ALIENAÇÃO PARENTAL: UM ESTUDO INTERDISCIPLINAR SOBRE A LEI 12.318 DE 2010.


17/08/2014 às 17h57
Por Ribeiro e Miranda Advocacia e Consultória Jurídica

A Constituição Federal Brasileira de 1988 estabeleceu que é dever da família, da sociedade e do Estado garantir o direito fundamental à convivência familiar para toda criança e adolescente, colocando-os a salvo de toda forma de negligência, violência e crueldade. Entretanto, o texto constitucional, no que se refere a esta garantia, não é plenamente eficaz, uma vez que sua aplicabilidade pode ser prejudica em caso de brigas judiciais durante ou após a separação do casal.

Neste sentido, a SAP (Síndrome de Alienação Parental), distúrbio de ocorrência comum em menores de idade com pais em disputas judiciais ocorre quando o genitor ou genitora, separados, disputam a guarda da criança ou adolescente e o manipula, induzindo-o ao rompimento dos laços afetivos com o outro genitor alienado. Trata-se de uma forma grave de violência simbólica contra a criança e o adolescente em que a única forma de proteção é o diagnóstico precoce e imediata denúncia ao judiciário para que o juízo declare a ocorrência de alienação parental, e advirta o guardião alienador, mediante intimação, para que desfaça a barreira psicológica que impede a aproximação entre o genitor alienado e a criança ou adolescente, em benefício do desenvolvimento sadio desta, conforme o art. 6º, inciso I da Lei n.º12.318, de 2010, sob pena de estipulação de multa guardião alienador (art. 6º, inciso III, Lei n.º12.318, de 2010).

O Estado encontra óbices demasiados resistentes para que possa entrar na esfera particular(vida privada), assim, a única forma de prevenção é a denúncia imediata ao poder judiciário logo que seja percebida a ocorrência de alienação parental. Para que haja maior efetividade da lei em estudo, bem como da constituição é preciso que o Estado providencie a mediação dos profissionais da área da saúde mental e assistência social que podem auxiliar na prevenção e tratamento da SAP.

É mais que evidente a preocupação predominante do estado com a violência física em detrimento da violência simbólica contra a criança ou adolescente submetido à atmosfera de brigas judiciais envolvendo seus guardiões.

No antigo Código Civil de 1916, como a família era limitada ao grupo do casamento, só havia família se houvesse matrimônio. A dissolução do matrimônio era impedida e caso houvesse algum vínculo extramatrimonial ou filhos ilegítimos havia uma punição que excluía direitos. Neste sentido, ensina a doutrina de Maria Berenice Dias que: “A família tinha uma formação extensiva, verdadeira comunidade rural, integrada por todos os parentes, formando uma unidade de produção, com amplo incentivo à procriação. Sendo uma entidade patrimonializada, seus membros eram força de trabalho. O crescimento da família ensejava melhores condições de sobrevivência a todos. (..) Esse quadro não resistiu a revolução industrial, que fez aumentar a necessidade de mão-de-obra, principalmente nas atividades terciárias”[1]

Os avanços sociais trouxeram mudanças de paradigmas na estrutura familiar, com a Constituição Federal de 1988 e o Código Civil de 2002. Hoje, o homem e a mulher estão em "pé de igualdade", tanto economicamente, quanto socialmente. Dessa forma, na hipótese de separação dos cônjuges que tenha filhos crianças e adolescentes, sendo as famílias mais instruídas é comum a guarda compartilhada, prevista na prevista na Lei 11.698/2008. Todavia o contingente variado de famílias em nosso país continental não apresenta o grau de instrução e inteligência emocional necessário o uso da guarda compartilhada. Por tudo isso, reinterasse manipulações a criança e ao adolescente que propriciam o surgimento da Síndrome da Alienação Parental. Ou seja, é nas famílias desestruturadas que surgem cidadãos desestruturados, na grande maioria dos casos.

O instituto da guarda compartilhada encontra-se plasmado no art. 3° da Lei 12.318/10 que demonstra, com perfeita técnica jurídica, que a prática do ato de alienação parental fere o direito fundamental da criança ou do adolescente à convivência familiar saudável, prejudicando a realização de afeto nas relações com genitor e com o grupo familiar, constitui abuso moral contra a criança ou o adolescente e descumprimento dos deveres inerentes à autoridade parental ou decorrentes de tutela ou guarda. Ademais, há dialogo entre o sobredito artigo e a Constituição Federal em seu art. 226 que garante o direito fundamental à convivência familiar, bem como a Lei n° 8069 de 13 de julho de 1990 (Estatuto da Criança e do Adolescente em seu art.19).

Assim, ocorrendo a alienação parental além dos prejuízos ao direito do genitor alienado, haverá forte abalo a formação dos filhos objetos dessas disputas perniciosas. Os filhos terão prejuízo por sofrerem uma verdadeira lavagem cerebral, bem como perderem o outro genitor como referência.

Venosa esclarece que “O guardião em geral, seja ele divorciado ou fruto de união estável desfeita, passa a afligir a criança com ausência de desvelo com relação ao outro genitor, imputando-lhe má conduta e denegrindo a sua personalidade sob as mais variadas formas. Nisso o alienador utiliza todo o tipo de estratagemas. Trata-se de abuso emocional de consequências graves sobre a pessoa dos filhos. Esse abuso traduz o lado sombrio da separação dos pais. O filho é manipulado para desgostar ou odiar o outro genitor.” (grifo nosso)[2]

No que se refere à questão dos aspectos psicológicos nós temos que a criança vítima da Alienação Parental passa a expressar um comportamento hostil, criando os mesmos sentimentos de rejeição pelo pai ou mãe que o guardião alienador externa e lhe transfere.

O genitor alienador apresenta diversos sintomas, conforme podemos ver na lição de François Podevyn que elenca uma lista de comportamentos típicos de um genitor alienador:“a)-Recusar de passar as chamadas telefônicas aos filhos; b)Organizar várias atividades com os filhos durante o período que o outro genitor deve normalmente exercer o direito de visitas; c)Apresentar o novo cônjuge aos filhos como sua nova mãe ou seu novo pai; d)Interceptar as cartas e os pacotes mandados aos filhos; e)Desvalorizar e insultar o outro genitor na presença dos filhos; f)Recusar informações ao outro genitor sobre as atividades em que os filhos estão envolvidos (esportes, atividades escolares, grupos teatrais, escotismo, etc.); g)Falar de maneira descortês do novo conjugue do outro genitor; h)Impedir o outro genitor de exercer seu direito de visita; i)“Esquecer” de avisar o outro genitor de compromissos importantes (dentistas, médicos, psicólogos); j)Envolver pessoas próximas (sua mãe, seu novo conjugue, etc.) na lavagem cerebral de seus filhos; k)Tomar decisões importantes a respeito dos filhos sem consultar o outro genitor (escolha da religião, escolha da escola, etc.); l)Trocar (ou tentar trocar) seus nome e sobrenomes; m)Impedir o outro genitor de ter acesso às informações escolares e/ou médicas dos filhos; n)Sair de férias sem os filhos e deixá-los com outras pessoas que não o outro genitor, ainda que este esteja disponível e queira ocupar-se dos filhos; o)-Falar aos filhos que a roupa que o outro genitor comprou é feia, e proibi-los de usá-las; p)-Ameaçar punir os filhos se eles telefonarem, escreverem, ou a se comunicarem com o outro genitor de qualquer maneira; q)-Culpar o outro genitor pelo mau comportamento dos filhos.”[3]

Não custa mencionar que os Tribunais de Justiça do país, vem se posicionando sobre o tema, evidenciando esmero no cuidado da criança e adolescente vítima da SAP, como por exemplo mantendo visitas e arbitrando multas para desestimular condutas do genitor alienador, conforme podemos ver nas seguintes decisões: “AGRAVO DE INSTRUMENTO. AÇÃO DECLARATÓRIA DE ALIENAÇÃO PARENTAL. MEDIDA DE SUSPENSÃO TEMPORÁRIA DAS VISITAS. Mostra-se prudente manter a liminar de suspensão temporária das visitas, a fim de assegurar o bem estar da criança, mormente sua saúde psíquica. Agravo de instrumento desprovido. (SEGREDO DE JUSTIÇA) (Agravo de Instrumento Nº 70047112321, Sétima Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Jorge Luís Dall'Agnol, Julgado em 16/05/2012) (TJ-RS - AI: 70047112321 RS, Relator: Jorge Luís Dall'Agnol, Data de Julgamento: 16/05/2012, Sétima Câmara Cível, Data de Publicação: Diário da Justiça do dia 18/05/2012)”(grifo nosso). “AGRAVO DE INSTRUMENTO. AÇÃO CAUTELAR. PEDIDO DE SUSPENSÃO DE VISITAS. SUSPEITA DE ABUSO SEXUAL. ACUSAÇÃO DE ALIENAÇÃO PARENTAL. 1. Tendo sido apreciado com o necessário cuidado e lançada decisão com suficiente clareza, com criteriosa regulamentação de visitas, cabe à parte cumprir com a decisão judicial. 2. A relutância no cumprimento do que foi decidido deixa transparecer preocupante situação de alienação parental, dando corpo às acusações feitas pelo recorrido no seu contraponto às acusações de abuso sexual. 3. Descabe determinar que outras pessoas acompanhem a visitação,...(TJ-RS - AI: 70050929967 RS , Relator: Sérgio Fernando de Vasconcellos Chaves, Data de Julgamento: 11/09/2012, Sétima Câmara Cível, Data de Publicação: Diário da Justiça do dia 14/09/2012)”

Em sede de conclusão, podemos perceber que o tema objeto deste trabalho é demasiado delicado, uma vez que tem por objeto complexas relações particulares, blindadas pelas paredes da casa que se presume um lar.

  • Direito de Família
  • Divócio
  • Alienação parental

Referências

[1] DIAS, Maria Berenice. Manual de Direito das Famílias. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2005, p. 24.

[2] VENOSA, Silvio de Salvo. Direito civil: direito de família. 11. ed. São Paulo: Atlas, 2011, p.320

[3] PODEVYN, François. Síndrome de Alienação Parental. Disponível em: . Acesso em: 24 junho. 2013


Ribeiro e Miranda Advocacia e Consultória Jurídica

Bacharel em Direito - Teresina, PI


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