RESUMO
O presente estudo pretende examinar como o imposto predial territorial urbano (IPTU), face ao princípio constitucional da função social e a característica extrafiscal deste tributo, poderá atingir a finalidade educacional de desenvolvimento urbano e o planejamento de estruturação das cidades que fazem uso de tal instituto. Com as experiências de diversos municípios que há um tempo vêm cobrando progressivamente o IPTU, observou-se que seu objetivo vem aos poucos sendo alcançado. Em suma, todo o processo consisti na organização financeira do país que se utiliza de institutos tributários também para regular o mercado, educar os cidadãos, fortalecer a economia interna, sendo, portanto, parte fundamental da política nacional de desenvolvimento.
Palavras-chave: Desenvolvimento. Extrafiscal. Função social
ABSTRACT
This study aims to examine how urban land property tax, compared to the constitutional principle of the social function and the extrafiscal characteristic of this tax, can achive the educational purpose of a urban planning and structuring of the cities that make use of such an institute. With the experiences of many municipalities wich there is a time that come charging progressively the urban land property tax, it was observed that their goal is slowly being achieved. In short, the whole process consist into a financial organization in the country that uses tax institutes also to regulate the market, educate citizens, strengthen the domestic economy, being, therefore, fundamental part of a national policy development.
Keywords: Development. Extrafiscal. Social function.
1. INTRODUÇÃO
A iniciativa de confeccionar esta pesquisa surgiu a partir do conhecimento de que tal instituto vem sendo utilizado em um número maior de cidades brasileiras. Trata-se, portanto, de matéria de grande relevância não só para estudantes e profissionais do direito, mas também para a sociedade pátria em geral.
Dessa forma, a problemática se desenvolve a partir do que dispôs o constituinte de 1988 quanto ao Sistema Tributário Nacional e os direitos individuais de propriedade, o poder de tributar inerente ao Estado (em questão, os Municípios), sob a análise da instituição, arrecadação e fiscalização do IPTU, entendendo se o caráter extrafiscal do Imposto Predial e Territorial Urbano progressivo no tempo tem alcançado seu objetivo.
A finalidade do presente trabalho é apresentar os principais aspectos relacionados ao imposto predial territorial urbano no ordenamento jurídico pátrio, analisando desde o Sistema Tributário Nacional elencado na Constituição de 1988, até as peculiaridades trazidas pela Lei n˚ 5.172/1966 (Código Tributário Nacional).
O embasamento lógico e científico para o desenvolvimento deste estudo foi construído a partir de obras doutrinárias, textos publicados em revistas jurídicas, jurisprudência, vídeo aula e legislação.
Primeiramente será apresentado noções introdutórias acerca do da estruturação tributária brasileira (Sistema Tributário Nacional), abordando seus institutos, conceitos e características.
Em conseguinte, pontuará sobre o imposto predial territorial urbano no ordenamento jurídico pátrio, evidenciando o tema sob a égide da Constituição de 1988, bem como os principais aspectos do CTN – Código Tributário Nacional.
Por fim, adentrará no caráter extrafiscal do IPTU, bem como da sua progressividade. Serão analisados aspectos como o princípio da função social da propriedade, a competência dos municípios, os objetivos a serem alcançados com o tributo em análise na finalidade em que será progressivamente majorado.
2. SISTEMA TRIBUTÁRIO NACIONAL
Na realidade brasileira, em um breve histórico, é possível ver que a primeira Constituição, a de 1824, não trouxe a previsão de distribuição de receita. Gerando enormes dificuldades, uma vez que a Assembleia Real poderia estabelecer tributos, o que trazia diversas consequências, como a centralização da receita estatal nas mãos no poder monárquico.
Apenas em 1834 fora instituído um decreto em que dava às Províncias o direito de arrecadação. Vigendo esta situação até 1891, com a nova constituição proveniente da proclamação da República em 1889.
Nesta segunda Constituição, de 1891, estabeleceu a divisão territorial em Estados, o que fez com que surgisse a necessidade de receita estes entes, e que fora distribuída nesta Carta Magna outorgando competências aos entes - como, por exemplo, a União possuía competência apenas quanto à importação e os estados nas relações de vendas, etc., e os Municípios não tinham ainda competência tributária definida (dependendo de repasse).
Interessante notar que já a essa época era prevista a imunidade recíproca dos entes políticos e desde então constou em todas as demais constituições brasileiras. Ressalta-se, também, que a competência era de maneira concorrente, inclusive dando a possibilidade de bitributação.
No meio tempo que há entre as constituições de 1891 e 1934, ocorrem algumas inovações, como a instituição do Imposto de Renda na década de 20 (herança norte americana), que, ainda que representasse muito pouco em um país pobre, com o tempo foi crescendo e gerando renda.
Em 1934, a constituição trouxe mais inovações, como a criação de competências municipais, a exemplo do imposto sobre profissões, motores, dentre outros.
A Constituição de 1937 implementa novas tributações, como a criação dos impostos únicos como combustíveis e minerais. E este tempo as competências param de ser concorrentes e não há mais a possibilidade da bitributação.
Por sua vez, na Constituição de 1946 grande parte do que já existia foi mantido, mas delineia-se novos direitos individuais de garantia do contribuinte (ex.: imunidade do papel), que embora houvessem sido levantados timidamente algumas nas constituições de 1934 e 1937, tomaram forma na de Carta Política de 1946.
O Brasil que era pobre, já não era tão pobre a esta altura e havia uma maior preocupação com os tributos relativos à renda, consumo e proventos em um contexto pós-guerra. Perdendo a interesse como fonte os impostos de importação.
O federalismo toma maiores proporções e se fortifica, fazendo com que haja a necessidade de maior arrecadação por parte dos Estados e Municípios.
Nesse sentido, o Sistema Tributário que teve seu modelo com base no contexto de 1934, tornou-se velho ante à nova roupagem da economia com o fortalecimento da indústria nacional e consequentemente da economia interna. Para se ter uma noção, todos os impostos àquela época eram cumulativos.
Portanto, em 1965 fez-se uma reforma tributária com a EC n˚ 18, que, inclusive, é a base para o Sistema Tributário atual. Pode-se citar a instituição de impostos não cumulativos como uma grande mudança para toda a economia brasileira, a qual crescia verticalmente para não haver a necessidade de incidir inúmeras vezes um tributo sobre o mesmo bem.
Fala-se, ainda, na instituição de princípios e ampliação dos direitos e garantias individuais.
Em se tratando da Constituição de 1967, não há muitas alterações do que já se estava vivendo com a reforma vivida pela EC n˚ 18 que fora feito por grandes economistas e tributaristas. O que ocorrera de igual forma com a Constituição de 1969, em que o ponto relevante fora apenas a diminuição da participação dos Estados na repartição de receitas.
Por fim, chega-se à Constituição Federal de 1988, onde é mantida a estrutura básica de repartição tributária, os impostos únicos foram instintos e os Estados receberam competência para tributar os fatos geradores dos impostos únicos.
É de ver-se que ocorre, também, uma revitalização do caráter federativo da República Federativa do Brasil, dando maior competência tributária aos Estados que já havia.
Porém, no final, observa-se que se manteve grande parte da reforma de 65, bem como as evoluções que ocorreram até 1988.
A doutrina especializada conceitua o atual Sistema Tributário Nacional, em síntese, como sendo um conjunto (complexo) de normas e princípios, constitucionais e infraconstitucionais, que disciplina os atos dos órgãos fiscalizadores, vincula suas ações, dá direitos e deveres aos contribuintes, institui responsabilidade, etc.
Neste sentido, Harada (2009) leciona que se trata de um conjunto de normas constitucionais cuja natureza é tributária, contidos em um sistema jurídico global, formado por um complexo unitário e ordenado de normas subordinadas aos princípios fundamentais, reciprocamente harmônicos.
Pode-se depreender do conceito alencado que o Sistema Tributário Nacional é formado por uma variedade de textos, não unificados, mas que possuem uma relação de obediência, subordinação e harmonia.
2.1 DEFINIÇÃO DE TRIBUTO
A Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 estabeleceu, em seu artigo 24, inciso I, que é competência concorrente da União, dos Estados e do Distrito Federal legislar sobre Direito Tributário, onde cabe à União estabelecer normas gerais (§ 1˚ do mesmo dispositivo).
O Código Tributário Nacional que já vigia à época da elaboração da atual Constituição Federal, Lei n˚ 5.172/1966, fora recepcionado com o status de lei complementar, ainda que sua origem seja de lei ordinária, tendo em vista que à época de sua edição (vigência da Constituição Federal de 1946) não existia lei formalmente complementar.
Tal recepção foi de extrema importância, uma vez que o CTN – Código Tributário Nacional -, hoje materialmente complementar, está a salvo das investidas da lei ordinária. Importante ressaltar, também, que para qualquer tipo de alteração, no que se refere ao art. 146, III da CF/88, faz-se mister lei complementar.
Após esta breve explanação, vale mencionar que o legislador, ao tratar de um tema tão delicado como os tributos, fez questão de pontuar não só normas gerais, mas também se valeu de muitos conceitos, tirando, inclusive, parte do trabalho doutrinário.
Nesse sentido, no artigo 3˚ do CTN o legislador pontuou que “Tributo é toda prestação pecuniária compulsória, em moeda ou cujo valor nela se possa exprimir, que não constitua sanção de ato ilícito, instituída em lei e cobrada mediante atividade administrativa plenamente vinculada.”
2.3.1 Características
Primeiramente, tributo é prestação pecuniária, ou seja, é a obrigação de prestar recurso financeiro ao Estado (Sabbag, 2012). Ainda sobre a prestação pecuniária, o legislador se preocupou em dizer que deve ser em moeda ou cujo valor nela se possa exprimir, redundância que se dá no sentido de evitar pagamento de tributo in labore (serviço, trabalho) ou tributo in natura (em bens).
Frise-se, nesse sentido, que o pagamento além de ser efetuado em espécie, deve também estar em moeda corrente nacional, não se aceitando o pagamento em moeda alienígena ou em cheque.
Tributo é uma prestação compulsória, ou seja, é aquela que decorre de uma obrigação e não de uma relação contratual ou facultativa. Isso se dá pelo fato de o interesse público tem supremacia em relação ao interesse privado, ensejando poder estatal de coerção a forçar o cumprimento da obrigação (compulsoriedade) e atingir o fim social que é o seu intento.
Lembrando que a compulsoriedade apenas é possível, à luz do art. 5˚, II, da Constituição Federal de 1988, através de lei. Portanto, tal característica se deriva do princípio da legalidade.
Nesse sentido, o tributo é uma prestação ex lege, em que o agente pratica o ato descrito em lei, chamada de hipótese de incidência, e assim pratica o fato gerador eleito pelo legislador, independendo do animus das partes, seja do sujeito ativo ou do passivo.
Outro ponto conceitual que é de extrema relevância, é que tributo não é sanção. Ora, sanção é a multa, sanção é aquilo que se estabelece ante a um ato ilícito praticado por um determinado agente. Em que pese muitos crerem que pagar tributo é uma sanção, os dois conceitos não se confundem, pois tributo tem sua finalidade, em síntese, arrecadar fundos ao estado para que este possa, em contra prestação, dar à população os cuidados básicos para uma boa qualidade de vida (inerente à atividade do estado social).
Por fim, é cobrada mediante atividade administrativa plenamente vinculada, que nada mais é que o lançamento. O art. 142 do CTN conceituou a esta “atividade” (entende-se ser, a bem da verdade, um ato) como:
Compete privativamente à autoridade administrativa constituir o crédito tributário pelo lançamento, assim entendido o procedimento administrativo tendente a verificar a ocorrência do fato gerador da obrigação correspondente, determinar a matéria tributável, calcular o montante do tributo devido, identificar o sujeito passivo e, sendo caso, propor a aplicação da penalidade cabível.
O lançamento é o ato pelo qual se torna exigível o tributo. É ato vinculado, formal e, portanto, que deve ser escrito, não se aceitando lançamento verbal.
É possível a discussão em sede administrativa ou judicial do quantum debeatur e an debeatur (quantidade e qualificação), o que extraí da característica de não se tratar de ato autoexecutório.
2.4 COMPETÊNCIA TRIBUTÁRIA
A atribuição da competência tributária se dá mediante normas constitucionais com o escopo de distribuir as tarefas inerentes ao poder tributante. Justifica-se o uso de normas rígidas a fim de regulamentar a delicada função fazendária de cada ente da federação, não dando demasiada margem para discussões.
Aduz Costa (2013) que a competência tributária é uma aptidão dos entes federativos para criar tributos, através da edição do veículo legislativo que se fizer necessário, pontuando em seu bojo todos os elementos de sua hipótese de incidência.
Por sua vez, Sabbag (2012) conceitua competência tributária como sendo a habilidade privativa e constitucionalmente outorgada ao ente federativo para que este, fundamentado na lei, provenha à instituição da exação tributária.
Sabe-se, ante o exposto, que a competência apenas atingirá sua finalidade se observada alguns procedimentos e respeitados alguns princípios, tais como o da legailidade, do pacto federativo, dentre outros, cujo desrespeito pode gerar a nulidade do exercício de tal competência.
2.4.1 Características
Sopesando os conceitos trazidos é possível encontrar vários pontos em comum, o que se induz a pontuar as características encontradas no conceito de competência tributária, quais sejam, privatividade, indelegabilidade, incaducabilidade, inalterabilidade, irrenunciabilidade e facultatividade.
Quanto à privatividade, em que pese a Constituição falar que a competência tributária é privativa de determinado ente político, atribuí-se à sua característica a exclusividade, melhor dizendo, compete privativamente à aquele ente criar determinado imposto.
Pode-se citar, a título de exemplo, que compete privativamente à União o IPI (imposto sobre produtos industrializados); o ITCMD (imposto transmissão causa mortis ou doação) é competência privativa dos Estados; já o IPTU (imposto predial territorial urbano) compete aos Municípios. Insta mencionar que existem exceções, como, por exemplo, impostos extraordinários guerra, em que um ente (União) pode invadir competência privativa de outro;
Em se tratando da indelegabilidade, esta é a característica que estabelece que, uma vez atribuída a competência a determinado ente político, este não poderá as delegar a terceiros. Sendo assim, a competência que a CF/88 deu à União para instituir o IE (imposto de exportação) não pode ser repassado aos Estados ou Municípios, a título de exemplo;
Por sua vez, por incaducabilidade entende-se que se por um acaso o ente federativo competente não instituir determinado tributo de sua competência, não haverá nenhum óbice (caducabilidade) para que o faça no tempo que entender ser mais conveniente e oportuno. O direito de instituir o tributo não se perde, seja em razão do tempo ou de qualquer outra hipótese;
Já a inalterabilidade, se dá por apenas ser possível a ampliação das dimensões dadas pela Carta Magna através de Emenda Constitucional, não podendo as pessoas políticas, a seu bel-prazer, o ampliá-la;
Irrenunciabilidade, em virtude da indisponibilidade do interesse público, não se pode o ente político renunciar das atribuições dadas pela CF/88;
Por fim a facultatividade, que nada mais é do que o uso ou não da competência tributária é opcional e livre, cabendo a cada ente federativo fazer uso das suas atribuições (respeitados os limites constitucionais). Com exceção do ICMS que, por possuir caráter nacional, quando se tratar de benefícios, isenções e incentivos, para a sua concessão é necessário de deliberação (Convênio) dos demais Estados e Distrito Federal, é o estipula o art. 155, § 2˚, XII, g da CF/88.
2.4.2 Classificação
A Competência Tributária pode ser classificada em 06 tipos, segundo Sabbag (2012), os quais são: privativa, comum, cumulativa, especial, residual e extraordinária.
Vale lembrar que se trata, conforme pontua Amaro (2012), de uma classificação com utilidade apenas didática e sem rigor científico.
Passa-se à análise de cada uma delas:
{C}· {C}Privativa, é o poder que dispõe as pessoas políticas para criar os impostos que estão taxativamente previstos na CF/88 (arts. 153, 154, 155, 156). Essa competência é exclusiva, ou seja, apenas aquela pessoa pode criar os impostos a ele atribuídos. Em que pese os constitucionalistas separarem a competência privativa (passível de delegação) da exclusiva (indelegável), ficou consagrado no Direito Tributário (pelo uso dessa terminologia no art. 153 da CF/88) a denominação competência privativa.
{C}· {C}Comum, às taxas e contribuições de melhoria, tributos não vinculados, atribui-se a competência comum, melhor dizendo, a Constituição não estipulou o ente competente para instituí-los. Isso significa que àquela pessoa política que os instituir cabe a competência tributária, vale dizer, “de modo comum” à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios.
{C}· Cumulativa, assim dispõe o art. 147 da CF/88: “Competem à União, em Território Federal, os impostos estaduais e, se o Território não for dividido em Municípios, cumulativamente, os impostos municipais; ao Distrito Federal cabem os impostos municipais.” Trata-se, portanto, da competência cumulativa ou múltipla que possuem a União, em se tratando de Território e do Distrito Federal. Estes entes acumulam competências de duas ou mais pessoas políticas, cabendo a eles a sua instituição.
{C}· Especial, conforme Sabbag (2012), é o poder de instituir os empréstimos compulsórios (art. 148, CF) e as contribuições especiais (art. 149, CF), tendo como justificativa tal classificação o fato de terem subsistido, por um grande período, inúmeras discussões sobre a natureza tributária desses dois tributos.
{C}· {C}Residual, Bartine (2013) entende por competência residual a atribuição dada à União que, por meio de lei complementar, tem a aptdão de instituir outros imposto que não sejam os preconizados no texto da CF/88, em observância do art. 154, I da CRFB.
Lembra, ainda que tal competência é estendida a outras contribuções sociais, ultrapassando o limite de impostos, com a finalidade de expansão da seguridade social, conforme determina o art. 195, § 4˚, da Carta Magna, devendo ser observado os mesmos parâmetros do art. 154, I, da CF/88.
{C}· {C}Extraordinária, é a competência em que se valerá a União para a criação do Imposto Extraordinário Guerra ou Empréstimo Compulsório, por meio de lei ordinária (face à urgência da medida), o que deixa a possibilidade de sua instituição por meio de medida provisória - MP, uma vez que, de acordo com o art. 62, § 1˚, III, CF, não será possível a utilização da MP em caso de matéria atribuída a lei complementar.
Nota-se características próprias desses tributos que poderão incidir sobre fatos geradores de outros tributos, sejam eles da União ou não, ou até mesmo criar novo fato gerador, o que remete a entender como uma hipótese excepcional de bis in idem e de bitributação. Todavia, insta mencionar, tais tributos têm caráter provisório e uma vez cessadas as situações que lhe deram causa (guerra ou sua iminência).
2.4.3 Competência Tributária e Capacidade Tributária Ativa
Em primeiro lugar, insta mencionar quais seriam as atribuições dadas a quem tem competência tributária. Nesse sentido, são 03 (três) estes encargos, quais sejam: instituir (criar), arrecadar e fiscalizar.
Por “instituir” pode-se entender que o tributo preenche todos os requisitos para sua exigibilidade. Mas o que seriam esses requisitos? O tributo para ser instituído é necessário lei - ou ato com força de lei –, inclusive em alguns casos faz-se mister lei complementar.
A lei que instituir o tributo deverá conter todas as especificações para que se possa identificar o critério material, espacial, temporal, pessoal e quantitativo. Em outras palavras, deve ter em seu bojo a hipótese de incidência (fato gerador), onde, quando, quem e quanto.
Por sua vez, arrecadar é recolher, ter em segurança, guardar, reunir, cobrar. É a atividade estatal cujo processo se visa o recolhimento da contribuição de cada sujeito passivo (contribuinte ou responsável) para se colocar nos cofres públicos e fazer a devida repartição.
Já à fiscalização tributária compete, em suma, proceder a averiguação de se o pagamento efetuado está em consonância com quantum debeatur e an debeatur (lançamento por homologação), ou, ainda, quando informado de que alguém realizou um fato gerador, se o tributo incorrer em lançamento por declaração ou de ofício, fazer os cálculos e apresentar o montante (crédito) devido ao sujeito passivo.
Compete, também, efetuar a cobrança dos tributos em aberto (não pagos). Que se dá, primeiramente, por via administrativa e, em seguida, caso não adimplido o crédito, realizar a inscrição do correspondente crédito tributário em Dívida Ativa, pois só então terá posse de um título executivo extrajudicial denominado Certidão de Dívida Ativa, que viabilizará a cobrança judicial.
Ressalve-se que para a validade dos atos administrativos da fiscalização requer a competência do agente público ou autoridade administrativa.
Esses os ônus e bônus do ente federativo a que for atribuído constitucionalmente competente para instituir, arrecadar e fiscalizar os tributos a eles designados. Lembrando que a Competência tributária é privativa, indelegável, incaducável, inalterável, irrenunciável e facultativa.
Observa-se ainda que no quesito indelegável, fala-se apenas em instituição do tributo, ou seja, não se pode delegar (dar a terceiro) a criação de tributo, nada se falando quanto à arrecadação e à fiscalização, pois estes sim podem ser delegados.
Ora como se daria essa delegação?
Frise-se que essa delegação pode se dar entre os entes políticos e entre pessoas de direito público e às pessoas de direito privado poderá ser apenas atribuída a arrecadação, conforme autoriza o § 3˚ do artigo 7˚ do Código Tributário Nacional.
Sendo assim, um tributo de competência da União poderá ser delegado a sua fiscalização e arrecadação aos Estados e aos Municípios, bem como poderá ser atribuída à arrecadação a uma entidade financeira de direito privado, e de mesma forma um tributo dos Estados ou Municípios poderá ser delegada a fiscalização e arrecadação às outras pessoas políticas (União, Estados, Distrito Federal e Municípios) e às pessoas de direito privado cabe, quando delegada, a arrecadação.
A isto, delegação da fiscalização e arrecadação de um tributo por uma pessoa de direito público a outra, dá-se o nome de Capacidade Tributária Ativa.
Bartine (2013) aduz que a Capacidade Tributária Ativa é a capacidade de arrecadação e fiscalização de tributos, sendo que esta capacidade pode ser atribuída a pessoas dotadas de competência tributária como, também, às pessoas jurídicas de direito público que não possuem competência, a exemplo das autarquias e fundações públicas. Não sendo possível sua delegação às pessoas jurídicas de direito privado.
Ante o exposto, destaca-se 03 (três) características principais quanto à Capacidade Tributária Ativa, são elas: a delegabilidade, a transferibilidade e a precariedade.
Primeiramente, analisa-se a delegabilidade, a qual encontra fundamento no art. 7˚ da Lei n˚ 5.172/66 que reza que:
A competência tributária é indelegável, salvo atribuição das funções de arrecadar ou fiscalizar tributos, ou de executar leis, serviços, atos ou decisões administrativas em matéria tributária, conferida por uma pessoa jurídica de direito público a outra, nos termos do § 3º do artigo 18 da Constituição.
Pode-se falar, portanto, que a Capacidade Tributária Ativa é a atribuição dada por um ente político que recebeu a competência constitucional quanto àquele tributo a outras entidades de direito público, no que se refere à arrecadação e fiscalização do tributo delegado.
Ao tratar da transferibilidade, Caio Bartine (Direito Tributário, 2013, p. 90 e 91), com muita propriedade, pontua que:
A competência tributária é intransferível, no entanto, a capacidade tributária ativa poderá ser transferida entre os próprios entes dotados de competência tributária, desde que haja, para tanto, autorização expressa na Constituição Federal.
Temos uma autorização expressa na Constituição Federal, quando do advento da EC 42/2003, que insere no inciso III, no § 4˚ do art. 153 da CF/1988, possibilitando que os Municípios que assim optarem, poderão na forma da lei, realizar a arrecadação e a fiscalização do imposto Territorial Rural (ITR), desde que não haja implicação na redução do imposto ou qualquer outra fora de renúncia fiscal.
Percebe-se claramente que o Município não está, de maneira nenhuma, exercendo a competência tributária do ITR, sendo este imposto de competência federal. Apenas aqueles Municípios que resolverem, por opção, realizar a arrecadação e a fiscalização desse tributo, poderão fazê-lo, permanecendo ainda com 100% (cem por cento) do produto da arrecadação.
(...)
A União permanece na condição de sujeito ativo e que delega apenas a realização da arrecadação e fiscalização, a ser realizada em conformidade com as determinações constitucionais e legais.
Portanto, a transferibilidade, que siginifica que um ente pode passar para outro ente ou até mesmo um “particular” (instituição financeira, ...) aquela atribuição, é uma característica da capacidade tributária ativa mas não é da competência.
Dessa forma, quando há a necessidade fiscalização ou arrecadação de determinado tributo é possível o ente que detenha a competência sobre aquele tributo, por razões de conveniência ou oportunidade juntamente com autorização expressa constitucional, poderá passar a outro ente federativo ou a um “particular” essa função, ressalvado a competência tributária que é de instituição do tributo.
Em último lugar, a capacidade tributária ativa é precária, e o que isso significa?
Dizer que a Capacidade Tributária Ativa é precária significa que uma vez que essa delegação se deu somente por uma questão de facilidade organizacional administrativa, onde a CF/88 permite ao ente federado o uso dessa descentralização da arrecadação ao tempo em que achar necessário, respeitados os limites legais, de igual modo pode o ente delegante revogar tal delegação a qualquer tempo.
Conforme pode se extrair do § 2˚, art. 7˚ do CTN, “A atribuição pode ser revogada, a qualquer tempo, por ato unilateral da pessoa jurídica de direito público que a tenha conferido”.
Desse modo, pela precariedade que cerca a delegação da arrecadação e fiscalização de determinado tributo por parte de uma pessoa política, não há que se falar em direito adquirido pela pessoa pública delegada.
3. IPTU
3.1 COMPETÊNCIA E SUJEITO ATIVO
Como outrora definido, a competência tributária compreende o poder do ente político para instituir, arrecadar e fiscalizar.
Ao Imposto Predial Territorial Urbano fora atribuído competência aos municípios no art. 156, I, da CF. Nos seguintes termos: “Compete aos Municípios instituir impostos sobre: I – propriedade predial e territorial urbana”
Significa dizer que se o Município em que esteja situado o bem imóvel e este haja criado o IPTU, por meio de lei ordinária municipal, está incumbido de arrecadá-lo e fiscalizá-lo (estas duas últimas podem ser delegadas).
Da mesma forma, apenas o Município instituidor tem o poder de isentar, isto se dá também com a edição de uma lei ordinária que tenha esta finalidade (isenções autonômicas). Nesse sentido, por previsão constitucional, é proibido as chamadas isenções heterônomas, ou seja, isenções feitas por um outro ente que não aquele que instituiu o tributo, conforme art. 151, inciso I da Carta Magna de 1988.
Esta afirmativa (da competência ser apenas dos Municípios) não é absoluta e merece as devidas considerações no que se refere à instituição e isenção pelo Distrito Federal e excepcionalmente pela própria União.
Quanto ao Distrito Federal, tendo em vista o exposto no artigo 147 da CF/88, compete, cumulativamente com os impostos estaduais – art. 155, CF -, os impostos municipais e, portanto, pode o Distrito Federal criar o IPTU, arrecadá-lo e criá-lo, exercendo, assim, a sua competência plena.
Por sua vez, se vier a ser criado um Território – não dividido em Municípios – preconiza o art. 147 da Carta Política de 1988 que os impostos de competência municipal poderão ser instituídos pela União, através de uma lei ordinária federal, cumulativamente com os impostos estaduais.
Dessa forma, podemos dizer que, na quase totalidade das vezes, cabe aos Municípios a instituição e isenção do IPTU, sem esquecer da competência do Distrito Federal, e em caso da criação de um Território Federal, à União é outorgada tal incumbência.
Em que pese o acima exposto, vale ressaltar, por último, que a competência tributária é facultativa, conforme preleciona Sabbag (2012) que o exercício da competência tributária, embora seja intransferível e irrenunciável, é considerado facultativo.
Ainda que o art. 11 da Lei de responsabilidade Fiscal (LC n. 101/99) disponha que, no plano de gestão fiscal da pessoa política, deve haver a instituição de “todos” os tributos cuja entidade possui competência, sob pena de incorrer em sanções (art. 11, parágrafo único). Entende, o nobre doutrinador, que, salvo melhor juízo, o legislador teve a motivação de estimular a instituição do tributo economicamente viável, o que seria pertinente até mesmo ao IPTU (...)
Insta mencionar que o IPTU corresponde a grande parte da arrecadação das municipalidades, sendo de extrema importância para a gestão administrativa a sua renda gerada aos cofres públicos e, por isso, há um enorme exercício da competência tributária municipal.
3.2 CARACTERÍSTICAS
3.2.1 Sujeito Passivo
O CTN se incumbiu de estipular aqueles que são os sujeitos passivos do IPTU, pontuando que os contribuintes do imposto são o proprietário, o titular de domínio útil e o possuidor.
Passa-se à análise individual e pormenorizada de cada um dos mencionados.
{C}· Proprietário: exerce a propriedade aquele que, segundo o artigo 1.228 do Código Civil, “tem faculdade de usar, gozar e dispor da coisa, eo direito de reavê-la de quem quer que injustamente a possua ou detenha”. Podemos levantar, também a necessidade do animus domini àquele que possua a coisa.
Assim sendo, o mero locatário (mesmo entendimento para o comodatário) não é legitimado passivo do IPTU, uma vez que se encontra na situação de mero detentor de coisa alheia e não encobertado pelo animus definitivo.
Ressalte-se que os contratos em que conste a obrigação do inquilino de pagar o IPTU não podem ser opostos contra o Fisco, por força do art. 123 do CTN, devendo ser resolvida a inadimplência contratual na seara civil.
Vejamos o posicionamento, já pacificado, dos tribunais:
TRIBUTÁRIO - IPTU - CONTRIBUINTE - POSSUIDOR - ART. 34 DO CTN. 1. O IPTU é imposto que tem como contribuinte o proprietário ou o possuidor por direito real que exerce a posse com animus definitivo - art. 34 do CTN. 2. O comodatário é possuidor por relação de direito pessoal e, como tal, não é contribuinte do IPTU do imóvel que ocupa. 3. Não sendo contribuinte o possuidor e confundindo-se, no Município, as posições de proprietário do imóvel e de sujeito ativo para a cobrança do IPTU, resulta indevido o tributo. 4. Recurso especial improvido.(STJ - REsp: 325489 SP 2001/0067505-5, Relator: Ministra ELIANA CALMON, Data de Julgamento: 18/11/2002, T2 - SEGUNDA TURMA, Data de Publicação: DJ 24.02.2003 p. 217RTFP vol. 52 p. 296)
{C}· Domínio útil: para a compreensão deste assunto, é necessário a análise de dois institutos, a enfiteuse e o usufruto.
No entanto, adentraremos apenas no usufruto, uma vez que a enfiteuse (é um tipo de arrendamento por longo prazo ou até mesmo perpétuo de terras públicas a particulares, obrigando o enfiteuta a efetuar o pagamento de um valor anual, certo e invariável, em numerário ou espécie, ao ente proprietário. Este, mediante contrato, entrega ao enfiteuta, o domínio útil e o pleno gozo do bem) encontra-se em desuso por ser desvantajoso.
Quanto ao usufrutuário atenta-se à seguinte jurisprudência:
TRIBUTÁRIO. RECURSO ESPECIAL. RESTITUIÇÃO DE INDÉBITO. IPTU. USUFRUTUÁRIO. LEGITIMIDADE. I - Consoante jurisprudência desta Corte, o usufrutuário tem legitimidade para questionar a cobrança de IPTU. II - "Segundo lição do saudoso mestre Pontes de Miranda,"o direito de usufruto compreende o usar e fruir, ainda que não exerça, e a pretensão a que outrem, inclusive o dono, se o há, do bem, ou do patrimônio, se abstenha de intromissão tal que fira o uso e a fruição exclusivos. É direito, erga omnes, de exclusividade do usar e do fruir'. O renomado jurista perlustra, ainda, acerca do dever do usufrutuário de suportar certos encargos, que "os encargos públicos ordinários são os impostos e taxas, que supõem uso e fruto da propriedade, como o imposto territorial e o predial". Na mesma linha de raciocínio, este Superior Tribunal de Justiça, ao apreciar a matéria, assentou que, "em tese, o sujeito passivo do IPTU é o proprietário e não o possuidor, a qualquer título (...) Ocorre que, em certas circunstâncias, a posse tem configuração jurídica de título próprio, de investidura do seu titular como se proprietário fosse. É o caso do usufrutuário que, como todos sabemos, tem a obrigação de proteger a coisa como se detivesse o domínio" (REsp 203.098/SP, Rel. Min. Carlos Alberto Menezes Direito, DJ 8. 3.2000)." (REsp nº 691.714/SC, Rel. Min. FRANCIULLI NETTO, DJ de 27/06/05) III - Agravo regimental improvido (STJ - AgRg no REsp: 698041 RJ 2004/0152237-0, Relator: Ministro FRANCISCO FALCÃO, Data de Julgamento: 05/12/2005, T1 - PRIMEIRA TURMA, Data de Publicação: DJ 06.03.2006 p. 193)
{C}· Possuidor: embora polêmica a matéria no que se refere ao alcance do instituto posse (não nos interessando a posse na perspectiva da propriedade), parece uníssono o entendimento de que a posse puramente dita não se faz suficiente a caracterizar a legitimidade passiva do IPTU.
Para tanto, faz-se mister a exteriorização do animus domini, que se dará em atitudes habituais, quando instituído na posse, que o proprietário tomaria, tal como na posse ad usucapionem.
Assim vem sendo o entendimento da Corte Superior:
TRIBUTÁRIO. RECURSO ESPECIAL. IPTU. LOCATÁRIO. ILEGITIMIDADE ATIVA AD CAUSAM. ARTS. 34, 121 E 123 DO CTN. PRECEDENTES. (...) 3. “Contribuinte do imposto é o proprietário do imóvel, o titular do seu domínio útil, ou o seu possuidor a qualquer título” (art. 34 do CTN). O “possuidor a qualquer título” refere-se, tão-somente, para situações em que ocorre posse ad usucapionem, não inserida nesta seara a posse indireta exercida pelo locatário. 4. Os documentos de quitação do tributo discutido estão em nome do proprietário. 5. O contrato de locação, com cláusula determinando a responsabilidade do inquilino pela liquidação do IPTU, não pode ser oponível à certidão de pagamento de imposto. 6. Recurso provido. (STJ - REsp: 818618 RJ 2006/0025263-0, Relator: Ministro JOSÉ DELGADO, Data de Julgamento: 06/04/2006, T1 - PRIMEIRA TURMA, Data de Publicação: DJ 02/05/2006 p. 273)
Outro caso de posse que deve ser cuidadosamente estudado é o do promitente comprador. Isso se dá quando alguém firma um contrato de promessa compra e venda se colocando na posição de adquirente, mesmo que ainda não transferida a propriedade, por ter caráter de irretratabilidade, podendo, inclusive, incidir multas em caso de descumprimento da promessa.
Por isso, com base no art. 150, § 3˚ da CF/88, o promitente comprador é legitimado para ocupar a sujeição passiva do IPTU, sendo suficiente para tanto o direito real de aquisição de coisa alheia.
3.2.2 Fato Gerador
“Fato gerador” é a expressão utilizada pelo CTN (arts. 114 e 115) para denominar o acontecimento escolhido pelo legislador em que incidirá determinada obrigação tributária, bem como para o fato concretizado no mundo real.
Por isso, decorre desta denominação diversas críticas pertinentes e que são supridas pelos doutrinadores com outros títulos que podem, com maior fidelidade, elucidar o que o legislador quis transmitir.
Bartine (2013) sobre o tema explanou o que a hipótese de incidência é o que a lei determina como um fato geral e abstrato que, quando praticado no mundo concreto por qualquer pessoa, irá gerar uma relação jurídica que obriga as pessoas a recolherem dinheiro aos cofres públicos ou, ainda, cumprir deveres de natureza administrativa. Já o fato imponível é aquele fato típico tributário, melhor dizendo, é a prática de um fato descrito na norma legal abstrata, com todas os seus elementos.
Assim sendo, pode-se classificar o fato gerador em abstrato e concreto, sendo aquele a hipótese descrita pelo legislador na lei como ensejador do imposto e este o fato ocorrido no mundo real que se enquadra (subsunção) na hipótese narrada na lei.
Outra classificação bastante pertinente é a que diferencia o fato gerador da obrigação tributária principal da obrigação tributária acessória. Quanto ao assunto mister é maiores explicações.
A obrigação tributária principal, segundo Costa (2013), nasce com a consumação do fato gerador sendo o seu objeto o pagamento de penalidade pecuniária ou do tributo. Fora dada tal nomenclatura haja vista se tratar da relação jurídica de maior relevância do direito tributário.
Por sua vez, quanto à obrigação acessória, a professora Costa (2013) esclarece que são condutas comissivas ou omissivas exigíveis dos contribuintes cujo intuito é de assegurar o devido cumprimento da obrigação principal. Compreendem, sempre, uma obrigação de “fazer” ou de “não fazer”.
Feitas as devidas considerações, passa-se à apreciação do fato gerador abstrato, ou seja, aquele escolhido pelo legislador para a incidência do IPTU.
O artigo 32 do CTN traz como sendo o fato gerador do IPTU “a propriedade, o domínio útil ou a posse de bem imóvel, por natureza ou por acessão física, como definido na lei civil, localizado na zona urbana do Município”.
Sobre esta definição deve-se trabalhar os conceitos de propriedade, domínio útil, posse, bem imóvel por natureza e bem imóvel por acessão fisica, e zona urbana. Os três primeiros foram esmiuçados no item 2.2.1, passa-se à análise dos próximos.
O Código Civil de 2002 não tratou da conceituação dos bens imóveis por natureza ou por acessão, no entanto, o Código de 1916 o fizera. Nesta oportunidade, os estudiosos do direito se valem, também, das considerações do Código passado para complementação dos conceitos modernos sobre essa classificação.
Com propriedade, o Dr. Eduardo Sabbag (Manual de Direito Tributário, 2012, p. 996), definiu-os assim:
a) Bens Imóveis por (sua) natureza (art. 43, I): “O solo, com sua superfície, os seus acessórios naturais e adjacências naturais, compreendendo as árvores e frutos pendentes, o espaço aéreo e o subsolo”. Em outras palavras, tais bens são aqueles que se formaram por força da natureza, compreendendo o solo com a sua superfície, em profundidade e verticalidade, os seus acessórios e adjacências naturais; as árvores, a vegetação e frutos pendentes;
b) Bens Imóveis por acessão física (natural) (art. 43,II): “Tudo quanto o homem incorporar permanentemente ao solo, como a semente lançada ao solo, os edifícios e construções, de modo que não se possa retirar sem destruição, modificação, fratura ou dano”. Vale dizer que esses bens englobam a formação de ilhas, de aluvião, de avulsão, de abandono de álveo, e, sobretudo, aquilo que se une por construção e edificação, de modo que não se possa retirar sem destruição, modificação, fratura ou dano.
Quanto à conceituação de zona urbana, esta se faz imprescindível para a satisfatória compreensão do fato gerador do IPTU. Ora, este liame é justamente o ponto mais relevante de diferenciação entre o IPTU municipal e o ITR federal, uma vez que os dois incidem sobre a propriedade, sendo um da situada na zona urbana e o outro na zona rural.
O que se entende por zona urbana? O § 1˚ do artigo 32 do CTN se incumbiu de tal definição, dizendo ser zona urbana aquela que seja estabelecida em lei municipal, sendo necessário que este espaço delimitado contenha ao menos dois dos melhoramentos da lista dos cinco incisos seguintes, quais sejam:
I - meio-fio ou calçamento, com canalização de águas pluviais;
II - abastecimento de água;
III - sistema de esgotos sanitários;
IV - rede de iluminação pública, com ou sem posteamento para distribuição domiciliar;
V - escola primária ou posto de saúde a uma distância máxima de 3 (três) quilômetros do imóvel considerado.
Será, ainda, considerada zona urbana, com fulcro no § 2˚ do mesmo dispositivo legal, aquela área que, mesmo que não seja servida por nenhum dos melhoramentos, havendo previsão em lei municipal, esteja inserida em área de loteamento aprovado pelos respectivos órgão e cuja destinação seja a moradia, indústria ou comércio.
Por fim, menciona-se que o fato gerador do IPTU é apurado anualmente, melhor dizendo, o critério temporal (quando) da incidência do imposto, se dá no dia 1˚ de janeiro de cada ano, por mera ficção jurídica.
3.2.3 Base de Cálculo
A base de cálculo de um tributo, como o próprio nome sugere, é de onde, ou melhor, o ponto de encosto, embasamento, fundação, etc., em que se efetuará o cálculo do montante a ser pago pelo sujeito passivo.
O artigo 33 do CTN preconiza ser a base de cálculo do IPTU o valor venal do imóvel. Entende-se por valor venal do imóvel, o valor que, caso colocado a venda em condições normais do mercado imobiliário, seria vendido tendo como pagamento o preço à vista.
Frise-se que o parágrafo único daquele dispositivo pontuou que não deve ser considerado, a fim de valoração do imóvel, os móveis que estejam alojados no imóvel, seja de maneira temporária ou permanente.
Por não tomar medidas objetivas de aferimento, o cálculo sempre foi um grande problema a ser enfrentado, ficando quase que a bel prazer dos avaliadores que o executam.
Noutro lado, tendo em conta o princípio da legalidade tributária, o art. 97, IV do CTN estabelece que a base de cálculo será fixada por lei.
Por sua vez, o Poder Executivo poderá valer-se de um Decreto para a atualização monetária da base de cálculo. Entretanto, é necessário tomar cuidado com esta correção que poderá apenas ocorrer dentro de índices oficiais, pois caso os extravaze incorrerá em um majoração disfarçada de correção monetária (art. 97, § 1˚, CTN) e tal majoração só é permitida através de lei (art. 97, II, CTN). Neste sentido, o STJ se posicionou na Súmula 160.
Outro ponto a ser mencionado é que, segundo o art. 150, § 1˚, da CF, a fixação da base de cálculo do IPTU não está sujeita à anterioridade nonagesimal, ou seja, para fixar a base de cálculo do IPTU apenas é necessário respeitar a anterioridade do exercício fiscal, em outras palavras, apenas poderá ser fixada no ano civil (que corresponde ao exercício fiscal) seguinte ao em que ocorrera a publicação da lei que a fixou, mesmo que a publicação tenha ocorrido no dia 31 de dezembro.
3.2.4 Alíquota
A alíquota, de acordo com Sabbag (2012), é uma grandeza que estipula a dimensão do fato gerador. É revelada através de índice de percentagem que, juntamente com a base de cáculo, permitirá a aferição do quantum deverá ser pago.
E, assim como a base de cálculo, é imprescindível para a fixação da alíquota a previsão em lei, nos termos do art. 97, IV, CTN, sendo exceção ao princípio da legalidade apenas os tributos de caráter preponderantemente extrafiscal (IPI, IOF, II, IE).
Por ser um imposto de competência dos Municípios estes legislarão e estipularão a percentagem adequada para o cálculo do montante devido, não havendo restrições legais quanto ao mínimo ou máximo, devendo apenas observar os princípios norteadores do direito tributário (princípio da capacidade contributiva, da isonomia, da vedação ao confisco, dentre outros).
{C}{C}{C}
4. IPTU PROGRESSIVO NO TEMPO
4.1 PRINCÍPIO DA ISONOMIA TRIBUTÁRIA
Primeiramente, convêm pontuar que o princípio da isonomia tributária é uma interpretação especializada do princípio constitucional norteador e genérico da isonomia que encontramos no caput do art. 5˚ da Carta Suprema de 1988.
O princípio constitucional da isonomia genérica coloca homens e mulheres em um tratamento que venha a fazê-los iguais e, dessa forma, busca-se a realização da justiça. Nesse sentido, Regina Helena Costa (Curso de Direito Tributário, 2013, p. 75), leciona que:
A ideia de igualdade irradia seus efeitos por todo o ordenamento jurídico e é considerada por muitos seu princípio mais relevante.
A igualdade pode ser entendida em dupla acepção. Se nos referimos à igualdade no seu sentido material ou substancial, queremos significar o desejável tratamento equânime de todos os homens, proporcionando-lhes idêntico acesso aos bens da vida. Cuida-se, portanto, da igualdade em sua acepção ideal, humanista, que jamais foi alcançada.
Já a igualdade no sentido formal, de irrefutável relevância prática, expressa as legítimas discriminações autorizadas aos legisladores, vale dizer, aquelas equiparações ou desequiparações consagradas na lei. Dirige-se, assim, o princípio, imediatamente ao legislador e mediatamente aos seus aplicadores.
Portanto, o princípio da igualdade autoriza o estabelecimento de discriminações, por meio das quais se viabiliza seu atendimento, em busca da realização de justiça.
Em sendo assim, tal diretriz impacta intensamente o âmbito tributário, porquanto o legislador e o aplicador da lei hão de atentar as diferenças entre os sujeitos, procedendo às necessárias discriminações na modulação das exigências fiscais.
Como já mencionado pela autora, quando o princípio da isonomia, cuja finalidade é a proporção da justiça social mediante tratamento igual ou desigual para aqueles que são, em um conceito estritamente objetivo, semelhantes ou dessemelhantes, passa ao contexto tributário, tornando-se o princípio da isonomia tributária, ele não perde sua essência, mas tem uma nova roupagem.
Roupagem esta que se adere aos ditame tributários, melhor dizendo, adentra em um contexto da matéria “autônoma” (didaticamente) rodeada por conceitos, leis, princípios, analogias, doutrinas, dentre outras fontes, que é própria da especificidade do Direito Tributário e, portanto, este princípio tem que enfrentar situações que são comuns aos preceitos que agora aborda.
Com essa nova abordagem, o texto constitucional tratou do princípio da isonomia tributária no art. 150, II da CF/88, o qual prevê:
Art. 150. Sem prejuízo de outras garantias asseguradas ao contribuinte, é vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios:
(...)
II - instituir tratamento desigual entre contribuintes que se encontrem em situação equivalente, proibida qualquer distinção em razão de ocupação profissional ou função por eles exercida, independentemente da denominação jurídica dos rendimentos, títulos ou direitos;
Note-se que nasce uma nova ênfase mandamental. Ora no princípio do art. 5˚ destaca-se a positividade do mandamento genérico, em que “todos são iguais perante a lei (...)”, e já letra do inciso II, artigo 150 da CF, temos a negatividade comportamental “é vedado instituir tratamento desigual (...)”.
Sendo assim, pode-se observar que é um importante controle tributário e de defesa dos cidadãos, que encontram neste dispositivo uma limitação que garante um direito equipolente, respeitando as distinções que lhes são próprias.
Pois bem, quais são estas desigualdades que permitem o tratamento diferenciado na área tributária? O que tomar como norte a se concluir pelas vertentes distintivas de atuação?
Amaro (2012) explana sobre o tema dizendo ser necessário buscar qual a desigualdade que obriga o a discriminação, devendo diferenciar (com incidência tributária menos gravosa ou com isenções) o tratamento de situações que cuja capacidade contributiva se revele pequena ou mínima.
Caminha-se, então, para o entendimento de que deverão receber tratamento igual aqueles que tiverem igual capacidade contributiva, e com desigualdade os que revelem riquezas diferentes.
Pode-se concluir, desse modo, que a análise deve ser pautada, no campo do Direito Tributário, com base no princípio da capacidade contributiva, o qual, de pronto, passa-se à análise.
4.2 PRINCÍPIO DA CAPACIDADE CONTRIBUTIVA
O princípio objeto desta análise é de suma importância para a compreensão de diversos institutos e normas que permeiam o direito tributário. Uma vez que o respeito à norma constitucional abstrata da capacidade contributiva é também uma garantia do contribuinte e, como tal, o legislador, os julgadores e a máquina estatal deve obsevá-lo para não ir de encontro com seus preceitos.
Aduz o § 1˚ do art. 145 da Carta Magna de 1988 que:
Sempre que possível, os impostos terão caráter pessoal e serão graduados segundo a capacidade econômica do contribuinte, facultado à administração tributária, especialmente para conferir efetividade a esses objetivos, identificar, respeitados os direitos individuais e nos termos da lei, o patrimônio, os rendimentos e as atividades econômicas do contribuinte.
Sabe-se que se chega ao princípio da isonomia tributária passando pelo da capacidade contributiva, uma vez que no Direito Tributário a análise contributiva é feita observando os signos presuntivos de riqueza, ou seja, os patrimônios, bens, renda, serviços, etc. do contribuinte que demonstram o quantum que deve ser contribuído pelo sujeito passivo da obrigação tributária.
Isso se dá pelo caráter objetivo da matéria que não se preocupa com questões pessoais (emocionais), de licitude, dentre outros aspectos que são pertinentes a outros ramos do direito. Sua análise é mais fria, praticou a hipótese descrita na lei como passível de incidência (ocorrendo a subsunção), deve recolher o montante gerado pela obrigação estabelecida na lei.
Veja como se posiciona a jurisprudência atual:
AGRAVO. DIREITO TRIBUTÁRIO. MANDADO DE SEGURANÇA. ITCD. PROGRESSIVIDADE DAS ALÍQUOTAS. LEI ESTADUAL N.º 8.821/89. INCONSTITUCIONALIDADE. Segundo precedente do Órgão Especial deste Tribunal de Justiça, é inconstitucional a progressividade das alíquotas de ITCD previstas nos arts. 18 e 19 da Lei Estadual n.º 8.821/89. A inconstitucionalidade decorre da proibição de que nos tributos reais haja mensuração da capacidade contributiva por critérios subjetivos, diversos da objetividade tributada. Interpretação do art. 145, § 1º da CRFB/88. ALÍQUOTA APLICÁVEL. Aplicável ao caso a alíquota... (TJ-RS - AGV: 70051339505 RS, Relator: Denise Oliveira Cezar, Data de Julgamento: 29/11/2012, Vigésima Segunda Câmara Cível, Data de Publicação: Diário da Justiça do dia 05/12/2012)
Um de seus fundamentos é justamente o princípio da isonomia que fora estudado no tópico anterior, uma vez que para tratar as diferenças deve-se averiguar o quantum cada sujeito pode contribuir de forma a igualar, sempre que possível, o impacto que sofrido em seu patrimônio.
Ora, basta pensar que não se pode tributar alguém que perceba R$ 100.000,00/mês (cem mil reais por mês) do mesmo modo em que se tributa o sujeito que auferi R$ 2.000,00/mês (dois mil reais por mês). Neste caso, suponhamos uma carga tributária de 30% no salário dos dois, o primeiro continuaria com os seus saudosos R$ 70.000,00 (setenta mil reais) mensais para as despesas, já o segundo lhe restaria apenas R$ 1.400,00/mês (mil e quatrocentos reais por mês). Qual dos dois seria mais afetado?
Por isso, não se pode distanciar a isonomia tributária da capacidade contributiva devendo uma completar a outra a fim de alcançar a tão sonhada justiça fiscal (um patamar programático, onde o impacto tributário sofrido pelo “rico” e pelo “pobre” seja “justo” com ambos de acordo com sua capacidade econômica).
Vê-se, de modo teórico, quais as discussões pertinentes para se desenvolver meios práticos de alcançar o objetivo igualitário. Mas qual seria o modo prático em que se poderia traçar as ações legislativas, arrecadatórias e fiscalizatórias?
Essa pergunta ecoou por algum tempo no mundo jurídico, inclusive levantando discussões filosóficas. Afinal seria possível mesmo chegar a uma justiça fiscal? Ou seria apenas utopia?
Perguntas feitas e que continuam sem respostas concretas... Pode-se apenas afirmar que estamos longe de chegar a tal patamar e que nosso pré-histórico sistema tributário não tem conseguido acompanhar as mudanças sociais e deixado muitas injustiças transparecer no cotidiano do povo brasileiro.
Retomando ao ponto das ações práticas que devem ser tomadas e feitas as perguntas retóricas, chegou a alguns meios de tentar, na prática, alcançar a isonomia no que se refere à tributação.
Tem-se como linha de atuação vigorando no país a progressividade.
4.2.1 Progressividade
Discutiu-se ser a progressividade a medida prática encontrada como meio de validar o princípio da isonomia e da capacidade contributiva (especialmente) com o objetivo de atingir a tributação justa.
E o que seria a progressividade?
A progressividade é uma técnica de incidência em que as alíquotas irão variar de acordo com a base de cálculo. Em outras palavras, quanto maior for a base de cálculo em que for aplicar a alíquota, maior será a alíquota, girando em torno de seu aspecto quantitativo.
Esta técnica, atualmente, é utilizada apenas em 03 (três) impostos, são eles: o IPTU, o ITR e o imposto sobre a renda.
Quanto à progressividade no IPTU, Eduardo Sabbag (Manual de Direito Tributário, 2012, p. 170 e 171), aduz que:
Até o exercício de 2001, muitos municípios efetuavam o lançamento do IPTU com base em alíquota única, em sintonia com o art. 156,§ 1˚, da Carta Constitucional.
Na verdade, o art. 156, § 1˚, da Constituição Federal de 1988, na sua redação original, permitia, a título de exceção, a progressividade de alíquotas para o IPTU, desde que fosse para assegurar o cumprimento da função social da propriedade. Existiam, então, duas formas de cobrança desse tributo: uma com finalidade arrecadatória, baseada na proporcionalidade da exação, e outra, de cunho extrafiscal, pela qual a mensuração do imposto poderia ser feita de modo progressivo, respeitado o objetivo de atender à função social da propriedade.
(...)
Com a Emenda Constitucional n. 29, publicada em 13-09-2000, alterou-se a redação do mencionado art. 156, dando nova conformação ao progressivo IPTU. Criou-se a possibilidade de tal imposto ser progressivo não apenas para o fim de se assegurar o cumprimento da função social da propriedade (progressividade no tempo) – o que já se permitia -, mas também em razão do valor do imóvel. Além disso, permitiu-se o estabelecimento de alíquotas diferentes em razão da localização e uso do imóvel.
O autor levanta a existência de dois tipos de progressividade no que se refere ao IPTU, a progressividade extrafiscal (que busca atingir a função social da propriedade) e a progressividade fiscal (cuja finalidade é arrecadatória e se dá em razão do valor do imóvel).
A progressividade fiscal (em razão do valor do imóvel) não é objeto do presente trabalho e não há muitas considerações a serem feitas, apenas lembrar a ideia de que a finalidade fiscalizatória é aquela cujo objetivo principal é levar dinheiro aos cofres público para que o estado realize suas atividades.
Já a progressividade extrafiscal merece maiores detalhamentos.
4.3 IPTU PROGRESSIVO NO TEMPO: CARÁTER EXTRAFISCAL
O IPTU progressivo no tempo possui dois tipos de progressividade, a fiscal (já mencionada no tópico anterior) e a extrafiscal.
Quanto à extrafiscalidade Geraldo Ataliba (Revista de Direito Público, n. 93, p. 233) a define como um dos instrumentos tributários para obtenção de finalidades não arrecadatórias, mas cujo objetivo é servir de estimulo, induzir ou coibir comportamentos.
Dessa forma, a extrafiscalidade busca outras finalidades se não arrecadar, conforme pontua José Marques Domingues de Oliveira (Capacidade contributiva: conteúdo e eficácia do princípio, 1998, p. 115) são objetivos próprios deste caráter a “redistribuição da renda e da terra, a defesa da economia nacional, a orientação dos investimentos privados para setores produtivos, a promoção do desenvolvimento regional ou setorial, etc.”.
Vencido este ponto, pode restar a dúvida de qual é o caráter extrafiscal que é observado na progressividade no tempo do IPTU?
Este ponto merece destaque, uma vez que para chegar a uma conclusão é necessário traçar uma linha de raciocínio.
Conforme será elucidado no próximo tópico, a utilização de terrenos na área urbana deve observar o plano diretor para cumprir a função social da propriedade.
Caso não seja atingida a finalidade (função social da propriedade) pela inobservância do plano diretor (que significa solo não edificado, subutilizado ou não utilizado), o proprietário incorrerá em algumas sanções, cujo objetivo é forçar a adequada utilização do solo. A segunda etapa é justamente a aplicação do IPTU progressivo no tempo, que poderá chegar a 15% do valor do imóvel.
Portanto, a extrafiscalidade do IPTU progressivo no tempo é justamente por sua finalidade não ser arrecadatória, mas sim indutora ou coibidora de comportamento, buscando apenas o uso adequado do solo pelo proprietário.
Assim vem entendo a Suprema Corte que reconhece desde a Constituição Federal de 1988 o caráter extrafiscal que pode ser atribuído ao IPTU, observe:
PROCESSUAL CIVIL E TRIBUTÁRIO. AGRAVO DE INSTRUMENTO. ART. 544 DO CPC. EXECUÇÃO FISCAL. IPTU. PROGRESSIVIDADE DE ALÍQUOTAS. ANTERIOR À EC 29/2000. CONSTITUCIONALIDADE. MUNICÍPIO DE CONTAGEM. QUESTÃO QUE DEMANDA INTERPRETAÇÃO DE DIREITO LOCAL. LEI Nº 1.611/83. APLICAÇÃO DA SÚMULA 280/STF. ACÓRDÃO RECORRIDO QUE DECIDIU A CONTROVÉRSIA À LUZ DE DISPOSITIVOS DE ÍNDOLE INFRACONSTITUCIONAL. OFENSA REFLEXA AO TEXTO DA CARTA MAGNA. AUSÊNCIA DE PRESTAÇÃO JURISDICIONAL NÃO VERIFICADA NA ESPÉCIE. VIOLAÇÃO AO ART. 93, IX, DA CF. INOCORRÊNCIA. (...) Precedentes desta Corte: AI 688410 AgR, Relator: Min. Joaquim Barbosa, DJe- 30/03/2011;AI 748648 AgR, Relator: Min. Dias Toffoli, DJe- 19/11/2010.6. In casu, o acórdão recorrido assentou: EMBARGOS À EXECUÇÃO FISCAL - MUNICÍPIO DE CONTAGEM - IMPOSTO PREDIAL E TERRITORIAL URBANO - PROGRESSIVIDADE ANTERIOR À EC 29/2000 - CARÁTER EXTRA FISCAL PREVISTO NO ART. 182, § 4º, DA CF -ADMISSIBILIDADE. Não se admite, até a EC 29/2000, a progressividade no IPTU, salvo exceção de caráter extrafiscal prevista no art. 182, § 4º da CF (Súmula nº 668 do STF). (...) Ex positis, NEGO SEGUIMENTO ao agravo de instrumento. Publique-se. Int.. Brasília, 13 de fevereiro de 2012.Ministro Luiz (STF - AI: 742258 MG , Relator: Min. LUIZ FUX, Data de Julgamento: 13/02/2012, Data de Publicação: DJe-035 DIVULG 16/02/2012 PUBLIC 17/02/2012)
4.4 PRINCÍPIO DA FUNÇÃO SOCIAL DA PROPRIEDADE URBANA
O princípio da função social da propriedade urbana tem seu fundamento na Constituição Federal de 1988, mais precisamente nos art. 5˚, XXIII e 182, § 2˚. Nesses termos:
Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:
(...)
XXIII - a propriedade atenderá a sua função social;
Art. 182. A política de desenvolvimento urbano, executada pelo Poder Público municipal, conforme diretrizes gerais fixadas em lei, tem por objetivo ordenar o pleno desenvolvimento das funções sociais da cidade e garantir o bem- estar de seus habitantes.
(...)
§ 2º - A propriedade urbana cumpre sua função social quando atende às exigências fundamentais de ordenação da cidade expressas no plano diretor.
Pode-se extrair o § 2˚ do artigo 182 da Carta Política de 1988 que para cumprir a função social da propriedade é necessário observar os ditames expressos do plano diretor. Entretanto, o que é o plano diretor?
Nas palavras de Flávio Villaça (Dilemas do Plano Diretor, 1999, p. 238), arquiteto e doutor em geografia urbana, o plano diretor:
Seria um plano que, a partir de um diagnóstico científico da realidade física, social, econômica, política e administrativa da cidade, do município e de sua região, apresentaria um conjunto de propostas para o futuro desenvolvimento socioeconômico e futura organização espacial dos usos do solo urbano, das redes de infraestrutura e de elementos fundamentais da estrutura urbana, para a cidade e para o município, propostas estas definidas para curto, médio e longo prazos, e aprovadas por lei municipal.
Extraindo-se de tal conceito que o plano diretor é o que dita a organização estrutural de uma cidade. Ali pode-se encontrar os pontos principais a serem seguidos para que haja harmonia estrutural no município.
Importante ressaltar que é o plano diretor do município que estipula o local onde se estabelecerão as zonas residenciais, industriais e comerciais (para que se evite problemas), o quanto deve permanecer de área verde, que permite ou veda alguns tipos de construções em determinados lugares, dentre outros pontos fundamentais para uma vida harmônica em sociedade.
Neste sentido, Júnior e Novelino (2012) elucidam que o cumprimento da função social da propriedade urbana traz aos habitantes desta cidade um desenvolvimento e expansão social e o bem-estar, isso se dá quando é possível verificaro atendimento das exigências fundamentais de ordenação da cidade contidas no plano diretor. Esse é o motivo pelo qual a Constituição faculta ao Município exigir, em observância à lei federal, do proprietário do solo não edificado, subutilizado ou não utilizado, que seja promovido seu adequado aproveitamento.
Por isso que o legislador se posicionou no sentido de que uma propriedade cumprirá sua função, frise-se, social ao seguir as normas do plano diretor.
É de ver-se que ao acompanhar toda a linha de raciocínio que se desenvolvera até aqui pode-se criar um ponto de convergência entre os institutos que cautelosamente foram esmiuçados.
Observe a conclusão a que se chega:
O princípio da isonomia tributária busca dar justiça fiscal aos contribuintes, de tal forma que o impacto sofrido por todos seja proporcionalmente igual. Para que um dia isso seja possível deve-se observar a capacidade contributiva de cada sujeito passivo da obrigação tributária. O meio prático para tanto, atualmente, rege-se através do instituto da progressividade que se aplica ao IPTU (tributo em análise). A progressividade dá o caráter extrafiscal ao IPTU quando em razão do tempo para se obter o cumprimento da função social da propriedade, uma vez que coibi e/ou induz o comportamento social.
CONCLUSÃO
O presente estudo teve como finalidade uma análise do tema IPTU progressivo no tempo. Em que pese o tema ser bastante vasto, encontra-se, na medida do possível, abordado os assuntos que julga-se ser essencial à compreensão da matéria.
Em busca de saber da efetividade de tal instituto apresentou-se os aspectos mais relevantes do imposto predial territorial urbano dentro do sistema jurídico brasileiro, ante ao Sistema Tributário Nacional, previsto na Constituição Federal, e o Código Tributário Nacional.
A fim de trazer as discussões mais atuais e significativas para a correta compreensão do instituto, o trabalho fora embasado em pesquisa realizada na jurisprudência, doutrina, legislação, revistas jurídicas e vídeo aula, o que fora imprescindível para o êxito do estudo apresentado.
Primeiramente, traçou-se conceitos importantes para a compreensão do tema, como as definições de tributo e suas características, que elucidam a matéria trabalhada dentro do ramo do direito tributário, bem como o diferencia da multa que em muito se assemelha com aquele.
Aduziu, também, a competência tributária, levantando pontos relevantes que a distingue da capacidade tributária ativa e que permite a harmônica autonomia do sistema tributário federativo brasileiro, de tal forma que se pode delegar as funções arrecadatórias e fiscalizatórias, porém não se pode delegar a instituição do tributo.
Adentrando no liame do IPTU, fora destrinchado qual o ente federativo competente, extraindo-se que a regra é os municípios e o DF, tendo como exceção (em caso da criação de um território que não se dividi-se em municípios) a União que tem autorização constitucional para que o faça.
Pontuou-se, nessa linha, quem seria o sujeito passivo do IPTU, lembrando ser o proprietário, o detentor de domínio útil e o possuidor (presente o animus domini), bem como qual a hipótese em que incide o imposto (fato gerador), tendo como base de cálculo o valor venal do imóvel e como alíquota o percentual estipulado em lei municipal.
Delineou, ainda, os conceitos do princípio da isonomia constitucional e tributária, bem como o da capacidade contributiva do sujeito passivo da obrigação tributária, o que, por consequência, trouxe à tona a progressividade no tempo do IPTU.
Em último lugar, adentrou-se no caráter extrafiscal que recebe o IPTU progressivo no tempo quando seu objetivo é coibir ou induzir um determinado comportamento que se baseia na função social da propriedade nos limites do plano diretor.
REFERÊNCIAS
AMARO, Luciano. Direito tributário brasileiro. 18ª ed. São Paulo. Saraiva, 2012.
ATALIBA, Geraldo. IPTU – Progressividade. Revista de Direito Público (RDP) n. 93.
BARTINE, Caio. Direito Tributário. 2ª ed. São Paulo. Revista dos Tribunais, 2013.
BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília, DF: Senado, 1988.
BRASIL. Lei nº 5.172, de 25 de outubro de 1966. Dispõe sobre o Sistema Tributário Nacional e institui normas gerais de direito tributário aplicáveis à União, Estados e Municípios. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l51 72.htm>. Acesso em: 13 mai. 2013.
COSTA, Regina Helena. Curso de Direito Tributário. 3ª ed. São Paulo. Saraiva, 2013.
HARADA, Kiyoshi. Direito Financeiro e Tributário. 19ª ed. São Paulo. Atlas, 2009.
MACHADO, Hugo de Brito. Curso de Direito Tributário. 28ª ed. São Paulo. Malheiros, 2007.
SABBAG, Eduardo. Manual de direito tributário. 4ª ed. São Paulo. Saraiva, 2012.
VALADÃO, Marco Aurélio. Sistema Tributário Brasileiro. Programa Aula Magna - TV Justiça. Disponível em: <http://www.youtube.com/watch?v=3PN73CZRc_c>. Acesso em: 13 mai. 2013.
VILLAÇA, Flávio. Dilemas do Plano Diretor. In: CEPAM. O município no século XXI: cenários e perspectivas. São Paulo: Fundação Prefeito Faria Lima – Cepam, 1999. p. 237 – 247.