É uníssono no ordenamento brasileiro que a lei penal não retroagirá. Porém se a nova lei traz benefício ao réu, excetua-se a regra anterior e passa-se a aceitar a aplicação retroativa do novel dispositivo legal. É isto que está insculpido no art. 5º, XL da Constituição Federal, bem como no parágrafo único do art. 2º do Código Penal.
Todavia, surgiu imbróglio doutrinário e jurisprudencial quando uma nova lei era mais benéfica apenas em parte quando comparada com a lei revogada. Surgiu o impasse se seria possível combinar ambas as leis, ou seja, a parte benéfica da lei revogada juntamente com a parte mais benéfica da nova lei.
Esta discussão foi potencializada quando da revogação da Lei 6368 de 1976 e da entrada em vigência da Lei 11343 de 2006, a famigerada lei de drogas. Esta nova lei tipifica em seu art. 33 o crime de tráfico de drogas, cuja pena mínima é 5 anos de prisão. Já a Lei 6368 tipificava em seu art. 12 o mesmo crime, porém com pena mínima de 3 anos de prisão. Desta forma, percebe-se que a nova lei não veio para beneficiar o réu.
Entretanto, a nova lei, a Lei 11343, criou uma causa de diminuição de pena no § 4º do art. 33 variável de 1/6 a 2/3 para os casos em que o réu for primário, tiver bons antecedentes e não se dedique às atividades criminosas nem integre organização criminosa. Destarte, percebe-se que neste ponto a nova lei beneficia o réu e deve retroagir.
O debate concentra-se nos casos de crimes de tráfico de drogas cometidos antes da nova lei e, portanto na vigência da Lei 6368 e em que o réu faz jus a esta causa de diminuição de pena prevista na nova lei. No que tange a nova pena mínima, a nova lei não poderá retroagir, pois mais gravosa. Devendo-se, assim, aplicar a Lei 6368.
Poder-se-ia, assim, aplicar a Lei 6368 no que tange a pena mínima – pois mais benéfica – e aplicar a causa de diminuição de pena da Lei 11343? Poder-se-ia, desta forma, combinar ambas as leis?
O Superior Tribunal de Justiça pacificou os questionamentos acerca deste tema com o advento de sua Súmula 501 e segundo a qual “É cabível a aplicação retroativa da Lei 11.343/2006, desde que o resultado da incidência das suas disposições, na íntegra, seja mais favorável ao réu do que o advindo da aplicação da Lei n. 6.368/1976, sendo vedada a combinação de leis”
Assim, o STJ vedou a combinação de leis penais no tempo com o advento de sua nova súmula. Corroborando tal entendimento, o Supremo Tribunal Federal no julgamento do Recurso Extraordinário 600817 asseverou não ser possível a aplicação da causa de diminuição do artigo 33, parágrafo 4º, da Lei 11.343, combinada com pena prevista na Lei 6.368.
A dúvida que fica é saber qual o entendimento destes tribunais superiores quando o novo Código Penal entrar em vigência, pois de acordo com o anteprojeto deste código a redação de seu art. 2, § 2º prevê que o juiz poderá combinar leis penais sucessivas, no que nelas exista de mais benigno. Percebe-se, desde já, que se o novo Código Penal for aprovado com esta redação o imbróglio de outrora voltará à tona. Qual será o posicionamento do STF e do STJ com esta nova redação? Isso serão cenas para os próximos capítulos do mundo jurídico brasileiro.