Rafael Oliveira e Silva[1]
Dayanna Silva Batista [2]
O presente artigo possui objetivo de demonstrar e divulgar o direito do contribuinte em pleitear administrativamente ou mediante ação judicial adequada o recebimento dos valores previdenciários recolhidos acima do limite máximo estabelecido por lei que são obrigatoriamente descontados em sua folha de pagamento mensalmente.
PALAVRAS-CHAVE: CONTRIBUINTE. INDÉBITO. INSS. LIMITE.
Antes de adentrar no tema acima deve-se, primeiramente, fazer uma abordagem geral sobre a Previdência Social.
Segundo Ítalo Romano Eduardo e Jeane Tavares Aragão Eduardo, “a Previdência Social que conhecemos na atualidade, surgiu através da Lei Eloy Chaves com o Decreto Legislativo de n°. 4.682 de 1923, em que foram criadas as caixas de aposentadorias e pensões para os trabalhadores das empresas ferroviárias aquela época.”
A previdência Social é um seguro obrigatório que visa garantir uma renda ao contribuinte e sua família, em casos inesperados ou de aposentadoria pelas suas diversas formas, doença, acidente, gravidez, prisão, morte, bem como garantir a reabilitação profissional, ou seja, a Previdência social serve para substituir a renda do segurado-contribuinte, quando da perda de sua capacidade laborativa total ou parcial, conforme afirma o próprio site da Previdência Social.[3]
Ademais, o segurado da Previdência Social é toda pessoa física que exerce atividade remunerada, efetiva ou eventual, com ou sem vínculo empregatício, bem como aquele que a lei define. Assim, temos dois pressupostos básicos para a condição de segurado, quais são: (i)ser pessoa física (ii)exercer atividade remunerada.
Importante frisar que a Previdência Social tem caráter contributivo e filiação obrigatória, conforme dispõe o Art. 201 da Constituição Federal. Ou seja, o indivíduo que necessite dos benefícios oferecidos deve necessariamente contribuir e ser filiado a Previdência Social, ao contrário da Assistência Social, na qual, não há necessidade de contribuição e filiação para receber qualquer benefício, bastando estar em estado de vulnerabilidade.
A partir desse introdutório e em conformidade com Jhenny Andrade, pode-se afirmar que os segurados que exercem atividade remunerada, contribuem com a previdência social com base na respectiva remuneração/ganho, no qual, engloba os ganhos habituais do empregado, a qualquer título, sob forma de moeda ou utilidades. Assim, a Previdência Social estabeleceu alíquotas diferenciadas para cada categoria de contribuinte.
Desde modo, de acordo com a Portaria do Ministério da Economia - ME Nº 9, de 15 de janeiro de 2019, têm-se alíquotas que variam de 8% a 11% do salário de contribuição para empregado, empregado doméstico e trabalhador avulso e alíquotas que variam de 5% a 20% para contribuintes individuais e facultativos, sendo este limitado ao teto de R$5.839,45 (cinco mil oitocentos e trinta e nove reais e quarenta e cinco centavos) em 2019. Ou seja, independentemente do tipo de segurado, a contribuição possui um limite máximo previsto em lei.
Insta salientar que esse limite se justifica através do fato de que os benefícios do Regime Geral de Previdência possuem um teto, ou seja não podem ser superiores a determinado valor, logo, a contribuição segue limite idêntico, pois o salário de contribuição não ultrapassa o valor fixado em lei.
Nesse contexto, no momento atual da nossa economia dos preços elevados e a necessidade de manutenção da economia familiar ou elevação da mesma, observa-se o crescimento de indivíduos que exercem, simultaneamente, mais de uma atividade remunerada, assim, tornando complexa a forma de contribuição para o Regime Geral da Previdência Social.
A Lei nº. 8.212/91, que trata da organização da Seguridade Social, bem como do Plano de Custeio, em seu art. 12, §2º, dispõe que todo aquele que exercer, concomitantemente, mais de uma atividade remunerada sujeita ao RGPS é obrigatoriamente filiado em relação a cada uma delas, ou seja, em relação a cada atividade remunerada, o segurado deverá recolher as contribuições previdenciárias correspondentes. (ANDRADE, Jhenny).
Assim sendo, reitera-se que o teto do salário de contribuição é limitado ao montante de R$5.839,45 (cinco mil oitocentos e trinta e nove reais e quarenta e cinco centavos), sendo assim, a Previdência estabeleceu referido valor como teto máximo para concessão dos benefícios previdenciários, não justificando contribuição maior ao que poderá ser concedido a título de benefício.
Todavia, nos casos em que o segurado exerce mais de uma atividade remunerada e aufere remuneração acima do teto, o controle dos valores a serem recolhidos quase sempre é feito pelo próprio contribuinte que na generalidade acaba não se atentando aos valores recolhidos em demasia. Pois, o INSS e a Receita Federal não realizam uma fiscalização assídua e, muitas vezes, o segurado - até por falta de informação - sofre prejuízos financeiros ao pagar valor superior ao que é devido.
Nesse sentido, a Instrução Normativa nº. 971/09 da Receita Federal do Brasil, que dispõe sobre normas gerais de tributação previdenciária e de arrecadação das contribuições destinadas à Previdência Social, esclarece em seu art. 87, § 2º, inciso I, alínea “b”, que quando a remuneração global do segurado for superior ao limite máximo do salário de contribuição, ele poderá eleger qual a fonte pagadora que primeiro efetuará o desconto, cabendo às que sucederem efetuar o desconto sobre a parcela do salário de contribuição complementar até o limite máximo do salário de contribuição. (ANDRADE, Jhenny).
Deste modo, o segurado deverá eleger uma fonte pagadora principal sobre a qual incidirá a contribuição previdenciária e, sendo esta valor igual ou maior ao máximo do salário de contribuição, a fonte secundária/subsidiária não poderá recolher mais tributos.
O salário de contribuição[4] será obtido a partir da soma das remunerações recebidas pelo segurado, sendo a primeira fonte igual ou superior ao teto, a secundária não poderá recolher tributo sobre a folha de pagamento do trabalhador. As contribuições podem ser consultadas através de suas folhas de pagamentos.
Entretanto, nem todos os empregadores se atentam ao disposto na Instrução Normativa ou transferem a responsabilidade ao empregado, dificultando o controle pelo mesmo, pois, estabelecem normas que levam o contribuinte ao erro.
Para exemplificar, evidencia-se, por exemplo, um médico que exerça atividade remunerada em dois hospitais obtendo mensalmente o salário de R$8.000,00 (oito mil reais). Observa-se que o primeiro empregador já recolhe o teto da previdência, assim, não podendo a fonte secundária realizar qualquer recolhimento em sua fonte. Não obstante, algumas empresas possuem requerimentos mensais, semestrais ou anuais a serem preenchidas pelo empregado para que não haja desconto, transferindo a responsabilidade do controle do recolhimento ao empregado.
Ademais, pode-se citar outro exemplo, utilizado no artigo da Jhenny Andrade, Restituição de contribuições pagas acima do teto do INSS, em que destacou a situação de um professor que exerce docência, de modo concomitante, em duas universidades, sendo que em cada um dos vínculos empregatícios recebe uma remuneração de R$3.500,00. Observa-se que a soma dos salários de contribuição ultrapassa o teto estabelecido pela autarquia previdenciária. Logo, este professor deverá informar a uma das empregadoras que os descontos a título de contribuição previdenciária deverão recair sobre valor inferior ao total da remuneração mensal, uma vez que possui fonte pagadora principal, ao passo que a secundária deve apenas complementar o valor até atingir o teto da contribuição.
No cotidiano, são comuns os descontos sobre o valor total das remunerações mensais, ultrapassando o limite de contribuição, sem observância das normas aplicáveis. Nestes casos, é possível a restituição dos valores pagos a maior, com a devida correção monetária, conforme entendimento do Superior Tribunal de Justiça. Para tanto, o segurado poderá requerê-la através do site da Receita Federal e, uma vez criado embaraços pelo órgão quando do dever de restituir, será possível o ajuizamento de ação judicial, chamada de “Repetição do Indébito” a fim de reaver os valores pagos acima do teto de contribuição.
De acordo com Hugo de Brito Machado Segundo, a Ação de Repetição do Indébito é assegurada constitucionalmente, pois, nenhum tributo será exigido sem lei que o estabeleça. Como consequência disso, a restituição do tributo pago indevidamente, seja ele decorrente de recolhimento sem amparo na lei, o que ocorre no presente caso, ou, seja decorrente da exigência inconstitucional, tem fundamento na Constituição Federal de 1988.
Pertinente ressaltar que a Ação de Repetição do Indébito é uma ação que tem por finalidade o reconhecimento desse direito, com a condenação do ente público à restituir valores que auferiu de forma excessiva. Vale ainda mencionar, que o Requerente (contribuinte) poderá requerer o ressarcimento referente aos 5 (cinco) últimos anos.
E mesmo que, seja um direito líquido e certo do contribuinte que recolheu a mais em sua folha de pagamento e que o artigo 165 do Código Tributário Nacional firma o direito à repetição do tributo indevido, a Receita Federal, por reiteradas vezes não acata os requerimentos administrativos, fazendo-se necessária a intervenção da tutela jurisdicional.
Com isso, ampliou-se muito na jurisprudência dos Tribunais Pátrios, o entendimento de que se comprovado o recolhimento com valor excedente ao teto máximo do salário de contribuição, em atenção ao exercício concomitante de duas atividades remuneradas vinculadas ao Regime Geral da Previdência Social, para fins contributivos, deverá ser assegurado o direito à restituição dos valores descontados, aplicando-se a correção monetária, em consonância com o Código Tributário Nacional. Veja-se:
PROCESSUAL CIVIL E TRIBUTÁRIO. PRESCRIÇÃO. CONTRIBUIÇÕES PREVIDENCIÁRIAS. COBRANÇA DE VALOR ACIMA DO TETO PREVISTO NA LEI Nº 8.212/1991. RESTITUIÇÃO. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. 1. O Pleno do egrégio Supremo Tribunal Federal, em julgamento com aplicação do art. 543-B do Código de Processo Civil de 1973 (repercussão geral) (RE 566.621/RS, Rel. Min. Ellen Gracie, trânsito em julgado em 17/11/2011, publicado em 27/02/2012), declarou a inconstitucionalidade do art. 4º, segunda parte, da Lei Complementar nº 118/2005, decidindo pela aplicação da prescrição quinquenal para as ações de repetição de indébito ajuizadas a partir de 09/06/2005. 2. De acordo com o entendimento deste egrégio Tribunal: "A Lei 8.212/1991 prevê o salário de contribuição (art. 28, I a IV), sobre o qual incidirá a alíquota devida (art. 20), que incidirá sobre o total das remunerações recebidas pelo segurado, considerado valor mínimo (art. 28, § 3º) e também limitada ao teto do salário de contribuição (art. 28, § 5º). [...] Comprovado o pagamento acima do teto previsto, devida a restituição ao contribuinte, nos termos do art. 165 do CTN" (AC 0001737-80.2004.4.01.3800, Rel. Des. Federal Maria do Carmo Cardoso, Oitava Turma, julgado em 17/06/2011, DJe 23/09/2011). 3. Os honorários de sucumbência têm característica complementar aos honorários contratuais, haja vista sua natureza remuneratória. 4. Ademais, a responsabilidade do advogado não tem relação direta com o valor atribuído à causa, vez que o denodo na prestação dos serviços há de ser o mesmo para quaisquer casos. 5. A fixação dos honorários advocatícios deve guardar observância aos princípios da razoabilidade e da equidade, considerando-se o previsto nos incisos I a V do § 3º c/c o inciso II do § 4º do art. 85 do NCPC, cujo montante deverá ser apurado no momento processual oportuno. 6. Remessa oficial não provida. Apelação parcialmente provida. TRF1. (07 de 12 de 2018). APELAÇÃO CIVEL (AC) : AC 0006797-38.2007.4.01.3700. Relator Hercules Fajoses. DJ 07/12/2018. Acesso em 16 de 10 de 2019, disponível em JusBrasil: https://trf-1.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/661612905/apelacao-civel-ac-ac- 67973820074013700?ref=juris-tabs
Tal entendimento se consolidou após debates, tendo em vista que o direito brasileiro veda o aumento de patrimônio de um indivíduo às custas de um terceiro. E, ocorrendo descontos acima do permitido pela lei e por regimentos, sem a correspondente devolução a pessoa física, resultaria no enriquecimento ilícito pela Autarquia Previdenciária.
Conclui-se então que o segurado, que exerce atualmente ou que já exerceu atividades concomitantes e que teve recolhimento superior referente a contribuição previdenciária ao teto estabelecido legalmente, poderá reaver tais valores, mês a mês, devidamente corrigidos e com juros de mora, desde que seja observado o prazo decadencial de cinco anos, na proposição da ação judicial.
[1] Advogado. Pós Graduando em Direito de Empresa pela PUC-MG. E-mail: [email protected]
[2] Graduanda do Curso de Direito do Centro Universitário de Belo Horizonte – MG (UNI-BH). E-mail: [email protected]
[3] Regime Geral – RGPS. Acesso em 03 de setembro de 2019. Disponível em: <http://www.previdencia.gov.br/perguntas-frequentes/regime-geral-rgps/>
[4] Salário contribuição é o valor que serve de base para a incidência das alíquotas das contribuições sociais. (EDUARDO, Ítalo; EDUARDO, Jeane)