No direito, após respeitados e transpassados os ritos processualísticos, chegamos à tão buscada Coisa Julgada. De forma mais clara, a Coisa Julgada, nada mais é do que a entrega da prestação jurisdicional pelo aspecto material, ou seja, o julgador julga adentrando o mérito, o cerne, da questão outrora discutida.
Tratando-se do âmbito criminal, a coisa julgada pode ser afastada por meio de Revisão Criminal, tendo em vista que a decisão outrora firmada, pode estar eivada de vício de nulidade por exemplo.
O respeitável doutrinador Renato Brasileiro de Lima, nos ensina o conceito de Revisão Criminal em sua obra Manual de Processo Penal, 5ª Edição, pág. 1806, senão vejamos:
"pode ser compreendida como ação autônoma de impugnação, da competência originária dos Tribunais (ou das Turmas Recursais, no âmbito dos Juizados), a ser ajuizada após o trânsito em julgado de sentença condenatória ou absolutória imprópria (leia-se, exclusivamente em favor do acusado), visando à desconstituição da coisa julgada, sempre que a decisão impugnada estiver contaminada por erro judiciário".
Várias podem ser as situações que ensejam a Revisão Criminal a fim de efetivar direitos constitucionalmente resguardados, sendo as mais comuns conforme inteligência do artigo 621 do Código de Processo Penal, como a seguir demonstrado:
Art. 621. A revisão dos processos findos será admitida:
I - quando a sentença condenatória for contrária ao texto expresso da lei penal ou à evidência dos autos;
II - quando a sentença condenatória se fundar em depoimentos, exames ou documentos comprovadamente falsos;
III - quando, após a sentença, se descobrirem novas provas de inocência do condenado ou de circunstância que determine ou autorize diminuição especial da pena.
Indo mais a fundo, tem-se uma questão bastante controvertida que é a possibilidade ou não do cabimento de Revisão Criminal em caso de surgimento de entendimento jurisprudencial mais benéfico. Na doutrina podemos encontrar posicionamentos divergentes, tanto no sentido de que é perfeitamente possível o cabimento da Revisão Criminal como também ser incabível.
O notável doutrinador Guilherme Nucci entende que:
"Como regra, não deve provocar a revisão criminal. O entendimento acerca de diversos temas, questões fáticas e jurídicas, pode mudar ao longo do tempo, não sendo causa válida para justificar a revisão da pena aplicada. Aliás, da mesma forma que a jurisprudência minoritária pode passar a ser majoritária, ninguém garante que o caso do sentenciado não seria julgado, novamente, por magistrados integrantes da mesma corrente orientadora da anterior condenação".
Já para Gustavo Badaró, tal entendimento afronta o princípio da legalidade, senão vejamos:
"Discorda-se de tal entendimento. A questão deve ser tratada a partir de uma premissa realista do princípio da legalidade, reconhecendo-se de complementariedade entre a lei e sua interpretação. Se houver mudança jurisprudencial em tema já estável e consolidado, num sentido mais benéfico aos acusados, isso não poderá deixar de ser levado em conta".
Particularmente, discordo do posicionamento de Guilherme Nucci e concordo com Badaró visto que, o último estabelece uma vertente mais garantista e legalista, o que é corretíssimo do ponto de vista constitucional pois, a Carta da Republica, mais precisamente em seu artigo 5º inciso XL assevera claramente que "a lei penal não retroagirá, salvo para beneficiar o réu".
Alguns podem até tentar argumentar dizendo que, a Carta da Republica foi clara ao usar a palavra "lei" e não "decisão" para tratar sobre a retroatividade penal, porém, eu pergunto: Jurisprudências (decisão colegiada, acordão, como quiser chamar), são proferidas com base em uma lei vigente, logo, se o entendimento deixou de ser rigoroso, por óbvio a interpretação sobre determinado tipo legal passou a ser mais benéfico, então, diante disso, qual a justificativa para o posicionamento dos Tribunais de Justiça não poderem retroagir a fim ensejar e embasar uma Revisão Criminal para tutelar um direito anteriormente restringido mas agora oportunizado?
Em suma nobres leitores, se interpretarmos o referido texto Constitucional de modo a afastar a possibilidade da aplicação de um posicionamento novo e mais benéfico pacificado nos Tribunais de Justiça em situações onde já ocorreram o trânsito em julgado (Revisão Criminal), estaremos, sem dúvida, agindo com indiferença frente ao texto legal (artigo 5º XL: retroatividade penal) e consequentemente afrontando nossa tão virtuosa Carta da Republica.