se dirigir para uma pessoa apenas, Perelman (1997) afirma que deve se estabelecer um diálogo entre as partes, com intuito de estreitar essa ligação subjetiva, fazendo-lhe perguntas e respondendo a objeções. Ao passo que o auditório universal tem a característica de ser uma criação do orador, em que esse irá fundar a sua argumentação em premissas válidas por todos, inclusive pelo próprio orador, pois esse deve levar em consideração fatos, fazendo com que sua argumentação seja de cunho científico ou filosófico, ao contrário das argumentações dirigidas a auditórios mais restritos, mais particulares, que se valem dos preceitos atinentes à retórica, ou seja, adesão dos ouvintes através de argumentos situados no campo da opinião.

Ocorre, porém, segundo o autor, que ao se dirigir a um adversário busquemos atingir também interlocutores da mesma forma que ao se dirigir a um auditório universal (ou suponhamos se dirigir pelo fato desse auditório ser uma ilusão do orador) coincida com um auditório particular que se conhece bem. Perelman conclui então que todo orador fabrica um modelo de homem a que se espera convencer e que os auditórios universais são variáveis nas seguintes explanações:

De fato, fabricamos um modelo do homem – encarnação da razão , da ciência particular que nos preocupa ou da filosofia – que procuramos convencer, e que varia com o nosso conhecimento dos outros homens, das outras civilizações, dos outros sistemas de pensamento, com oque admitimos ser fatos indiscutíveis ou verdades objetivas. É por essa razão, aliás, que cada época, cada cultura, cada ciência, e mesmo cada indivíduo, tem seu auditório universal. (Perelman, 1997, p. 74)

De fato a característica do auditório é primordial, entretanto, afirma Perelman (1997), de igual importância é a opinião que o auditório tem desse orador. Essa interação entre orador e auditório é imprescindível para que ocorra a adesão dos argumentos. Essa interação não diz respeito apenas aos juízos morais ou estéticos, complementa o autor, a argumentação influi diretamente nessa ligação, ao passo que “a personalidade do orador garante a seriedade da argumentação, inversamente, uma argumentação fraca ou desastrada diminui a autoridade do orador” (Perelman, 1997, p. 75).

Essa interação não é o único fator que irá determinar o sucesso de uma argumentação retórica. Perelman (1997) afirma que, diferentemente da lógica que é coerciva, a retórica pode ser a qualquer tempo questionada, ademais, diversos meios podem diminuir a intensidade da interação entre orador e auditório. Entre esses métodos ele cita o preconceito que funcionará como um fator prévio à argumentação do orador e influirá positiva eu negativamente sob a estima do orador. Deste mote, cabe a quem irá se valer da retórica usar técnicas capazes de dirimir esses preconceitos desfavoráveis à sua pessoa, o autor cita que uma dessas técnicas seria a de elogiar a quem se quer criticar inicialmente, para quebrar com esse preconceito.

É devido a essas variáveis relacionadas com o campo da argumentação retórica que a noção de contradição deve ser substituída pela de incompatibilidade, afirma o autor. Pois, no campo da lógica o oposto significa contradição e devendo assim ser excluído, já no campo da retórica por se tratar de adesão da vontade de outrem, se trata da necessidade moral, aquela em que os elementos podem ser sempre alterados, representando assim não uma contradição e sim uma incompatibilidade entre o que se expõe e a adesão do auditório, nesse sentido afirma Perelman, acerca das incompatibilidades contidas no campo da retórica, “tais incompatibilidades, característica da argumentação retórica, são manifestamente dependentes do que se considera uma vontade” (Perelman, 1997, p. 78).

No que tange às incompatibilidades cabe ao orador se valer de métodos capazes de removê-las. Para o autor “tais técnicas são as que, no indivíduo, devem ajudar na solução dos conflitos psicológicos” (Perelman, 1997, p. 78). Complementa o autor que as incompatibilidades sempre podem ser removidas e sempre podem ser alteradas as condições do problema, incorre no fato de que nunca se pode coagir alguém através da argumentação ao absurdo, pode-se coagir, entretanto ao ridículo.

Nesse sentido, afirma o autor que quando conseguir coagir outrem ao ridículo quase vencerá a batalha no campo da argumentação, pois levando o outro ao ridículo obrigará que esse mude seu argumento.

Portanto, se o adversário consegue, com sua argumentação, convencer-nos do ridículo, terá quase ganho a partida. Quem afirma que, por nada no mundo, mataria um ser vivo, e a quem se mostra que sua regra o impedirá de absorver um anti-séptico por medo de matar micróbios, deverá, para não se deixar encurralar no ridículo, limitar o alcance da sua afirmação. (PERELMAN, 1997, p. 79).

Todos esses fatores atinentes à argumentação retórica, que não é coerciva, reafirmam que tal campo não condiz com os preceitos utilizados na lógica formal, por exemplo, preceitos estes formais que estabelecem procedimentos previamente estabelecidos capazes de definir métodos concatenados de alcançar um resultado e se repetir esse procedimento, destarte uma argumentação mal feita pode trazer resultados danosos ao auditório, ao passo que um procedimento mal realizado no campo da lógica não influi no resultado, pois esse caminho será novamente trilhado sem trazer danos, nesse sentido afirma Perelman (1997) que determinar a intenção, a significação e o alcance de quem fala são problemas fundamentais da retórica.

Decerto, conclui o autor que determinados procedimentos da argumentação estão próximos aos procedimentos de uma lógica da probabilidade, que consistem nos argumentos baseados no normal, na competência, bem como a prova pelo exemplo. Porquanto situam entrem os procedimentos da argumentação retórica, segundo Perelman (1997) argumentos destinados a aumentar adesão mediante a presença, tendo como papel primordial nesses argumentos as metáforas. E por fim, conclui o autor que os procedimentos considerados primordiais à argumentação retórica estão situados entre esses dois grupos mencionados, que consistem na qualificação e desqualificação. Afirma o autor:

Encontraremos nesse grupo toda argumentação filosófica baseada no real e no aparente, nos fins e nos meios, no ato e na essência, na quantidade e na qualidade, e outros pares de oposição considerados fundamentais. (PERELMAN, 1997, p. 83).

Esses argumentos primordiais à argumentação retórica, afirma Perelman (1997), funcionam as vezes independentemente da vontade do orador, e as vezes intencionalmente. Nesse sentido, um procedimento usual de desqualificação consiste em relativizar um valor tornando-o um meio, como por exemplo alegar que a moral não passa de meio cujo escopo teleológico consiste no bem estar social, afirma o autor. No que tange ainda à desqualificação: “A depreciação resultante do fato de algo ser considerado expediente é uma das principais formas de desqualificação. Foi ela que mais atingiu a própria retórica.” (Perelman, 1997, p.84).

Atingiu de forma negativa, conforme complementa o autor afirmando que ao passo que algum fato se torna um expediente culmina, por conseguinte, em tirar deste fato qualquer eficácia. Como exemplo, Perelman (1997) faz alusão ao homem que virtuoso que é respeitado, contudo, se percebermos que este se comporta unicamente para obter o respeito, todos passarão a qualificá-lo como “ostentatório” e não mais como virtuoso, desqualificando assim esse fato.

Deste mote, à desqualificação são impostas técnicas capazes de atenuar os efeitos desta e não arruinar com toda argumentação retórica. Afirma Perelman (1997) que um passo importante para não deixar com que toda argumentação se torne expediente, ou seja, se valendo do discurso epidíctico (aquele que almeja fazer do discurso um atraente espetáculo à plateia) ao se dirigir a um auditório a sua única ambição seja que sua tese seja aceita pelos ouvintes, toda argumentação retórica deve conter um valor em que o próprio orador acredite nela e que se esforce para alcançar um auditório universal mesmo se tratando de uma ficção. Nesse sentido afirma Perelman:

Por conseguinte, vê-se o interesse apresentado, para o valor dos argumentos, pelo cuidado de dirigi-los a um auditório universal. É a este auditório que se visa nos raciocínios mais elevados da filosofia. (...) Todavia, dirigir-se a este auditório constitui, no modo de agir de um espírito honesto, o esforço máximo de argumentação que lhe possa ser reclamado. (PERELMAN, 1997, p. 87).

Perelman (1997) conclui ratificando o valor da retórica e sua primordial importância no estudo das ciências sociais, tal como a Filosofia e o Direito. Para o autor a retórica é imortal, pois, permite sustentar o pró e o contra, deste mote “o juiz esclarecido é aquele que decide depois de ter ouvido o pró e o contra. Poderíamos dizer que a retórica, mais do que formar o pleiteante, deve formar o juiz.” (Perelman, 1997, p. 90). E por derradeiro, afirma o autor que se cobiçamos nos afastar definitivamente do positivismo, é necessário nos valermos de instrumentos capazes de conhecer o real humano, entendermos os juízos de valor e ter liberdade de opinar e flutuar livremente num campo da ciência humana, se abstendo dos preceitos atinentes à lógica formal.

A retórica tem um espaço limitado ao extremo no modelo jurisdicional brasileiro, ao passo que a maior parte dos processos se dá de forma escrita. Um modelo que valorizasse a retórica valorizaria, por conseguinte, a atuação do advogado que teria ao seu alcance uma ferramenta eficaz de persuasão que vai de encontro em alcançar o que de melhor a lei propõe para seu cliente.

2.2 Hermenêutica

Para se falar do espaço para a hermenêutica, falar-se-á do problema hermenêutico da aplicação, com intuito de elucidar, a priori, o tema.

Para Gadamer (2002), o problema hermenêutico recebeu um significado sistemático, a partir do momento em que se reconhece que interpretação e compreensão não se dividem.

A interpretação não é um ato posterior e oportunamente complementar à compreensão, porém, compreender é sempre interpretar, e, por conseguinte, a interpretação é a forma explícita da compreensão. (GADAMER: Verdade e método, 2002, p. 459).

Contudo, afirma o autor, essa fusão entre interpretar e compreender afastou, erroneamente, da compreensão hermenêutica, o terceiro momento de sua problemática, a aplicação. Ao passo que esse três momentos, interpretar, compreender e aplicar perfazem a estrutura hermenêutica completa.

O modelo originário da hermenêutica se deu com o intérprete da vontade divina, segundo Gadamer (2002). Nesse sentido a lógica natural era adaptar um texto qualquer que fosse à situação atual vivida. Entretanto, atualmente, esse contexto não se faz apenas dessa forma, conforme afirma o autor:

Mas ainda hoje em dia o trabalho do intérprete não é simplesmente reproduzir o que realmente diz o interlocutor, ao qual ele interpreta, mas ele tem de fazer valer a opinião daquele assim como lhe parece necessário, tendo em conta como é autenticamente a situação dialogal na qual somente ele se encontra como conhecedor das duas línguas que estão em comércio. (GADAMER, 2002, p. 460)

Deste mote o intérprete exerce uma minuciosa tarefa de se tornar uma espécie de mediador entre o texto e aplicar esse conteúdo ao contexto atual. Em suma, e.g. o advogado deve estar munido de conhecimento suficiente para alcançar a estrutura completa da hermenêutica, interpretar, compreende e aplicar, extraindo primeiramente para si como aquela lei poderá ajudar seu cliente e a posteriori fazer uma interface entre o problema atual deste com o texto legal, e por derradeiro convencer os demais da sua tese que defende os interesses da parte.

Se originalmente a hermenêutica se fez a partir dos intérpretes da vontade divina, posteriormente a história da hermenêutica afirma que para se obter o seu conceito pleno era necessário juntar três formas de hermenêutica. A filológica, a teológica e a jurídica. Afirma Gadamer (2002).

Sendo assim o autor complementa que o momento chave de ligação estre as hermenêuticas repousava no momento da aplicação, ao passo que uma lei não quer ser entendida num contexto histórico, tampouco um texto contendo uma mensagem religiosa não tem a pretensão de ser colocada apenas como um simples documento histórico, concluindo que o texto, seja uma lei ou uma mensagem de salvação, para serem compreendidos adequadamente é necessário o fazer em cada instante, a cada situação fática de uma maneira nova e distinta de uma já utilizada, ou seja é necessário compreender, interpretar e aplicar.

Por derradeiro, conclui Gadamer (2002), que o cerne da hermenêutica não se faz pelo domínio que o intérprete tem do texto, e sim pelo caráter de servidão que o intérprete deve prestar em fazer com que um texto seja aplicado no contexto atual de forma única, ou seja, que a cada fato novo uma nova forma de aplicação deve prevalecer. Ademais, “compreender é então um caso especial de aplicação de algo geral a uma situação concreta e particular”. (Gadamer, 2002, p. 465).

Afirmado que o problema da hermenêutica consiste na junção entre compreensão, interpretação e aplicação, a distinção entre jurista e historiador jurídico se torna peça chave pra elucidar o tema. Enquanto aquele toma o sentido da lei partindo de um caso concreto, esse busca determinar o sentido da lei, conforme afirma Gadamer:

O jurista toma o sentido da lei a partir de e em virtude de um determinado caso dado. O historiador jurídico, pelo contrário, não tem nenhum caso de que partir, mas procura determinar o sentido da lei, na medida em que coloca construtivamente a totalidade do âmbito de aplicação da lei diante dos olhos. Somente no conjunto dessas aplicações torna-se concreto o sentido de uma lei. (GADAMER, 2002, p. 483)

É importante frisar a posição que o autor implica entre as duas figuras acima citadas, pois o jurista além de ter o conhecimento, que é do âmbito de atuação do historiador, que se trata da objetividade histórica, bem como as revoluções e as conquistas que permearam aquela lei, deve também adaptar o texto da lei e seu sentido histórico ao contexto atual e o caso concreto. Em suma, afirma Gadamer que o jurista não deve se ater apenas em se portar como o leitor originário da lei (tarefa do historiador jurídico), mas, além disso, saber adequar aquela lei ao contexto atual, aplicando-a ao caso atual.

A partir do momento em que o jurista tem essa consciência de que sua função deve ser a de conhecer o sentido originário da lei e trazer esse sentido ao contexto atual para solucionar o caso concreto, afirma Gadamer (2002) que essa consciência gera uma segurança jurídica, em que as decisões do juiz não são frutos de arbitrariedade e qualquer advogado teria ideia das consequências de cada ato praticado em desconformidade com a lei e sua sanção.

Trazendo esses métodos interpretativos à esfera de atuação do advogado, a contribuição de Gadamer foi imensurável no que tange ao trabalho do intérprete. Se valendo desse preceitos o advogado deve ter a consciência de que uma lei precisar sim ser estudada historicamente, contudo, não se ater a esse sentido pretérito. Após absorver o conteúdo histórico da lei é que o poder de interpretação do texto legal assume papel principal fazendo com que essa lei pretérita possa sanar o conflito atual.

Dissecando as etapas propostas por Gadamer, a compreensão consiste no contato inicial com o texto, uma leitura para se aferir o que o texto está dizendo, esse primeiro momento só é alcançado se valendo do aspecto universal da hermenêutica, que é a linguagem, segundo Gadamer (2002). Posteriormente à compreensão se faz a interpretação do texto, ou seja, qual a conexão daquelas palavras com um sentido plausível, nessa etapa o intérprete deve dialogar com o texto. E por derradeiro se faz aplicação desse sentido, valendo-se da norma pretérita para sanar o caso particular atual.

Destarte, tem-se que que hermenêutica proposta por Gadamer seria aceita pela corrente majoritária entre os estudioso da disciplina que estuda a arte de interpretar. Nestes moldes foi possível verificar o quão empenhado o intérprete deve ser, ao passo que deve ter ciência da conteúdo histórico da lei, bem como saber utilizar esse conteúdo no contexto atual de forma que peculiar.

A partir do momento em que as leis passarem a ser criadas visando um contexto geral, ou seja, abranger o máximo de pessoas e classes possíveis essa leis terão o conteúdo mais denso, daí o fundamental conhecimento dos preceitos aqui expostos. Ao advogado teria uma atuação mais incisiva e mais participativa, tendo em vista que a mera indicação dos preceitos legais mitiga a importância dessa função.

CONCLUSÃO

O império romano foi pioneiro em visualizar o direito como uma ciência, influenciando assim os ordenamentos jurídicos póstumos. Esse culto às formas fez com que uma metodologia de criação de leis e a forma como elas eram aplicadas tomassem formas científicas abandonando assim, em sua totalidade, a forma de direito fundada na autoridade divina.

Outro fator que guarda relação com a codificação excessiva se deu na escola exegética francesa. Com a advento dessa escola da interpretação das leis criou-se o fetichismo da lei, ou seja, a confiança total nas leis codificadas e sua capacidade de resolver todos os problemas inerentes ao ser humano. Os ordenamentos jurídicos que se valiam desses preceitos faziam com que as leis tentassem alcançar todos os possíveis fatos.

A análise que Bobbio (1995) faz dos conceitos de coerência e completude comunga a atual realidade do ordenamento pátrio. Tendo em vista que assumiu ser o ordenamento incompleto ficando a cargo do juiz se valer da analogia, os costumes e os princípios gerais de direito quando a lei for omissa (conforme artigo 4º da Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro), contudo não se comporta como se aceitasse tal fato, pois cria demasiadas leis que buscam atingir cada caso particular.

Deste mote, Vico elenca as conveniências e inconveniências desse sistema jurídico que é demasiadamente codificador. Uma das conveniências disposta pelo autor, no que tange à facilidade com que se faz a subsunção das leis aos fatos, só o é para o juiz, ao passo que, como fora versado, limita o poder de atuação do advogado. No que tange à prestação jurisdicional o trabalho do advogado deve ser exaltado, tendo em vista que esse exerce a função pública de fazer valer a justiça para aqueles cidadãos que não possuem capacidade postulatória. Destarte, ratifica-se que um sistema jurídico posto nestes moldes, apresentados no primeiro capítulo, ao limitar o poder de atuação do intérprete, limitam, por conseguinte, a prestação jurisdicional.

O fetichismo da lei, que ocasiona a criação excessiva de leis consiste no maior golpe à atuação do intérprete, pois dessa forma se tenta alcançar todos os fatos com a lei, ou seja se trata da lei correndo atrás dos fatos, uma busca impossível.

Com efeito, aquele ordenamento jurídico que cria leis com o escopo de prever todas as ações humanas passa a compor o sistema jurídico de leis de pouca relevância no sentido macro, ou seja, aquele caso particular mirado pela lei específica não expressa uma relevância para todos os legislados, ao passo que atinge apenas pequena parcela. Nesse sentido, Vico assevera que um ordenamento jurídico deve conter normas que alcancem a maior quantidade possível de legislados, a rigor, trará assim uma confiança maior a esse amálgama normativo. Vale ressaltar que o processo inverso, de criação de leis específicas, usurpa a seriedade de todo ordenamento.

Destarte, para que o jurista possa atuar em sua plenitude e em consonância com sua função prestada à justiça, ele necessita que o ordenamento lhe ofereça condições de trabalho adequadas, ou seja, requisito mínimo e inicial que esse sistema jurídico seja ao menos respeitado por todos.

Por derradeiro a inconveniência versada por Vico acerca da criação excessiva de leis tolhe a confiabilidade do ordenamento jurídico, fato esse que verifica fielmente com a realidade por nos brasileiros presenciada. Nossos representantes, responsáveis por legislar, se valendo dessa autonomia de criar leis específicas favorecem a sua classe, criando leis que lhe tragam benefício próprio. Um exemplo vivo disso se trata das regalias que os parlamentares brasileiros gozam utilizando dinheiro publico, sejam diárias abusivas, seja auxílios auspiciosos, fora a remuneração que não condiz com a realidade de um país emergente

Após apresentados os aspectos atinentes à codificação, o segundo capítulo trouxe as ferramentas que tem o condão de expandir a atuação do intérprete, se valendo de aspectos que condizem com a ciência do direito enquanto ciência social e não como um sistema concatenado de regras.

Nesse sentido, a hermenêutica jurídica, aqui exposta através dos pensamentos de Gadamer, desempenha papel crucial para que o intérprete alcance o objetivo de interpretar a lei, compreendê-la e aplicá-la conforme o caso concreto na conjectura atual do problema, pois como o próprio Gadamer afirma: a lei não quer ser compreendida historicamente.

A hermenêutica deve ser utilizada indiscriminadamente ao passo que a lei deve servir para resolver o conflito atual. Em nosso modelo processual maior parte da lide se dá por escrito, do ponto de vista hermenêutico há um abismo hipotético que impossibilita que o leitor compreenda qual a intenção última do autor, deste mote deve o advogado, ao se valer do texto da lei, dialogar com esse. Com efeito, da mesma forma que o advogado se vale do texto da lei para compreender e melhor escolher os argumentos de defesa do seu cliente ele se vale da escrita para expor sua tese de defesa, dificultando assim que a sua ideia seja alcançada de forma satisfatória. A comunicação oral é um instrumento pouco utilizado por nosso ordenamento pátrio, contudo se vê como um importante veículo para expor a sua tese, podendo se valer, o intérprete, a rigor, da retórica e da eloquência.

Contudo, insta salientar que a hermenêutica por si só não sanaria os problemas que a codificação demasiada causa na atuação do intérprete. A retórica presta papel de igual importância nessa empreitada, pois seria a forma de externalizar a compreensão da lei e fazer com que os ouvintes se convençam da sua tese, de uma forma mais tangível para o ser humano, ou seja, a partir da oralidade. O direito posto de forma meramente textual causa o inconveniente de mecanizar uma ciência social que lida com a complexa e contingente vida humana.

Como foi explanado no segundo capítulo, versando acerca da retórica, essa carece de um liame subjetivo entre quem discursa e o ouvinte, desta feita o jurista, em especial o advogado, deve guardar uma postura reta e transpor o devido respeito que a sua profissão exige, assim ele conseguirá prender a atenção dos ouvintes e, por conseguinte, se valendo das ferramentas aqui citadas, retórica e hermenêutica, convencer àqueles que o escutam.

Essas duas ferramentas manejadas em conjunto entram em consonância com a múnus publica que o advogado exerce e presta à justiça. Ratificando que o direito, hoje posto como uma ciência social, não deve depositar a sua metodologia, leia-se os seus métodos científicos, sobre os preceitos regidos pela inexistente lógica jurídica, como afirma Perelman. Deste mote, o trabalho do intérprete guarda um papel de destaque, ao passo que esse deve assegurar ao cidadão que a sua expectativa de justiça, posta nas normas, seja alcançada.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

BOBBIO, Norberto. Teoria do Ordenamento Jurídico. Trad. Maria Celeste C. J. Santos. Brasília: Universidade de Brasília, 1995.

BRASIL, Decreto-Lei 4.657, 1942, Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/Del4657compilado.htm>. Acesso em 21 de junho de 2016.

CAENEGEM, R.C. Van. Uma introdução Histórica ao Direito Privado. Trad. Carlos Eduardo Lima Machado. São Paulo: Martins Fontes, 1999.

GADAMER, Hans-Georg. Verdade e Método: traços fundamentais de uma hermenêutica filosófica. Rio de Janeiro: Vozes, 2002.

LEITE, Gisele. A tese de Hans Kelsen, a norma fundamental e o conceito de justiça. 2013 Disponível em: http://www.ambito-juridico.com.br/site/?n_link=revista_artigos_leitura&artigo_id=13905. Acesso em 13 de jul. 2016.

PERELMAN, Chaím. Retórica. Trad. Maria Ermantina Galvão G. Pereira. São Paulo: Martins Fontes, 1997.

SANTOS, Vladimir Chaves dos. O Conceito de engenho e de inovação na Scienza nuova de Giambatista Vico. Tese (doutorado) – Programa de Pós-Graduação: Filosofia, Campinas, 2009.

[1] O Direito, segundo Kelsen é uma ordem normativa da conduta humana, um sistema de normas que regulam o comportamento humano. As normas jurídicas que compõem essa ordem não surgem de fontes e de instâncias estranhas ao próprio sistema jurídico, mas se formam mediante o processo por ele mesmo regulado. Assim, o Direito é a sua própria fonte, enquanto regula o seu permanente processo de autoprodução. A norma jurídica só existe no sistema e a identificação feita por Kelsen entre a validade e a existência da norma jurídica se explica exatamente porque só adquire sentido dentro do sistema que a regula. (LEITE, 2013.)

  • Filosofia do direito
  • corrupção
  • criação demasiada de leis

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